Natal 2020: Covid-19 traz dificuldades ao setor cultural

Produção de eventos e contratação de artistas para as festividades de fim do ano sofrem com cascata de adiamentos e restrições

por Vitória Silva sex, 02/10/2020 - 12:04
Mauro Smith Mauro Smith

Recentemente, adjetivos que cercam um “novo formato” têm sido utilizados com frequência. Para o setor cultural, o “novo normal” tem significado uma série de cancelamentos, adiamentos e restrições que frustram a prática artística, ainda que por extrema necessidade. O Natal de 2020 deverá ser diferente em todas as cidades do país. Uma das festas mais esperadas do ano trará na sua nova realidade menos interação com o Papai Noel e restrições para a ceia da família.

A capital pernambucana já adia e cancela eventos desde março, com o início do isolamento social na cidade. O espetáculo do Boi Voador, que faz parte da cerimônia de aniversário do Recife, foi cancelado ainda no início da pandemia. A estreia da Seleção Brasileira nas Eliminatória da Copa do Mundo de 2022 e o encontro nacional de prefeitos também. 

Em 26 de setembro, o Governo de Pernambuco publicou no Diário Oficial do Estado três portarias detalhando os novos protocolos para a retomada dos eventos sociais e culturais, autorizados a partir da 9ª etapa do Plano de Convivência das Atividades Econômicas com a Covid-19.

Desde o dia 28 de setembro, os municípios das Gerências Regionais de Saúde (Geres) 1, 2, 3, 4 e 12 passaram a poder realizar eventos com limite máximo de público de até 100 pessoas ou 30% de ocupação do espaço. Será possível, ainda, reabrir cinemas e teatros sob a adoção de medidas preventivas.

Tratando-se de uma festa mais íntima, e parte de toda celebração de encerramento de ano para as famílias brasileiras, o Natal 2020 consequentemente não foi cancelado no Recife, mas se organiza em ritmo lento e com grandes dificuldades para os artistas, sobretudo os que compõem espetáculos de natal.

O LeiaJá conversou com o professor de teatro Ytalo Santana, que produz o grupo O Tapete Voador e trabalha em uma academia de artes em Boa Viagem, Zona Sul do Recife. Ambos tiveram suas atividades afetadas ou temporariamente interrompidas por causa da pandemia. Ytalo diz que o único trabalho que se manteve foi o de professor de teatro na academia, e que a expectativa para uma retomada completa é grande.

O artista também compartilhou a sua frustração quanto à falta de reconhecimento geral com a classe artística. “A pandemia está servindo para mostrar o quanto ainda a arte é marginalizada. A última classe a ser socorrida pelo governo foram os artistas e os profissionais técnicos da arte. E mesmo assim, os recursos da Lei Aldi Blanc ainda não foram repassados ao nosso estado. O que me espanta neste cenário é: a arte está sendo consumida em massa desde o início do isolamento, e não se tem um olhar reflexivo sobre como esses artistas vão pagar suas contas daqui pra frente?”, questionou.

Sobre os desafios na retomada de atividades, Ytalo diz que a condição de retomada em si já pode ser inviável. “É o seguinte, a gente sabe que vai ter alguns trabalhos, sim. Mas pensa comigo: o caixa de um grupo que está parado há cinco meses precisa se recuperar. Então, os trabalhos do final de ano serão para “tapar um buraco” que esses meses vêm deixando”, explicou. 

Uma das saídas tem sido utilizar o Instagram e demais redes sociais para divulgar o conteúdo produzido e tentar fechar trabalhos. “Por lá (redes) que fortalecemos os laços e deixamos acesa a chama do "já já a gente se encontra”, comentou. Apesar da reabertura, Ytalo acredita que poucos artistas se arriscarão em uma retomada. Ele também diz que a busca por lives diminuiu bastante.

Com o Dia das Crianças se aproximando, o professor diz que alguns telefonemas já foram feitos, mas nada com o ritmo de antes. Sobre os trabalhos de Natal, a realidade é ainda mais escassa. “O Natal é uma época que eu trabalho bastante como produtor do grupo. Porém, até o momento, só apareceram dois eventos para outubro. As empresas privadas do setor cultural ainda estão se restabelecendo”, acrescentou.

No entanto, além do financeiro, uma outra queixa disputa a urgência do artista: a saudade do público. “Quando a gente prepara um espetáculo, uma apresentação, uma sessão de histórias, a gente tem o cuidado muito grande com o nosso público. O olho no olho, o abraço, as palmas. Então, essa ausência do calor humano chega a ser angustiante. A saudade do palco dói”, disse o artista.

Marília Maia, diretora geral da academia onde Ytalo trabalha, também comentou que, apesar dos espetáculos de natal serem uma grande contratação da escola nos fins de ano, ela não espera fechar trabalhos para o natal de 2020.

O LeiaJá também entrou em contato com as assessorias dos shoppings Recife e RioMar, os dois maiores da Região Metropolitana, e populares pelos eventos de chegada do Papai Noel e solenidade de Natal. Os centros comerciais seguem em negociação com as agências de eventos, e ainda não têm informações concretas à imprensa ou ao público. Porém, ambos confirmaram a celebração natalina deste ano, e os detalhes devem ser divulgados no começo de novembro. A assessoria do Shopping RioMar ainda mencionou a produção de uma coletiva de imprensa, que divulgará o protocolo de medidas para a solenidade.

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