Tópicos | Dia da Consciência Negra

Em um fim de semana ocupado com publicações para enfraquecer o Dia da Consciência Negra, o presidente da Fundação Palmares, Sérgio Camargo, encerrou o domingo (21) em defesa da ex-secretária da Cultura, a atriz Regina Duarte, que propôs o Dia da Consciência Branca. Celebrado em 20 de novembro, o Dia da Consciência Negra foi inclusa pela pauta antirracista em alusão ao nascimento de Zumbi dos Palmares.

Desde que foi nomeado pelo Governo Bolsonaro, Camargo se mostra interessado em trocar a data que exalta o povo preto para o 13 de maio, quando a princesa Isabel assinou a lei Áurea e iniciou o processo de abolição dos escravos no Brasil.

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Em nova polêmica, ele aponta que as críticas contra suas posições partem do “vitimismo” da "negrada mimizenta" e ironizou ao indicar que a decisão pelo Dia da Consciência Branca não configura racismo.

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O gestor também ameaça bloquear quem falar mal da princesa Isabel e politiza o debate racial culpabilizando a esquerda de se aproveitar da comemoração da Consciência Negra para segregar os brasileiros.

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A luta por igualdade racial no Brasil é um debate histórico. Presente em diversos âmbitos da sociedade, na política, parlamentares tentam viabilizar espaços dentro dos Três Poderes, nos quais possam ser debatidas pautas de interesse social — uma vez que o combate ao racismo deve ser um objetivo de toda a sociedade e não somente de pessoas negras ou não-brancas, diretamente afetadas por esse sistema. Apesar dos debates pela luta contra o racismo terem ganhado mais espaço ao longo dos anos, e de personalidades negras terem ocupado posições de destaque, a representatividade negra ainda é menor do que 20% no Congresso Nacional, e o número engloba ativistas raciais e não ativistas.

Neste Dia da Consciência Negra, o LeiaJá faz uma menção honrosa a algumas das presenças negras na política brasileira e que seguem na ativa por um debate mais justo no país da miscigenação e da “democracia racial”. Confira: 

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Paulo Paim

Senador da ala gaúcha do Partido dos Trabalhadores, foi eleito um dos 100 afrodescendentes mais influentes do mundo. O parlamentar foi agraciado com o Prêmio Most Influential People of African Descent (Mipad), realizado desde 2017 em Nova York com o apoio da ONU. O Mipad sempre ocorre após a abertura da Assembleia Geral das Nações Unidas. O objetivo é homenagear artistas e cidadãos que se posicionam contra o racismo e lutam a favor do direito dos negros.  

Paim nasceu em Caxias do Sul (RS). Está no terceiro mandato de senador da República, tendo sido, também, quatro vezes deputado federal. Seu projeto mais recente foi aprovado em plenário do Senado há dois dias, na quinta-feira (18), e deve seguir para análise da Câmara dos Deputados. O PL 4.373/2020, relatado por Romário (PL-RJ), tipifica a injúria racial como crime de racismo no Brasil. 

Erika Hilton 

A paulista nascida em Franco da Rocha fez história ao ser eleita a primeira vereadora trans e negra em São Paulo, nas eleições municipais de novembro de 2020; e a mulher mais votada no Brasil naquelas eleições, com 50.508 votos. Em 24 de março, foi nomeada presidenta da Comissão de Direitos Humanos da Câmara dos Vereadores de São Paulo, a maior cidade do Brasil. Sua militância começou ainda na adolescência. Em 2015, enfrentou na justiça uma empresa de transporte público que se recusava a aceitar seu nome social. A ação foi vitoriosa para a vereadora, que acumulou mais de 100.000 assinaturas a uma petição online pela sua causa e, assim, atraiu a atenção do Partido Socialismo e Liberdade (PSOL), que a convidou a se juntar às suas listas de candidatos. Pouco depois, Erika criou um curso pré-vestibular na Universidade Federal de São Carlos para pessoas trans.

Benedita da Silva

Silva foi nascida e criada na favela da Praia do Pinto, no Rio de Janeiro. Com uma vida repleta de dificuldades, insistiu na carreira acadêmica e formou-se aos 40 anos de idade em Estudos Sociais e Serviço Social. Em 1982 tornou-se a primeira negra a ocupar uma cadeira na Câmara de Vereadores da Cidade do Rio de Janeiro. Foi eleita Deputada Federal por duas vezes. Em seu primeiro mandato, durante a reforma da Constituição do Brasil, ela garantiu às mulheres presidiárias o direito de permanecerem com os seus filhos durante a amamentação. 

Foi autora de 84 projetos de leis de grande importância para a população. Sua atuação ajudou a escrever a história recente do país. Foi também a primeira negra a chegar ao Senado Federal, o mais alto escalão do Poder Legislativo brasileiro. Disputou o Governo do Estado do Rio de Janeiro onde foi vice-governadora e desenvolveu todos os projetos sociais da gestão. Em 2010 foi eleita mais uma vez para Câmara Federal. 

Marina Silva

Na política desde a década de 80, a ativista ambiental Marina Silva, atualmente, faz parte da Rede Sustentabilidade, partido fundado por ela. É um rosto conhecido e respeitado da política, já tendo sido ministra e senadora, e também candidata à presidência da República. A última vez que disputou as presidenciais foi em 2018, mas a candidatura não foi muito longe. 

Aos 60 anos, Silva foi eleita para seu primeiro cargo público em 1988, quando se elegeu vereadora de Rio Branco pelo PT. De lá para cá, ela ocupou cargos de deputada estadual e senadora pelo Estado do Acre nos anos 90 e 2000, além de ter sido ministra do Meio Ambiente entre 2003 e 2008, sob o governo Lula. Após deixar o PT em 2009, Marina filiou-se ao Partido Verde (PV), passando depois pelo PSB — quando resolveu disputar a Presidência no lugar de Eduardo Campos, morto em acidente aéreo em 2014. Após isso, fundou o Rede. Atualmente, a política já não é mais tão esperançosa sobre ocupar o assento presidencial, mas ainda tem consigo o sonho que tinha quando disputou o cargo pela primeira vez: ver uma mulher negra e de origem pobre ser presidenta do Brasil, fato ainda inédito na democracia brasileira. 

Robeyoncé 

A presença da co-deputada Robeyoncé Lima na Assembleia Legislativa de Pernambuco (Alepe) é um marco histórico para o país. A psolista é a primeira mulher trans a fazer parte da casa legislativa e uma das únicas no Brasil inteiro a ocupar um cargo do tipo. Advogada, Robeyoncé o coletivo “Juntas”, que optou por uma candidatura compartilhada, tendo representantes de diferentes minorias sociais. Ela também foi a primeira advogada trans, negra e nordestina a conseguir o nome social na carteirinha da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB). 

Subrepresentação ainda domina casas legislativas 

De todos os parlamentares no Congresso, apenas 17,8% são negros. Isso quer dizer que, entre os 594 deputados federais e senadores, 106 declararam ser da cor preta ou parda. O cenário não muda se as duas Casas forem analisadas separadamente. Na Câmara, dos 513 deputados em exercício, 89 são pretos. Em contrapartida, 344 são brancos. Os dados são da própria Câmara Federal. No Senado, a diferença é ainda mais evidente. A proporção de brancos é quase quatro vezes maior do que a de pretos — 64 para 17. Observados apenas os parlamentares que se elegeram no ano passado e se autodeclararam pretos, o número é ainda menor. Apenas três senadores negros foram eleitos em 2018. 

O cenário das duas Casas fica longe de representar a diversidade brasileira. Segundo dados do IBGE, mais da metade da população é de pretos e pardos — 9,3% e 46,5%, respectivamente. Já os brancos representam 43,1%. 

Candidaturas negras cresceram em 2020

Em 2020, pela primeira vez, os candidatos negros passaram a ser o maior grupo de postulantes a cargos eletivos no país desde que o TSE passou a coletar informações de raça, em 2014. Ao todo, 276 mil candidatos pretos ou pardos se registraram para concorrer no pleito, o equivalente a 49,9%.

Nas últimas eleições, em outubro de 2020, os negros aumentaram sua participação no comando das prefeituras e no número de cadeiras nas câmaras de vereadores, segundo dados do TSE. Dos mais de 5,4 mil prefeitos eleitos, aproximadamente 1,7 mil candidatos se declararam pretos ou pardos, o que corresponde a 32% do total. O número é superior a 2016, quando 29% dos candidatos eleitos eram negros segundo a classificação do IBGE.

Os três principais clubes de Pernambuco - Náutico, Santa Cruz e Sport - postaram nas redes sociais mensagens fazendo menção ao Dia da Consciência Negra. Conhecido por um passado elitista, o Náutico publicou nas redes sociais uma mensagem lembrando que a luta pela igualdade racial é diária.

O Sport fez menção a cor preta que integra as cores do clube e citou que ‘nosso preto é cor de luta’. Já o Santa, primeiro clube em Pernambuco a aceitar jogadores pretos num período em que o racismo era ainda pior do que nos dias atuais, ressaltou o orgulho da história de inclusão do clube. 

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 Segundo Marcelo Carvalho, diretor do Observatório da Discriminação Racial no Futebol, em 2021 os números de denuncias de racismo nos campos de futebol do Brasil aumentou em relação ao ano passado. São 51 casos de injúria racial, contra 31 relatados em 2020. Em entrevista ao Lance ele ainda lamentou o desfecho do caso Celsinho e disse que não se surpreende com os números. 

“ É um aumento que não nos surpreende, pois a pandemia acarretou em uma interrupção no futebol e durante muitos meses, houve jogos com portões fechados. Porém, à medida que o público retornou aos estádios, a impressão é de que as injúrias raciais voltaram com mais força”, disse.

“O que acontece sempre no futebol tem uma projeção muito grande. Quando vemos em um tribunal esportivo pessoas relativizarem o racismo, a luta para que a discriminação seja combatida fica enfraquecida. A dor não é pelo grito, pelo xingamento ou piada de um torcedor ou dirigente em um estádio. Essa dor tem reflexo, que é o genocídio da população negra”, completou.

20 de novembro é a data da morte de Zumbi dos Palmares, um dos maiores líderes negros na luta pela abolição da escravatura no Brasil. Em sua homenagem, desde 2011 se atribui a data como o Dia da Consciência Negra, que busca trazer a reflexão sobre a inserção do negro na sociedade brasileira.

Pensando na importância de reflexão da data, o LeiaJá traz uma lista com filmes que podem ajudar você a entender melhor a luta diária dos negros:

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Quilombo – Youtube

Um clássico dos filmes nacionais, Quilombo retrata a história de Ganga Zumba, ex-escravo em fuga que se torna líder do quilombo dos Palmares e mais tarde, ensina seu filho Zumbi, a lutar pela abolição da escravatura no Brasil.

Histórias Cruzadas – Star+

O longa baseado no livro “The Help” retrata a relação de uma patroa branca, interpretada por Emma Stone, com suas empregadas negras, em plena época da luta pelos direitos civis nos EUA. Destaque para Octavia Spencer que chegou a vencer o Oscar de atriz coadjuvante pelo seu papel no filme em 2012.

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12 Anos de Escravidão – Star+

Solomon Northup é um negro livre, que ao aceitar um emprego em outra cidade, é sequestrado no caminho e vendido como escravo por seus dois senhores por 12 anos.

Estrelas Além do Tempo - Telecine

Durante a Guerra Fria entre EUA e Rússia, três mulheres afrodescendentes, cientistas da NASA, são a peça chave para vitória dos norte-americanos, liderando uma das maiores operações tecnológicas registradas na história da corrida espacial.

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Malcom X – Amazon Prime

A história do líder ativista americano, que teve o pai morto pela Klu Klux Klan e a mãe internada por insanidade. Como protagonista, Denzel Washington deu seu melhor e deu um show no papel de Malcom.

Selma, Uma Luta Pela Igualdade – Amazon Prime

O drama retrata a luta de Martin Luther King Jr. e outros para garantir o direito de voto dos negros, de uma forma pacífica, partindo da cidade de Selma, interior do Alabama. No papel do pastor King, o ator David Oyelowo.

Invictus – HBO Max

Retratando o fim do apartheid, a África do Sul tem Nelson Mandela como presidente buscando liderar um país dividido de forma racial e econômica. Como estratégia, se une ao capitão do time de Rúgbi e promove a união a partir da Copa do Mundo do esporte, em 1995.

Movimentos negros integrantes da Articulação Negra de Pernambuco (Anepe) realizarão, neste sábado (20) que celebra o Dia da Consciência Negra, uma marcha com o tema “O povo negro resiste ao genocídio: antes, durante e depois da pandemia”. O ato tem concentração a partir das 14h, no Pátio do Carmo, área central do Recife e, de lá, segue até a Praça do Arsenal da Marinha, onde será realizado o Festival da Cultura Negra. Das 15h às 21h, também acontece a Feira Akofena, na rua do Bom Jesus, com a participação de 20 empreendedoras negras. A marcha recebe apoio do movimento Fora Bolsonaro. 

Serão pautadas na ocasião as desigualdades sociais no contexto pandêmico, como a diferença no número de vacinados e mortos pela Covid-19 entre grupos de pessoas brancas, negras e de outras etnias. O movimento se posiciona a favor da tese de que a gestão do governo de Jair Bolsonaro (sem partido) cometeu genocídio contra pessoas não-brancas Brasil. 

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Entre as atrações confirmadas para o Festival da Cultura Negra, previsto para iniciar às 17h40, estão o Afoxé Oyá Alaxé, Uana Mahin, Okado do Canal, MC Agô, Dj IDLibra e Coco do Seu Zé Moleque. Além disso, o palco também vai sediar a Batalha do Conhecimento, encabeçada pelo tradicional recital Boca no Trombone. 

A organização do evento orienta todos os participantes da Marcha da Consciência Negra de Pernambuco e do Festival da Cultura Negra a utilizarem máscaras de proteção contra a Covid-19, além de manterem o distanciamento social adequado durante os eventos. 

O 20 de Novembro homenageia a luta de Zumbi e Dandara, figuras líderes do Quilombo dos Palmares, mas também rememora o longo processo de organização das populações negras brasileiras, que há mais de 500 anos se colocam em movimento pelo fim do racismo institucional no país.  

Durante os dias 16 e 17, integrantes da Anepe também estiveram articulados com grupos de Arcoverde, Ipojuca e Garanhuns na realização da Caravana Negra, uma apresentação e chamada para a marcha no Recife. “O objetivo é chegar em localidades que estão mais distantes da região metropolitana do Recife e falar sobre as atividades que a Anepe e a Coalizão Negra têm realizado”, conta Emanuelle Marques, integrante da Articulação Negra de Pernambuco. 

Serviço: 

Marcha da Consciência Negra de Pernambuco  

Data: 20/11 

Local: 14h, na Praça do Carmo, Centro 

Festival da Cultura Negra (Encerramento da Marcha) 

Data: 20 de novembro às 18h  

Local: Praça do Arsenal  

Atrações: 

Afoxé Oyá Alaxé; Okado do Canal; Uana Mahin; Dj IDLibra; Dj Boneka; MC Agô; Recital Boca no Trombone; Paje IB; Sujistência; Coco do Seu Zé Moleque; Dj Themonia e Kizombadeiras (Rede de Mulheres Negras de PE) 

Mais informações 

Articulação Negra de Pernambuco - https://www.instagram.com/articulacaonegrape/

Antigamente, "quando nascia uma criança mais clara era motivo de comemoração", lembra Bianca Santana. Mas hoje, aos 37 anos, ela se reconhece plenamente como mulher negra.

Quando era pequena, sua avó, baiana, com a pele mais escura do que a dela, pediu que ela prendesse o cabelo em um coque muito apertado "senão ficava parecendo essas neguinhas".

"Às vezes, ela colocava o braço dela ao lado do meu mostrando o clareamento" resultante da miscigenação, conta à AFP. Foi só aos 30 anos que Bianca finalmente decidiu usar um penteado afro.

Autora do livro "Quando me descobri negra", publicado em 2015, Bianca afirma que cada vez mais pessoas pardas estão adquirindo essa consciência no Brasil.

"Os pardos estão cada vez mais negros, cada vez menos alisam o cabelo, cada vez mais assumindo uma identidade negra", analisa.

O Brasil, com 213 milhões de habitantes e a maior população negra fora da África, celebra no sábado (20) o Dia da Consciência Negra.

O país, o último das Américas a abolir a escravidão, em 1888, é marcado pelo racismo estrutural, com menos de 5% de executivos negros nas 500 maiores empresas brasileiras, apesar de representarem a maioria da população. Além disso, há diferenças salariais significativas com os brancos, ainda que com as mesmas qualificações.

Os negros são, ainda, a grande maioria entre os desempregados e os moradores das favelas.

- O mito da "democracia racial" -

Para o IBGE, a população negra é a soma dos pretos e pardos. Estes dados se baseiam na "autoidentificação", forma como as pessoas se definem a si próprias nos formulários oficiais.

O último censo oficial, de 2010, mostrou pela primeira vez que a população negra era majoritária no país, com 43,4% de pardos e 7,5% de pretos. No censo do ano 2000, mais de 53% dos brasileiros disseram ser brancos.

As pesquisas trimestrais realizadas pelo IBGE com uma amostra representativa da população confirmam essa tendência nos últimos anos.

A mais recente, do segundo trimestre de 2021, reporta 45,9% de pardos, 8,8% de pretos e 44,2% de brancos.

"Tem um trabalho muito importante dos movimentos negros de ampliar a conscientização sobre a negritude no Brasil, porque o Brasil foi fundado sobre esse mito da democracia racial, de que não há racismo, que estamos todos misturados", diz Djamila Ribeiro, filósofa e autora do livro "Pequeno manual antirracista".

Esse mito, acrescenta, "dificultou inclusive o entendimento das pessoas negras se verem como negras".

- "A cor do pecado" -

Para Roberta Calixto, analista de treinamentos e ações afirmativas no Instituto de Identidades do Brasil (ID_BR), que trabalha por uma maior inclusão da população negra no mercado de trabalho, as políticas de cotas implementadas gradualmente nos últimos 15 anos marcaram um ponto de inflexão.

"Até então, a gente tem dentro do cenário brasileiro uma ideologia de branqueamento porque crescemos com uma ideologia de que ser branco é a meta, que precisa se identificar como branco porque ser uma pessoa negra é pejorativo", explica.

"Com as cotas, passamos a ter um reconhecimento maior das pessoas negras. Sem dúvida houve uma inversão de valores. Passamos a ter um reconhecimento maior das pessoas negras; pela primeira vez, passa a ser interessante se dizer negro", insiste esta mulher parda de 30 anos, que lembra ter ouvido sua mãe dizer que ela tinha que "ser três vezes melhor do que qualquer pessoa para ser considerada igual" em uma sociedade marcada pelo racismo.

Henrique Vieira, pastor evangélico de 34 anos, filho de uma mulher branca e um homem negro, reconheceu tarde sua negritude, assim como Bianca Santana.

"Tinha um livro de evangelização quando era criança que dizia que a cor preta era a cor do pecado e a cor branca, a cor da santidade", lembra.

"Até a minha adolescência, não me identificava como negro, mas como 'moreno'. Mas me reconhecer como um homem negro foi uma conquista ao longo da vida (...) e pude identificar melhor o peso do racismo sobre o meu corpo, minha memória e minha subjetividade", reflete.

Para celebrar o Dia Nacional da Consciência Negra, comemorado em 20 de novembro, o Paço do Frevo recebe o Afoxé Omô Nilê Ogunjá no seu projeto Sábado no Paço. Além da musicalidade percussiva do Afoxé, o espetáculo contará com bailarinos que, através da dança, reforçarão os sentidos das letras que festejam as culturas de matrizes africanas e contestam questões do nosso contexto social contemporâneo. A apresentação acontecerá às 17h, na Praça do Frevo, no terceiro andar do museu, com ingressos a R$ 10 (inteira) e R$ 5 (meia).

O evento reverencia as raízes negras do Frevo, que nasceu nas ruas do Recife entre o final do século 19 e início do século 20, ao misturar ritmos e passos de expressões culturais de matriz africana, como a Capoeira. Considerado um símbolo de resistência, o Frevo dá corpo a cortejos que ocupam as ruas e o espaço público, disseminando  saberes e tradições da Cultura Popular. Para aproximar ainda mais as bases culturais que formam o gênero, o Paço do Frevo abre espaço para o Afoxé do Omô Nilê Ogunjá.

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Criado em 2004, na comunidade do Ibura, o grupo busca fomentar ações que valorizem a cultura negra com o intuito de promover políticas afirmativas, fortalecendo a identidade étnico-racial através do Afoxé. O Omô Nilê Ogunjá, cujo nome significa “Filhos da Casa de Ogunjá”, define-se como um trabalho cultural, artístico e religioso. Entre suas atividades, estão shows e formações em espaços comunitários e escolas para onde levam sempre a força da cultura de matriz africana e propõem políticas públicas que proporcionem mais respeito e dignidade para as vidas negras.

O projeto Sábado no Paço convida os visitantes do museu e a comunidade a participarem de atividades culturais que aproximam o público do universo diverso do Frevo. O ingresso para o evento está incluso no valor da entrada do museu. Aos sábados, o Paço do Frevo funciona das 11h às 17h, com última entrada para visitação às 16h30 - 30 minutos antes do horário de fechamento.

PAÇO DO FREVO 

O Paço do Frevo é reconhecido pelo IPHAN como centro de referência em ações, projetos, transmissão, salvaguarda e valorização de uma das principais tradições culturais do Brasil, o frevo. Patrimônio imaterial pela UNESCO e pelo IPHAN, o frevo é um convite à celebração da vida, por meio da  ativação de memórias, personalidades e linguagens artísticas, que no Paço do Frevo encontram seu lugar máximo de expressão, na manutenção de ações de difusão, pesquisa e formação de profissionais nas áreas da dança e da música, dos adereços e das agremiações do frevo. Ao longo de sete anos, recebeu mais de 700 mil visitantes, teve mais de 2 mil alunos formados em suas atividades e promoveu mais de 600 apresentações artísticas, em atividades presenciais e virtuais, que incluem o denso engajamento de seus mais de 60 mil seguidores nas redes sociais.

O Paço do Frevo é uma iniciativa da Fundação Roberto Marinho, com realização da Prefeitura do Recife, por meio da Fundação de Cultura Cidade do Recife em consonância com a Secretaria Municipal de Cultura, e gestão do Instituto de Desenvolvimento e Gestão (IDG). O projeto conta com o patrocínio do Itaú, da Uninassau e da White Martins, apoio cultural do Itaú Cultural e apoio do Grupo Globo e do Ministério do Turismo, por meio da Lei de Incentivo à Cultura

SERVIÇO

Dia da Consciência Negra

'Sábado no Paço' recebe o Afoxé Omô Nilê Ogunjá

Paço do Frevo: Praça do Arsenal da Marinha, s/n, Bairro do Recife - Recife/PE

Dia: 20/11, sábado, às 17h

Ingresso: R$ 10 (inteira) e R$ 5 (meia-entrada) - incluso no bilhete do museu

 

*Via assessoria de imprensa.

Deputados de diversos partidos manifestaram repúdio pela morte de João Alberto Silveira Freitas, um homem negro de 40 anos que foi espancado por seguranças em um supermercado da rede Carrefour, em Porto Alegre (RS). Por meio de suas redes sociais, os parlamentares lamentaram o episódio, ocorrido na noite de quinta-feira (19), véspera do Dia da Consciência Negra (20 de novembro).

“O assassinato de João Alberto Silveira Freitas, um homem negro de 40 anos, na véspera do #DiaDaConscienciaNegra, nos lembra que, no nosso país, a luta antirracista ainda tem um longo caminho pela frente. Minha solidariedade aos amigos e familiares de Beto. A nossa luta agora é por justiça!”, disse a deputada Tabata Amaral (PDT-SP).

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"Num país como o Brasil, forjado na escravidão, onde a cada 23 minutos uma pessoa negra é morta, precisamos dar um fim nessa estrutura genocida e racista, nesse ciclo que há séculos mata e cria abismos sociais nesse país", disse o líder da Minoria, deputado José Guimarães (PT-CE).

A líder do PCdoB, deputada Perpétua Almeida (PCdoB-AC), também manifestou repúdio. "Se você não se indignar com esse vídeo [o registro da agressão], é porque já morreu por dentro! Na véspera do Dia da Consciência Negra, João Alberto foi espancado e morto por seguranças do Carrefour em Porto Alegre! O crime? Ele era negro! Racismo mata!"

Usando a hashtag "VidasNegrasImportam", o líder do MDB, deputado Baleia Rossi (MDB-SP), afirmou: "que Deus conforte a família da vítima dessa atrocidade. Todas as autoridades do País precisamos nos manifestar contra isso e tomar mais atitudes".

O líder do PSDB, deputado Carlos Sampaio (PSDB-SP), também lamentou o episódio de violência. "O Dia da Consciência Negra amanheceu com as imagens brutais de um negro sendo espancado até a morte em um supermercado de Porto Alegre. Um crime bárbaro, que nos causa indignação, revolta e mostra que, infelizmente, ainda existe racismo em nosso país. É inaceitável qualquer tipo de violência, ainda mais se for motivada por discriminação racial", disse.

Racismo estrutural

O líder do PDT, deputado Wolney Queiroz (PDT-PE), citou a necessidade de combate ao racismo estrutural: "Dia da Consciência Negra e mais uma notícia da triste realidade desse racismo estrutural que ainda assola o Brasil: João, assassinado por seguranças do #Carrefour. Negros são 75,7% dos brasileiros assassinados em 2018. Todos juntos na luta antirracista #VidasNegrasImportam".

 

O líder do Novo, deputado Paulo Ganime (Novo-RJ), classificou o episódio como "brutal e covarde". "Absurda a morte de João Alberto Silveira Freitas. Atitude brutal e covarde que aconteceu no Carrefour de Porto Alegre. Não é a primeira vez que fatos absurdos acontecem nas dependências da rede francesa. Uma vez pode ser erro individual, duas vezes pode ser coincidência, mas 4?", questionou.

A deputada Fernanda Melchionna (Psol-RS) criticou a fala do vice-presidente da República, Hamilton Mourão, que afirmou não haver racismo no País. "O vice-presidente Hamilton Mourão disse hoje que racismo não existe no Brasil. Hoje, Dia da Consciência Negra e em que o Brasil se revolta com a morte de um homem negro a chutes e pontapés no Carrefour."

"Quando se ouve que não há racismo no Brasil, devemos observar de onde vem a afirmação, se de alguma fonte ignorante, ou de alguém interessado na manutenção desse flagelo, resultado de uma escravidão ainda não superada e a perpetuação da ideologia da casa-grande", disse o líder do PT, deputado Enio Verri (PT-PR).

O líder do PSB, deputado Alessandro Molon (PSB-RJ), afirmou que o racismo "não só existe, como mata". "Um governo que nega as mazelas estruturais de nossa sociedade a empurra para o abismo. É isso o que vemos o tempo todo. Basta."

“As cenas que vimos em vídeo ontem em Porto Alegre revoltam e reforçam a sociedade doente que vivemos, de um racismo estrutural. É preciso colocar um fim nessa triste realidade. A luta antirracista precisa ser de todos. Justiça e respeito!", disse o líder da oposição, deputado André Figueiredo (PDT-CE).

Investigação

O presidente da Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara dos Deputados, deputado Helder Salomão (PT-ES), pediu urgência na investigação do caso e a punição dos envolvidos. “É um homicídio trágico em um quadro sistêmico e intolerável. As imagens que circulam nas redes sociais são nítidas e mostram a absoluta desproporcionalidade nas agressões e indicam até mesmo a prática de tortura”, declarou.

O deputado lembrou que os dois agressores de João Alberto Silveira Freitas foram presos em flagrante. "Um deles é policial militar e foi levado para um presídio militar. O outro é segurança da loja e está em um prédio da Polícia Civil. Um deles não tem o registro nacional para atuar na profissão, mas a polícia não informou qual dos dois. Ambos são funcionários de uma empresa terceirizada."

Helder Salomão lembrou ainda que João Beto, como era conhecido a vítima, era soldador de portões e que deixa mulher e uma enteada.

*Da Agência Câmara de Notícias

 

Na véspera do Dia da Consciência Negra, cenas brutais do assassinato de João Alberto Silveira Freitas, no estacionamento de uma loja do Carrefour em Porto Alegre, no Rio Grande do Sul, nesta quinta-feira (19), chocaram o Brasil. E mesmo que poucos, em meio a tantos, três jogadores brasileiros se expressaram nas redes sociais. 

Um nome que sempre se posiciona a assuntos relacionados a questões sociais, Richarlison, lamentou a morte de João Alberto e lembrou de outros casos. 

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Já Taison foi mais contundente na sua crítica. "Eles não gostam da gente, querem ver o nosso sangue, que coincidentemente tem a mesma cor do sangue deles". Atuando aqui no Brasil, Marinho também se uniu ao coro em postagem no seu Instagram.

Taison do Shaktar Donetsk fez um forte apelo no seu INstagram, com imagem do espancamento de João Alberto ao fundo. Foto: Reprodução/Instagran

Mais jogadores se posicionaram sobre o Dia da Consciência Negra, mas sobre a morte de João Alberto foram poucos.

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O presidente do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), ministro Luiz Fux, pediu hoje (20), durante evento organizado pelo órgão pelo Dia da Consciência Negra, um minuto de silêncio em homenagem ao homem negro que foi espancado até a morte por seguranças no estacionamento de um supermercado em Porto Alegre.

O crime ocorreu na noite de ontem (19), em um supermercado Carrefour da zona norte da capital gaúcha. A vítima foi identificada como João Alberto Silveira Freitas, de 40 anos. Ele teria se desentendido com a caixa do estabelecimento, sendo depois conduzido pelo segurança da loja até o estacionamento, onde começaram as agressões.

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“Independentemente de versões, o que nos deve preocupar é a violência exacerbada. Toda violência é desmedida e deve ser banida da nossa sociedade. Mas esse é um triste episódio, exatamente no momento em que nós comemoramos o Dia Nacional da Consciência Negra”, disse Fux sobre o crime. “Esse minuto de silêncio é um dever de todo brasileiro”, acrescentou em seguida.

Nesta sexta-feira, o CNJ firmou uma parceria de combate à discriminação no Judiciário com a Faculdade Zumbi dos Palmares, instituição de ensino de São Paulo voltada para a qualificação e inclusão de jovens negros, criada pelo advogado José Vicente, fundador da organização não governamental (ONG) Afrobras. 

“Faz parte do nosso sonho o dia em que todos poderão andar livremente pelo nosso país independentemente da sua raça ou da sua cor de pele, o dia em que nosso Estado Democrático de Direito vai permitir que nós de fato sejamos cidadãos de primeira classe, e não sejamos submetidos a essa brutalidade da cena social de todos os dias”, disse Vicente durante a solenidade. “Queremos render nossas condolências a essa família destroçada.”

Fux, que lembrou ter recebido em 2015 o título de “negro honorário”, concedido pela ONG Educafro, havia dito mais cedo, em um congresso sobre registro civil, que o "Brasil foi a sociedade escravocrata mais longa de todo o mundo" e que, por isso, deve-se lembrar cotidianamente disso para ter a "inclusão social como resgate histórico”.

Outros ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), como Gilmar Mendes e Alexandre de Moraes, também comentaram o episódio em Porto Alegre, que classificaram de “bárbaro”. Sem citar o crime, o ministro Luís Roberto Barroso, que é também presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), disse nesta sexta-feira que o país “tem o dever de reparar a chaga moral a escravidão”.

 

“Nascer negro é consequência, ser negro é consciência”. Com as palavras do líder quilombola Zumbi dos Palmares, nos direcionamos à celebração desta sexta-feira (20), o Dia da Consciência Negra, mesma data em que o líder faleceu em 1695. E falar sobre essa data é também uma forma de resgatar as lutas e homenagear as raízes do povo afro-brasileiro, até mesmo na educação.

Instituído por meio da Lei 10.639 - que inclui obrigatoriamente no currículo oficial da rede de ensino a História e Cultura Afro-Brasileira, assim como a indigena -, o Dia da Consciência Negra é um assunto que pode ser cobrado no Exame Nacional do Ensino Médio (Enem), através da abordagem do tema racismo, direitos sociais, contribuições materiais e imateriais da população afro-brasileira, dentre outros, tal como versa a lei. Para o professor de filosofia e sociologia Salviano Feitoza, a lei abre espaço no âmbito da educação para o conhecimento produzido por esses grupos durante a história. “Isso abre espaço para quebrar o modelo da história única, que compõe a nossa educação, que é marcada por uma aparência de diversidade”, explicou o docente.

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Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o Brasil tem mais de 50% da população autodeclarada negra. O LeiaJá convidou o professor de história Hilton Rosas para resolver cinco questões relacionadas aos assuntos que permeiam o Dia da Consciência Negra na prova do Enem. Confira, a seguir, as resoluções feitas pelo docente:

Questão 1 (Enem – 2017)

A luta contra o racismo, no Brasil, tomou um rumo contrário ao imaginário nacional e ao consenso científico, formado a partir dos anos 1930. Por um lado, o Movimento Negro Unificado, assim como as demais organizações negras, priorizaram em sua luta a desmistificação do credo da democracia racial, negando o caráter cordial das relações raciais e afirmando que, no Brasil, o racismo está entranhado nas relações sociais. O movimento aprofundou, por outro lado, sua política de construção de identidade racial, chamando de “negros” todos aqueles com alguma ascendência africana, e não apenas os “pretos”. GUIMARÃES, A. S. A. Classes, raças e democracia. São Paulo: Editora 34, 2012. A estratégia utilizada por esse movimento tinha como objetivo

A) Eliminar privilégios de classe.

B) Alterar injustiças econômicas.

C) Combater discriminações étnicas.

D) Identificar preconceitos religiosos.

E) Reduzir as desigualdades culturais.

Resolução: A resposta correta é letra “C”. Na década de 30, já se tem a ideia de que deveríamos ter o negro inserido no processo de formação da sociedade brasileira pela questão histórica da escravidão e esta população sendo consequência de mais de 300 anos da escravidão e desta relação que marcou a formação do Brasil desde sua efetiva colonização. Tal questão nos traz o reflexo que se tinha de inclusão e o combate ao racismo baseado no contexto das ideias de ‘raças’ .

Questão 2 (Enem 2018)

Num país que conviveu com o trabalho escravo durante quatro séculos, o trabalho doméstico é ainda considerado um subemprego. E os indivíduos que atuam nessa área são, muitas vezes, vistos pelos patrões como um mal necessário: é preciso ter em casa alguém que limpe o banheiro, lave a roupa, tire o pó e arrume a gaveta. Existe uma inegável desvalorização das atividades domésticas em relação a outros tipos de trabalho. RANGEL, C. Domésticas: nascer, deixar, permanecer ou simplesmente estar.  In: SOUZA, E. (Org.). Negritude, cinema e educação. Belo Horizonte: Mazza, 2011 (adaptado).

A) Criação de novos ofícios

B) Erradicação da atividade informal

C) Redução da desigualdade de gênero

D) Fragilização da representação sindical

E) Ampliação de direitos sociais

Resolução: A alternativa correta é letra “E”. “Neste aspecto, a busca pela ampliação dos direitos sociais está na busca pelo fim das mazelas contra as minorias e por isso a cultura pode ser observada como um conjunto de crenças, valores, costumes, linguagens e significações de um determinado grupo. Sua relação com a sociedade parte do pressuposto de que nós, enquanto indivíduos, estamos em constante evolução, e a cultura, por não ser estática também, ou seja, ela é dinâmica e acompanha os processos sociais, tendo a indústria cultural como um pilar nesse processo. Além disso, a cultura como vemos, pode ser diferente para outros grupos, porém, somos todos seres sociais que devem ser vistos em igualdade, sem discriminação por raça, etnia, região ou crença.

Questão 3 (Enem 2018)

Outra importante manifestação das crenças e tradições africanas na Colônia eram os objetos conhecidos como “bolsas de mandinga”. A insegurança tanto física como espiritual gerava uma necessidade generalizada de proteção: das catástrofes da natureza, das doenças, da má sorte, da violência dos núcleos urbanos, dos roubos, das brigas, dos malefícios de feiticeiros, etc. Também para trazer sorte, dinheiro e até atrair mulheres, o costume era corrente nas primeiras décadas do século XVIII, envolvendo não apenas escravos, mas também homens brancos. CALAINHO, D. B. Feitiços e feiticeiros. In: FIGUEIREDO, L. História do Brasil para ocupados. Rio de Janeiro: Casa da Palavra, 2013 (adaptado). A prática histórico-cultural de matriz africana descrita no texto representava um(a)

A) Expressão do valor das festividades da população pobre.

B) Ferramenta para submeter os cativos ao trabalho forçado.

C) Estratégia de subversão do poder da monarquia portuguesa.

D) Elemento de conversão dos escravos ao catolicismo romano.

E) Instrumento para minimizar o sentimento de desamparo social.

Resolução: Temos a resposta correta na letra “E”. Aqui a questão nos remonta à necessidade de que devemos diminuir as atenuações ao desamparo social baseado em fenótipos e arquétipos estabelecidos por uma estrutura histórica e consequentemente social.

Questão 4 (Enem 2017)

Na segunda metade do Século XIX, a capoeira era uma marca da tradição rebelde da população trabalhadora urbana na maior cidade do Império do Brasil, que reunia escravos e livres, brasileiros e imigrantes, jovens e adultos, negros e brancos. O que mais os unia era pertencer aos porões da sociedade, e na última escala do piso social estavam os escravos africanos. SOARES, C. E. L. Capoeira mata um. In: FIGUEIREDO, L. História do Brasil para ocupados. Rio de Janeiro: Casa da Palavra, 2013. De acordo com o texto, um fator que contribuiu para a construção da tradição mencionada foi a

A) Elitização de ritos católicos.

B) Desorganização da vida rural.

C) Redução da desigualdade racial.

D) Mercantilização da cultura popular.

E) Diversificação dos grupos participantes.

Resolução: A alternativa correta é letra “E”. Mesmo após a abolição da escravatura, as tradições que estavam voltadas à afrodescendência, como ritos, folclore, inclusive a capoeira, eram vistos como perigosos para a sociedade, porque transpassavam a ideia de que aquilo era feito por ‘negros rebeldes’ que não acatavam as ordens vigentse, que naquele momento e, até hoje, são dadas pela supremacia branca e disfarçada com a democracia racial no país, que não existe. Desmistificando a questão da capoeira, de está somente ligada aos negros, havia outros participantes de outros grupos também. Hoje, a capoeira é considerada patrimônio imaterial da cultura brasileira.

Questão 5 (Enem 2017)

Para a Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco), é importante promover e proteger monumentos, sítios históricos e paisagens culturais. Mas não só de aspectos físicos se constitui a cultura de um povo. As tradições, o folclore, os saberes, as línguas, as festas e diversos outros aspectos e manifestações devem ser levados em consideração. Os afro-brasileiros contribuíram e ainda contribuem fortemente na formação do patrimônio imaterial do Brasil, que concentra o segundo contingente de população negra do mundo, ficando atrás apenas da Nigéria. MENEZES, S. A força da cultura negra: Iphan reconhece manifestações como patrimônio imaterial. Disponível em: www.ipea.gov.br. Acesso em: 29 set. 2015. Considerando a abordagem do texto, os bens imateriais enfatizam a importância das representações culturais para a

A) Construção da identidade nacional.

B) Elaboração do sentimento religioso.

C) Dicotomia do conhecimento prático.

D) Reprodução do trabalho coletivo.

E) Reprodução do saber tradicional.

Resolução: Tomar a presença do negro na formação nacional especificamente do brasil é crucial para o desenvolvimento de uma identidade nacional, [visto que há contribuições materiais e imateriais feitas pela população negra, através do conhecimento de plantas medicinas, por exemplo], sendo assim a questão é a letra “A”. 

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---> 'Escrevivências’: mulheres negras exaltam suas raízes 

O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Gilmar Mendes disse nesta sexta-feira (20) ser “escandalosa” a notícia do assassinato “bárbaro” de um homem negro em um supermercado de Porto Alegre, em pleno Dia da Consciência Negra, celebrado hoje. 

“O Dia da Consciência Negra amanheceu com a escandalosa notícia do assassinato bárbaro de um homem negro espancado em um supermercado. O episódio só demonstra que a luta contra o racismo e contra a barbárie está longe de acabar. Racismo é crime!”, escreveu o ministro em sua conta oficial no Twitter.

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O ministro se referiu à notícia de que ontem (19), na véspera do Dia da Consciência Negra, um homem negro, de 40 anos de idade, foi espancado até a morte no supermercado Carrefour de um bairro da zona norte de Porto Alegre. Um vídeo que mostra a cena causa grande repercussão nas redes sociais.

Nesta sexta-feira, sem citar o crime, outros ministros do Supremo também se manifestaram por ocasião do Dia da Consciência Negra, entre os quais o presidente da Corte, Luiz Fux, e Luís Roberto Barroso, também presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE). 

“O Brasil foi a sociedade escravocrata mais longa de todo o mundo e por isso devemos cotidianamente nos lembrarmos disso para termos a inclusão social como resgate histórico”, disse Fux pela manhã, durante o Congresso Nacional do Registro Civil.

Em sua conta oficial no Twitter, o ministro Luís Roberto Barroso lembrou o julgamento em que o TSE determinou distribuição proporcional de recursos de campanha entre candidatos brancos e negros. Ele escreveu que o país tem o “dever de reparar a chaga moral da escravidão”.

Na noite da última quinta (19), véspera do Dia da Consciência Negra no Brasil, as redes sociais foram inundadas com imagens de um homem preto sendo espancado até a morte por seguranças de um supermercado da rede Carrefour, em Porto Alegre.  Ele era João Alberto Silveira Freitas e tinha 40 anos. O vídeo rapidamente viralizou e muitas reações de revolta e indignação começaram a ser compartilhadas na internet. Muitos famosos também se posicionaram, estarrecidos com a violência. 

O humorista Hélio de La Peña compartilhou uma matéria sobre o caso, em seu Twitter, e comentou: “Carrefour e seu jeito de celebrar o Dia da Consciência Negra”. O ator e ex-BBB Rodrigo França usou a mesma rede social para deixar registrada sua indignação. Ele escreveu, repetidamente a frase: “Um homem negro foi espancado até a morte por dois seguranças brancos, no supermercado Carrefour”. 

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A jornalista Flávia Oliveira também compartilhou uma reportagem e escreveu: “A notícia é um homem negro espancado até a morte em Porto Alegre. Mais um corpo negro assassinado nesse país violento e racista”; a atriz Patrícia Dejesus compartilhou a publicação da colega. 

Muitos outros nomes da arte e do entretenimento também se manifestaram em repúdio ao ocorrido. O humorista Yuri Marçal, a jornalista Aline Midlej, o escritor Leví Kaique Ferreira, e o rapper Dexter. Esse último deixou um questionamento. “Infelizmente, nada de novo. Nossas vidas valem quanto? Isso é Brasil! Revolta explica meu sentimento”. 

Qual morte merece ser chorada? Há vidas que valem mais que outras? Para a sociedade, o corpo estirado no chão pode ser de um vagabundo que merecia aquele fim. Para o governo, pode ser mais um número a somar nas estatísticas. Mas aquele corpo era filho de alguém.

Peixinhos é um bairro pobre e periférico em Olinda de mães em luto que, por causa do julgamento social, esconderam o choro da perda de seus meninos até da própria família. A morte desses jovens - perpetradores de violência, envolvidos com o tráfico de drogas ou simplesmente pobres e moradores da periferia - é silenciada e banalizada. Assim como eles, suas mães são vítimas da exclusão social, do racismo, da violência urbana, do genocídio dos jovens negros. São mães que adoeceram e que se viram perdidas sem a presença daqueles a quem dedicavam a vida.

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O coletivo Mães da Saudade, do Grupo Comunidade Assumindo suas Crianças (Gcasc), surgiu para ouvir essas mães e oferecer apoio e perspectiva. Mostrar que a dor delas é legítima. Que o lamento não tem que ser solitário e privado. Fazê-las falar o que para elas era tão importante e ninguém queria ouvir. Tirar o choro preso e angustiante. E pensar para além da tragédia.

Nos cinco textos a seguir, as mulheres resilientes Carmem, Sandra, Cleonice, Rosineide e Prazeres, integrantes do Mães da Saudade, gentilmente concordaram em contar um pouco da dor que cada uma carrega e da luta para continuar. A sexta matéria apresenta o projeto Mães da Saudade e o Gcasc. No tópico seguinte, especialistas e autoridades debatem a tragédia da violência urbana. Ao final, são apresentados em quadrinhos casos semelhantes ocorridos em outras periferias da Região Metropolitana do Recife, evidenciando que a morte violenta de jovens não é um problema exclusivo de Peixinhos. E que há muitas mais mães precisando de apoio.

 

As lágrimas de Carmem

Ela já não lembra mais o ano. Mas sabe que foi uma terça, 5 de maio. Carmem Rosane Alves saiu pelas ruas procurando notícias do filho de 16 anos que não havia dormido em casa. Amauri havia chegado em casa no final da tarde do dia anterior após o bico no armazém. “Tu ainda vai sair?”, ela perguntou, escondendo na fala o desejo de que ele ficasse. “Vou”, respondeu Amauri. “Eu só vou aqui na frente e depois eu volto para tomar café e tomar um banho.” 

Quando já passava das nove da noite, Carmem largou a carteira de cigarro e decidiu deitar. O filho que ia só ali na frente não voltou. Ela continuou acordada esperando e nada. O olho não pregava. Aguardou a batida na porta, que não veio. Em algum momento, ouviu tiros. Lá de longe. “Comecei logo a tremer”, ela lembra. Uma chuva forte começou a cair. Carmem diz ter olhado para o lado e visto um vulto do seu filho. Mas não podia ser. “Como uma pessoa passa por uma porta fechada?”, ela se perguntou.

Na manhã seguinte, não aguentando mais, decidiu procurar o garoto. Abordou vários conhecidos de Amauri. “Vá ver o repórter”, sugeriu um colega dele. A aflição de Carmem disparou e ela nem ao menos tinha uma televisão no apertado barraco onde morava. Chegou perto de pedir ao vizinho que lhe deixasse assistir à tv, mas descartou a ideia para não causar ciúmes à esposa dele. 

Ela insistiu que o colega dissesse o que ocorreu. “Mataram o seu menino ontem lá na Areinha”, disse.

Ela lutou para salvar seu filho. Fez o que estava ao seu alcance. Mesmo tendo vivido sempre em Peixinhos, Olinda, mudou-se para Dois Carneiros, em Jaboatão dos Guararapes, sem pensar duas vezes, após um amigo de infância de Amauri ser assassinado no beco da casa que morava. Amauri era traficante e usuário de drogas. “Mas não devia”, diz a mãe, lembrando daquilo que ainda lhe trazia um conforto.

A mulher descobriu que Amauri fumava maconha quando ele tinha entre 13 e 14 anos. O jovem passou a consumir a droga excessivamente, segundo a genitora. “Quando tirava pra fumar, fumava com gosto, com fé. Tinha dia que eu ia buscar ele lá embaixo, porque ele não estava podendo vir de tanta maconha. Os olhos chega tavam feito pimenta de tão vermelho. Eu ia lá e voltava agarrada com ele duas horas da madrugada”.

Carmem, diarista, mãe de oito filhos, acostumada a trazer o filho pelo braço nas madrugadas, lutou, mas não conseguiu evitar a tragédia. Aconselhava o rapaz, queria vê-lo em um cenário diferente, mas não sabia o que fazer. Afinal, “Como uma pessoa passa por uma porta fechada?”

Viu o filho morto no chão, rodeado de curiosos. Sentiu ser consumida por vergonha. “Qualquer mãe que perde seu filho, no momento que a notícia chega, a primeira coisa que vem é a decepção. Você tem um filho por nove meses e depois vê ele estirado na rua com um bocado de gente ao redor...”, ela lamenta, com um pesar da mãe que perde o filho após travar um embate contra o destino.

Apesar do envolvimento do jovem com o tráfico, Carmem afirma não ter sido essa a motivação do crime, pelo menos não diretamente. Amauri se envolveu com uma mulher. O ex-namorado dela, ao saber do relacionamento, resolveu se vingar. 

Carmem consegue ser tolerante quando questionada sobre nunca ter sido procurada pela polícia. “Depois que fiz o enterro passei duas semanas lá. Aí peguei e voltei pra Peixinhos. Se tiveram lá, não me acharam. Nunca falei com a polícia sobre isso”. Duas semanas é tempo suficiente para a polícia procurar um familiar de uma vítima. Nunca procurou. Nunca colheu o depoimento dela. Muitas mães, com dor semelhante a que Carmem carrega, também nunca foram procuradas e o crime ficou sem solução.

O homicídio de Amauri, porém, passou longe de ficar impune. Ele morreu na terça e seu assassino encontrou o mesmo destino dois dias depois, na quinta-feira. O suposto comparsa do criminoso, que auxiliou no homicídio, teve a vida ceifada um mês depois. Os assassinos de Amauri eram conhecidos, costumavam ir até a porta da casa dele chamá-lo para sair.

No caminho para o Instituto de Medicina Legal (IML), no Recife, carregando as roupas que vestiria o filho para o enterro, Carmem passou na frente da casa do jovem que matou Amauri. Na janela, a mãe dele desatou a chorar. “Estou chorando pelo seu filho”, disse para Carmem. “Só não vou no enterro do seu porque estou resolvendo o enterro do meu para amanhã”, acrescentou.

Amauri era querido tanto em Dois Carneiros quanto em Peixinhos. Auxiliava em uma oficina o pai daquele que o matou. Sua mãe não esquece os momentos de desobediência - “é o cigarro que tá comendo tua cabeça”, ralhou o rapaz certa vez quando a mãe sugeriu que ele não estava acompanhado de boas amizades. Mas também era Amauri que cancelava os planos da noite e sentava ao lado dela quando Carmem não se aguentava de dor de cabeça. Ela cochilava, abria o olho e ele estava lá. “Já passou?”, “Ainda não”. E ele continuava ao lado dela. “Passou”, dizia a mulher após outro cochilo. Só então ele saía.

No IML, a mãe não quis ver o filho morto. O pai, que não é próximo a ela e nem ela quer que seja, cumpriu essa tarefa e reconheceu o garoto por um sinal. 

Quando, aos cacos, Carmem voltou para Peixinhos, foi recebida por críticas. “O povo reclamou comigo, todo mundo me xingou quando eu voltei. Disseram que não ia acontecer nada com ele aqui em Peixinhos”. A diarista se convenceu disso. “Foi o meu maior erro. Se eu não tivesse levado ele, não sei se taria vivo, mas teria vivido mais, não teria morrido tão rápido”, diz.

Ela lembra como ficou desnorteada após a perda do filho. “Eu tinha morrido. Parecia um cadáver. Muito feio”. Atualmente, Carmem é conhecida por Delícia, apelido que ganhou após vencer duas vezes o concurso de Miss Delícia, uma brincadeira do grupo Mães da Saudade, projeto que oferece apoio e perspectivas a mães que tiveram os filhos assassinados no bairro de Peixinhos. 

A brincadeira com o apelido Delícia é capaz de lhe trazer um sorriso. Nesse rosto não correm lágrimas. Não importando a dor que esteja a martelar sua cabeça, ela não chora. Não importando as lembranças do dia mais triste da sua vida, ela não chora. É uma promessa.

Assim como viu o vulto do filho atravessando as portas da casa, ela diz continuar a ver Amauri após aquele 5 de maio do ano que ela já não lembra. Vê acordada, vê dormindo. Mais de uma vez sonhou com filho dizendo que estava com fome. Atenciosa, ela serve o prato. “Vou embora agora. Vim de tão longe”, “Vai, meu filho”. Faz um tempo que ela não tem visões do jovem, o que traz algum desassossego. “Ele conversa. Aí eu pego e boto comer pra ele. Eu acho que é ele, visse? Porque eu acho que quando a pessoa morre tem direito de visitar a família. Tem o tempo, mas tem direito de visitar sim”.

Carmem se recorda de chorar o tempo todo. Aí, então, recebeu uma visita. “Ele veio no sonho e disse que eu tava chorando muito e ele não tava podendo seguir o caminho dele.” Carmem respondeu que não iria chorar mais. “E dito e feito. Eu não choro mais não. Sinto muito, mas eu não vou chorar, não choro mais não. Isso aí eu prometi a ele”, diz com os olhos secos. O grupo Mães da Saudade também foi outro importante fator no fortalecimento dela - a mulher acredita que estaria morta se não fosse o acolhimento recebido no projeto -.

Disposta a ajudar o filho a seguir o caminho dele, como o mesmo pediu, ela decidiu que era momento de se valorizar mais. Esse raciocínio resultou nas suas duas primeiras tatuagens. “Preciso viver, já perdi muito tempo, principalmente andando pelo mundo afora, atrás desse que morreu”, afirma. 

Porém, a faxineira não consegue se tranquilizar. Além da tatuagem de um terço no braço direito, outra mais abaixo diz ‘Berg’, nome de outro filho seu. Tinha 30 anos e estava há seis preso por tráfico e posse de arma de fogo quando a conversa com Carmem ocorreu, em 2018. É a grande preocupação dela. “Ele tem que pagar, ele deve sim. Mas eu tô aperreada. Tenho medo quando o Berg se soltar.” Hoje Berg está em liberdade.

Delícia é mãe de cinco mulheres e três homens. O mais velho, criado pela tia porque Carmem precisava trabalhar, tem 33 anos. “O cara é cidadão, viu? Tem três filhos, trabalha no lava-jato. Não fuma. Às vezes toma uma cervejinha dentro de casa. Trabalha até o domingo.” A mais nova é uma menina de dez. Carmem não é tão próxima das outras filhas, que ocasionalmente vêm visitá-la com os netos. Ela não visita as filhas. 

A vida ensinou bem a Carmem que não se passa por portas fechadas. Mesmo decidida a se valorizar, ela sabe que seus dias estão entrelaçados aos de seus filhos. Perguntada sobre seu maior sonho, a mulher que decidiu recuperar o tempo perdido responde: “que meus filhos continuem vivos.”

 

O janeiro e o fevereiro de Sandra

Sandra Calixto da Silva, de 59 anos, diz “mas é assim mesmo” quando não tem mais o que falar. Quando o silêncio ocupa espaço no seu relato. A expressão “mas é assim mesmo” denota naturalidade do fato descrito. É assim mesmo que as coisas são, é o curso natural, não há o que se fazer, não pode ser evitado. Hoje ela é uma mulher doente, que não tem mais a casa que um dia teve, que não tem o bar que um dia teve e que, no espaço de dois meses, perdeu dois filhos assassinados.

“Mas é assim mesmo”, ela continua a dizer.

O caso é que, para algumas mães, é natural que seus filhos morram primeiro do que elas. Não importa o que a ciência e a lógica digam. Sob algumas pessoas, operam outras lógicas. A frustração, a raiva e o sentimento de que algo está errado existe. Mas elas são ensinadas a naturalizar esses acontecimentos. Aconteceu com uma, aconteceu com outra. E o mundo não parou nem, na verdade, pareceu dar valor. “Então é assim mesmo”, ela passa a dizer para tentar se convencer, mesmo sabendo, lá no fundo, que algo está muito errado. 

Sandra sofreu a indescritível dor da morte de Luiz Carlos Calixto da Silva, de 17 anos e 11 meses, no dia 7 de janeiro. Em 28 de fevereiro do mesmo ano, chorou a morte do outro filho, Williams Soares da Silva, 16. Mais uma vez, eram jovens de Peixinhos, periferia de Olinda, que se envolveram com o tráfico de drogas e tiveram suas vidas ceifadas. Sandra lutou contra a tragédia que já previa, chegando a ponto de separar um cômodo de sua casa para que seus filhos fumassem maconha tranquilamente, desde que se afastassem das amizades que mantinham.

Luiz e Williams eram inseparáveis. Formavam um trio de amigos com mais um rapaz de Dois Unidos, no Recife, a quem Sandra não lembra o nome, mas se refere como “má influência”. O terceiro jovem morreu dois meses depois de Williams. Em menos de seis meses, o trio inseparável de amigos não existia mais.

Sandra confessa nunca ter tido jeito para ser mãe. Não apreciava a ideia de parar sua vida para cuidar das crianças. Dona de um bar na área central do Recife, se sentia melhor ajudando os filhos financeiramente. Luiz e Williams foram criados pela avó. Semanalmente, Sandra os visitava. “Eu só fazia trabalhar para dar o que eles precisavam”, resume.

Luiz e Williams traficavam até mesmo no bar de Sandra. “Quando eu descobri, fiquei dando dinheiro para eles fumar dentro da minha casa mesmo, para não se juntar com quem não presta. Dava um dia a um, um dia a outro. Eu dizia ‘já que tu tás com esse vício, faz aqui, deixa teus amigos pra lá, não faz fora, não’. Eu chorei, eu implorei, só faltei me ajoelhar no chão.” Eles nunca aprovaram a ideia de apenas consumir a droga na casa da mãe.

O amigo dos irmãos era procurado pela polícia. Os colegas de Sandra iam até ela contar do perigo ao qual seus filhos estavam expostos. “Ô, mãe, deixa pra lá, eu não faço na frente da senhora”, dizia um. “Meu filho, isso é feio. Deixe disso. Não falta nada pra você comer, não tem que andar com gente que não presta. Anda com gente que presta pra você ter sossego”, a mulher aconselhava.

Entre uma terça e uma quarta-feira, Sandra sonhou que Luiz Carlos era assassinado. Acordou assustada ao vê-lo morto. “Fica por aqui porque se tu for pra Peixinhos tu vai morrer”, ela alertou o filho, levando a sério o sonho que teve. “Às vezes eu tenho aviso das coisas, sabe?” No domingo daquela semana ele estava morto. 

Naquela data, o jovem bebia com a namorada, que estava grávida. Um colega apareceu o chamando para local próximo. Foi lá, na Rua São Sebastião, em Peixinhos, que tiraram a vida de Luiz Carlos. Sandra, que há poucos dias havia sonhado com a morte do filho, dessa vez, foi acordada com a real notícia da morte dele.

O assassinato do irmão foi o estopim para Williams, que começou imediatamente a planejar vingança. Ele conseguiu um revólver com um primo policial e passou a dizer abertamente para a família que iria matar quem assassinou Luiz Carlos. “Eu quero me vingar da morte do meu irmão. Ele não era para morrer”, dizia. A mãe, que mal conseguia processar que um filho seu havia morrido, se desesperava quando via aquela cena, mas não sabia como impedir. Em 28 de fevereiro, Williams foi chamado para fumar maconha na comunidade de Olinda Ilha do Maruim. Lá, ele também foi vítima de uma emboscada e morto com tiros da própria arma que adquirira. 

“Perdi minha saúde”, resume Sandra. Hoje ela diz viver ‘à custa de remédio’. Na data da entrevista, tinha três cirurgias marcadas, uma ela nem lembrava mais do quê. Também deu fim a tudo. Vendeu a casa por meros R$ 6 mil. Arrepende-se amargamente. Livrou-se das roupas dos filhos, não conseguia mais vê-las. “Gastei tudo que tinha, hoje não tenho nada”, diz ela, que passou a dividir com outros parentes a casa da mãe já falecida.

Sandra só descobriu quem matou Luiz Carlos oito anos depois. Uma amiga da sua irmã contou ter visto o momento e ainda pediu ao algoz que não fizesse aquilo. Era um rapaz do bairro que cresceu junto de Luiz Carlos e Williams. Na época da entrevista ele estava preso. Não por esse crime, que sequer teve investigação. “Ele já matou muito aqui em Peixinhos”, diz a ex-comerciante. Em semiliberdade, ele aparece no bairro com frequência. “Eu tenho controle porque não posso com ele, tá uma lapa de homem medonho. Mas é assim mesmo, ele vai achar, se fazendo de amigo da gente e acontecer uma coisa dessa, é coisa que a pessoa nunca esquece, a perda de um filho, mas é assim mesmo.” Já o assassino de Williams foi morto dois meses depois da emboscada na Ilha do Maruim.

A ex-comerciante tem um terceiro filho, mas “é mesmo que não ter”, nas palavras dela. Ele tinha oito anos quando ceifaram a vida dos seus irmãos. Trabalha desde os nove, “graças a Deus”, ela suspira. O rapaz tem uma loja de conserto de celular e relógio. “Ele era para ser assim comigo não. Sou uma boa mãe. Dia das Mães ele não pega nem um sabonete para me dar”, lamenta a genitora. Com a filha de Luiz Carlos, que o adolescente nem chegou a conhecer, ela também não tem proximidade. “Ela fala comigo quando passo por lá. Fui pros 15 anos dela e tudo. Eu queria ser mais próxima dela, nunca deixei ela em vão, quando eu tinha condições, ajudei. Tudo eu fiz. Tudo, tudo, tudo. Não deixei nada para depois.”

Todas as feridas acumuladas ao longo da vida jamais se aproximarão do que aqueles dois meses causaram a Sandra. “Eu só fazia chorar. Agora eu esqueci mais um pouco. Antigamente era demais. Mas é assim mesmo, né? Tudo é assim mesmo. Tem que se conformar porque não vai voltar mais à vida. Aí pronto, gastei tudo que eu tinha. Não tenho mais nada hoje. Mas tenho minha vida, né? E a saúde. A saúde não, né? Que a saúde não tem mais como eu tinha, né, não? Mas é assim mesmo. É uma coisa que vai e não volta mais depois que morre. A gente não esquece.”

 

A morte ao redor de Cleonice

Colocaram uma rosa no lugar do olho azul que foi arrancado pelo projétil. O enterro foi há mais de dez anos. Mataram Fábio na rua onde morava. Era por volta das nove da noite quando acordaram a comerciante para dar o aviso. Ela correu desesperada para tirar o carro da garagem e socorrer o neto que criou como filho. “Tem mais jeito não”, constatou quando iam colocar o corpo no carro.

Apesar de ser a mais dolorosa, essa não foi a única morte a atingir Cleonice Pedrosa de Albuquerque, de 71 anos. Ela viveu um período de muitas perdas - o que talvez explicasse seu tom de voz choroso e cansado -. Atualmente, ela dorme inquieta, assombrada pela sensação de que as mortes violentas que circundam sua vida não vão acabar.

O primeiro baque foi há mais tempo. O marido, aos 29 anos, se suicidou motivado por uma paixão que sentia por outra mulher. Deixou a esposa com seis filhos. Em período mais recente, ela perdeu o irmão, usuário de maconha e com passagem na cadeia por tráfico. Ele estava chegando em casa quando alguém o convidou para fumar nas redondezas. O jornaleiro foi vítima de uma emboscada que culminou em seu assassinato.

Em uma noite em que o algoz do jornaleiro estaria se gabando do feito, o filho de Cleonice se vingou e o matou em um bar. Gutemberg ainda estava preso na data em que ela foi entrevistada. Então veio a morte de Fábio, aos 17 anos. Pouco depois, foi a vez de Deinho, de 16 anos, outro neto de Cleonice. O corpo de Deinho foi encontrado no bairro de Aguazinha, já em estado de decomposição.

Fábio, Coquinho, como era conhecido, estava envolvido com o tráfico de drogas há pouco tempo. Porém, não era de baixar a cabeça para os comandantes do tráfico da área. Nutria raiva do grupo, responsável por matar um amigo seu anos antes. Um dia Fábio atirou contra eles. Naquele momento, assinava sua sentença.

Em um sábado, ele tomou banho, sentou no sofá, em seguida repousou a cabeça no colo da mãe. "Não saia não", Cleonice advertiu. Ela sentia que o filho tinha virado alvo porque as pessoas perigosas de Peixinhos rondavam sua casa. Quinze dias antes, eles chegaram até o quintal da residência, mas, por algum motivo, não foram além.

Coquinho foi até a esquina. Vestia o belo blusão que a mãe havia comprado no shopping. Estava acompanhado de um amigo e duas garotas. Chegaram duas motos. Quatro homens desceram e apertaram o gatilho. Morreu Fábio e morreu o amigo, que nada tinha a ver com a questão. A mãe do amigo de Coquinho mora na mesma rua de Cleonice.

“Fábio tinha tudo”, reflete Cleonice, que na época do crime mantinha um pequeno comércio. “Tudo que eu podia fazer por ele, eu fazia. Eu tinha certeza que ele não ia ficar nessa vida”. Ela não sabe explicar como o neto se envolveu com o crime, mas se questiona se tudo aquilo que adquiria para o garoto alguma vez preencheu uma ausência afetiva.

O jovem é filho de um homem que foi deixado bebê na porta de Cleonice e que se tornou um alcoólatra desinteressado pela paternidade. E que bebia tanto que os seus irmãos iam buscá-lo em um carro de mão. Era agressivo com Fábio. A mãe, viciada, também abandonou o garoto quando ainda era bebê, em um roteiro semelhante ao do seu pai.

Fábio sempre teve o sonho de conhecer a mãe. Três meses antes de morrer, suas súplicas foram atendidas. A família fez um esforço e localizou mulher no Janga, na cidade vizinha de Paulista. Ela foi trazida para Peixinhos e, logo após, houve o assassinato. Parecia a realização de um último desejo.

Mesmo com curto período no tráfico, a imagem de Coquinho logo estava manchada. Chegava gente na casa de Cleonice: “Fábio matou uma pessoa agorinha.” Ela, então, mostrava que o filho dormia em casa desde cedo. Ele estava ficando conhecido a ponto de ser apontado como autor até do que não fazia. A Polícia Militar aparecia com frequência atrás dele. Uma dessas aparições foi no Carnaval. Os policiais foram até a casa em Peixinhos quando só havia o pai de Cleonice, na época com 90 anos. 

“Dona Cleonice, eu estou aqui na sua casa atrás de Flávio”, disse uma voz ao telefone. “Quem são vocês?”, ela perguntou. “Nós somos policiais.” A mulher suspendeu a celebração e voltou apressada. Encontrou a casa já toda revirada. Ela alega que os policiais roubaram o dinheiro da renda do sábado e do domingo que ela havia juntado. Vasculharam o guarda-roupa e, segundo ela, subtraíram até uma toalha de renda. O marido atual de Cleonice chegou a prestar queixa. Foi alertado por um sargento amigo: “Tu vai perder teu tempo porque não vai dar em nada”.

“Tu vai morrer!”. A frase faz Cleonice acordar do sono tremendo. A morte de Fábio a jogou em um quadro depressivo aterrador. Não reunia forças para trocar a roupa que vestia. A família a arrastava para debaixo do chuveiro. Vivia apavorada. Ela se livrou de tudo relacionado ao filho, com exceção de uma foto, para não esquecer o desenho de seu rosto. “Tu vai morrer!”, por mais de uma vez ela ouviu essa frase e acordou assustada.

Cleonice sobreviveu e tem se recuperado - o projeto Mães da Saudade exerce papel fundamental nesse processo de melhora -. Apesar dos evidentes avanços e da confiança que readquire, o desassossego continua e a morte ainda parece rondar a mulher. Ela soube que mais um neto, um rapaz de 18 anos, estava vendendo maconha e pedra de crack dentro de favela em Olinda, seguindo um caminho parecido com o dos primos Fábio e Deinho. Os últimos relatos são de que ele parou de traficar, arrumou um emprego vendendo verdura, mas continua consumindo maconha. Gutemberg estava prestes a progredir para o regime aberto. A felicidade que ela tinha de ter o filho próximo convivia com o medo da perda. “Ele já aprontou muito. Meu medo é que matem ele também, né? Tem noite que eu nem durmo direito, sabia?, preocupada com isso”, a idosa relata.

Gutemberg é o pai de Deinho, o outro neto assassinado de Cleonice. Sofreu a morte do filho. Chegou a tirar o garoto da casa da outra avó, com quem vivia, para afastá-lo das más companhias. O jovem, de temperamento agressivo, passou cerca de um mês na casa do pai até voltar a morar com a avó, que faleceu em um acidente de moto. Depois, morreu Deinho. Na juventude, Gutemberg ia para os bailes funks, participava das violentas brigas de bairros. Falta-lhe um dedo na mão, arrancado por uma bala que ele mesmo disparou quando brincava com um revólver. 

Em uma das visitas ao filho na prisão, certa vez apontaram a Cleonice: “Olha lá quem matou Coquinho”. Ela olhou com hesitação. Foi na Penitenciária AgroIndustrial São João (Paisj), na Ilha de Itamaracá, na Região Metropolitana do Recife. Ela se acostumou a ver, nos dias em que visitava Gutemberg, presos consumindo maconha, crack, pó. “É uma feira”, diz ela, que pagava R$ 50 a “um cara de lá mesmo” para dar um celular ao filho, com quem mantinha constante contato.

Gutemberg tem uma casinha no mesmo terreno onde a mãe mora. E ela pensa em largar a casa onde vive desde os seis anos e vender tudo. Tirá-lo de onde a morte parece residir.

 

O frio de Rosineide

Adílio era diferenciado. Driblava, dava ritmo, atacava, dono de um passe preciso e ainda goleador. Gostava de deixar o atacante na cara do gol, mas também aparecia lá na frente para fazer a tabela. Com Zico e Andrade, formou um meio-campo histórico do futebol brasileiro. Naquele jogo, em 17 de abril de 1983, foi novamente peça essencial no fortalecimento do meio-campo do Flamengo diante do Corinthians de Sócrates. Fez, inclusive, um dos gols. A partida acabou 5x1 em um Maracanã com mais de 90 mil torcedores.

Distante 2,3 mil quilômetros dali, Rosineide Maria da Silva Moreira, a Neide, sentia contrações na sua casa em Peixinhos, Olinda. O marido, naquele momento, havia decidido: o menino seria Adílio. Nasceria no dia 21 de junho de 1983.

Muitos anos depois, 2 de junho de 2006, fazia um sol escaldante e comum do litoral de Pernambuco. Neide acordou com frio. “Frio?”, espantou-se sua mãe. Neide também não soube explicar.

Enquanto narra a história, Neide, hoje com 58 anos, percorre longos caminhos. Hesita em chegar naquele 2 de junho. Estica a história o máximo que pode, como se, dessa forma, aquele ocorrido nunca fosse chegar.

Ela começa a história dizendo sempre ter sonhado com um filho homem. Não sabe explicar o porquê. Concretizou-se em 1983, com a chegada de Adílio Rogério da Silva Moreira. Um ano antes, havia nascido Aurineide Iara da Silva Moreira. Um ano depois, nasceu Auriacelly da Silva Moreira.

Com o pai desses três filhos, Neide passou 15 anos. Ao comentar sobre ele, resiste inicialmente, mas se abre: “Apanhei muito dele." Ela pede que os detalhes da violência não sejam expostos. E não era só ela a vítima. O filho também era agredido.

Desde que seus meninos eram crianças, Neide trabalhava como balconista em uma padaria. Trabalhava para não deixar faltar nada aos meninos. O marido era distante deles.

Adílio não absorvia o que ouvia em sala de aula. “Não entrava na mente dele”, diz a mãe, que foi chamada para conversar com a psicóloga da instituição. A profissional estava interessada em saber se algo de errado ocorria no ambiente familiar que explicasse as notas baixas do garoto. Relutantemente, Neide contou que era vítima de violência doméstica. “O problema é esse”, apontou a psicóloga. Para melhorar o desempenho do filho, Neide afirma ter procurado não demonstrar o que acontecia entre ela e o pai dele. E confiscou o minigame.  

A mulher salta a história para a vida adulta de Adílio, quando ele começou a trabalhar na Companhia Pernambucana de Saneamento (Compesa), em São Lourenço da Mata, Região Metropolitana do Recife, o que a enchia de orgulho. Um período de cortes tirou o emprego dele, que, em dificuldades financeiras, decidiu abrir um fiteiro nas proximidades de sua casa. Naquela mesma época, Adílio havia se tornado pai.

Então, certo dia, Neide acordou com frio.

O sol ardia lá fora, mas a balconista chegava a tremer gelada. Já era de tarde quando foi tomar banho - com água quente -. Vestiu uma blusa de mangas compridas. O pulso também doía muito, uma crise de sua artrite reumatoide.

Encontrou o filho no fiteiro. “Estou sentindo tanta dor na minha mão e um frio tão estranho”, disse a ele. “Tu já tomou remédio, mainha?”, o rapaz perguntou. “Se tu quiser eu vou lá na padaria avisar que tu tá doente.” Ela recusou a proposta. Deu a ‘bença’. Ele deu um beijo. “Se não aguentar, venha simbora.”

Passava das 18h quando o telefone tocou na padaria. Quem atendeu foi o proprietário. Neide lembra do olhar dela cruzando o dele. O telefone foi colocado no gancho. Chegou um cliente que só gostava de ser atendido por Neide. O telefone tocou outra vez. “Neide, é para você.” Ela pediu que o cliente não procurasse outro funcionário, pois ela voltaria para atendê-lo. Não voltou.

A balconista saiu do local em desespero. Chegou aflita na emergência de uma unidade de saúde de Olinda. Havia uma multidão. Os olhares dos presentes apontavam para alguma pessoa que acabara de chegar. “O que é aquilo ali?”, “parece que balearam o rapaz”, ela ouvia o vozerio enquanto tentava se aproximar. “Meu filho já estava morto.”

No dia anterior aquele dia frio, cinco pessoas teriam ido até o Alto da Bondade, comunidade em Olinda, e matado um homem com crueldade, com direito a pisada e cusparada. Entre os assassinos estaria o cunhado de Adílio.

O irmão da esposa de Adílio teria envolvimento com homicídio e tráfico de drogas na região. O crime no Alto da Bondade, entretanto, não ficaria sem resposta. No outro dia, moradores da comunidade desceram atrás de vingança.

Enquanto estava na urgência, Neide ainda viu chegar um segundo corpo. Era Alemão, um amigo do cunhado de Adílio. Levou mais de dez tiros. Ainda estava vivo, mas morreu naquela madrugada.

“Meu filho morreu por engano”, afirma Neide com segurança. Adílio morreu com um único tiro na nuca, disparado pelo garupa de uma moto. Funcionários de uma padaria ao lado do fiteiro teriam ouvido o condutor dizer ao homicida que a pessoa errada havia sido assassinada. “Eles estavam atrás de uma pessoa que no dia da morte no Alto da Bondade estava com um boné branco para trás. Moreno e de cabelo crespo. Assim ouvi dizer. Mas meu filho não usava boné.” Perante a balconista, a sogra de Adílio disse ao filho: “Isso não era pra ter acontecido com ele. Era pra ter acontecido contigo. Agora Adílio morreu por causa de tu.”

Neide foi chamada para depor na investigação dos homicídios. Já circulava no bairro a história de que o alvo não seria o seu filho e que se tratava de uma vingança contra o homicídio do dia anterior no Alto da Bondade, com envolvimento do cunhado dele. “Eu não sei”, respondeu ela ao delegado quando perguntada sobre quem matou seu filho e por que matou. O delegado insistia. “Eu não sei, eu não sei.”

Por mais que estivesse corroída de dor e raiva, a mulher negou saber qualquer fato sobre a tragédia. “Eu fiquei com medo de falar a verdade. Eu tinha medo e duas filhas. Tinha meu neto”, ela explica. Com 15 dias da morte, ouviu que o assassino do filho estava preso. Depois, escutou que ele havia morrido. Porém, em outra oportunidade, voltou a ouvir que ele continuava na prisão. A verdade é que, para ela, não importava mais.

O cunhado de Adílio também acabou na prisão, o que foi bem visto pela sua própria família, pois ele estava marcado para morrer e ali, sem liberdade, teria vida. Quando deixou o cárcere, a família o levou para longe. Posteriormente, ele acabou voltando para Peixinhos. Consequentemente, foi assassinado. A mãe dele foi quem apresentou o grupo Mães da Saudade a Neide. Hoje elas se encontram nas reuniões da ONG, ambas tentando se reerguer do baque que é perder um filho.

“Se eu disser a você que é fácil, é não. Se eu disser a você que eu não sinto, eu tô mentindo. Se eu disser a você que sou forte, eu tô mentindo. Eu me faço de forte, é diferente, né?”, Neide resume. Ela já se aposentou. Participa das atividades do Mães da Saudade com regularidade. Hoje, com o apoio recebido, diz que a saudade é moderada, dá para suportar. Yuri, de 13 anos, está ficando a cara do pai. “Ele também é amoroso. Me abraça, me beija, pergunta se estou bem. A fisionomia. O jeito. É mesmo que eu estar vendo meu filho”.

 

O Salmos 91 de Prazeres

Prazeres Raimundo da Silva, 63 anos, conhece bem as ruas de Peixinhos, onde nasceu e se criou. Entre becos desnivelados e chão de barro, ela anda sempre acompanhada de um caderno e uma caneta. Assim que se encosta para conversar com algum vizinho, abre o caderno e começa a escrever. 

“Www.geraçãodefogo.com.br”, ela começa o texto. O site que ela escreve no topo da página não está no ar. “Orai e praticai o Salmos 91”, diz a frase seguinte. A mensagem que ela escreve continua por duas páginas de um caderno pequeno:

“Para que Deus possa continuar te fortalecendo. Eu sou o Deus que Cura”, ela escreve

Prazeres sorri quando conta a sua história cheia de infortúnios. Acha graça em um evento ou outro. Lembra das perdas com ar de naturalidade. Chora por poucos segundos quando se recorda do irmão, Uranzildo Raimundo da Silva, que faleceu em Águas Compridas após se desequilibrar e cair de uma escadaria em junho de 2018, caso divulgado na imprensa. 

Foi em 1994 que ela perdeu seu primeiro filho. Prazeres voltava da feira, onde trabalha recebendo em verduras. Jorge Antônio Raimundo da Silva tinha 21 anos. Ele fazia bicos, ajudava um vendedor em um fiteiro e gostava de ficar perambulando pelas ruas.

Naquele dia, Jorge havia passado a tarde bebendo com a tia. “Quando chegou no Condor [em Peixinhos] ofereceram um gole de cachaça a ele. Ele disse que não queria. Correu. Prontamente meteram bala nele. Ali mesmo deram 18 tiros nele.” Ela lembra a quantidade porque viu no laudo na delegacia as setas na foto do corpo dele. “Foram 18 setas.”

As pessoas ficaram surpresas por Prazeres não ter chorado. Sempre foi naturalmente anestesiada, a própria afirma.

“Eu vou mudar a tua história”

Prazeres teve uma criação muito rígida. Não podia ir à casa do vizinho ver televisão e nem tinha tv em casa. Se saísse, apanhava. Não podia ir até a esquina. 

Durante apenas um ano de sua vida, Prazeres saiu de Peixinhos com os pais e se mudou para o bairro de Águas Compridas, também em Olinda. Foi nessa época que o seu compadre se aproveitou que ela estava sozinha em casa e a estuprou, tirando sua virgindade. Ela tinha 17 anos. Engravidou. 

O homem seguinte que apareceu em sua vida foi o pai de suas duas filhas. Certa vez este marido trouxe um peixe para o almoço, o qual ela deixou descongelando em cima de um balcão. Prazeres conversava com a vizinha. “Ele ficou perguntando ‘cadê o peixe’, ‘cadê o peixe’. Teve uma hora que dei uma resposta grossa, aí ele prontamente pegou a faca.” Prazeres correu para a sala, o companheiro foi atrás. Ela chegou na porta, ele a alcançou. Ela correu para a casa da vizinha. “Aí quando eu chego na casa da vizinha, eu tô furada. Acima do rim. Levei dois pontos. Eu tava grávida de oito meses”, lembra. A mulher foi socorrida e nunca mais voltou para o agressor.

Tempos depois, Prazeres se casou com o homem com quem teria José Carlos, outro filho já falecido. O marido era alcoólatra. Por causa de algo que a mulher diz não lembrar, ele lhe acertou um tapa no rosto. Ela gritou e foi acudida pela vizinha. Após aquele tapa, nunca mais voltou para o agressor.

O companheiro seguinte era ‘raparigueiro’, como classifica Prazeres. Morreu atropelado por um ônibus. Antes da fatalidade, ele chegou a ser preso. Prazeres foi visitá-lo na delegacia e isso mudou em certa medida os rumos de sua vida.

“Não chorai porque eu vou continuar mudando tua história, porque eu sou Deus”

A feirante foi acolhida pela Polícia Civil. Fez amizade com os agentes e começou a trabalhar informalmente faxinando e cozinhando lá. No final do mês, os policiais faziam uma cotinha e lhe entregavam.  Ela diz ter aprendido na delegacia sobre o mundo, o que sempre lhe foi negado. “Aprendi muita coisa, porque às vezes chegava uma pessoa toda descabelada como vítima e fazia o boletim de ocorrência. Quando era no dia da ‘acarência’, a vítima era quem tava sendo acusada. Aquela que chegou descabelada sendo vítima não era vítima, era a acusada.”

Há nove anos Prazeres virou evangélica. Passou a evangelizar as vítimas que iam fazer o boletim de ocorrência e os próprios policiais. Pouco tempo depois, já estava munida de caderno e caneta. No começo, as mensagens da mulher que estudou até a quarta série não saíam como ela queria. “Eu sei que começou de repente, eu escrevendo só ‘Salmos 91’. Era tudo feio, letra por dentro de letra, faltando palavra”, recorda.

Se está conversando na rua, Prazeres está escrevendo; se está em um culto da igreja, está escrevendo. “Eu estou dando glória e estou escrevendo”. Se sair muito naquela semana, o caderno dura apenas oito dias com folhas limpas.

“Quando tem uma horda de drogados, eu amo chegar no meio deles e pregar. Primeiro pergunto logo ‘tu tem Bíblia em casa? Pega o Salmos 91 que Deus tem um plano lindo na tua vida. Quer mudar tua história? Só quem muda é Ele’.” Ela comemorava que havia entregado dias atrás uma folha para um rapaz e na madrugada seguinte ele mandou mensagem avisando estar muito bem após a leitura. “É um incentivo de vida”, resume a idosa.

Ela escrevia dentro do ônibus quando um homem anunciou o assalto. O veículo trafegava na Avenida Luís Correia de Brito, Olinda. Com uma espingarda calibre 12 caseira na mão, o assaltante recolhia os pertences de todos os passageiros e chegou até ela, que lhe entregou um papel. ‘Orai e praticai o Salmos 91’. “Não, tia, fique com isso”, o homem respondeu. “Perto de mim não chegou pá assaltar. Assaltou todo mundo, eu não”, diz.

Além de trabalhar na feira aos domingos recebendo em verduras e na delegacia de Peixinhos, a mulher fez serviço de empregada doméstica por muitos anos. Diversas vezes os filhos ficavam a sós em casa, cuidando uns dos outros. “Minha vida foi sair de manhã e chegar de noite. Fazia faxina. Ia daqui pra Ouro Preto a pé. Sempre pra botar o alimento dentro de casa. Trabalhava pra não tá pegando nada de ninguém.” 

“Para que Deus possa continuar tirando a ousadia e o empecilho e a obra negativa que caia sobre a Terra”

Prazeres não sabe a motivação da morte do filho Jorge Antônio. Sabia que ele se envolvia com atos ilícitos, pois o flagrava com más companhias nos arredores da feira.  E sabe quem o matou. Também foi morto anos depois. O assassino foi arrastado e alvejado no lixão da Muribeca, em Jaboatão dos Guararapes, na Região Metropolitana do Recife, por um tenente da Polícia Militar. A família só conseguiu reconhecer o corpo por causa da cueca que usava, presente da esposa, e da tatuagem com os dizeres ‘amor só de mãe’. À época da entrevista, o policial estava preso por outro homicídio - tem a fama de matador -. Prazeres não lembra de ter sido procurada pela Polícia Civil ou de ter havido investigação da morte de Jorge.

José Carlos, o outro filho, também estava envolvido com a criminalidade da área. Tinha até fama pior. Foi autuado na Lei Maria da Penha por agredir a esposa. Assim como Jorge, era alcoólatra e usuário de drogas. “Não era por falta de conselho”, comenta Prazeres. Carlinhos foi acometido por uma doença degenerativa e faleceu em 2017. 

“Para que Deus possa continuar crescendo na tua casa. Para que Deus possa continuar te fortalecendo”

As pernas esguias de Prazeres não revelam as peregrinações que a mulher costuma fazer. Grande parte das verduras que recolhe da feira aos domingos ela transforma em cestas para distribuir a famílias mais vulneráveis. Sai distribuindo por aí, Rio Doce, Maranguape II, Alto da Bondade, entre outros. Leva a questão a sério. Em certa ocasião, rompeu ano separando verduras. Enquanto os fogos estouravam lá fora, ela separava as cestas, colocando cenoura, batata, chuchu, pepino.

Foram aquelas mesmas pernas acostumadas a rodar Olinda para conseguir sustentar os filhos e entregar cestas de verduras que derrubaram a porta da própria casa de três cômodos, impedindo que a neta fosse estuprada por um primo, genro de Prazeres, e não vivenciasse o mesmo destino que o dela. A feirante notou que algo estava errado ao se deparar com um neto nervoso na cozinha. Ao escancarar a porta trancada, assustou o homem, que começou a subir as calças. Os próprios familiares pediram que Prazeres não registrasse queixa, que pensasse na filha. “Eu fui direto para a DPCA [Departamento de Polícia da Criança e do Adolescente]. Se ele fosse meu filho eu também iria levar até o fim”, diz a idosa, agindo como ela queria que alguém tivesse agido naquele ano em Águas Compridas. 

 

Projeto Mães da Saudade

Havia uma espécie de correnteza. Forte. Correnteza que empurrava os corpos de jovens e os deixavam estirados no meio da rua. E então pessoas se acumulavam ao redor do corpo enquanto uma mancha vermelha escurecia no chão. Vozerio. E chegavam a polícia e o IML. E iam embora a polícia e o IML. E as pessoas. E silêncio. Tudo voltava à normalidade. A vizinhança ganhava um assunto a mais na conversa de porta de casa. Mas a correnteza continuava deixando os corpos estirados no meio da rua. Mais um. E mais um. Era um cenário que se tornava corriqueiro em Peixinhos, bairro periférico de Olinda.

Nem todo mundo fechava os olhos para aquele roteiro que se banalizava. Entendiam que aquele fenômeno não era natural como um curso d’água. O que parecia correnteza não era correnteza. “Peixinhos tem 12 favelas, é um bairro superpopuloso e a gente vê que não tem política de juventude aqui. O homicídio ainda existe, a violência é grande, o tráfico é bem pesado aqui e esses jovens não têm opção”, diz a educadora social Elisângela Maranhão. Ela e mais alguns outros criaram, em 1986, o Grupo Comunidade Assumindo suas Crianças (Gcasc), com o objetivo de remar contra aquela maré e salvar a vida dos adolescentes do bairro. Por meio de ações como alfabetização, dança, esporte, informática, oficinas e outras atividades culturais e educacionais, a organização iniciou uma batalha que nem mesmo o poder público parecia disposto a travar. Passaram também a ir à rua, em protestos, mobilizando a periferia e cobrando investimentos.

No começo da década de 1990, o Gcasc idealizou um painel com os nomes dos jovens assassinados na comunidade. Em 1993, já havia 44 nomes na lista. 

Não era só a morte dos jovens que Elisângela e os demais integrantes do Gcasc enxergavam. Além do corpo estirado, das pessoas ao redor, do vozerio, da polícia, do IML, havia mais alguém ali. Uma mulher chorando desesperada. A mãe daquele corpo.

Desde o começo do Gcasc, a figura da mãe em luto mexia com os integrantes do grupo. Apesar da invisibilização. Apesar da ausência de comoção social pela morte do adolescente. Mães como Carmem, Sandra, Cleonice, Rosineide e Prazeres, cujas histórias foram retratadas nos textos anteriores. Mães que precisavam chorar em privado, mas tão privado que nem na própria casa o pranto era permitido. “Essas mães não podem vivenciar o luto. Historicamente a relação do pai é de ausência. Ele é omisso na afetividade, na educação e em cuidar desse filho. Tanto é que quem leva a culpa todinha é a mãe. E o pai diz ‘vai chorar por aquele marginal? Ele procurou’”, comenta Maranhão. Rasgadas pela perda do filho e sem poder externar a dor, muitas mulheres perdem o prazer pela vida. Deixam de sorrir, deixam de sair de casa. Entram em depressão. Viram mulheres doentes.

A mãe enlutada fazia parte do ambiente em torno do Gcasc e, se a sociedade de maneira geral parecia nem percebê-la, ali o silêncio que ela era induzida a viver incomodava como um grito sem fim. Em 2012, então, o grupo criou um projeto voltado para ela. Surgiu o Mães da Saudade, com o objetivo de acolher as mulheres que perderam filhos em Peixinhos e oferecer apoio, apresentar perspectivas e inseri-las na luta pela vida dos outros jovens da comunidade. “É um projeto para abraçá-las. Para elas pensarem nos seus filhos, nas lembranças positivas, qual era a relação afetiva que ele tinha com ela. A gente faz a coleta da história e da vida desse filho tentando esquecer a parte trágica”, explica Maranhão.

Foram identificadas em Peixinhos 70 mães que tiveram pelo menos um filho vítima de homicídio. Dessas, 55 participam do projeto. Algumas são ativas, estão presentes em todas as atividades, outras aparecem esporadicamente. “É um desafio muito grande. As mães oscilam muito. Uma hora elas estão fortes, outra, muito abaladas”, percebe a educadora.

As marcas estão sempre presentes. Uma participante, por exemplo, sempre rompia o ano suja. Comprava roupa da filha, arrumava a filha, mas não conseguia reunir vontade para se arrumar. Outra não gosta de comemoração de aniversário e no Dia das Mães desaba no choro. Ela pede a Deus para sonhar com o filho e não consegue.

Ver ou sentir o filho morto em sonhos e visões é um fenômeno que ocorre repetidas vezes com essas genitoras. Esse era o caso de Carmem, cujo filho lhe pediu em sonho que parasse de chorar e ela assim o fez. Na pesquisa “Luto e memória das Mães da Saudade de Peixinhos”, realizada pela antropóloga Catarina Morawska, outros exemplos foram encontrados. Como a mãe que diz escutar o filho chamando “mainha” e, quando senta na beira da cama em que dormia com o filho, sente o pulso dele em cima do corpo, do braço que ele costumava repousar sobre ela durante o sono. “Pode aparecer quantas horas quiser que mainha não tem medo não, que mainha sabe que é você”, a mãe diz. Outra genitora afirma ver o filho quando acorda - ele dormia no mesmo quarto que ela. Há mais uma que garante sentir o filho chegando em casa. 

Chamados de "alma sebosa" e considerados por muitos como dignos de morrer em plena juventude, esses meninos são definidos como bons, amorosos e alegres por quem lhes criou. Opiniões essas que muitas vezes estavam escondidas no peito dessas mulheres, que não conseguiam encontrar uma oportunidade de colocar esse peso para fora. Afundavam na “correnteza”. Integrantes do Gcasc que entrevistaram essas mulheres ouviram frases como “foi duro falar sobre meu filho, mas o peso que sinto no peito está mais leve”, “hoje a saudade apertou muito, mas foi bom pra mim” e “vocês me ajudaram ouvindo, obrigada.” 

Os responsáveis pelas coletas são os jovens do próprio bairro, que configuram uma parte importante do Mães da Saudade. Chamados de jovens multiplicadores, eles recebem formação política, cultural e em Direitos Humanos. Tão logo recebem formação e participam das atividades do Gcasc, são convidados a visitar escolas e realizar oficinas com crianças e adolescentes. Os multiplicadores capacitados passaram a realizar um levantamento de narrativas junto às mães. 

“No primeiro ano do projeto, era muito difícil elas virem participar”, conta a jovem multiplicadora Fernanda Alves. “Mas hoje uma chama a outra. Elas avisam que a vizinha está na mesma situação, pede para irmos lá. Ou mesmo essa vizinha já conhece e vem junto com uma Mãe da Saudade”, acrescenta.

"Esse sentimento de aconchego, de juntar, de escutar o outro e ter voz é massa", acrescenta Ricardson dos Santos, também jovem multiplicador. Outra integrante, Melissa Santiago, completa: “Elas se dão força, é uma cumplicidade mesmo que elas têm uma com a outra. Assim que uma mãe vira Mãe da Saudade [perde um filho] elas vão lá, dizem ‘já passei por isso, tem um grupo que pode te ajudar’. Elas ensinam mais para a gente do que a gente para elas. A força delas chama a atenção. Como é que alguém consegue passar por tudo isso e ainda continuar em pé?”, indaga Melissa.

Apesar das cicatrizes, a importância do projeto é inegável e o reconhecimento está presente na fala dessas mães, que recebem atendimento psicológico e participam de debates, cursos, atos públicos e eventos culturais. Carmem acredita que estaria morta se não fosse o grupo. Quando a lembrança dói na sua cabeça, ela vai ao Gcasc para pensar em outras coisas. Rosineide, mesmo com o entendimento de que finge ser forte, passou a sorrir mais e a interagir melhor com as pessoas. Cleonice se sente entrosada. Antes, ela aparecia na sede apenas em dia de eventos maiores. Passou a comparecer com frequência e participar das reuniões. “Agora tô vivendo melhor”, diz Cleonice.

Uma das atividades realizadas pelo grupo Mães da Saudade é o círculo restaurativo, que tem o objetivo de aproximar e fortalecer as mulheres. Em uma das ocasiões, elas foram levadas ao Centro de Cultura Luiz Freire, no Sítio Histórico de Olinda. Carregavam um semblante animado ou desconfiado por não estarem acostumadas a passear pelas ruas da cidade alta. Ao longo daquele dia, uma a uma contava sua história de vida. Relatos de dor, mágoa, frustração, felicidade, alegria, saudade. Elas se reconheceram uma na outra. Se abriram. Houve espaço para sorrisos, para gargalhadas. “Como é que alguém consegue passar por tudo isso e continuar em pé?” foi a difícil pergunta que Melissa fez. Ali, naquele dia ao menos, uma mãe sustentava a outra.

 

Juventude perdida

Peixinhos é um bairro com becos estreitos, casas humildes e barracos de madeira, lixo em muitos pontos, rio que cheira mal e ruas de terra que viram grandes poças e lama em dias de chuva. É uma região de elevada vulnerabilidade social. Os números aferidos no bairro de Olinda desenham com maior clareza a situação. Segundo os dados de 2010 do Atlas do Desenvolvimento do Recife e Região Metropolitana, 23,25% da população do bairro não possui água encanada, 10,43% não possui instalações sanitárias e 9,10% não tem coleta de lixo. Ainda 42,02% dos responsáveis pelos domicílios têm renda de até um salário mínimo. 

O Grupo Comunidade Assumindo Suas Crianças (Gcasc) visitou 242 casas em 2014 para uma pesquisa. Como descrevem, o foco se deu nas "vísceras do bairro", lugares escondidos e esquecidos como Beira Rio, Cabo Gato, Condor, Giriquiti, Marezão, Sítio dos Arcos, Beco do Luar, Beco do Pavão, Toca do Calango, Detran, Cuscuz, Favela da Xuxa, Vila das Pedreiras, Areial e Vila da Cohab. Nas casas visitadas, a média era de quatro ocupantes, sendo a residência mais populosa um núcleo familiar composto de 16 pessoas.

Das 242 pessoas entrevistas, 126 (52,1%) afirmaram ter perdido alguém da família por homicídio. Quando perguntados quais membros da família sofreram assassinato, o número chegou a 172, indicando que em muitas casas havia pessoas que perderam mais de um parente de modo violento.

Ao todo, 50,9% dos assassinados eram de uma geração abaixo das pessoas entrevistadas, sendo filhos, netos, enteados e sobrinhos. Um total de 37,7%  era parente da mesma geração, como irmão, companheiro, primo, cunhado. Apenas 11,4% perderam pessoas de geração acima: pai, mãe, padrasto, tio. Um elevado número de entrevistadas, 72,3%, declarou que alguém da família estava preso no momento da pesquisa. Outro dado obtido trata da escolaridade. Entre as pessoas acima de 15 anos, apenas 18,4% possuíam ensino médio completo; 15,9%, ensino fundamental completo; e 58,7% não completaram o ensino fundamental ou não estudaram. Apenas 0,9% ingressou no ensino superior.

A pesquisa do Gcasc diz que 71,1% das provedoras são mulheres e 48,3% afirmaram que, além de serem provedoras principais, ao menos mais uma pessoa contribui com a renda familiar - dados de 2010 repassados pelo Sistema de Informações Municipais de Olinda (Simo) apontam que 47,42% das mulheres são responsáveis pelos domicílios em todo o bairro de Peixinhos. Para Elisângela Maranhão, educadora social no Gcasc, os números indicam um ciclo vicioso, pois a necessidade de renda possivelmente leva os indivíduos a deixarem a escola, mas a baixa escolaridade parece ser um dos fatores a explicar por que a grande ocupação dos provedores das casas visitadas é nas áreas de serviço e comércio, em sua maioria ocupações com baixa remuneração e informais. O dinheiro oriundo do trabalho é somado a benefícios assistencialistas. A maioria das entrevistadas, 57,9%, recebia algum benefício ou participava de programas sociais do governo. Das pessoas assassinadas citadas durante os questionários, só 22,7% estavam empregadas e 25,6% frequentavam a escola à época do crime.

O estado de Pernambuco não ocupa posição confortável na morte prematura de jovens, fenômeno que cresce no país desde a década de 1980. Daniel Cerqueira e Rodrigo Leandro de Moura, no estudo ‘Custo da juventude perdida no Brasil’, de 2013, revelam como essas mortes violentas impactam a todos: elas equivalem ao custo anual de cerca de 1,5% do Produto Interno Bruto (PIB) nacional, o equivalente a R$ 79 bilhões. Em Pernambuco, o custo decorrente da morte violenta de jovens é maior, 3,5% do PIB. O cálculo foi feito considerando a diminuição da expectativa de vida por conta das mortes prematuras e, consequentemente, a queda da capacidade de produção e de consumo da população.

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Diante de tantos números que dialogam entre si, explicações para os corpos de jovens estirados em Peixinhos que se dão em cima das escolhas individuais das pessoas e por causa do envolvimento com o tráfico ou consumo de drogas parecem rasas e insuficientes. Entendimentos diferentes desses são vocalizados tanto por especialistas quanto por representantes dos governos.

O coordenador de projetos do FBSP, David Marques, salienta se tratar de uma situação multicausal. “Em relação à juventude, as principais associações são com a questão da vulnerabilidade, então é a ausência dos bens sociais, bens culturais mais elementares - boa parte deles oferecidos pelo Estado -, que não estão à disposição de vários segmentos da juventude”, resume. Expressiva parte dos jovens vítimas dos homicídios no Brasil são chamados de ‘nem-nem’. “Eles nem estudam e nem trabalham. Fora da escola e do mercado de trabalho, têm reduzidas oportunidades. Muitas vezes não têm mobilidade, mobilidade urbana mesmo, ficam muito concentrados no seu próprio bairro”, acrescenta Marques.

As Mães da Saudade têm perfis muito semelhantes. Repetem-se situações como baixa escolaridade, histórico de violência doméstica, companheiro ausente e necessidade de ficar distante dos filhos para obter renda, geralmente em trabalhos autônomos ou informais. 

O pesquisador David Marques destaca a existência de vasta bibliografia apontando relação entre a violência e a baixa escolaridade. “Quanto mais anos de estudo, menor é a probabilidade de você ser vítima de homicídio no Brasil. A gente tem uma informação do Atlas, que se você pega o perfil das vítimas de homicídio entre 2007 e 2017, no caso de homens especificamente, 74,6% das vítimas de homicídio nesse período possuíam no máximo sete anos de estudo, ou seja, uma educação bastante básica, bastante fundamental ainda, muitas vezes não completa”, ressalta.

Sobre violência doméstica, o coordenador de projetos do FBSP relata existir estudos que evidenciam a transmissão interdirecional de violência. “Ambientes familiares com violência doméstica com certeza têm efeito sobre a criança, que, em um ciclo perverso, vai se tornar um adulto que vai ter relações perpassadas pela questão da violência. Evidentemente que não é um determinismo, contudo as chances são mais elevadas. A violência doméstica vai influenciar aspectos na vida desse jovem em direção ao envolvimento com dinâmicas criminais e na sua própria formação como cidadão”, observa.

Ele continua: “A unidade familiar monoparental, só com um dos pais, que geralmente é a mãe e que geralmente tem que trabalhar dobrado para conseguir sustentar os filhos, causa um impacto no desenvolvimento social dessas crianças. Isso estava bastante presente nas conclusões do Comitê Cearense pela Prevenção de Homicídios na Adolescência. Estudos qualitativos em São Paulo mostram também que isso é verdade. Então existe sim essa grande associação entre a vulnerabilidade de forma mais ampla e esses aspectos mais específicos da família.”

A educadora social Elisângela Maranhão, coordenadora do Gcasc e do Mães da Saudade, resume por que Peixinhos é atingido por esse quadro de vulnerabilidade. “Peixinhos é um bairro que ainda não avançou em políticas públicas. A gente vê que não tem política de juventude aqui. A violência é grande, o tráfico é bem pesado aqui e esses jovens não têm opção. O governo não tem esse comprometimento real e não tem estratégias de médio e longo prazo para crianças, adolescentes e jovens. O que o governo vem fazendo de 20 anos pra cá são só paliativos, ações que duram seis meses, às vezes um ano, mas e aí?", questiona.

Opinião semelhante a de Elisângela é emitida pelo secretário de Segurança Urbana de Olinda, coronel Pereira Neto. “O bairro tem um histórico de pouca presença dos governos em toda as esferas no que diz respeito a equipamentos públicos, no que diz respeito a qualidade de vida e de ter presença mais próxima da juventude”, alerta. 

Antônio Francisco Pereira Neto é coronel da Reserva Remunerada da Polícia Militar de Pernambuco, já tendo ocupado as funções de chefe de inteligência da PM e comandante geral da instituição em 2015, ficando à frente do cargo máximo da corporação por 11 meses, em um período de elevados índices violentos em Pernambuco. Questionado se defende a perspectiva mais individualista sobre as causas do envolvimento do jovem com a criminalidade ou se acredita se tratar de um problema estrutural, ele diz entender que políticas públicas “fazem com que se reduza muito as condições externas para que o jovem possa se envolver com a criminalidade”. O secretário também diz que a estrutura familiar é muito importante nessa equação. “Muitos pais deixam o menino na escola e não quer saber o que ele está fazendo lá, o que deixou de fazer, se está realmente lá. É preciso que toda sociedade, não só o poder público, mas a comunidade e a família, principalmente, tenham essa percepção de que se eu não cuido dos meus filhos, obviamente o traficante vai adotá-lo.”

Ainda no começo do século, o Ipea apontava: "desigualdade social é a grande causa da violência entre jovens". O estudo "Desigualdade social, violência e jovens no Brasil", de 2004, indicava que a violência não existia por causa da pobreza, mas pela desigualdade de distribuição de renda. O Brasil é o nono país mais desigual do mundo, conforme a organização internacional Oxfam.

Um dos grandes empecilhos no combate à violência é o diálogo entre as muitas organizações que, de alguma forma, estão envolvidas com o tema segurança pública. Quando questionado sobre medidas para a diminuição da morte violenta de jovens, David Marques, do FBSP, começa mencionando a necessidade de falar em aperfeiçoamento institucional e governança. 

De acordo com Marques, 1440 organizações no país têm alguma responsabilidade sobre segurança pública. “É preciso construir ferramentas de articulação entre essas diferentes instituições. Também é preciso um maior protagonismo do Governo Federal no sentido da coordenação, da construção de uma governança, realmente arrumar a casa para que se possa avançar em políticas públicas baseadas em evidências. Tem que se avançar na mudança de paradigma no desenvolvimento das políticas de segurança do ‘eu acho’ para ‘existem evidências que indicam que essa é a melhor forma de ação e não aquela outra’”, sintetiza. 

Outra característica se repete entre as Mães da Saudade: a morte do filho não foi solucionada. A percepção, várias vezes, é que nem sequer houve investigação. Mães não foram ouvidas pela polícia e nem souberam de inquérito. O algoz do jovem fica impune até que seja preso por outro crime ou assassinado. Marques aponta que a segurança pública tem sido pensada de forma muito ostensiva, em detrimento do policiamento investigativo. “Quando a gente fala de repressão qualificada, é que você tenha polícias mais inteligentes, mais legalistas, mais efetivas, para se dar uma resposta mais qualificada e desenvolver urgentemente estratégias de prevenção da violência”, sustenta.

O pesquisador acrescenta a importância da articulação com outros saberes. “Com educação, cultura, lazer’, ele cita, ‘falar sobre sistema socioeducativo, sobre sistema prisional e sobre os egressos desse sistema, falar sobre alternativas que podem ser construídas dentro do território, emprego e renda, discutir a questão da política de drogas, para atualizá-la e modernizá-la em função das discussões que vêm sendo feitas em outros lugares do mundo. A gente ainda tem uma dificuldade e entende a questão da violência como um problema somente de polícia. Ele é de polícia também”, explica.

“É preciso que cada vez mais parlamentares, governadores, prefeitos, presidentes e ministros compreendam que é necessário deixar de fazer as coisas como normalmente são feitas e fazer um esforço maior para executar a intersetorialidade, a articulação de fato, não apenas no papel. Isso implica tirar algumas instituições da sua zona de conforto, isso implica trazer para dentro do paradigma da formulação e da implementação de políticas públicas essa característica da articulação. E isso gera resistência”, acrescenta o pesquisador. 

No início de 2019, o Governo de Pernambuco criou a Secretaria de Políticas de Prevenção à Violência e às Drogas, com o objetivo de executar a lei de prevenção social ao crime e à violência de Pernambuco - sancionada em maio - e promover as políticas sobre drogas e prevenção. A pasta é chefiada por Cloves Benevides, que já passou pelos governos de Minas Gerais e Alagoas e, em Pernambuco, pela Secretaria de Desenvolvimento Social, Criança e Juventude.

Benevides carrega um discurso otimista e empolgado sobre ações que estão para ocorrer em áreas vulneráveis do estado a partir da criação da lei e da secretaria. "Nenhum estado fez a aposta na dimensão de que Pernambuco vem fazendo", ele afirma. O secretário diz saber a dimensão do desafio. "Nossos problemas estruturais históricos do país, de má distribuição de renda, de pouco acesso a direitos, de muita impossibilidade de protagonismo de grupos muito vulneráveis nos remete a uma situação de muita desvantagem nesse enfrentamento", salienta.

Tendo já uma carreira de anos no trabalho de combate às drogas, Cloves não vê na legalização uma saída, mas entende que a política atual de combate precisa ser repensada. "Sou um indivíduo que não consegue ver como viável um processo de legalização amplo, geral e irrestrito. Se perguntar minha posição pessoal, é impossível fazê-la [a legalização] e é inadequada fazê-la. Mas também entendo que a penalização de condutas de consumo é uma hipocrisia e, em alguns aspectos, precisa ser revista”, defende.

Com a utilização de indicadores da área de segurança pública, foram identificados 58 territórios em Pernambuco considerados os mais vulneráveis. Segundo Benevides, está havendo uma articulação entre secretarias para que programas específicos sejam implantados nessas localidades. 

Dos 58 territórios, 12 devem ganhar núcleos de prevenção à violência. Serão espaços que com oficinas de esportes, lazer cultura, formações no campo audiovisual e de outras ciências que dialoguem com jovens vulneráveis desses territórios. O governo também promete implementar nos núcleos o trabalho de mediação de conflitos, presença frequente de defensores públicos e as ações de cidadania, em que diversas secretarias visitarão a localidade com ações de saúde, educação, e de ressignificação dos espaços urbanos, além de equipes da Celpe e Compesa em uma parceria com o Programa das Nações Unidas para os Assentamentos Humanos (ONU Habitat). Mulheres como as Mães da Saudade, vítimas da violência, também devem ser atendidas nas ações da secretaria, por meio de grupos reflexivos.

O Coronel Pereira Neto, secretário de Olinda, também afirma que serão instaladas duas delegacias e um departamento de polícia em Peixinhos. "Já temos uma delegacia, vamos ter mais duas, isso faz com que ocorra uma presença maciça do governo de forma ostensiva no bairro e isso também é uma forma de redução da criminalidade na área e faz com que as pessoas tenham maior sensação de segurança", explica. À frente da Guarda Municipal, ele diz que a equipe tem feito palestras sobre drogas nas escolas de todo município. Em Peixinhos, quatro escolas foram atendidas e 210 alunos participaram.

Esse tipo de abordagem do poder público através de palestras não é bem visto pelo Gcasc, por serem eventos esporádicos. Educadores do grupo também salientam que vários projetos já foram iniciados na região, mas acabam sendo interrompidos.

Na contramão da aplicação das ações propostas por David Marques e diversos estudiosos de segurança pública está também a opinião pública. O corpo assassinado já não choca. É mais um corpo jovem no chão e é isso. Vida que segue. A população pede e comemora a morte de criminosos. A preocupação está na fala da jovem multiplicadora do Mães da Saudade Melissa Santiago, que menciona o quadro assim que questionada sobre o panorama de Peixinhos. “O problema aqui não é só a violência, mas a banalização dela. O fato de existir violência, mas estar todo mundo tão acostumado com ela que está nem aí para nada”, destaca a jovem.

Um estudo do FBSP mostra que quanto maior o nível que a pessoa tem de ser vítima da violência, maior a propensão que ela tem de naturalizar, aceitar ou aderir a determinados enunciados de ordem autoritária. “Enunciados que vão dizer que para você fazer o controle da violência você precisa de mais violência. Se a gente não consegue mudar a chave das políticas públicas, dificilmente a gente vai conseguir convencer essa pessoa de que a gente já sabe que isso não é verdade. Em grande medida, para que você aceite um enunciado como esse, você precisa desumanizar determinados segmentos populacionais os quais você culpa pela situação da violência”, detalha David Marques.

O secretário Cloves Benevides reflete que o elevado número de óbitos crescente na última década contribui para a banalização da morte violenta. "O senso comum é, às vezes, o reflexo de um cansaço da sociedade ou de uma descrença, não necessariamente é aquilo o que as pessoas pensam. Mas há um efeito manada, um efeito que vai levando as pessoas a um pensamento comum e mais fácil, às vezes menos crítico, de que eventuais fenômenos da vida, e são fenômenos da vida, tornam certos segmentos da população irrecuperáveis". Benevides acrescenta: "Para mim, o bandido bom é o bandido que pague sua dívida com a sociedade, se efetivamente o devido processo legal demonstrar que ele tem culpa, e que seja ressocializado. Ponto. Não é natural que a gente trabalhe com essa perspectiva de vingança o tempo inteiro, que entenda que todo adolescente que entra no sistema socioeducativo é um caso perdido e o ideal é que ele morresse, que todo indivíduo egresso do sistema prisional é irrecuperável. Eles também são pais, são filhos, deram contribuição à sociedade antes do eventual ato e nós precisamos trabalhar com a sua recuperação e a perspectiva de reinserção, se não a sociedade é insustentável e insuportável".

 

Além de Peixinhos

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Textos: Jorge Cosme

Fotos e vídeos: Júlio Gomes

Artes: Jorge Cosme e João Lima

Edição de Vídeo: Danillo Campelo

 

 

 

 

 

 

 

Vinícius Barros quer celebrar o Dia da Consciência Negra com abraços. No single Para abraçar quem sou, lançado nesta sexta (20), o artista pernambucano envereda pelo caminho do afeto, abraçando e acolhendo sua negritude e ancestralidade. A data para lançamento da música foi escolhida a dedo e o resultado já pode ser conferido nas plataformas digitais. 

Barros já possui duas obras lançadas:  o EP Universo, de (2015), e o álbum Banzo, de 2017. O artista já. havia se debruçado no tema da negritude neste último. Ali, a temática surgiu como forma de protesto, com letras e percussões altivas, em tom de denúncia. Agora, o músico percorre os caminhos do afeto para exaltar sua raça e sua cor. 

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Para abraçar quem sou é uma composição de Vinícius, com arranjo elaborado de forma coletiva entre Guilherme Eira (guitarra), Lucas Crasto (baixo) e Guigo Nascimento (bateria). O projeto contou ainda com a participação especial de Nego Henrique, percussionista do Cordel do Fogo Encantado e Gabi da Pele Preta, Larissa Lisboa e Lucas Crasto. Além do lançamento, Vinícius também participa, nesta sexta (20), de um show coletivo pela plataforma Ágora Sonora. A apresentação visa celebrar a data com artistas pernambucanos e paraibanos. 


 

Nesta sexta-feira (20) é celebrado o Dia da Consciência Negra. A data é comemorada anualmente no Brasil, colocando em pauta a importância dos movimentos negros na luta contra o racismo e desigualdade social e sinaliza o quanto a discussão e os debates sobre o tema ainda são importantes em nossa sociedade.

Por sua simbologia, a data não é usada somente para comemorar as vitórias já alcançadas, mas também para protestar e discutir a importância da vida negra. O LeiaJá listou algumas músicas de compositores e artistas negros que trazem o debate e a reflexão sobre o racismo e o empoderamento. Confira:

##RECOMENDA##

Bluesman - Baco Exu do Blues

Formation - Beyoncé

Negro é Lindo - Jorge Ben

Refavela - Gilberto Gil

Sucrilhos - Criolo

Bate a Poeira - Karol Conká

Olhos Coloridos - Sandra de Sá

A Carne - Elza Soares

Mississippi Goddam - Nina Simone

Boa Esperança - Emicida

Em 2020, a pauta da sociedade tem sido cada vez mais a luta contra o racismo e o empoderamento negro. Trazer a tona esse debate e reflexões nas redes sociais e mídias tem sido cada vez mais necessário e também vem se mostrando eficiente no combate ao preconceito.

Nesta sexta-feira (20) se celebra o Dia da Consciência Negra, uma data fundamental para você conhecer mais sobre o assunto e fazer uma reflexão sobre a inserção e oportunidades destinadas á população negra em nosso país e no mundo. Pensando nisso, o LeiaJá listou alguns filmes que estão disponíveis na Netflix e que abordam a temática. Confira: 

##RECOMENDA##

MoonLigth - Sob a Luz do Luar

Abordando questões raciais, orientação sexual e criminalidade em sua temática, o longa conta a história de um jovem negro que tenta conquistar seus sonhos, mesmo tendo nascido pobre, negro e gay em um bairro periferico. O filme foi vencedor do Oscar em 2017. 

Bem-Vindo a Marly-Gomont  

Um médico se muda do Congo com a família para uma vila no interior da França e precisa lidar com as dificuldades do local, a rejeição dos moradores e todos os preconceitos de um lugar onde as pessoas nunca viram uma pessoa negra. O filme é baseado em uma história real e vale muito a pena conferir.

Dias Sem Fim

pesar de ter uma história já vista em outras produções, o filme aborda de maneira realista e sem romantização a história de um jovem condenado à prisão perpétua, contado em um drama que, para o espectador, pode ser um choque de realidade. O longo trata sobre violência e criminalidade.

O Menino que Descobriu o Vento 

Se o este filme pudesse ser resumido em uma palavra seria ‘inspirador’. O drama é baseado em uma história real e conta a vida de um jovem, filho de agricultores, que cresceu em um vilarejo em Malauí e busca alternativas para ajudar seu povo. O longa aborda questões sociais, o desmatamento e o avanço industrial.

Os feriados de Corpus Christi (11 de junho) e do Dia da Consciência Negra (20 de novembro) foram antecipados para esta quarta (20) e quinta-feira (21) em São Paulo. A medida foi publicada no Diário Oficial dessa terça-feira (19) por meio do Decreto nº 59.450 com o objetivo de ampliar o índice de isolamento social na cidade. A sexta-feira (22) foi declarada ponto facultativo nas repartições públicas municipais da administração direta, autarquias e fundações.

Por causa dessa antecipação, alguns equipamentos municipais terão o horário de funcionamento alterado de quarta-feira (20) a domingo (24), ou até segunda-feira (25), caso também seja antecipado o feriado estadual pela Revolução Constitucionalista de 1932 (de 9 de julho). Confira abaixo o funcionamento dos serviços municipais:

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CIDADE SOLIDÁRIA

Os postos continuam recebendo doações todos os dias, das 10h às 17h.

ECOPONTOS

As unidades funcionam de segunda a sábado, das 6h às 22h, e aos domingos e feriados, das 6h às 18h.

EDUCAÇÃO

As aulas a distância estarão suspensas durante o feriado (se aprovada a antecipação do feriado estadual pela Revolução Constitucionalista, as aulas retornam na terça-feira, 26). 

PARQUES

Os parques municipais continuam fechados por tempo indeterminado.

A remoção de animais silvestres encontrados pela população pode ser feita pelo atendimento da Guarda Civil Ambiental, acionada pelo telefone 153.

ABASTECIMENTO

Feiras livres funcionam normalmente todos os dias. Mercados municipais vão ter horários diferenciados;

RODÍZIO DE VEÍCULOS

Suspenso de quarta-feira (dia 20) até domingo (dia 24).

TRANSPORTE PÚBLICO

A frota de ônibus diária, entre 20 e 24 de maio, será adequada para garantir o deslocamento dos profissionais de serviços essenciais que não terão interrupções em suas atividades. Dessa forma, permanecerão em circulação 5.991 veículos para atender 1.013 linhas, incluindo as 150 noturnas.

Além disso, o atendimento nos postos de venda em terminais de ônibus e no Expresso Tiradentes, permanecerá das 6h às 22h. Já as lojas Augusta, Metrô Jabaquara e Santana estarão fechadas.

Um dos serviços mais procurados nos postos de atendimento é a recarga do bilhete, que pode ser realizada por meio de aplicativos. A lista com os aplicativos credenciados para a venda de crédito do Bilhete Único está disponível no site http://www.sptrans.com.br/app/. Após a compra dos créditos, recarregue o cartão nas máquinas automáticas ou nos validadores no interior dos coletivos.

Em virtude do fechamento dos postos de atendimento nas subprefeituras, todos os cartões do Bilhete Único Especial PCD com data de validade a partir de 23 de março foram revalidados automaticamente por até 90 dias.

Devido ao fechamento do Posto Central, os usuários devem acessar o link: http://www.sptrans.com.br/atendimento para serem atendidos de forma online.

Excepcionalmente, os idosos podem tirar dúvidas, bloquear o Bilhete Único Especial Idoso (por motivo de perda ou roubo) e até apresentar justificativa após bloqueio do cartão pelo e-mail atendimento.idoso@sptrans.com.br. A SPTrans informa ao passageiro idoso que não haverá atendimento presencial e para qualquer dúvida, envie e-mail.

Mesmo sem o cartão, a pessoa idosa poderá embarcar e desembarcar pela porta dianteira do veículo e apresentar ao operador um documento oficial com foto no momento do desembarque.

ASSISTÊNCIA SOCIAL

Equipamentos de Assistência Social da Rede Direta - SAS, Cras, Creas, Centros POP e NPJ - estarão fechados.

SAÚDE

Hospitais, prontos-socorros, assistências médicas ambulatoriais (AMA) 24h e as Unidades de Pronto Atendimento (UPA), funcionarão o dia todo, de forma ininterrupta, considerando a nova rotina de atendimento nos ambulatórios hospitalares e na rede de atenção básica por causa da pandemia do novo coronavírus, contemplada na Portaria 182/2020.

As unidades básicas de Saúde (UBS), os ambulatórios de especialidades (AE) e a Rede Municipal Especializada (RME) em doenças sexualmente transmissíveis (DST/Aids), que funcionam de segunda a sexta-feira, das 7h às 19h, ficarão abertas durante todo o feriado prolongado.

As AMA/UBS Integradas funcionarão na quarta-feira (20), na quinta  (21), na sexta  (22), no sábado (23) e no domingo (24) com pronto atendimento,na maioria das unidades, das 7h às 22h.

As  unidades AMA 12h, com atendimento de segunda à sábado, inclusive feriados e pontos facultativos, atenderão todos os dias, com aumento de assistência e ampliação de horário para o enfrentamento ao novo coronavírus, das 7h às 22h.

Os centros de Atenção Psicossocial (CAPS), que atendem 24 horas, funcionarão de quarta (20) até sexta (22). No sábado (23) e no domingo (24), apenas com demandas internas.

As AMA Especialidades e os Hospitais Dia, que abrem de segunda-feira a sábado, das 7h às 19h, ficam abertas na quarta-feira (20), quinta-feira (21), sexta (22) e sábado (23).

Todos os agendamentos de consultas, exames e campanha de vacinação estão mantidos.

HOSPITAIS VETERINÁRIOS

Os hospitais veterinários, das zonas norte e leste, ficarão fechados na quarta (20) e na quinta (21). Na sexta (22) funcionarão normalmente.

Todas as medidas foram adotadas para reduzir as aglomerações e diminuir a cadeia de transmissão do novo coronavírus, mantendo o distanciamento social.

O futebol brasileiro registrou mais um caso de racismo, nesta quarta-feira (20), justamente no Dia da Consciência Negra. Em um jogo válido pelo Campeonato Piauiense sub-15, no estádio Albertão, o árbitro Iudiney Silva foi xingado de "negro urubu ladrão" e que deveria "voltar para o lixão".

"Sofri ofensas racistas vindo de um torcedor riverino, infelizmente no Dia da Consciência Negra eu pude viver na pele esse tipo de preconceito, que está muito enraizado na sociedade", disse o juiz, ao site Cidade Verde. Iudiney registrou Boletim de Ocorrência, mas como não havia policiamento no local, o suspeito não foi preso.

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"É um ato revoltante e estaremos adotando as providências", afirmou Robert Bown Carcará, presidente da Federação de Futebol do Piauí, também ao site Cidade Verde.

Nesta quinta-feira (21), um dia depois do Dia da Consciência Negra, o deputado federal Hélio Lopes (PSL-RJ) usou o Twitter para lembrar o comentário racista feito contra ele pelo cantor Marcelo D2, após a vitória do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) no segundo turno das eleições, em outubro de 2018. O parlamentar aproveitou para questionar os internautas se o episódio teria sido crime ou não, que sinalizaram positivamente.

Na ocasião, D2 chamou Hélio de 'negão do Bolsonaro', ressaltou o fato do deputado ser o único homem negro a aparecer ao lado do então candidato eleito no discurso de comemoração e insinuou que ele seria uma espécie de escravo do presidente eleito. Na época, a postura rendeu diversas críticas ao cantor. E Hélio reagiu dizendo que o presidente não era seu "patrão", mas sim um "irmão". 

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Nesta quinta, Hélio republicou a postagem de Marcelo D2 no Twitter e escreveu: "Eu poderia ter POSTADO ontem, deixei para postar hoje, pra mim  todo dia é DIA da CONSCIÊNCIA BRASILEIRA! VALE A PENA VER DE NOVO, vocês lembram desse episódio? Isso foi um CRIME ou NÃO?".

A publicação foi acompanhada das hashtags "#SomosTodosIguais", "#SomosTodosBrasileiros" e "#MinhaCorÉoBrasil".

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