Escritores enfrentam a pandemia com força criativa

Afetados pelo isolamento social e sob impacto da crise, autores paraenses se dedicam à escrita e publicam livros para sobreviver a dores e inquietações

qua, 31/03/2021 - 16:09

Desde o primeiro caso confirmado de covid-19 no Pará, em março de 2020, a pandemia do novo coronavírus mudou a vida das pessoas. Afetados pelo isolamento social, escritores paraenses analisam como a crise interferiu na produção de textos e esclarecem como o ato de escrever ajuda a suportar as dificuldades.

Para o escritor e poeta Alfredo Garcia, escrever durante a pandemia é uma forma de resistir. “Sem a produção de conteúdo literário, eu teria sucumbido durante esse isolamento. A arte foi o que me permitiu, até o momento, sobreviver nesse período pandêmico”, afirmou.

Alfredo também afirma que a covid-19 e o isolamento social influenciaram na produção de textos no último ano. “Houve uma inquietação criativa, e eu procurei dar vazão através da produção literária”, contou. Dessa inquietação surgiram o livro de poesias “Pandemia e Outros Poemas” e os romances “Fiapo” e “A Inquietante Gênese do Nada”. Além das novas obras, Alfredo relançou, junto com a editora Pará.grafo, “O Livro de Eros”, obra de 1998 considerada um clássico contemporâneo da literatura da Amazônia. 

No livro de poemas, diz Alfredo, o foco é a pandemia. "O distanciamento de pessoas que tinham uma troca de afeto. Essa produção dialoga com a minha existência”, explicou. Alfredo usou as redes sociais para publicar os poemas que agora virarão livro. “Os poemas foram divulgados no meu perfil no Facebook. Depois se tornaram e-book. E agora vai ser um livro impresso a partir do mês de abril”, detalhou.

O autor também escreve letras de músicas durante o isolamento. “Escrevo letras de canções de Música Popular Brasileira. Com parceiros tenho lançado singles. Estamos preparando EPs.  Tem um pronto para lançar em maio e outro na metade do ano”, declarou. Para Alfredo, o papel na pandemia, não só do escritor que produz literatura, mas do artista de forma geral, é muito importante. “Em nenhuma época da vida humana nós tivemos tanta necessidade de arte para que a alma pudesse respirar. Eu procuro fazer isso”, finalizou.

Para a escritora e poeta Telma Cunha, a pandemia trouxe certa dificuldade para escrever durante o isolamento. “Eu preciso de silêncio e a pandemia tem feito muito barulho em mim. Nesses dias cinzentos, muitas vezes, o poema flerta comigo, mas não vem”, afirma a poeta. Mesmo assim, a autora tenta escrever sempre que possível. “Rascunho poesia por todos os lugares: manuscritos, no computador, celular. Às vezes, escrevo até na palma da mão”, explica.

Telma conseguiu superar as dificuldades durante o isolamento e escrever um livro de aldravias – poemas de 6 versos e 6 palavras – intitulado “Pé ante pétalas”, sobre o cotidiano e as dores provocadas pela covid-19, e o conto infantil “A menina dos olhos de arco-íris”. A poeta faz uso da internet para divulgar as obras e manter contato com público. “As redes sociais e as lives me ajudam a não perder o elo com os leitores”, contou.

Assim como Alfredo Garcia, Telma acredita na capacidade do escritor de ajudar as pessoas a suportar o isolamento social. “Nessa ausência de liberdade, a minha poesia tem tocado as pessoas. Feito com que elas respirem aliviadas”, declarou. Uma amante de metáforas, a autora afirma que a palavra escrita representa, para ela, a coragem para suportar a pandemia. “Enquanto espero os primeiros raios iluminarem o Brasil para sermos felizes de novo. Livres desse vírus”, concluiu.

Mercado editorial

Os escritores não foram os únicos a sentirem os efeitos da pandemia do novo coronavírus. As editoras também tiveram vendas e publicações afetadas durante esse período, causadas pelo isolamento social dos consumidores.

A Pará.grafo Editora teve apenas seis títulos literários lançados no ano passado. Três foram produzidos por meio de financiamento coletivo, no site Catarse: “Ribanceira”, uma reedição do último romance do escritor Dalcídio Jurandir; o livro de crônicas “Panela de Barro”, de Jacques Flores; e “Antologia da Poesia Paraense”, uma coletânea que reúne 20 escritores da região.

Para o escritor e editor responsável pela Pará.grafo, Dênis Girotto, as empresas e os empreendedores tiveram uma grande necessidade de buscar novas formas de trabalhar durante o período pandêmico.

No caso da editora, ele explica que a saída encontrada foi buscar soluções para custeamento de "vaquinhas" virtuais e apostar em livros on-line. “Estamos tentando nos reinventar. Muitos leitores estão migrando para o e-book, que são mais baratos, ou os audiobooks, que são livros em que [a pessoa] ouve as histórias. São mais acessíveis e os leitores estão migrando para isso.”

A situação nas gráficas não é nada positiva. Dênis Girotto relata que, este ano, os insumos de produção para um livro aumentaram cerca de 20% em comparação com 2020. 

Apesar das dificuldades, Dênis diz querer abrir espaço para o livro e permitir o acesso à literatura pelo público, principalmente os jovens. Tornar o produto mais barato é a meta do editor, que acredita na leitura como transformação social no Brasil.

Por Amanda Martins e Felipe Pinheiro.

 

 

 

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