#FicaVivi: família luta para permanecer com filha adotiva

Nesta quinta-feira (25), o Tribunal de Justiça de Minas Gerais decide se a criança deve voltar para a casa da avó biológica, mesmo após seis anos com os pais adotivos

por Victor Gouveia qui, 25/02/2021 - 09:45

Retirada da família biológica por maus-tratos aos dois anos de idade e abandonada em um abrigo por um ano, Vivi só teve seu amor correspondido ao escolher o casal Carolina e Manuel. Aos nove anos recém-completados, os últimos seis foram de convívio acolhedor ao lado dos pais adotivos. Nesta quinta-feira (25), o Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG) julga se a criança deve voltar para a casa da avó biológica. A inconsistência da eventual decisão é caracterizada pelo apoio da ministra Damares Alves e o abaixo-assinado #FicaVivi, que possui mais de 300 mil assinaturas.

Nessa quarta (24), uma carreata atravessou as ruas de Belo Horizonte com destino à sede do Tribunal, para mobilizar tanto a Justiça, quanto a sociedade civil sobre o drama de perder a única filha. O que ainda é mais grave pelo fato do casal ter atravessado toda a burocracia do processo de guarda. "É uma pancada muito forte. Não é uma pancada numa criança ou em uma família. Ela é uma pancada no 'universo da adoção', especialmente sobre aqueles que ainda estão ansiosos pelos seus filhos", afirmou a mãe adotiva Carolina. Ela acrescentou que todo sistema de adoção foi impactado pela instabilidade gerada com o caso da filha.

A postura da Justiça fragiliza até mesmo as determinações do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), que preza pelo melhor interesse do menor e garante sua capacidade legal de defesa. "A mensagem é de total insegurança jurídica. A mensagem deixada é de que a adoção é frágil. Ela não acontece por causa do fator sanguíneo apenas [...] quer se privilegiar o biologismo em detrimento ao melhor para a criança", considera o pai Manuel.

Enquanto esteve em um abrigo, Vivi chegou a ser oferecida à avó, que recusou a guarda. O pai biológico cumpre pena domiciliar por envolvimento na morte do próprio pai e a mãe fugiu. "Quando nossa filha veio e o processo deu sentença na questão da destituição do poder familiar, aí começou de uma maneira mais vibrante a procura dessa avó", lembra o pai, que pontuou sobre a Ação de Destituição do Poder Familiar (ADP), proposta em 2014, e a decisão provisória contrária aos interesses da família adotiva, em novembro de 2020.

"A mesma Justiça que me filtrou várias vezes, que me fez várias entrevistas, que eu tive que contar para ela coisas da minha intimidade, pode me conceder legalmente a criança e depois, lá para frente, depois de anos, de ter entranhado os afetos, essa mesma Justiça parece que tem um lapso de memória, um Alzheimer, e resolve tomar, é isso?", questiona Carolina.

Com o apoio de mais de 343.200 pessoas, a luta da família Bella foi levada à Câmara Federal e defendida pelo procurador de Justiça do Rio de Janeiro, Sávio Bitencourt, e pela ministra da Mulher, Família e Direitos Humanos, Damares Alves. "Conte com o poder Executivo, conte com nosso apoio e que a gente caminhe deixando esse legado para o Brasil. Recebam meu abraço, e a todos os pais: 'não desista'. Nós vamos ter a garantia e a segurança jurídica do processo de adoção", reforçou a representante do Governo Federal.

"Os laços biológicos não são suficientes para garantir as relações afetivas e sociais", pontua a docente em Psicologia da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), Karina Moutinho. Mesmo com a incógnita sobre a reação de Vivi caso haja a ruptura, a professora sugere que ela precisa ser ouvida e apresente sua vontade ao longo de todo processo. "Esse caso é mais complexo porque ela vinha na plenitude do desenvolvimento por ter sido acolhida por essa família. Toda a referência estava ali com ela", complementou.

Para a ex-presidente da Associação Nacional de Grupos de Apoio à Adoção (Angaad) e mestra em psicologia, Suzana Schettini, Vivi e os pais adotivos vão sofrer graves consequências caso a separação seja oficializada. "Erros judiciais à parte não podem trazer outro erro humanitário grave, que seria arrancar a menina da sua família [...] tirá-la abruptamente e enviá-la para uma família estranha seria horrível. Poderia trazer sequelas psicológicas incomensuráveis e até gerar a morte psíquica dela. Não sei como ela se recuperaria de um choque desses", avalia.

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