Sem perfil: adoção é encontro de almas e ato de amor

Se as pessoas se abrissem para o diferente, não existiria crianças e adolescentes à espera de uma nova família

por Jameson Ramos sab, 25/05/2019 - 12:33

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O número não bate. Pernambuco tem atualmente mais de 1.191 pessoas dispostas a adotar, e 218 crianças e adolescentes cadastradas e aptas ao processo. No entanto, o grande problema para que essa conta feche é o perfil, ou idealização construída pelos pretendentes à adoção. A maioria ainda prefere bebês, contribuindo para que o número de pretendentes tenha uma absurda disparidade em relação ao quantitativo de menores que estão à espera de uma nova família.

Crianças negras, ou com algum tipo de deficiência e, principalmente, as mais "velhas" são as que mais enfrentam dificuldades para encontrarem um novo lar. Dados do Conselho Nacional de Justiça apontam que, no Brasil, 85,56% do total de aptos para adoção têm entre 7 e 17 anos de idade, o que representa 4.309 crianças e adolescentes. Contudo, apenas cerca de 11% dos pretendentes adotariam crianças nessa faixa etária.

Em Pernambuco, a realidade não é diferente. No total, 84,4 % de crianças e adolescentes disponíveis para adoção tem entre 7 e 17 anos de idade, correspondendo a 184 crianças e adolescentes, mas só 12% dos pretendentes adotariam crianças de sete anos ou mais. De acordo com o Tribunal de Justiça, os jovens perto de completarem 18 anos veem as chances de conseguirem uma nova família diminuir bruscamente. No país, apenas 157 pessoas adotariam meninos e meninas com 17 anos de idade. Em Pernambuco, apenas 4 das pessoas cadastrados aceitariam adotar nessas condições.

Ivison José Guimarães, 37 anos, juntamente com o Carlos Alberto da Silva, 37 anos, enquanto casados conseguiram furar essa bolha e adotaram três menores que já estavam na faixa das crianças e adolescentes que enfrentam maiores dificuldades para serem adotados. Depois que resolveram que queriam viver a paternidade juntos, o (agora ex) casal entrou na fila da adoção, na comarca de Jaboatão dos Guararapes, no Grande Recife.

Ivison relata que todo o processo rolou mais rápido do que imaginou. Pouco tempo depois de todo o processo necessário para a adoção, Carlos Eduardo Silva Rodrigues de Melo, agora com 11 anos, somou na vida do (ex) casal. O amor pela adoção foi tamanha que Carlos e Ivson resolveram possibilitar irmãos para o primogênito.

Foi assim que os irmãos biológicos João Lucas e Ivison Junior entraram na família Guimarães Silva.

Em entrevista ao LeiaJá, a secretária da Comissão Judiciária de Adoção de Pernambuco, juíza Hélia Viegas, diz que as pessoas preferem mais as crianças de menor idade, talvez, idealizando a concepção do parto, onde todos os cuidados serão dados desde os primeiros dias de vida do bebê. Uma outra preocupante possível explicação é o medo dos mitos.

“Há mitos de que aquela criança ou adolescente não vão se adaptar à nova família e que eles não vão formar um vínculo afetivo com os seus pais adotivos. Existem mitos que precisam ser desconstruídos para esses pretendentes que querem adotar - daí a importância de se passar pelos grupos de formação”, pontua a juíza.

Muitos dos pretendentes que estão na fila da adoção, anseiam por crianças com idade inferior a 3 anos - quanto menor a idade, mais pessoas querem adotar. No entanto, parece que no final do túnel tem um grupo, crescente, acendendo uma luz. Levantamento do Tribunal de Justiça de Pernambuco mostra que, mesmo o perfil idealizado por maioria seja um entrave para acabar com o número de menores que esperam pela chance de um novo lar, o número de adolescentes adotados está crescendo nos últimos anos.

Dos 127 adotados em 2018 em Pernambuco, 93 são crianças e adolescentes de 3 a 17 anos, o que corresponde a 73,2 % do total. Os números divulgados pelo TJ mostram praticamente o mesmo percentual do ano de 2017, quando dos 132 adotados, 93 estavam incluídos nessa mesma média de idade, equivalendo a 70,4% do geral.

18 anos e ainda não foi adotado? Na guarda do poder público

Ao chegar na maioridade, as pessoas que não foram adotadas continuam em instituições destinadas ao público infanto-juvenil, onde há um trabalho para que elas possam ser transferidas para as chamadas repúblicas ou casas de acolhidas destinadas ao público adulto. “Se não conseguir ter a sua própria autonomia financeira, não vai ser abandonado pelo poder público, que tem por obrigação protegê-lo, ainda que já adulto”, finaliza a juíza e secretária da Comissão Judiciária de Adoção de Pernambuco, Hélia Viegas

Como conseguir a adoção

O pretendente tem que entregar os documentos necessários na Vara da Infância e Juventude do município onde mora, ter condição financeira que possibilite uma educação mínima ao filho, passar por cursos de avaliação e formação, onde será informado da realidade das crianças e adolescentes disponíveis para a adoção. Cumprindo esses requisitos, a habilitação é dada e o nome do pretendente inserido no Cadastro Nacional de Adoção (CNA).

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