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Com milhares de migrantes que chegam diariamente, a fronteira dos Estados Unidos com o México vive momentos de tensão e emoções marcados pela determinação de quem busca viver o sonho americano sem visto.

Na cidade de Eagle Pass, no estado do Texas, o sol mal nascia no domingo (24), quando dezenas de migrantes já lutavam na água para resgatar um bebê de um ano e sua mãe, que foram atingidos por uma correnteza no meio do caminho.

Os migrantes haviam juntado seus cintos para usá-los como corda, mas a corrente de água os rompeu.

O resgate foi feito pelos próprios migrantes, que se mobilizaram enquanto a pequena Olga chorava e os militares na costa americana observavam.

A onda de aplausos e alívio ao chegarem ao solo logo foi sucedida por um último obstáculo: um emaranhado de arame farpado que as autoridades do Texas reforçam diariamente e que impede a passagem em regiões como esta, que não possuem muros, ao longo dos mais de 3.000 quilômetros de fronteira.

Voltar não é uma opção, então os migrantes seguem o caminho.

Mais abaixo, Yonder Urbina, que salvou Olga, e seu primo, Oskeivys González, encontraram uma parede de contêineres que escalaram para chegar aos EUA.

Enquanto a patrulha da fronteira resgatava o restante do grupo preso na água, outros na orla de Piedras Negras começaram a cruzar até o lado americano da costa.

- "Conseguimos" -

Após os momentos de tensão no rio, onde os agentes comumente intervêm com um barco salva-vidas, centenas de pessoas se reuniram em frente à intimidante parede de arame farpado.

Quando a sensação términa ultrapassou os 40ºC, a patrulha da fronteira precisou cortar parte deste arame para resgatar os migrantes da temperatura insuportável.

"Só queremos pegar nossos filhos e seguir em frente", disse a venezuelana Yusmayra Pirel, de 38 anos.

A maioria dos migrantes estava apenas com a roupa do corpo, além de seus celulares danificados pela travessia, documentos e dados de seus familiares nos EUA.

Ana Hernández pediu água para derramar na cabeça de seu bebê de 10 meses.

"Eles queriam roubar nossos bebês de um supermercado [no México], então corremos", disse ela.

Após o meio-dia, quando mais de 300 pessoas já haviam atravessado, outra mãe com três filhos chegou à costa americana. Seus filhos ficaram feridos ao passarem pelo arame farpado à beira do Rio Grande, mas foram resgatados pela patrulha.

"Graças a Deus conseguimos", disse o venezuelano Leonel Fernández.

Enquanto os militares da Operação Lone Star - lançada pelo governador do Texas, Greg Abbott - cobriam os buracos da grade de arame farpado com fios novos, mais migrantes continuavam a entrar no rio.

"Este é um lugar quente. Hoje foi tenso, mas para nós é mais um dia na fronteira", admitiu um dos agentes.

Embora o setor aéreo venha defendendo fortemente o uso de combustível sustentável de aviação (SAF, na sigla em inglês) como parte importante do processo de descarbonização, executivos de companhias aéreas relatam que não só a oferta do insumo é uma preocupação: segundo eles, ainda há incertezas acerca da disponibilidade, nos próximos anos, de aeronaves capazes de voar 100% SAF.

A avaliação é que, essa alternativa depende principalmente dos fabricantes de motores e aeronaves. Hoje, companhias aéreas já utilizam SAF, com um limite regulatório de 50%. No plano das companhias aéreas está previsto que o combustível represente pelo menos 65% da demanda global das aeronaves até 2050, quando o setor pretende atingir a meta de carbono zero. Atualmente, a representatividade do SAF no consumo global não chega a 2%: a capacidade de produção do insumo é de 100 milhões de litros por ano.

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Para o CEO da Gol, Celso Ferrer, o papel das fabricantes é fundamental para garantir um futuro com aeronaves 100% SAF ou até mesmo com outros combustíveis sustentáveis, como hidrogênio, por exemplo. "O que temos tentado fazer é deixar claro que há demanda e que temos disposição para incentivar a produção em alta escala. O papel das fabricantes é fundamental neste contexto, mas não temos ainda uma visibilidade da vida útil (do motor)", disse durante fórum promovido pela Boeing.

Ele acrescenta que os testes desses motores já vêm sendo feitos e que há uma confiança no mercado que haverá motores testados e seguros para voos 100% SAF. "Todo mundo está presumindo que vamos ter motores com essa tecnologia daqui a alguns anos."

O CEO da Azul, John Rodgerson, aponta que os efeitos de longo prazo do uso integral de SAF nos motores das aeronaves ainda não são totalmente conhecidos. "Temos de ter certeza que qualquer combustível é 100% seguro, uma coisa é fazer testes, mas isso ainda não foi feito no longo prazo."

O executivo diz que, para voar 100% SAF, um motor precisa ser desenvolvido para isso. "O motor tem de ser feito para SAF, e hoje não temos isso, não há uma turbina certificada para esse combustível. O que estamos dispostos a fazer é trabalhar juntos para deixar claro que, quando tiver o motor pronto, vamos demandar."

 

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

A convergência para uma candidatura única na disputa presidencial de 2022 entre os partidos do centro político é uma possibilidade ainda distante. Incertezas e obstáculos deixaram alargada e congestionada a terceira via. A praticamente um ano da definição do próximo presidente da República, pelo menos 11 pré-candidatos se apresentam para a disputa. Entre eles o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, que se filiou ontem ao PSD, e entrou informalmente nessa fila.

Este cenário reflete a movimentação dos presidenciáveis que hoje estão nas primeiras colocações das pesquisas de intenção de voto, a começar pelo próprio presidente Jair Bolsonaro, que trabalha persistentemente por criar condições para a reeleição. Neste ano, Bolsonaro reforçou a agenda de rua com apoiadores - incluindo as motociatas - e, mais recentemente, lançou o Auxílio Brasil, programa social que substituirá o Bolsa Família.

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O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) tem se dedicado a encontros partidários desde que se tornou novamente elegível por decisão do Supremo Tribunal Federal (STF). Com suas condenações na Operação Lava Jato anuladas e seu retorno ao xadrez político, o petista aparece com larga vantagem nas pesquisas, o que obrigou à revisão de estratégias nos campos da direita e da esquerda.

RESPOSTAS

No centro agora congestionado, os candidatos a candidato ao Palácio do Planalto, por sua vez, estão em compasso de espera. Três respostas são consideradas fundamentais para que uma terceira via possa se tornar real: quem vai vencer as prévias tucanas? Sérgio Moro será candidato? Bolsonaro conseguirá estancar sua queda de popularidade e se manter em 2022 como um candidato competitivo?

Da primeira pergunta, ao menos uma definição será dada. Se o escolhido for o governador de São Paulo, João Doria, dificilmente o PSDB aceitará compor uma chapa presidencial que não seja encabeçada pelo partido. Já se o governador gaúcho Eduardo Leite vencer, analistas tratam essa possibilidade como possível e até provável, o que facilitaria o entendimento com outras siglas.

"O resultado dessa disputa definirá os arranjos entre os partidos do centro. Se Leite vencer e aceitar ser vice - o que é, aliás, um anseio de uma ala do partido -, ele abre caminho para que outros nomes façam o mesmo. Doria dificilmente teria a mesma disposição. É nesse sentido que as prévias importam para fora do PSDB", disse a cientista política Lara Mesquita, do Centro de Estudos em Política e Economia do Setor Público (Cepesp) da FGV-SP.

A definição tucana também pode influenciar outra questão ainda em suspenso: a participação do ex-juiz e ex-ministro Sérgio Moro na eleição. Ainda relativamente bem colocado nas pesquisas de intenção de voto, pontuando entre 5% e 10%, de acordo com o cenário, Moro nunca confirmou nem descartou interesse no Planalto. Enquanto deixa a porta aberta para encabeçar uma chapa, o ex-juiz se aproxima de Doria para eventual parceria.

Mesmo que confirme a filiação ao Podemos nos próximos dias, o símbolo máximo da Lava Jato deverá enfrentar uma série de obstáculos para viabilizar uma candidatura presidencial. A começar pela busca de aliados - Moro enfrenta forte resistência no meio político, pois a operação atingiu dezenas de parlamentares que ocupam cadeiras no Congresso.

Para o cientista político Christopher Garman, no entanto, o fator preponderante na definição de uma terceira via com chances de vitória não está nas respostas do PSDB ou de Moro, mas nos índices de popularidade do presidente. "O que falta para o centro ser competitivo é espaço. O presidente precisa se enfraquecer mais para que uma terceira via apareça. Hoje, com a aprovação dele na casa dos 25% a 30%, essas chances são muito baixas. Calculamos que esse patamar precise cair mais dez pontos", afirmou o diretor executivo da Eurasia para as Américas.

Decidido a espremer esse centro e, ao mesmo tempo atrair o eleitorado petista, Bolsonaro aposta suas fichas no Auxílio Brasil, sem levar em conta o ônus econômico que a concessão do benefício pode lhe render, como aumento dos juros e inflação ainda em alta.

Para a economista e colunista do Estadão Ana Carla Abrão, a expectativa de piora na economia pode ajudar na construção de uma candidatura que concentre apoios no centro. "O Brasil sempre reage ao abismo. E estamos à beira dele. Isso, ao mesmo tempo que nos impõe riscos e grandes desafios, favorece o consenso em torno de um nome que se contraponha ao PT e a Bolsonaro. A crise econômica que já chegou e que será agravada pela via populista que o governo agora sinaliza adotar sem pudor, ao mesmo tempo que nos impõe um altíssimo custo econômico e social, favorece o surgimento de uma alternativa", disse Ana Carla.

PALANQUE

Líder nas pesquisas, Lula foca no discurso da retomada econômica e social enquanto trabalha para aumentar seu leque de alianças. O petista ensaia uma guinada ao centro para se mostrar viável ao mercado e atrair o mesmo centro democrático.

É nesse cenário que outros nomes tentam se firmar como opção aos eleitores que rechaçam a permanência de Bolsonaro e a volta de Lula. Ciro Gomes (PDT) já disse que não vai retirar seu nome da disputa. Terceiro colocado em 2018, o pedetista tem o aval do partido para se lançar pela quarta vez à Presidência e, aos poucos, vai montando suas estratégias, com jingle, plano de governo e até marqueteiro contratado: João Santana, ex-PT. O discurso e a imagem têm se adaptado, assim como o arco desejado de alianças, que inclui agora até partidos mais à direita, como o DEM e o PSL.

FILA

O ex-ministro da Saúde Luiz Henrique Mandetta (DEM) e o apresentador de TV José Luiz Datena (PSL) são alguns dos nomes com quem Ciro tem conversado para formar uma chapa. Ainda pontuando nas pesquisas, Mandetta já declarou aceitar ser vice, mas, como Datena, aguarda os rumos que seu partido vai tomar com a fusão com o PSL no novo União Brasil.

À exceção de Ciro, Bolsonaro, Lula e dos tucanos Doria, Leite e Artur Virgílio (também inscrito nas prévias, mas sem chances reais), o desejo de concorrer à Presidência é projeto embrionário para os demais nomes.

Pacheco foi lançado ontem em cerimônia repleta de simbolismo planejada pelo criador e presidente nacional do PSD, Gilberto Kassab. O ato de filiação se deu em Brasília, no Memorial Juscelino Kubitschek - mineiro, apaziguador e democrático, assim como o ex-prefeito quer "vender" Pacheco.

O presidente do Congresso vem sendo colocado por aliados como um nome para acabar com a divisão do País e inserir as reformas e planos de desenvolvimento no topo da lista de prioridades almejadas pelos mais diversos setores da economia - assim como JK. É advogado, jovem, agregador e de centro.

Menos conhecidos até o momento pelo eleitorado em geral, outros potenciais concorrentes se lançaram ao Planalto: o cientista político Luiz Felipe d'Avila, pelo Novo, e os senadores Alessandro Vieira (Cidadania) e Simone Tebet (MDB), a única mulher até agora a demonstrar intenção de participar da disputa presidencial de 2022.

Independentemente do nome, a professora Lara Mesquita avaliou que as alternativas à polarização precisam estreitar o espaço para candidaturas se quiserem oferecer uma opção concreta para o eleitor no ano que vem. "Hoje, o cenário é de dispersão", afirmou.

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

Armin Laschet, considerado o sucessor de Angela Merkel e até agora favorito para as eleições alemãs de setembro, começou sua campanha nesta quarta-feira (11) com as pesquisas mostrando uma alarmante queda de sua popularidade, o que aumenta a incerteza nas eleições.

O líder conservador iniciou, em um centro de boxe para jovens de Frankfurt, sua maratona de encontros com o olhar voltado para as legislativas de 26 de setembro, após as quais a chanceler Merkel deixará o poder.

No entanto, embora o candidato pretenda enviar, com essa visita, uma mensagem de que está disposto a "lutar", o efeito pode ser limitado.

"Pesquisa surpreendente!", dizia nesta quarta-feira o jornal Bild, o mais lido da Alemanha, sobre uma pesquisa realizada pelo instituto Forsa para a rede RTL, que credita 23% dos votos aos conservadores. Isso significa 13 pontos a menos do que tinham no início do ano, quando há apenas algumas semanas apresentavam cerca de 30% dos sufrágios.

Agora, Laschet está próximo dos ambientalistas (20% nas intenções de voto) e, inclusive, dos socialdemocratas do SPD, que conseguiram subir várias posições nas pesquisas, apesar de estarem em declínio durante muito tempo, alcançando 19% sob a liderança de Olaf Scholz, atual ministro das Finanças, que está usando com sucesso a carta da "concorrência".

- Inundações -

Armin Laschet está sendo castigado pela sua gestão das inundações na Alemanha em julho, já que o político conservador também governa uma das duas regiões mais afetadas pela catástrofe, Renânia do Norte-Vestfália.

As autoridades desse estado estão no centro das atenções há semanas, acusadas de não terem alertado a população a tempo, apesar dos avisos dos serviços de meteorologia.

Em uma visita recente a sua região, Laschet foi inclusive agredido por alguns dos moradores, que se queixaram da lentidão das ajudas públicas quando perderam tudo.

Também ficaram indignados com as imagens em que ele aparecia com uma atitude alegre junto ao chefe de Estado, durante uma visita deste último a sua região para homenagear as dezenas de vítimas das enchentes. Uma gafe que o obrigou a pedir desculpas publicamente e pela qual foi muito criticado.

Laschet "está atolado na lama na campanha eleitoral", considerou a revista Der Spiegel, fazendo alusão aos terrenos devastados pelas enchentes.

O candidato também tem dificuldades em gerar unanimidade em seu próprio lado, que o elegeu após primárias muito disputadas contra seu adversário bávaro Markus Söder, muito mais popular nas pesquisas de opinião.

Por último, Laschet também foi acusado de plágio por um livro que publicou há pouco tempo. É acusado de ter usado, sem citar, contribuições de um cientista político, um discurso de um responsável da comunidade judaica e até mesmo artigos da Wikipedia.

- Disputa aberta -

Até agora, sua rival ambientalista, Annalena Baerbock, era quem havia sido afetada por esses tipos de acusações. Estas, somadas a outras falhas e a um início de campanha fraco, provocaram uma queda dos Verdes nas pesquisas, apesar de na primavera (boreal) terem liderado as intenções de voto.

Faltam apenas seis semanas para as legislativas e o giro que a situação tomou faz com que a posição do candidato de direita seja a mais incerta.

Os conservadores de Merkel, apesar de estarem na liderança, estão imersos em uma espiral negativa e nada garante que poderão conservar a chancelaria.

Diante deste panorama, os socialdemocratas esfregam suas mãos.

"A disputa está aberta", proclamou nesta quarta-feira um líder do SPD, Lars Klingbeil. "Baerbock comete graves erros, Armin Laschet comete graves erros e as pessoas se perguntam quem tem a seriedade necessária para dirigir o país. É neste ponto que queremos convencer" o eleitorado, acrescentou.

Independente do que acontecer, a formação de uma coalizão governamental após as eleições já se apresenta como um autêntico quebra-cabeça, com várias combinações possíveis, na ausência de um partido que fique muito à frente dos outros.

População tem sofrido desgaste emocional diante dos resquícios da pandemia. Cenário é preocupante, mas pode ser combatido. Foto: Nathan Santos/LeiaJáImagens

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Dedos entrelaçados em sinal de oração, mãos aos céus como forma de agradecimento, rezas ante o mar e uma sintonia de esperança celebravam o novo ano. Sob fogos brilhosos e respingos de champanhe, 2020 chegou. Fotografei abraços e presenciei dizeres otimistas para o ciclo que começara. Tomado pela atmosfera comemorativa do réveillon, não imaginaria naquele momento eufórico que, meses depois, vivenciaríamos o início da mais crítica e enlutada crise de saúde dos últimos tempos. Os mesmos amigos e familiares que, com os pés na areia da praia festejavam o ano novo, hoje pedem às suas crenças que o período corrente leve consigo doença, medo, luto, mazelas, intolerâncias, desemprego, corrupção, entre outros males. O novo coronavírus, literalmente, atormentou o ano novo.

Não tão longe do litoral, *José Silva, 35 anos, reflete em seu apartamento - uma espécie de refúgio ante o cenário desolador da pandemia de Covid-19 -. Em isolamento social – séria e correta medida indicada pelos órgãos competentes de saúde para combater a proliferação da doença -, da janela do edifício ele observa as ruas situadas no coração do Recife, uma das capitais fortemente atingidas pelo novo coronavírus. Praticamente não há pessoas no local, antes de intensa movimentação. *José observa. Analisa. Questiona sua própria mente: “por que isso está acontecendo”?. Também rememora momentos em família, ao sentir falta dos abraços, do calor carinhoso característico da mãe idosa. São meses sem vê-la, sem tocá-la; tudo por amor a ela.

*José observa. Reflete. Agitada, sua mente não cansa, não para. Ao direcionar novamente sua atenção às ruas vazias, paralelamente sente um vazio de incertezas quanto ao seu futuro e das pessoas que ama.

*José viu, repentinamente, sua rotina tomar uma proporção antes inimaginável. Obrigatoriamente e de maneira consciente, afastou-se dos amigos, da família e do local de trabalho. Na mídia, alimentou-se de informações a respeito da problemática e complexa Covid-19, cujo rastro de estrago e morte marca países do mundo todo. *José acompanha, diariamente, as contagens de casos e óbitos, além dos efeitos oriundos da pandemia, que reverberam, além da saúde, na educação e economia de um país desigual, socialmente falando, desde os primórdios. Para *José, a pandemia potencializou os diversos problemas sociais e políticos que acometem o povo brasileiro, assim como instaurou desconfortos mentais.

A mente de *José não pausa. Todos os dias, durante a pandemia, é tomada por uma tempestade de pensamentos; seu corpo já sente os efeitos da ansiedade. Coração e mente acelerados, enquanto as noites não mais servem como um momento reparador, uma vez que, em várias ocasiões, o sono não vem. “Fiquei bastante tenso quando a quarentena, no início de março, começou a se estender. Diversos sentimentos de impotência brotaram em mim. Estou há quase seis meses sem ver minha família, e todo o meu pensamento vai para cada um que está distante de mim. Apesar de conversas por chamadas de vídeo, o contato físico faz falta. Não aguento mais ficar isolado por tanto tempo em casa, longe de quem eu gosto. Minha saúde mental está indo embora”, desabafa.

O medo cerca *José. Ele teme, por exemplo, perder pessoas queridas. Teme, ainda, que a crise econômica acarrete demissões. “É no silêncio da noite que a minha mente projeta um turbilhão de dúvidas e medos. Não sei como mudar a rota do meu pensamento para que eu sinta um certo alívio, de fato, de que as coisas irão realmente melhorar. Meus questionamentos estão sempre relacionados ao meu lado financeiro. Acho que, desde o início da pandemia, sinto instabilidade profissional. Não vejo com entusiasmo a capacidade que eu tenho de desenvolver o meu trabalho”, descreve ele.

É perceptível como *José trava uma luta emocional na qual é difícil desenvolver soluções imediatas. Talvez isso se dê pelo fato de que ele, sozinho, não detém o controle do atual cenário, pois, em suas mãos, não estão as soluções que possam, de uma vez por todas, colocar fim aos resquícios da pandemia em seu cotidiano. Nesse contexto, *José não consegue cessar os próprios medos e nem planejar o próprio futuro.

“Só espero que esse caminho de incertezas e de negatividade que estamos trilhando não deixe marcas profundas na alma, ao ponto de lembrarmos futuramente de tudo isso que estamos presenciando com tristeza e amargor. Me preocupa bastante ver que estou desacreditando a cada dia que se passa do meu potencial, da minha entrega, da garra que um dia eu lutei intensamente para conquistar o meu lugar. Ainda não passou pela minha cabeça buscar apoio psicológico para me dar um norte em meio a esse caos instalado pela pandemia. Não faço a mínima ideia se tenho a capacidade de sair desse mar de consternação sozinho”, diz *José.

*José Silva – nome fictício. Personagem preferiu preservar a sua identidade.

Doença pandêmica, mente em perigo

Mais de 23 milhões de casos confirmados no mundo. Quase 816 mil mortes. Assustadores, os dados globais da pandemia do novo coronavírus, informados pela Organização Mundial da Saúde (OMS) em seu mais recente balanço, expõem quão crítico é o cenário. Em 30 de janeiro de 2020, a OMS declarou que o surto da Covid-19 constitui uma Emergência de Saúde Pública Internacional, patamar de alerta mais alto da instituição. Localmente, de acordo com o consórcio de veículos de imprensa baseado nas informações das secretarias estaduais de Saúde, o Brasil registra mais de 3,7 milhões de pessoas diagnosticadas com o vírus e o número de óbitos passa de 117 mil. Além desse panorama, existem comprovações de que a pandemia tem bombardeado suas consequências na condição mental da população.

Em comunicados oficiais, a OMS já alerta que a pandemia da Covid-19 tem, de fato, forte impacto na saúde mental das pessoas. A entidade demonstra preocupação e orienta os países a tomarem medidas necessárias para ajudar suas nações.

À frente da Organização Mundial da Saúde, Tedros Adhanom explica que os efeitos econômicos e sociais da pandemia, da forma acelerada como se expandem e causam estragos, tendem a aumentar casos prejudiciais à saúde mental dos indivíduos. Depressão, ansiedade e transtornos mentais por uso de substâncias são alguns dos problemas citados pelo diretor-geral da OMS.

Tedros Adhanom, diretor-geral da OMS, pede atenção às questões relacionadas à saúde mental. Foto: OMS

Antes mesmo da pandemia, os números de transtornos mentais despertavam preocupação na Organização Mundial da Saúde. De acordo com a entidade, foram registrados 322 milhões de casos de transtorno depressivo em todo o mundo, bem como 264 milhões de pessoas eram acometidas por transtorno de ansiedade. Ainda sobre o período pré-pandemia, o estudo aponta que, no Brasil, 9,3% da população sofria distúrbios relacionados à ansiedade, correspondendo a um quantitativo de 18.657.943 cidadãos.

Se antes da Covid-19 a sociedade já ansiava aportes em relação à saúde mental, agora, mais do que nunca, segundos os especialistas, há a necessidade de cuidarmos com mais afinco de nossas mentes. Os resquícios pandêmicos são, metaforicamente, como uma imensa bola de neve que vai agregando problemas e mazelas, ao ponto de atingir a mente da população. De acordo com a psiquiatra Fátima Vasconcelos, integrante da Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP), mortes, luto, desemprego, crise econômica, risco de contágio, incertezas sobre a vida são alguns dos fatos pandêmicos que impulsionam dores emocionais. “Todos esses problemas juntos podem criar um quadro de ansiedade e depressão muito grande. Algumas dessas pessoas, tanto pela ansiedade quanto pela depressão, podem aumentar o consumo de substâncias lícitas e ilícitas. A gente tem também, além da depressão, ansiedade e do transtorno do estresse pós-traumático, o aumento do consumo de drogas, tanto álcool, quanto maconha e cocaína. Muitas crises já vinham acontecendo e já comprometiam a qualidade de vida da população”, explica a médica psiquiatra.

Dados e indícios preocupam

De acordo com a Organização Pan-Americana da Saúde (Opas), instituição vinculada à OMS, estão sendo levantados dados globais que ratificam os indícios de aumentos de ansiedade, depressão, entre outros males psíquicos, em virtude do novo coronavírus, bem como instituições passaram a traçar estratégias preventivas. Em maio deste ano, por exemplo, o secretário-geral da Organização das Nações Unidas (ONU), António Guterres, lançou um relatório sobre políticas públicas para a saúde mental com uma série de orientações aos governantes. “Luto pela perda de entes queridos. Choque com a perda de empregos. Isolamento e restrições à circulação. Dinâmicas familiares difíceis. Incerteza e medo do futuro. Problemas de saúde mental, incluindo depressão e ansiedade são algumas das maiores causas de miséria no nosso mundo”, alertou Guterres. “À medida que nos recuperamos da pandemia, precisamos transferir mais serviços de saúde mental para a comunidade e garantir que a saúde mental seja incluída na cobertura universal de saúde. Apelo aos governos, à sociedade civil, às autoridades de saúde e a outros que se reúnam com urgência para abordar a dimensão da saúde mental desta pandemia”, acrescentou o secretário-geral da ONU, conforme informações do site da Organização.

O relatório das Nações Unidas destaca, inicialmente, que embora a crise da Covid-19 seja, a priori, de saúde física, ela propagará sementes de uma grande crise de saúde mental, caso ações preventivas não sejam realizadas. O documento aponta que boa saúde mental é “fundamental” para o funcionamento da sociedade, devendo também ser pauta de cada país durante o enfrentamento ao novo coronavírus. Conforme o relatório, pesquisas realizadas em 2020 revelam alta prevalência de sofrimento na população durante a pandemia de Covid-19, como na China, em que 35% da população está angustiada. Nos Estados Unidos esse índice de angústia sobe para 45%, enquanto no Irã o percentual é ainda mais alarmante: 60%.

Ao analisarmos o cenário brasileiro, fica ainda mais evidente a necessidade de o País intensificar, prontamente, um combate dedicado aos problemas oriundos da pandemia que reverberam na saúde mental. Uma pesquisa realizada pelo Instituto Ipsos revelou que quatro em cada dez brasileiros sofrem sintomas de ansiedade como consequência da pandemia. Segundo o estudo, as mulheres são mais afetadas, representando 49% dos casos, enquanto o percentual dos homens é de 33%. O levantamento aponta que o índice de 41% coloca o Brasil na primeira posição entre os países mais ansiosos em decorrência do novo coronavírus. “A gente diz que o Brasil é um país feliz e não é. Na verdade, é um país que tem muita desigualdade, muita gente vivendo em condições grandes de pobreza, o que cria um quadro de ansiedade e depressão muito grande”, acrescenta a psiquiatra Fátima Vasconcelos.

 

Arte: João de Lima/LeiaJáImagens

Aliado fundamental do bem-estar, o sono, antes reparador, perdeu efeito para muitas pessoas. A pesquisa do Instituto Ipsos indica que, de dia, a preocupação é com a utilização segura de máscaras e com a limpeza correta das mãos e objetos, enquanto ao anoitecer, a luta de muitos brasileiros é contra a insônia. Segundo o levantamento, 26% da população nacional relatou dificuldades para dormir na pandemia; as mulheres são as mais afetadas, apontou a pesquisa. De novo, o Brasil aparece nas primeiras posições, quando analisamos os efeitos da falta de sono entre os países: no topo da tabela está o México, com 38% da população afetada, e em segundo lugar está o Brasil, com o percentual de 26%; em terceiro estão a África do Sul e a Espanha, ambos com 25% dos seus povos atingidos pela insônia. Em contraponto, as nações menos afetas foram Japão (6%), Coreia do Sul (10%) e Austrália (12%).

Ainda de acordo com o estudo do Instituto Ipsos, um em cada dez entrevistados no Brasil disse estar enfrentando sintomas depressivos em decorrência da pandemia do novo coronavírus. Fátima Vasconcelos reitera que existe uma relação muito clara com a disseminação dos sintomas e as mazelas pandêmicas. “Na pandemia, nós já temos mais de 100 mil pessoas mortas no Brasil. Claro que tivemos índices de recuperação, mas como ficaram os familiares das pessoas que já faleceram? E mais: há o risco de mais pessoas falecerem. Algumas se internaram para o tratamento da Covid-19 e se recuperaram, mas se recuperaram com um grau de sofrimento muito grande. Existem mães que perderam filhos e mães que tiveram filhos e esperaram um mês para vê-los. Depois da pandemia, todo mundo de alguma forma foi atingido”, comenta a psiquiatra.

Já no recorte das nações em que a população menos sente os sintomas de depressão, a pesquisa mostra que chineses (4%), japoneses e franceses (5%), e por fim os alemães (8%), são os povos menos deprimidos. Ainda segundo o Instituto Ipsos, a pesquisa aponta que, no Brasil, apenas 22% dos entrevistados disseram que não foram impactados por nenhum dos problemas identificados no estudo.

O próprio Ministério da Saúde brasileiro oficializou, publicamente, sua preocupação com a piora dos índices de problemas emocionais atribuídos aos efeitos da pandemia. A pasta realizou a “Pesquisa de Vigilância de Fatores de Risco e Proteção para Doenças Crônicas por Inquérito Telefônico COVID-19 (Vigitel)” e apresentou, no fim de maio, seus resultados, entre eles os oriundos da saúde mental da população. Segundo o Ministério da Saúde, mais de 2 mil pessoas foram ouvidas neste estudo. Confira, a seguir, os problemas relacionados à saúde mental que incomodaram os cidadãos entrevistados no levantamento e seus respectivos percentuais das pessoas afetadas:

Após os resultados oriundos da Vigitel, o diretor do Departamento de Análise em Saúde e Vigilância em Doenças Não Transmissíveis do Ministério da Saúde, Eduardo Macário, reforçou a necessidade de o Brasil oferecer atenção especial às questões de ordem mental, segundo ele, em alguns momentos colocadas de “lado”. Para o diretor, “eventos relacionados à saúde mental muitas vezes são colocados de lado numa situação como a que estamos vivendo”. Ele complementa: “Mas é fundamental serem monitorados e acompanhados”.

Cresce o número de atendimentos psiquiátricos durante a pandemia

Pesquisa da Associação Brasileira de Psiquiatria, a ABP, realizada em maio deste ano, identificou que, entre seus médicos associados, 47,9% dos entrevistados notaram aumento em seus atendimentos após o início da propagação do novo coronavírus. Levando em consideração esse grupo, o levantamento revelou um crescimento de até 25% nos atendimentos, quando comparados ao período anterior à pandemia para cerca de um terço dos participantes.

Um dos objetivos do trabalho estatístico da ABP foi identificar os atendimentos a novos pacientes. De acordo com a Associação, quase 68% dos psiquiatras entrevistados receberam pacientes novos após o começo da pandemia; são pessoas que nunca apresentaram sintomas psiquiátricos anteriormente. A apuração do estudo informa também que 69,3% dos médicos disseram que receberam pessoas que já haviam tido alta médica, porém, sofreram o reaparecimento de seus sintomas mentais; esses pacientes voltaram aos consultórios ou realizaram novos contatos para atendimentos. Ao todo, médicos de 23 estados, além do Distrito Federal, participaram da avaliação.

Arte: João de Lima/LeiaJáImagens

O levantamento da ABP, no que diz respeito aos médicos que não notaram aumento nos atendimentos, identificou um cenário contrário ao mencionado anteriormente: queda na quantidade de demandas. Esse decréscimo, no entanto, também pode ser entendido como uma consequência da proliferação do novo coronavírus, uma vez que entre os principais motivos revelados sobre a queda, está a interrupção do tratamento porque o paciente sente medo de sair de casa e ser contaminado pela Covid-19. Diminuíram, claramente, atendimentos às pessoas do grupo de risco, tais como idosos e brasileiros afetados por comorbidades, bem como foram empecilhos para os acolhimentos presenciais as restrições de circulação determinadas pelo poder público em algumas cidades.

"Essa pesquisa identificou dois cenários preocupantes como consequência de uma única possibilidade. O aumento dos atendimentos foi motivado, em sua maioria, pelo agravamento dos transtornos ou desenvolvimento de novas patologias psiquiátricas devido ao medo da Covid-19. Entretanto, a redução dos atendimentos àqueles que assim identificaram também se deve ao medo da contaminação e às estratégias para evitar o contágio", avalia o presidente da Associação Brasileira de Psiquiatria, Antônio Geraldo da Silva, conforme informações da assessoria de imprensa da entidade.

De acordo com os especialistas, a quebra da rotina também é um fator que pode potenciar desgastes emocionais na sociedade. Adaptar-se à uma nova realidade de trabalho, como nos casos do home office e das restrições impostas pelo isolamento social, é difícil e cria desafios. “Quando saímos de nossa homeostase, ou seja, o nosso modo usual de funcionamento, cognitivo, comportamental e emocional, temos que usar nossos mais nobres recursos para adaptação. É nesse sentido que muitas pessoas, ao não conseguirem fazer esse ajuste, adoecem e necessitam de atendimento especializado. É de se supor que, num momento de grande mudança e necessidade de adaptação, sintomas de ansiedade, depressão e relacionados a trauma aumentem e precisem de uma abordagem imediata", acrescenta o presidente da ABP ao site da instituição.

Sentimentos revelados

Um levantamento do Instituto de Pesquisas UNINASSAU, entidade vinculada ao Centro Universitário Maurício de Nassau, reuniu informações acerca dos efeitos do novo coronavírus na rotina de moradores do Recife. Um dos pontos abordados na capital pernambucana analisou a relação da Covid-19 com a saúde mental dos populares.

Segundo o Instituto, a pesquisa teve como objetivo “investigar a opinião da população residente na área de abrangência em relação à pandemia do novo coronavírus”. O universo do estudo corresponde a eleitores com 18 anos ou mais de idade, cujo grau de instrução vai do ensino fundamental incompleto ao nível superior concluído, entre outras características. No total, foram realizadas 628 entrevistas, no período de 11 a 14 de junho de 2020

Ao questionar os entrevistados sobre questões ligadas à saúde mental em meio à pandemia, a pesquisa reuniu vários sentimentos. As revelações expressaram incertezas quanto ao futuro, medos, angústias, entre outros declínios emocionais demonstrados pelos cidadãos. Acompanhe informações apuradas pela pesquisa no vídeo a seguir. Também registramos o comentário da psiquiatra Catarina Moraes, médica associada à Sociedade Pernambucana de Psiquiatria, acerca dos efeitos pandêmicos nas questões psicológicas.

Indicativos ou transtornos em vítimas da Covid-19

Pesquisadores e profissionais da saúde já admitem que pessoas acometidas pelo novo coronavírus podem desenvolver transtornos mentais e até problemas neurológicos. Um estudo da Universidade Oxford, da Inglaterra, publicado no dia 16 de agosto, revelou que uma em cada 16 vítimas da Covid-19 desenvolveu alguma espécie de transtorno mental no período de três meses após a doença. Segundo a pesquisa, o risco é duas vezes maior para as pessoas que necessitaram de hospitalização por causa dos efeitos do vírus.

A pesquisa da Universidade de Oxford avaliou mais de 60 mil pessoas que apresentaram recuperação após o diagnóstico do vírus pandêmico, bem como o estudo científico identificou que indivíduos que já apresentam doença mental têm um risco maior de serem acometidos pela Covid-19. Nas avalições, foram realizadas comparações com o surgimento de transtornos durante o tratamento de outras enfermidades, entre elas infecções respiratórias e de pele, pedra na vesícula e nos rins, fraturas consideradas graves e influenza.

O estudo da universidade inglesa somou seus resultados aos de outras pesquisas que também provaram relação entre transtornos mentais e o novo coronavírus. Cientistas ainda apontam que, mesmo sendo uma doença nova, cujo vírus acomete pessoas de faixas etárias diferentes, a Covid-19 pode castigar o cérebro e o sistema vascular, além do coração, pulmões, intestino e os rins.

Em outra conclusão científica, pesquisadores da University College London (UCL), de Londres, publicaram um artigo, em julho deste ano, em que mostra uma análise de 43 pessoas vitimadas pelo novo coronavírus. Segundo o artigo, os pacientes apresentaram complicações neurológicas, tais como psicose, delírio, tremores e até danos ao cérebro, ocasionando derrame.

A comunidade científica brasileira também tem desenvolvido importantes estudos acerca da relação da pandemia com a sanidade mental da população. A Universidade de Fortaleza (Unifor), por exemplo, realizou uma pesquisa que tem como principal questionamento “Quais os impactos psicossociais que a pandemia do novo coronavírus tem causado na saúde mental do brasileiro?”. O trabalho foi financiado pela Fundação Edson Queiroz, por meio da Diretoria de Pesquisa, Desenvolvimento e Inovação (DPDI).

De acordo com a Unifor, a pesquisa revelou que os piores índices de saúde mental aconteceram com pessoas que já foram diagnosticadas com a Covid-19, além das que integram o grupo de risco, residem com pessoas desse grupo ou concordam com o isolamento social indicado pelos órgãos competentes. O mesmo estudo mostrou também que apresentaram maiores indícios de adoecimento as pessoas em maior nível de adesão aos protocolos de combate à pandemia.

Em entrevista ao LeiaJá, a coordenadora do projeto de pesquisa e professora do Programa de Pós-Graduação em Psicologia (PPGP) da Universidade de Fortaleza, Cynthia Melo, explanou os resultados dos principais pontos do estudo. Uma das constatações indica que quem teve Covid-19 apresentou maior nível de ansiedade. Para a docente, isso se explica pelo fato de que as vítimas vivenciaram um risco alto de óbito. “É uma possibilidade de morte muito maior do que quem não teve a doença. Essa pessoa sabe da gravidade da doença mais de perto do que os outros”, esclarece.

Cynthia Melo é coordenadora do estudo desenvolvido pela Universidade de Fortaleza. Foto: Cortesia

O estudo da Unifor indicou, ainda, que os entrevistados que moram com pessoas do grupo de risco apresentaram mais indícios de adoecimento mental. De acordo com a coordenadora da pesquisa, uma das hipóteses para esse resultado é que os indivíduos temem sair de casa com receio de se contaminar com o novo coronavírus e, se saírem, colocarão em risco todas as pessoas com as quais moram. Há, portanto, um clima de tensão.

Em outro recorte do levantamento, foi identificado que quem concorda com o isolamento social apresenta indicadores de pior saúde mental. No entanto, a professora Cynthia alerta veemente que o isolamento é uma estratégia fundamental no combate à Covid-19, devendo, portanto, ser respeitado e praticado conforme as orientações da Organização Mundial da Saúde.

“O isolamento e o distanciamento social, apesar de necessários - devendo ser respeitados para a contenção da doença -, podem causar estresse. Por esses e outros fatos, a pandemia nos convoca a cuidados com a saúde mental. Além de ser um problema de crise epidemiológica com alto nível de contágio e de mortalidade, ela também é uma crise do ponto de vista psicológico. Tudo que envolve a doença, sensação de vulnerabilidade, risco de morte, incertezas sobre o futuro e isolamento, é adoecedor”, explica a professora.

A docente continua sua fala orientando a população sobre ações que contribuem para o bem-estar social durante o isolamento: “Para a população, existe a necessidade de se cuidar, de se prevenir, organizando os espaços da casa; tem o lugar certo para cada coisa, organizando a rotina, melhorando a ambientação do lar e fazendo uso de espaços verdes. Tenha hábitos que fazem bem, tais como aula de exercício físico ou assistindo uma live de um cantor que você gosta, ou conversando com os amigos em vídeo conferência. Pode estudar, ver um filme. Conseguimos manter essas práticas de forma adaptada. Além disso, algumas cidades abriram os espaços públicos; existem espaços verdes que são muito bons para serem usados, com liberdade e sem colocar os outros em risco, respeitando o distanciamento”.

No total, 2.705 brasileiros participaram da pesquisa da Universidade de Fortaleza. Além de Cynthia Melo, outros professores – doutores - trabalharam no levantamento e na análise das informações reveladas pelos entrevistados, bem como contribuíram para o projeto alunos de mestrado e doutorado do Programa de Pós-Graduação em Psicologia da Unifor. A coordenadora ressalta que o estudo apresenta indicadores de depressão, ansiedade e estresse, mas não crava que, de fato, as pessoas ouvidas sofrem literalmente esses transtornos mentais, porque, para a conclusão dos diagnósticos, devem ser feitas avaliações contínuas com instrumentos psicossociais.

A história e o anseio humano pelo bem-estar mental

Somos movidos a realizações. Buscamos - às vezes desenfreadamente - conquistas pessoais e profissionais, assim como bem-estar físico e mental. Nesse processo, porém, as pessoas podem encarar de diferentes formas êxitos, frustrações e problemas. Historicamente, a humanidade viveu desafios, transformações sociais, conflitos e fatos – acontecimentos históricos com impactos na condição mental dos indivíduos -, ao mesmo tempo em que caminha ao encontro da paz física e emocional.

A Organização Mundial da Saúde define saúde mental como um “estado de bem-estar em que o indivíduo percebe suas próprias habilidades, pode lidar com os estresses normais da vida, pode funcionar de forma produtiva e frutífera e é capaz de dar uma contribuição para sua comunidade”.

“O ser humano sempre está, de certa forma, em busca de uma felicidade, de bem-estar, de ter satisfação na vida. Isso acontece desde a primeira infância, depois na pré-adolescência, adolescência, vida adulta e entre os idosos. O ser humano tem algo dentro de si que vai buscando sentindo na vida, seja na escolha profissional ou mesmo na criança, por exemplo, quando ela faz a escolha de jogos que dão prazer. É a relação com a vida que tenha significado. Quando isso não acontece, os problemas aparecem. Problemas emocionais, sofrimentos, isso faz parte da vida humana, só que quando esses sofrimentos acabam por incapacitar as pessoas de trabalhar, estudar, de conviver em grupo, acabam se tornando transtornos, muitos deles de base genética, com componente hereditário muito forte”, comenta o professor da Universidade de São Paulo (USP) e coordenador do Instituto de Psicologia da instituição de ensino, Andrés Eduardo Aguirre Antúnez, em entrevista ao LeiaJá.

Andrés Eduardo Aguirre Antúnez, coordenador do Instituto de Psicologia da USP, alerta que problemas emocionais fazem parte da vida humana. Porém, quando começam a incapacitar as pessoas, eles podem virar transtornos mentais. Foto: Cortesia

Na corrida pelo bem-estar mental e físico, há pessoas que sentem a necessidade de expor à sociedade essa condição de realização humana. No entanto, isso não quer dizer que, verdadeiramente, elas vivenciam esse bem-estar. “Vários sociólogos falam que a gente vive em uma sociedade acelerada, cansada, ou a sociedade dos espetáculos. A gente tem hoje um ritmo acelerado de cotidiano. Você é acordado por um despertador, pula da cama, se arruma e vai trabalhar. E depois volta, corre, vem e vai. Você não tem tempo para o outro, não tem tempo para pensar no seu dia, no seu cotidiano, na sua vida. Ao mesmo tempo, a gente vive na sociedade dos espetáculos. É essa sociedade em que eu posso até não viver bem, mas eu tenho que mostrar, aparecer que estou bem. No Orkut, Facebook e Instagram. Às vezes, a gente está em um restaurante, e você vê um casal, amigos, cada um com o seu celular e não vivem o momento. Às vezes nem estou curtindo o restaurante, mas já estou ali fazendo uma foto para mostrar que estou no restaurante, mesmo que fisicamente apenas. É a sociedade que mostra que está tudo perfeito e as relações são muito descartáveis. Como dizem os jovens nas relações amorosas, a fila não anda, ela voa. As coisas vão girando. E no meio da Covid-19, essa sociedade se viu obrigada a parar. Pela primeira vez, nós fomos obrigados a parar”, reflete Cynthia Melo, professora do Programa de Pós-Graduação em Psicologia da Universidade de Fortaleza.

O filósofo coreano Byung-chul Han defende a ideia de que a sociedade contemporânea é marcada por um excesso de positividade. Para o estudioso, essa característica pode resultar em patologias psicológicas. “O que causa a depressão do esgotamento não é o imperativo de obedecer apenas a si mesmo, mas a pressão de desempenho. O que torna doente, na realidade, não é o excesso de responsabilidade e iniciativa, mas o imperativo do desempenho como um novo mandato da sociedade pós-moderna do trabalho”, defende o filósofo.

O estudioso continua: “Mas em relação à elevação da produtividade não há qualquer ruptura: há apenas continuidade. Alain Ehrenberg localiza a depressão na passagem da sociedade disciplinar para a sociedade de desempenho: 'A carreira da depressão começa no instante em que o modelo disciplinar de controle comportamental, que, autoritária e proibitivamente, estabeleceu seu papel às classes sociais e aos dois gêneros, foi abolido em favor de uma norma que incita cada um à iniciativa pessoal: em que cada um se comprometa a tornar-se ele mesmo. O depressivo não está cheio, no limite, mas está esgotado pelo esforço de ter de ser ele mesmo”. No áudio a seguir, o professor de filosofia e sociologia João Pedro Holanda traz mais detalhes acerca das ideias de Byung-chul Han. Clique na barra cinza:

Nos registros históricos, existem descrições de como o homem debatia questões sobre saúde mental. “Essa discussão sobre saúde mental é anterior à Segunda Guerra Mundial, porque já no final do século 19, começam a chegar discussões sobre isso. Freud já discutia a questão do homem moderno e as questões relativas ao mundo moderno, que têm muito do impacto da Revolução Industrial. Com os efeitos da Primeira Guerra Mundial, aconteceram os famosos traumas de guerra, resultando no aumento dessas discussões. O próprio Freud tratou alguns soldados. Alguns livros são bem emblemáticos sobre isso, como ‘Nada de novo no front’, escrito por Erich Maria Remarque, ex-soldado que vivenciou os conflitos. É um romance de um autor que lutou na guerra, em que ele fala como era o cotidiano no front e como isso impactava os soldados”, explica a professora de história Thais Almeida. “Essas discussões, porém, ganham os espaços públicos a partir da década de 50, após a Segunda Guerra Mundial. Foucault, por exemplo, publica o livro ‘História da Loucura’ em 1961”, complementa a docente.

Para o médico psiquiatra e historiador da Associação Brasileira de Psiquiatria, Walmor Piccinini, cuja atuação na medicina soma 54 anos de experiência, a Segunda Guerra Mundial marcou de maneira emblemática a psiquiatria. “No meu ponto de vista, embora a gente possa traçar vários aspectos filosóficos, a Segunda Guerra Mundial mudou a maneira de se olhar os problemas emocionais e mentais, porque os psiquiatras aprenderam a lidar com os soldados em estado de choque, em estado de crise, e a lidar de uma forma de recuperá-los para eles voltarem ao combate. Durante a guerra, não se fazia mais internamentos em hospitais, o atendimento era feito na linha de frente, e isso mudou a maneira de se ver o doente, porque, até então, o doente mental era recolhido para o asilo e lá ele era isolado. Depois da Segunda Guerra Mundial, surgiram medicamentos”, explica Piccinini.

De acordo com o historiador da ABP, a partir dos anos 90 a depressão passou a ter um crescimento expressivo. “Também a partir dos anos 90, existe um lado bem concreto disso tudo, que é o aumento das licenças médicas para o trabalho por depressão. Nós tivemos um esvaziamento dos hospitais psiquiátricos, a maioria das pessoas foi tratada nas comunidades com antipsicóticos, antidepressivos e ansiolíticos. Isso aconteceu em todo o mundo”, recorda o médico psiquiatra.

Outras pandemias, ao longo da história, também desencadearam efeitos de ordem mental na sociedade. Há mais de dez anos, a proliferação da H1NI deixou sequelas físicas e, consequentemente, emocionais nos acometidos pela doença, segundo pesquisadores da Universidade da Califórnia, nos Estados Unidos. De acordo com o estudo, metade das pessoas diagnosticadas com o vírus teve ansiedade, 25% apresentou depressão e em 40% dos pacientes foi identificado risco de transtorno pós-traumático. Por outro lado, ao analisarem o período após a epidemia de SARS na Ásia, ocorrida em 2003, os estudiosos documentaram um sentimento positivo: 60% dos pacientes passaram a valorizar mais a família, em uma comprovação de que, o isolamento social também pode aproximar as pessoas e fomentar uma atmosfera de solidariedade e união.

Acolhimentos e estratégias em prol da sanidade mental em meio à Covid-19

Sob o risco de uma crise global de ordem mental, instituições públicas e privadas tentam intensificar acolhimentos psicológicos e psiquiátricos durante a pandemia do novo coronavírus. Muitos profissionais realizam atendimentos de forma remota, uma vez que os serviços estão autorizados nesse formato durante a pandemia, em virtude da necessidade de manter o distanciamento social. A Lei 13.989/2020 regulamenta e autoriza a telemedicina nesse período, assim como os respectivos conselhos regionais de psicologia, orientados pelo Conselho Federal da área, permitiram os acolhimentos por meio de comunicação a distância.

Um dos serviços de acolhimentos remotos é desenvolvido em Campina Grande, na Paraíba, por meio do trabalho da Clínica Escola da UNINASSAU – Centro Universitário Maurício de Nassau. Antes mesmo da pandemia, a instituição de ensino oferecia atendimentos psicológicos presenciais de forma gratuita à comunidade acadêmica e ao público externo, porém, após o agravamento da Covid-19 no Brasil e da necessidade de valorizar o distanciamento social, o projeto passou a disponibilizar escutas de forma on-line, mediante a marcação dos interessados por meio da internet. O serviço se manteve sem custo para os usuários.

A psicóloga do serviço de acolhimento da UNINASSAU, Carla Correia, explica que os atendimentos anteriores à pandemia continuam sendo feitos, mas de maneira remota, somados às novas demandas advindas do período pandêmico. “A gente já oferecida os serviços presencialmente. Com a pandemia e diante da preocupação da universidade com a saúde mental dos alunos, colaboradores e da comunidade, sentimos a necessidade de estender o serviço e dar continuidade às escutas de forma on-line. Como o Conselho Federal de Psicologia permite, os psicólogos puderam atender de forma remota. Para isso, é preciso fazer um cadastro no e-Psi, um site do Conselho. Pessoas da Paraíba, Bahia, Pernambuco, Alagoas, entre outros estados, estão sendo atendidas no nosso projeto. O atendimento é realizado por meio de vídeo chamadas”, explana a psicóloga. De abril deste ano até agosto, mais de 160 pessoas foram acolhidas pela iniciativa, apresentando, principalmente, sintomas relacionados à depressão e ansiedade. “A própria pandemia desencadeou muitos sintomas obsessivos compulsivos, como na questão de aferir a temperatura repetidamente, por várias vezes ao dia. Na ansiedade, por exemplo, uma das características é a falta de ar e, em alguns momentos, nessa falta de ar, as pessoas se confundiam com alguns sintomas da Covid-19. Muitas vezes não tinham relação com o vírus e sim era algo relacionado à ansiedade. Notamos intensificação do medo, da insegurança. Tivemos pacientes de todas as faixas etárias, a partir de 18 anos; foi algo bem misto”, acrescenta Carla Correia.

Na visão da psicóloga, o atendimento remoto, diante do cenário difícil imposto pelo novo coronavírus, surge como uma alternativa importante para os acolhimentos dos pacientes. “Foi algo realmente novo para alguns profissionais, visto que o atendimento on-line só se dava apenas em alguma vezes, quando, por exemplo, um paciente viajava. No atendimento remoto, o lugar do paciente e do psicólogo não se altera, visto que é a fala - o que está sendo dito - que é relevante. Diante desse momento de pandemia, o atendimento on-line veio realmente para somar”, opina.

De acordo com o Conselho Federal de Psicologia (CFP), o Brasil tem registrados 375 mil psicólogos. Diante da proliferação do novo coronavírus e consequentemente da necessidade de realização dos atendimentos psicológicos de maneira remota, o site e-Psi – plataforma de cadastro dos profissionais que almejam atender remotamente – registrou um crescimento superior a 800%.

No âmbito do poder público, a Prefeitura de Olinda, na Região Metropolitana do Recife, por exemplo, é uma das gestões municipais que oferecem acolhimento remoto a pessoas com sofrimento mental durante a pandemia, além de encaminhamentos para aportes presenciais quando necessário. No caso de Olinda, a cidade é integrada à Rede de Atenção Psicossocial preconizada pelo Sistema Único de Saúde (SUS), cujo funcionamento ocorria antes mesmo da Covid-19. A partir da pandemia, em março deste ano, foram necessários ajustes na oferta dos serviços, porque com o isolamento social, as escutas precisaram ser feitas em formato remoto, bem como os profissionais da rede municipal previram que com as mudanças bruscas ocasionadas pela propagação do vírus, havia o risco de aumento nos números de casos relacionados à saúde mental entre a população.

Segundo a coordenadora de saúde mental da Secretaria de Saúde da Prefeitura de Olinda, Cíntia Mota, os teleatendimentos foram oferecidos, desde marco, a pessoas que, antes do contexto pandêmico, não apresentavam sintomas de transtornos emocionais. “Nós deixamos disponíveis dez números telefônicos, dos quais dois foram específicos para profissionais de saúde, porque a gente também percebeu um aumento desses profissionais em sofrimento mental, alguns na linha de frente do combate ao coronavírus”, explica a coordenadora. 

Também houve aumento de demanda nos atendimentos presenciais nos três Centros de Atenção Psicossocial (Caps) do município. “O acolhimento individual presencial começou a aumentar muito. Em um Caps que a gente tinha por dia de cinco a dez acolhimentos de porta aberta, chegamos a ter 25 pessoas e um único dia, para que a equipe pudesse dar conta de fazer o primeiro atendimento, acolhimento e orientação. Na população em geral, sintomas de ansiedade estão muito presentes. Sintomas ligados a depressão também aumentaram, assim como as ideações suicidas, que são outras questões ligadas a sofrimento mental”, detalha Cíntia.

De acordo com a Prefeitura de Olinda, cerca de 2 mil intervenções são realizadas por mês em cada Caps da cidade. No que diz respeito especificamente aos teleatendimentos como suporte psicológico durante a pandemia de Covid-19, mais de 600 acolhimentos foram registrados até o momento. No áudio a seguir, em entrevista ao LeiaJá, a coordenadora de saúde mental detalha como são feitas as escutas telefônicas:

Cíntia ainda alerta que os usuários do SUS não devem ter preconceito contra os atendimentos psicossociais, uma vez que, principalmente no atual cenário, qualquer pessoa corre o risco de sofrer desgaste emocional. “A gente previu que isso aconteceria e criamos estratégias para atender a essa população mesmo de forma isolada. Costumo dizer que produzimos em 2020 mais tecnologias de cuidado do que anos atrás. Em saúde mental, ainda existe muito preconceito no acesso a serviços especializados, porque a gente tem o adoecimento mental distante das nossas vidas, como se a gente não estivesse propenso a isso. E a pandemia aproximou muito a população geral ao sofrimento mental. Ou seja, eu posso adoecer porque não estou preparado para todas as dificuldades da vida. Por mais que tenhamos um repertório de estratégias para lidar com as dificuldades, a pandemia apresentou um cenário muito novo, de muita incerteza, que causou muito sofrimento”, comenta a coordenadora de saúde mental de Olinda.

Os teleatendimentos são gratuitos e estão disponíveis de segunda a sexta-feira, das 8h às 17h, mesmo horário de funcionamento dos Caps. Confira os endereços dos Centros de Atenção Psicossocial, além dos números para contatos no teleatendimento.

Recife, cidade-irmã de Olinda, também apostou no teleatendimento psicossocial para tentar diminuir as dores emocionais da população. Por meio da Secretaria de Saúde da capital pernambucana, o serviço foi batizado de “teleacolhimento” e, desde março deste ano, oferece escutas gratuitas via vídeos e telefones a pessoas que estão sentindo impactos na saúde mental. Os agendamentos são realizados por meio da ferramenta Atende em Casa, criada pelo poder público com a finalidade de promover atendimentos iniciais em formato digital, direcionando os usuários para profissionais de saúde que dão orientações em casos suspeitos de Covid-19. Após passar por um questionário, o público é perguntado se precisa de apoio emocional; havendo resposta positiva, é feito o direcionamento ao teleacolhimento.

Segundo a coordenadora do serviço, Angélica Oliveira, mais de 2 mil atendimentos relacionados a sofrimento mental foram realizados até o momento. Além do agendamento para o público geral, existe um e-mail exclusivo para profissionais da rede municipal de saúde do Recife, que estão atuando na linha de frente contra o novo coronavírus.

Angélica Oliveira, coordenadora do teleacolhimento oferecido pela Secretaria de Saúde do Recife. Foto: Nathan Santos/LeiaJáImagens

“O que mais aparecem são ansiedade, depressão e, de junho para cá, começou a surgir muito luto, pessoas sofrendo pela perda de parentes. Há muito medo de pegar a Covid e medo de perder o emprego. Por isso que o apoio é psicossocial, porque existem muitos problemas de ordem financeira”, explica a coordenadora.

O projeto conta com um trabalho multiprofissional, envolvendo 80 servidores municipais, como psicólogos, psiquiatras, assistentes sociais, terapeutas ocupacionais, entre outras funções. A coordenadora do teleacolhimento ressalta que o serviço não oferece consultas e nem receita medicamentos, pois, para isso, são necessárias avaliações presenciais e criteriosas com médicos psiquiatras da rede municipal de saúde ou em hospitais privados. “Por isso que nós chamamos de acolhimento psicossocial”, enfatiza Angélica, complementando que, havendo necessidade, os usuários podem ser encaminhados para os serviços presenciais. “É uma escuta qualificada e, quando necessário, fazemos o encaminhamento com qualidade, fazendo o contato com o serviço; a gente diz como a pessoa vai chegar e passa os contatos. Fazemos toda uma regulação desse cuidado para que quando ele – usuário - chegue no lugar do atendimento presencial, o local já esteja sabendo e o atenda de uma forma benéfica. É um trabalho integrado”, acrescenta Angélica.

Ainda de acordo com a coordenadora do teleacolhimento, os atendimentos específicos aos profissionais de saúde devem ocorrer de maneira continuada. “A gente está com uma demanda, desde junho, regular de profissionais que apresentam todos os tipos de sofrimento, tais como medo de pegar a Covid-19 e porque estão na linha de frente. Esse acompanhamento vai durar até o final da pandemia”, finaliza.

O cidadão que necessita do aporte psicológico, dependendo da situação, pode ser acolhido em mais de uma ligação ou vídeo. Caso apresente sofrimento grave, ele deve, ainda, ser encaminhado a um serviço presencial. O teleacolhimento está disponível de segunda a sexta-feira, das 8h às 17h. Veja endereços dos Caps, indicados a quem precisa de socorro presencial.

No vídeo a seguir, a coordenadora – e psicóloga de formação - do teleacolhimento dá mais detalhes a respeito do serviço, bem como revela dicas sobre como a sociedade pode combater desgastes psicológicos. Também participa da entrevista o assistente social Airles Ribeiro, que divide com Angélica a coordenação do teleatendimento da Prefeitura do Recife. Assista:

Quarta onda – Entre os profissionais de saúde mental, existe um entendimento de que os efeitos da pandemia da Covid-19 desencadearam uma nova “onda”. Miriam Gorender, professora de psiquiatria da Universidade Federal da Bahia (UFBA), detalhada as etapas: “A primeira onda é da doença em si. A segunda seria das complicações trazidas pela doença, como pessoas que ficam com lesões no pulmão, neurológicas e cardiológicas. Você tem ainda uma terceira onda das pessoas que adoecem de enfermidades que vinham sendo tratadas, como diabetes e pressão alta, e que deixam de ser tratadas porque toda a atenção está na Covid-19. Nesse caso, a pessoa fica com medo de ir ao médico, se consultar para continuar o seu tratamento, ou não tem uma UTI. A quarta onda é de doença mental, que deve acompanhar a gente por muitos anos, porque doença mental é crônica”.

Presidente da Associação Brasileira de Psiquiatria, Antônio Geraldo da Silva reitera o alerta e enfatiza a necessidade de ações imediatas. "A quarta onda, que é a onda das doenças mentais, já chegou e não temos mais tempo a perder. Temos que atuar firmemente para minimizar os prejuízos que todos terão deste momento, monitorando a saúde mental da população e o atendimento psiquiátrico”, defende Antônio.

Durante entrevista ao LeiaJá, a psiquiatra Fátima Vasconcelos – também vinculada à ABP – elencou uma série de atitudes que podem ajudar as pessoas, mesmo em casa, a tentar diminuir os impactos emocionais e o agravamento de casos da quarta onda. A médica alerta, porém, que não se trata de uma receita pronta, uma vez que nem todas as atividades são indicadas a todas as pessoas de maneira generalizada, já que cada indivíduo tem suas preferências cotidianas e particularidades. Acompanhe as dicas:

1 – Crie uma rotina: você irá sentir-se mais calmo e no controle de suas emoções; leia livros, veja televisão, filmes, series, documentários, mas evite ficar o tempo todo vendo notícias. É importante se informar, mas, o excesso de informação gera estresse. Ao invés disso, ligue para seus amigos e sua família. Uma rede de suporte social faz toda a diferença. A solidão pode levar a depressão.

No home office, crie uma rotina. Acorde, vista uma roupa confortável e comece seu o trabalho, mas, estabeleça horários. Para se distrair, jogue com crianças e idosos – desde que preservados os protocolos de saúde -, respeitando suas preferências. Um dos aspectos positivos do “fique em casa” foi a maior aproximação das famílias, que estão em home office e podem conviver mais com seus filhos e pais.

2 – Faça atividades físicas: caso não tenha a orientação de um profissional, a pessoa pode optar por realizar exercícios simples, como pular corda, realizar apoios, abdominais, agachamentos e polichinelos. É indicado variar o tipo de treino a cada dia, evitando a monotonia. Este tipo de atividade pode ser realizado tanto por adultos quanto por idosos que não possuam nenhuma doença cardiovascular, respiratória ou nas articulações.

3 – Mantenha uma boa alimentação: alimentar-se de forma saudável é fundamental para superar essa pandemia. Uma dieta equilibrada evita não apenas o ganho de quilos extras, garante também uma boa imunidade do corpo. Sendo assim, evite refrigerantes, doces e pratos gordurosos. Dê preferência aos alimentos naturais como frutas, verduras, vegetais e cereais e beba bastante água. O ideal mesmo é procurar um nutricionista para montar uma dieta adequada às necessidades do seu corpo. Evite bebidas alcoólicas. Definitivamente, neste momento não abuse de bebidas.

4 – Durma bem: é quase impossível dormir quando se está ansioso ou preocupado. Uma boa ideia para regular o sono é manter-se ativo durante o dia. Quanto mais atividades físicas fizer, mais cansado ficará e melhor será o seu sono e, por consequência, sua saúde.

5 - Tenha uma boa rotina de higiene: se for necessário quebrar o isolamento social, siga estes passos: use máscara quando sair; carregue álcool em gel a 70% para higienizar as mãos na rua; lave bem as mãos quando voltar; retire os sapatos na porta de casa; coloque as roupas usadas para lavar; tome um banho e lave os cabelos. Além disso, higienize tudo que veio do supermercado e mantenha a casa sempre limpa, inclusive maçanetas, puxadores e controles remotos. Lavar as mãos antes de preparar os alimentos sempre foi um hábito básico de higiene, mas é necessário reforçar essa dica em tempos de coronavírus.

Também em entrevista ao LeiaJá, o coordenador do Instituto de Psicologia da USP, Andrés Eduardo Aguirre Antúnez, destacou orientações para a população que corre risco de sofrimento mental. Entre elas está a busca de informações em fontes confiáveis, como as produzidas pelos cientistas das universidades. Para casos graves, o coordenador também exalta o trabalho do CVV - Centro de Valorização da Vida, por meio do telefone 188. Ouças as dicas no áudio a seguir:

O médico psiquiatra Walmor Piccinini compactua da ideia que é importante filtrar informações sobre o novo coronavírus. Receber um fluxo intenso de notícias negativas pode potencializar adoecimento psicológico, segundo o especialista. “As pessoas têm que evitar passar o dia inteiro presas no WhatsApp, na tevê, recebendo informações negativas. É preciso preservar a sanidade. Não se deixar bombardear por informações negativas. Também não adianta imaginar soluções mágicas: a pessoa tem que ter tranquilidade e saber o melhor a fazer no momento. Ficar mais em casa, se for possível, evitar o contato, diminuir essa ansiedade de ir à praia, de ir a um mercado, enfim, a pessoa deve se expor o menos possível tanto psicologicamente e quanto fisicamente. É indicado ouvir uma boa música, brincar com os filhos”, aconselha Piccinini.

A Associação Brasileira de Psiquiatria divulgou, em seu site oficial, uma série de orientações para a população e profissionais de saúde que devem ser compartilhadas durante a pandemia. "Com o intuito de orientar seus associados e a população em geral, a ABP tem publicado informações voltadas aos cuidados em saúde, tanto física quanto mental, direcionadas aos diversos públicos que a acompanham", destaca a ABP. Também no site da instituição, foi publicado um comunicado com o presidente da Associação; confira no vídeo produzido pela entidade:

A Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), umas das instituições mais atuantes no combate à pandemia de Covid-19, por meio do seu Centro de Estudos e Pesquisas em Emergências e Desastres em Saúde (CEPEDES), publicou o documento em que traz recomendações à população. Intitulada “Saúde Mental e Atenção Psicossocial na Pandemia COVID-19”, a publicação explica por que estamos sob o risco de uma carga grande de estresse.

“Durante uma pandemia é esperado que estejamos frequentemente em estado de alerta, preocupados, confusos, estressados e com sensação de falta de controle frente às incertezas do momento. Estima-se, que entre um terço e metade da população exposta a uma epidemia pode vir a sofrer alguma manifestação psicopatológica, caso não seja feita nenhuma intervenção de cuidado específico para as reações e sintomas manifestados. Os fatores que influenciam o impacto psicossocial estão relacionados a magnitude da epidemia e o grau de vulnerabilidade em que a pessoa se encontra no momento”, diz um trecho do documento.

Segundo as orientações da Fiocruz, a sociedade deve seguir ações de cuidado psíquico. São elas:

“Retomar estratégias e ferramentas de cuidado que tenham usado em momentos de crise ou sofrimento e ações que trouxeram sensação de maior estabilidade emocional;

Investir em exercícios e ações que auxiliem na redução do nível de estresse agudo (meditação, leitura, exercícios de respiração, entre outros mecanismos que auxiliem a situar o pensamento no momento presente, bem como estimular a retomada de experiências e habilidades usadas em tempos difíceis do passado para gerenciar emoções durante a epidemia);

Se você estiver trabalhando durante a epidemia, fique atento a suas necessidades básicas, garanta pausas sistemáticas durante o trabalho (se possível em um local calmo e relaxante) e entre os turnos. Evite o isolamento junto a sua rede socioafetiva, mantendo contato, mesmo que virtual;

Caso seja estigmatizado por medo de contágio, compreenda que não é pessoal, mas fruto do medo e do estresse causado pela pandemia, busque colegas de trabalho e supervisores que possam compartilhar das mesmas dificuldades, buscando soluções compartilhadas; investir e estimular ações compartilhadas de cuidado, evocando a sensação de pertença social (como as ações solidárias e de cuidado familiar e comunitário);

Reenquadrar os planos e estratégias de vida, de forma a seguir produzindo planos de forma adaptada às condições associadas a pandemia;

Manter ativa a rede socioafetiva, estabelecendo contato, mesmo que virtual, com familiares, amigos e colegas; evitar o uso do tabaco, álcool ou outras drogas para lidar com as emoções;

Buscar um profissional de saúde quando as estratégias utilizadas não estiverem sendo suficientes para sua estabilização emocional;

Buscar fontes confiáveis de informação como o site da Organização Mundial da Saúde; reduzir o tempo que passa assistindo ou ouvindo coberturas midiáticas;

Compartilhar as ações e estratégias de cuidado e solidariedade, a fim de aumentar a sensação de pertença e conforto social; estimular o espírito solidário e incentivar a participação da comunidade”.

Ainda de acordo com a Fiocruz, “caso as estratégias recomendadas não sejam suficientes para o processo de estabilização emocional, busque auxílio de um profissional de Saúde Mental e Atenção Psicossocial (SMAPS) para receber orientações específicas”. Leia o documento na íntegra.

De acordo com a presidente do Conselho Regional de Psicologia de Pernambuco (CRP-02), Alda Roberta Campos, é preciso deixar claro que sofrimento psíquico é algo comum em meio ao cenário conturbado da pandemia. “Sofrimento psíquico todo ser humano tem, uns mais, outros menos. Em um momento de pandemia, todo mundo vai sofrer de algum jeito, pelo medo, dificuldade de sono, aumento de ansiedade, diminuição ou aumento de apetite. Vai ter interferência na vida, ninguém está imune ao sofrimento psíquico. Sofrimento não é doença”, comenta a presidente.

Alda Campos orienta que o autocuidado é um comportamento importante no processo de combate ao sofrimento psíquico, uma vez que caso esse sofrimento comece a impedir que o indivíduo realize suas atividades cotidianas, como trabalho, estudos, projetos, convivência social e higiene pessoal, começarão os indícios de que a pessoa pode, de fato, estar sendo acometida por um adoecimento mental.

“Olhar para si, se autoconhecer para entender qual é a sua demanda e quais são os seus limites. O que você consegue fazer? Qual o reconhecimento do seu sentimento? A partir disso, você faz o seu projeto. Não existe uma receita de autocuidado. Oriento que olhe para você, enxergue o seu contexto. Como você pode acolher e ser acolhido? Com quem você conta? Amigos, amigas, familiares são as pessoas que você pode contar. O que você tem feito em relação à construção da rotina, para ressignificar seu dia e seu tempo? O autocuidado é isso, é olhar para si mesmo, para tornar esse período menos difícil”, explica psicóloga.

Saiba mais - No site da Organização Pan-Americana de Saúde, órgão ligado à OMS, são publicadas informações sobre autocuidados durante da pandemia de Covid-19. Entre eles, está uma série de infográficos que destacam atividades importantes para o nosso dia a dia que nos ajudam a preservar o bem-estar e, por consequência, a nossa saúde mental. Confira, a seguir, um deles:

Folheto produzido pela OMS traz orientações sobre saúde mental em meio à pandemia do novo coronavírus. Imagem: Divulgação - Opas/OMS

Atuação do poder público é necessária. Saúde é um direito de todos os brasileiros

O LeiaJá ouviu especialistas em saúde mental e fontes de entidades que representam a atuação de profissionais da área, para refletirmos a respeito de ações e políticas, por parte do poder público, que possam ajudar a população brasileira a se proteger dos sofrimentos psicológicos e do adoecimento mental. Alda Campos, presidente do Conselho Regional de Psicologia de Pernambuco, compartilhou a sua análise, projetando iniciativas em prol da saúde – física e psíquica - da sociedade.

Para Alda, inicialmente é preciso compreender que o conceito de saúde envolve um bem-estar que possui várias esferas. Questões financeiras, de moradia, perspectivas de vida, acesso à transporte, alimentação saudável, lazer, educação, entre outras, são algumas dessas vertentes. Segundo a presidente do CRP-02, combater desigualdades é um dos primeiros passos para garantir o bem-estar dos cidadãos. “Quando a gente está falando de saúde mental, não estamos falando apenas de ter ou não um diagnóstico. Estamos falando de uma qualidade de vida que precisa ser cumprida diante da nossa Constituição. Na nossa Constituição Federal, saúde é um direito de todos e dever do Estado”, destaca. “A nossa orientação em relação ao poder público é que ele deve oferecer cuidado interdisciplinar e intersetorial para a população, isso quer dizer, condições de vida, acesso à educação e à água, por exemplo. Como vai lavar a mão quem não tem água? É dever do poder público promover condições melhores de moradia, de acesso à educação e à saúde”, complementa.

Na visão da presidente do Conselho Regional de Psicologia de Pernambuco, a pandemia denunciou uma falta de assistência à nossa população e potencializou as diferenças e desigualdades sociais que o povo enfrenta, tais como saúde e educação precárias. Segundo Alda Campos, o Governo Federal precisa pensar um cuidado de reestruturação e reorganização social para a redução dessas desigualdades. “Essas desigualdades têm um impacto imenso na saúde mental das pessoas”, comenta Alda.

De acordo com a gestora do CRP-02, é importante que o Governo Federal, por meio dos Estados e municípios, fortaleça a Rede de Atenção Psicossocial (RAPS), do Sistema Único de Saúde. “Precisamos de cuidados multidisciplinares. São zelos com vários profissionais que vão ofertar cuidados interdisciplinares. O governo precisa aumentar investimentos na saúde coletiva, com acompanhamento médico, psicológico, com terapia ocupacional, assistência social, enfermagem. Cuidado não só através do SUS, mas também com o Sistema Único de Assistência Social (SUAS). Proponho ações do governo que vão ofertar, por exemplo, centros de convivência, locais de apoio onde as pessoas podem pernoitar, como as pessoas em situação de rua, acessando uma alimentação adequada. A gente precisa ter trabalhos que vão fazer a oferta de profissionalização. É um cuidado geral”, complementa.

Sobre o oferecimento de profissionalização, estratégia para o campo social e, inclusive, da saúde, Alda defende que o trabalho é um instrumento essencial na vida do brasileiro. “O trabalho garante a sobrevivência e traz a ideia de perspectiva de projetos. Precisamos resgatar na população o desejo de crescimento, de sonhos, projetos. Quando a gente pensa em um trabalho psicoterápico da psicologia, buscamos tratar o outro com igualdade para ele entenda que precisa cuidar dele próprio. A população precisa mais do que cesta básica, precisa voltar à possibilidade de a pessoa desejar e querer crescer, tendo projetos e geração de renda”, opina.

Outro ponto mencionado pela psicóloga diz respeito ao sofrimento psíquico enfrentado pelos profissionais de saúde que estão na linha de frente de combate à Covid-19. Segundo o Ministério da Saúde, 257 mil profissionais de saúde foram infectados pela doença até então; 226 morreram. Na análise da presidente do CRP-02, o autocuidado é peça fundamental para que esses trabalhadores sigam firmes no acolhimento da população. “Estamos trabalhando o autocuidado, os profissionais precisam se cuidar para puder ter uma oferta de cuidado maior para o outro. A ideia do autocuidado é você poder garantir o cuidado com a sua saúde para cuidar das outas pessoas. É necessário para todas as pessoas, mais ainda para quem está na linha de frente. Terapeutas ocupacionais, enfermeiros, técnicos em enfermagem, assistentes sociais, médicos, todos os profissionais que estão tendo cuidado direto com a população que está buscando saúde. Vigilantes, pessoal da cozinha, copa, pessoal da limpeza, nutricionistas, pessoas na reta guarda e na linha de frente dos hospitais também precisam desse cuidado, porque é um sistema de saúde composto por uma série de profissionais que estão envolvidos. Todo mundo precisa dessa atenção, acolhimento e escuta especializada”, alerta Alda Campos.

Por fim, a presidente do Conselho Regional de Psicologia de Pernambuco destaca a necessidade do zelo pelos psicólogos e psiquiatras. “As pessoas têm uma ideia de que os psicólogos não têm problema. Fazem uma associação do profissional de saúde, de uma forma geral, com heróis e heróis passam a ideia de que têm super poderes, que são imbatíveis. Mas nós temos um índice de mortalidade grande entre profissionais de saúde. Nós somos profissionais que precisamos de equipamento de proteção individual, de acolhimento, de salários dignos, respeito, descanso. São pessoas que estão com medo, preocupadas em contaminar a própria família, que adoecem. Não existem heróis no sentido mágico de super poderes. São pessoas que escolheram uma profissão, que se dedicam à ela e precisam de condições mínimas de trabalho”, reivindica.

A presidente do Conselho Federal de Psicologia (CFP), Ana Sandra Fernandes, reitera que políticas públicas de saúde mental são essenciais para a sociedade brasileira. No entanto, na visão da presidente, o Governo Federal não tem valorizado essas políticas nos últimos anos. “Se a gente não tiver um investimento efetivo nas políticas públicas de saúde e assistência social que garantem à população serviços de qualidade, teremos problemas, principalmente em um país com o nível de desigualdade como o nosso. O que a gente vê no Brasil, infelizmente, é o processo oposto. A Emenda Constitucional 95, que congelou por 20 anos investimentos em políticas públicas, como saúde e educação, a curto, médio e longo prazo, tende a trazer uma desassistência de forma muito marcante para a população em geral”, critica.

Ana Sandra Fernandes, presidente do Conselho Federal de Psicologia. Foto: Comunição CFP

Para a presidente do CFP, o Estado precisa aplicar recursos financeiros em políticas públicas com financiamento adequado. “Deve investir nos sistemas que já existem e facilitar a criação e a promoção de políticas públicas que, efetivamente, garantam o acesso da população a serviços essenciais, garantindo desde as coisas mais simples, como a presença dos insumos necessários para o funcionamento de um serviço, até a presença de profissionais qualificados, enfim, tudo isso é necessário e tudo isso precisa ser garantido. A população tem direito constitucional a esses serviços”, comenta.

Ana Fernandes ainda tece uma crítica aos poderes públicos de uma forma geral. Segundo a presidente do CFP, o País não apresentou, até então, uma política pública de aporte à saúde mental da população durante a pandemia do novo coronavírus. “No Brasil, a gente não tem acesso à política pública, a um projeto explícito, de um programa de saúde mental, posto, principalmente, para o País nesse contexto de pandemia que a gente está vivendo. Nós desconhecemos qual é o projeto, qual é a proposta, qual é o plano dos órgãos governamentais para uma política efetiva de saúde mental. Até hoje, o Conselho Federal de Psicologia nunca foi chamado para a construção de um projeto. Sinto pessoalmente falta de uma política clara, definida, sobre como esse enfrentamento vai ser feito neste momento e no pós-pandemia”, diz a presidente.

Ainda de acordo com a gestora do Conselho Federal de Psicologia, cabe aos governos federal, estaduais e municipais promoverem o funcionamento de suas redes de atenção psicossocial e de todos os seus equipamentos, bem como os gestores públicos devem garantir o acesso da população – principalmente da parcela mais pobre - a elementos básicos, como alimentação, educação e até internet – ferramenta que propicia os atendimentos psicológicos remotos -. “Nós somos um ser integrado, não é possível falar de saúde fazendo recortes. Para que a gente possa ter saúde em uma visão muito mais ampla, que tem a ver com saúde mental, física, entre outras esferas, precisamos estar bem do ponto de vista físico, e precisamos ter as nossas necessidades garantidas socialmente. Acredito que a saúde mental entra em um conjunto de bem-estar, não só importante, mas também fundamental. O Governo Federal precisa trabalhar para que a gente viva de uma forma mais organizada, em uma sociedade mais justa e mais igual, porque isso também contribui de uma forma significativa para o nosso processo de saúde física e de saúde mental por consequência”, finaliza sua análise a presidente do Conselho Federal de Psicologia.

O professor de psiquiatria da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), Bruno Monteiro, enxerga um cenário preocupante nos serviços públicos de saúde mental. De acordo com o docente, essa é uma das áreas mais carentes entre os segmentos de saúde direcionados à população. “A assistência em saúde mental já é um problema, uma área muito subvalorizada. Área muito pouca vista, é a última vista entre nas gestões públicas, em sua maioria. Você tem uma carência de serviço, pouco ambulatório, pouca psicoterapia, pouco médico psiquiatra. Os Caps não dão conta. Não estou vendo iniciativa no sentido de incremento do cuidado em saúde mental das populações”, avalia o professor, alertando que já havia, antes do cenário pandêmico, um contexto muito sério em relação à saúde mental da sociedade, potencializado após a Covid-19. “Já está tendo uma explosão de adoecimento mental, a pandemia potencializa e desencadeia um estado de mal-estar que já está presente nas pessoas. Sem pandemia, a situação da saúde mental já era um problema, as pessoas estavam muito ansiosas, deprimidas, tensas”, adverte o educador universitário.

Nascimento indica uma orientação que tem a ver com a forma que os governantes conduzem seus trabalhos sob os efeitos sociais do novo coronavírus. Segundo o professor da UFPE, os discursos dos gestores devem transmitir conforto. “Uma medida de saúde mental nessas horas é um grande sentimento de apaziguamento dado pelas autoridades. A medida terapêutica para aplacar o sofrimento dessas pessoas é tudo o que os políticos não estão fazendo agora. É o cara cuidar bem dessa população, dizer que está tomando as medidas: ‘vocês podem contar com a gente nisso, teremos assistência aqui, vai estar sendo resguardado financeiramente ali’. Claro que as pessoas vão precisar de um psicólogo e eventualmente de uma medicação. Mas, além disso, a forma como é conduzida a catástrofe, por parte do poder público e das autoridades sanitárias, também tem influência sobre a saúde mental das pessoas”, explana.

Ao sugerir possíveis estratégias de combate aos males mentais, o professor da UFPE destaca que são fundamentais o planejamento e a execução de ações emergenciais por parte dos governos. Entretanto, o docente de psiquiatria não acredita na celeridade dos poderes públicos nesse sentido. “O Ministério da Saúde, fundamentado nas instituições consultivas, como a Associação Brasileira de Psiquiatria, que é uma entidade de referência técnica, deveria criar políticas públicas cuja a tradução seja a implantação de algumas medidas específicas em curtíssimo prazo, começando com as medidas para dar uma acalmada na população, propiciando espaços de lazer, de convivência segura presencial ou on-line. No último estágio, deve haver o aumento da assistência à saúde, com maior disponibilidade de mais psicólogos e psiquiatras para a população. É fundamental um aumento da oferta e disponibilidade de profissionais de saúde mental, sobretudo psicólogos e psiquiatras na rede pública. A gente sabe que vai ser muito difícil de ser implementado”, diz o professor da UFPE.

O diretor-geral da Organização Mundial da Saúde, Tedros Adhanom Ghebreyesus, também reforçou seu alerta em orientação aos chefes de poder de todos os países que enfrentam a problemática pandemia do novo coronavírus. “Devemos aproveitar esta oportunidade para criar serviços de saúde mental adequados para o futuro: inclusivos, baseados em comunidades acessíveis. Porque, em última análise, não há saúde sem saúde mental”, frisa o gestor da OMS.

O que diz o Ministério da Saúde?

O LeiaJá também entrou em contato com o Ministério da Saúde em busca de um representante que pudesse nos responder questionamentos a respeito da postura do Governo Federal no âmbito da saúde mental em meio ao cenário pandêmico. Por meio da sua assessoria de imprensa, a pasta respondeu com informações oriundas de suas equipes técnicas. Confira:

LeiaJá - A partir dos efeitos da pandemia do novo coronavírus, tais como crise econômica, luto, medo da doença, entre outros, profissionais e entidades ligadas à saúde mental alertam que o Brasil pode ter aumento de casos de depressão, ansiedade e transtorno de estresse pós-traumático. O Ministério da Saúde concorda com esses alertas? De que maneira a pasta interpreta e explica o atual cenário de saúde mental da população? 

Ministério da Saúde - A literatura científica sugere que medidas restritivas como quarentena, isolamento e distanciamento social têm um impacto sobre o bem-estar psicológico das pessoas, bem como reações em decorrência do medo da contaminação e/ou do luto pelos óbitos de pessoas próximas. As reações psicológicas às pandemias incluem comportamentos desadaptativos, angústia emocional e respostas defensivas como: ansiedade, medo, frustração, solidão, raiva, tédio, depressão, estresse, comportamentos de esquiva, assim como diversas outras manifestações psíquicas e/ou físicas. Esse é o fenômeno que os especialistas estão chamando de “quarta onda da evolução da pandemia de Covid – 19”. 

LeiaJá - Quais são as ações promovidas pelo Ministério da Saúde, a nível federal, em prol da saúde mental da população? E durante a pandemia, quais ações foram criadas para atender os usuários do SUS? 

Ministério da Saúde - A Política Nacional de Saúde Mental compreende as estratégias e diretrizes adotadas pelo País com o objetivo de organizar a assistência às pessoas com necessidades de tratamento e cuidados específicos em Saúde Mental, visando fortalecer a autonomia, o protagonismo e promover uma maior integração e participação social destas pessoas. A atenção às pessoas com necessidades relacionadas aos transtornos mentais, incluindo aquelas com necessidades decorrentes do uso de crack, álcool e outras drogas, são assistidas nos pontos de atenção à saúde da Rede de Atenção Psicossocial, no âmbito do Sistema Único de Saúde. A Rede de Atenção Psicossocial (RAPS) é composta atualmente pelos serviços Atenção Primária à Saúde, os Centros de Atenção Psicossocial (CAPS)  em suas diversas modalidades, Serviços de Residência Terapêutica (SRT), Unidades de Acolhimento, Unidades de Referência em Saúde Mental em Hospitais Gerais, Leitos em Hospitais Psiquiátricos Especializados e Equipes Multiprofissionais em Saúde Mental. 

No âmbito Nacional, já foram realizadas diversas ações relativas à saúde mental no contexto da pandemia: 

Nota Técnica elaborada pela Coordenação Geral de Saúde Mental, Álcool e Outras Drogas (CGMAD), com as recomendações à Rede de Atenção Psicossocial sobre as estratégias de organização no contexto da infecção de Covid – 19; 

Parceria com a Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS/OMS) com a oferta de uma campanha para promover a saúde mental no contexto de Covid-19, através de materiais voltados aos profissionais de saúde, familiares, idosos e cuidadores e população em geral, com o objetivo amenizar os efeitos negativos da pandemia da Covid-19 na saúde mental dos brasileiros. 

Projeto Telepsi, realizado em parceria com o Hospital das Clínicas de Porto Alegre, que oferece teleconsulta psicológica e psiquiátrica para manejo de estresse, ansiedade, depressão e irritabilidade em profissionais do SUS que enfrentam a Covid-19 - e mais recentemente ampliada para os trabalhadores dos serviços essenciais. 

Desenvolvimento de um questionário on-line através do FormSUS, com o objetivo avaliar o impacto da pandemia de Covid-19 e do distanciamento social na saúde mental da população brasileira. 

Lançamento de uma série de ações com o objetivo de informar à população sobre questões envolvendo doenças mentais, na expectativa de promover saúde e bem-estar do brasileiro diante da pandemia da Covid-19. A primeira iniciativa consiste em três eventos virtuais do programa “Mentalize: sinal amarelo para atenção à saúde mental” que está marcado para os dias 25, 26 e 27 de agosto, sempre às 19h, no canal do Youtube do Ministério da Saúde. Serão encontros on-lines, abertos ao público em geral, que reunirão especialistas para falar sobre temas que envolvem saúde mental com o foco na saúde da criança e do adolescente, dos trabalhadores e dos idosos. O objetivo é desmistificar e reduzir estigmas sobre doenças mentais. Acompanhe: youtube.com/minsaudeBR.

LeiaJá - De que forma o Ministério da Saúde trabalha, em parceria com os estados e municípios, para oferecer serviços gratuitos de atendimentos psicológicos e psiquiátricos, além dos serviços de acolhimento psicossocial?  

Ministério da Saúde - A gestão do Sistema Único de Saúde (SUS) é tripartite, ou seja, compete à União, aos estados e aos municípios a prestação de ações e serviços de saúde. O Ministério da Saúde atua por meio de repasse de recurso financeiro de incentivo e de custeio para habilitação dos serviços da Rede de Atenção Psicossocial (RAPS). 

LeiaJá - Psiquiatras alertam que, no pós-pandemia, pode haver um aumento expressivo em casos de ansiedade e de pressão. Quais são os planos do Governo Federal para combater um possível surto de transtornos mentais no pós-pandemia?  

Ministério da Saúde - O Ministério da Saúde tem trabalhado para ampliação dos serviços de atendimento à saúde mental, em 2020 foram incentivadas as aberturas de 18 novos CAPS, 8 Serviços de Residência Terapêutica (SRT) e 29 novos leitos de saúde mental em hospital geral. Está prevista a habilitação de 77 novos CAPS, 100 SRT e 144 leitos em hospitais gerais. 

LeiaJá - Em 2019, quanto foi investido em serviços de saúde mental e quanto já foi investido em 2020? Já há uma projeção de recursos para 2021? 

Ministério da Saúde - Em 2019 foi incorporado no teto dos Fundos Municipais e Estaduais de Saúdeo valor de R$ 85,9 milhões. Foram ainda investidos R$ 12 milhões para estruturação e abertura de novos serviços. 

Em 2020, foi incorporado o valor de R$ 5,4 milhões no teto e pago R$ 814 milhões de incentivo para abertura de 18 CAPS, 8 SRT e 29 leitos em hospital geral. Está em tramitação a habilitação de novos serviços que alcançarão um total de R$ 66,6 milhões/ano. Para 2021, o planejamento orçamentário ainda está em elaboração. 

Um debate constantemente em voga durante o período de quarentena é a questão da economia. Empregos ameaçados, ou mesmo perdidos, empresas paradas, incertezas de futuro. Nesse cenário, torna-se de suma importância – mais do que em outras épocas – o planejamento financeiro. Isso vale para pessoas, famílias, empreendedores, empresas e até governos. Já que não sabemos até quando a crise vai durar e quais serão seus efeitos reais, estar preparado se faz ainda mais importante.

Antes de tudo, é preciso dizer que a quarentena pode ser uma boa oportunidade, se pensarmos na ótica do planejamento financeiro. Muitas vezes, pela correria da vida, não paramos para organizar gastos e receitas, equilibrar as contas. Com a desaceleração das atividades comerciais, depois das medidas impostas por administrações municipais e estaduais, necessárias para diminuir a velocidade de disseminação do novo coronavírus, muitas pessoas se viram com a renda sensivelmente comprometida, quase que da noite para o dia. Analisando essa realidade, comprovamos a relevância do planejamento financeiro, algo não usual para o brasileiro. Agora, no entanto, todos se veem forçados a fazer esse planejamento, a fim de equalizar as contas de casa e das empresas. E é preciso fazer isso com muito cuidado e atenção.

Segundo especialistas, para fazer um bom planejamento de gastos, dentro da realidade de quarentena, é preciso, antes de tudo, ter informação. Para as contas domésticas, deve-se levantar todos os gastos mensais da residência – alimentação, aluguel, contas, dívidas, enfim, os gastos obrigatórios e mesmo os supérfluos. Então, é hora de avaliar o que pode ser cortado – mesmo que temporariamente. Por exemplo, compras excessivas, etc. Essa lista vai das necessidades e possibilidades de cada um.

Uma dica bem interessante que serve para qualquer momento é a chamada “regra 50-30-20”: deve-se reservar 50% do orçamento para gastos essenciais; 30% para os gastos variáveis, supérfluos e do estilo de vida; e 20% para pagar dívidas e investir. Assim, é possível equalizar melhor as finanças pessoais.

Já para empreendimentos, é preciso fazer um rol de fornecedores, contratos, dívidas e pagamentos com estrutura e pessoal. Tudo isso, na ponta do lápis, mostra um panorama da real situação da empresa. A partir daí, vem a etapa de cortes e renegociações. A diminuição de jornada de trabalho e salário foi uma opção oferecida pelo Governo Federal, que se encarrega de completar o salário do colaborador proporcionalmente ao que ele teria direito a receber como seguro-desemprego. Renegociar contratos e dívidas com fornecedores e credores também é indicado, para conseguir um fôlego a mais.

O mais importante para empreendedores: é necessário pensar nos mais diversos cenários de futuro, desde uma retomada rápida da atividade econômica até uma demora maior e estar preparado para todos eles, traçando estratégias de atuação para cada caso.

Estamos vivendo uma realidade completamente nova e ainda muito incerta. Enquanto não se tem perspectivas reais e sólidas do que os próximos meses nos reservam, precaução e antecipação são as melhores armas para sofrer menos os impactos da crise econômica. No mais, é manter a fé de que um futuro melhor virá e, tão logo isso tudo passar, voltaremos a prosperar.

A cinco meses das eleições municipais, três incertezas rondam as campanhas para prefeito. Ainda há dúvidas se o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) vai manter a data da votação para 4 de outubro, se o Fundo Eleitoral será ou não destinado para o combate à pandemia do novo coronavírus e sobre como será a campanha em meio às regras de isolamento social. Políticos e profissionais que trabalham com partidos políticos avaliam que terão que lidar com uma campanha mais curta e sem contato físico, além de mais dependente da TV.

As redes sociais não devem ter o mesmo papel que nas eleições de 2018, segundo o pesquisador Renato Meirelles, fundador do Data Popular e hoje dono do Instituto Lokomotiva. Ele observa que oito em cada dez brasileiros afirmam que sua franquia de dados no celular não dura o mês inteiro.

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Meirelles aponta para o aumento do uso de TV e rádio como ferramenta de informação. "A internet serve para blindar o eleitorado fixo, ou seja, o piso que ele tem", afirmou o pesquisador. "A TV vai ter um papel importante para desarmar as fake news." Outros especialistas ouvidos pelo Estadão manifestaram opiniões semelhantes.

Com a previsão de uma campanha relâmpago e sem os tradicionais eventos eleitorais, os pré-candidatos com maior tempo de TV deverão ter vantagem. Os partidos têm evitado fechar contratos, já que não sabem se o dinheiro virá. Em São Paulo, o prefeito Bruno Covas (PSDB), candidato à reeleição, é um dos poucos que já contrataram um advogado eleitoral, e os trabalhos seguem em marcha lenta, comparado que o que seria esperado sem a covid-19.

Financiamento

Publicitários ouvidos pela reportagem contam que, em condições normais, este seria o momento de realizar pesquisas, fazer eventos para divulgar apoios partidários e montar as equipes de comunicação e marketing. "As campanhas já saberiam que vão tocar", disse o publicitário Nelson Biondi. Responsável por diversas campanhas tucanas e do ex-governador Paulo Maluf, ele decidiu ficar de fora neste ano. "Esse mercado já era ruim e ficou pior."

Uma das principais incertezas é em relação ao dinheiro. Enquanto as parcelas do Fundo Partidário continuam sendo transferidas às legendas pelo TSE, o Fundo Eleitoral é uma bolada única, com liberação programada para meados de junho - justamente a época que epidemiologistas apontam como o possível pico da pandemia no Brasil.

No entorno de Bruno Covas já se discutem formas de realizar a convenção de julho de forma virtual. O desafío é encontrar uma solução técnica que respeite o voto secreto e comporte mil delegados em rede. "Nossa preocupação e empenho é para que tudo possa ser feito pela internet", disse César Gontijo, que integra a executiva nacional do PSDB.

A equipe do prefeito está focada em manter o calendário eleitoral. Já a maioria dos adversários ouvidos pelo Estadão não se opõe à adiar o pleito, desde que ainda ocorra neste ano e não acarrete em prorrogação dos mandatos de quem é prefeito ou vereador atualmente.

Essa possibilidade é admitida pelo ex-governador Márcio França (PSB), pelos deputados federais Joice Hasselmann (PSL) e Orlando Silva (PC do B), pelo deputado estadual Arthur do Val (conhecido como Mamãe Falei, do Patriotas) e pelo ex-ministro Andrea Matarazzo (PSD), todos pré-candidatos. O PSOL, que vai lançar chapa com Guilherme Boulos e Luiza Erundina, também informou que não é contra o adiamento nesses termos.

Já o pré-candidato do Novo, Filipe Sabará, disse ainda não ver necessidade de falar em adiamento, mas acrescentou que avaliará a questão nas próximas semanas.

O PT é contra discutir o adiamento, ao menos neste momento. A reportagem entrou em contato com a pré-candidata Marta Suplicy (SD), mas não obteve resposta.

"As eleições podem ser adiadas se o clima estiver como agora. Seria impossível produzir uma eleição tranquila com essa pandemia. Se for em dezembro, a gente ganha dois meses para evitar problema", ponderou França.

"A decisão de prorrogar ou não as eleições é como a decisão pelo isolamento social, tem que ser definida por médicos", defendeu Andrea Matarazzo. "Praticamente suspendi a pré-campanha e coloquei foco no combate à pandemia", afirmou o pré-candidato Orlando Silva, que é deputado federal e um dos autores do projeto de lei da renda mínima emergencial.

"Atrasa a contratação de pré-campanha já que, normalmente, você passaria a contratar em junho, para preparar a coleta de dados", afirmou França, sobre a indefinição em relação ao Fundo Eleitoral.

"Todos os esforços têm que ser direcionados ao combate à covid. Mas há muito barulho em torno do Fundo, cujo valor não significaria grandes resultados (para o lidar com a pandemia)", argumentou Joice Hasselmann. "O Fundo Eleitoral não (ajudaria) e ainda deixaria a questão de como a eleição será custeada, porque o custo da democracia existe", concluiu.

Adiamento

O PT informou que não considera adequado debater adiamento das eleições municipais. De acordo com o presidente do diretório municipal, Laércio Ribeiro, muitos dirigentes do partido avaliam que, como ainda faltam meses até a hora de a população de dirigir às urnas, não é o caso de se falar em postergar as disputas. Neste sábado, 16, a legenda escolheu Jilmar Tatto como seu pré-candidato à Prefeitura de São Paulo. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

Na sexta-feira, um único bitcoin, a moeda digital mais famosa do mundo, ultrapassou o valor de US$ 6 mil (ou cerca de R$ 19 mil), valorização de 137% desde o primeiro dia de outubro. Esse desempenho, apesar de impressionante, não é novidade para o ativo, que sobe sem parar há cerca de 1 ano e meio. Não é por acaso que a "criptomoeda" tem chamado tanto a atenção dos investidores. Mas, afinal, vale a pena colocar dinheiro em bitcoin?

A reportagem conversou com especialistas e empresários do mercado financeiro, de entusiastas da moeda tecnológica aos mais conservadores. E, de uma forma geral, a recomendação dada aos investidores é de terem cautela. Apesar de reconhecerem a força do ativo, que já dispõe de valor de mercado de US$ 99,7 bilhões (mais que a companhia americana American Express, que vale US$ 82 bilhões na Dow Jones), a alta volatilidade assusta.

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"O problema é a incerteza. O bitcoin ainda é arriscado. Para colocar R$ 50 e ver como é, tudo bem", afirma o coordenador do Centro de Estudos de Finanças da FGV, Willian Eid. "Gosto de investir no que conheço e vejo perspectiva."

Para Adilson Silva, sócio da consultoria financeira Mazars Cabrera, a falta de lastro em um ativo econômico é o principal problema. "Esse é um mercado que você não consegue avaliar economicamente a situação dele, para onde vai, então você pode perder ou ganhar muito dinheiro", avalia.

Ressalvas à parte, o fato é que, embora seja complexo e oscilante, as corretoras estão de olho no bitcoin como um possível ativo a integrar suas carteiras de investimento. Membro do Instituto de Tecnologia e Sociedade do Rio de Janeiro (ITS-RJ), Gabriel Aleixo acredita que isso pode vir a acontecer já em 2018. "Vejo o mercado dando sinais de que está mais aberto para uma mudança nesse sentido, seja para utilização da moeda em si ou da tecnologia blockchain, que é o sistema por trás dela", diz.

O blockchain é a tecnologia que permite autenticar transações na moeda virtual. A XP Investimentos, por exemplo, estuda formas de adaptar a tecnologia para transações do dia a dia, como explica João Paulo Oliveira, especialista da corretora no assunto. "O que o mercado observa é o uso dessa tecnologia, que oferece transações mais rápidas, baratas e seguras", conta.

Hoje o perfil dos interessados em ganhar dinheiro com a moeda são de investidores mais arrojados e experientes, que buscam diversificar a carteira, conta Rodrigo Batista, CEO do Mercado Bitcoin, plataforma para comprar e vender a moeda.

Equilíbrio

No longo prazo, alguns especialistas acreditam que a cotação do bitcoin deve se tornar mais estável e a moeda ainda manterá uma trajetória de alta. "Hoje, o bitcoin é uma moeda 100% especulativa. Mas ela deve passar por evolução natural, porque o mundo caminha para a economia digital", comenta Adilson Silva, da Mazars.

Com o mercado global se voltando para plataformas digitais e se o bitcoin for regulamentado, é possível que a moeda deixe de ser especulativa e volte a ser usada principalmente para compra e venda, avalia.

Regulação

O presidente do Banco Central, Ilan Goldfajn, afirmou que o bitcoin é um ativo sem lastro e as pessoas compram porque acreditam na valorização. "Isso é a típica bolha ou pirâmide que existe na economia há centenas de anos", disse.

Em setembro, o banco central chinês disse que tornaria ilegal a moeda. Na ocasião, a cotação do bitcoin caiu mais de 10% no mercado. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

Faltando um ano e três meses para as eleições, em Pernambuco só existe uma certeza: a candidatura do governador Paulo Câmara (PSB) à reeleição. No campo da oposição, o cenário depende ainda de negociações para definições de candidaturas. Pré-candidato em potencial a governador, o senador Armando Monteiro (PTB) começou a entrar no jogo, mas seu projeto está vinculado ainda ao formato da sua aliança.

Ele deseja criar um novo arco de forças aglutinando lideranças e partidos que estão se desgarrando da base de sustentação de Câmara, como o PSDB, o DEM e o grupo dissidente do PSB, liderado pelo senador Fernando Bezerra Coelho, com quem teve uma conversa, anteontem, em Petrolina. Fácil? Longe de se traduzir nisso, até porque os interlocutores não falam um português claro.

Fernando Bezerra, por exemplo, joga com uma candidatura própria, a do filho, o ministro Fernando Coelho, mas não será surpresa se aceitar a vaga de vice, para o próprio filho, na chapa de Paulo Câmara. Sua própria candidatura a governador está praticamente descartada por causa das denúncias envolvendo seu nome na operação Lava Jato.

Já o PSDB tem como interlocutor o ministro de Cidades, Bruno Araújo, que também não sabe para que lado o rio corra, ou seja, não é oposição de fato ao projeto de reeleição de Câmara nem tem a certeza de que Armando consiga agregar forças de centro-direita para montar uma chapa competitiva. Bruno quer ser senador, mas devido à falta de clareamento do quadro nacional, não enxerga se o caminho mais próximo seria abraçar-se ao PSB ou a Armando.

O DEM, por fim, sonha em ter Mendonça Filho disputando o Governo do Estado, mas o partido está isolado, só elegeu um prefeito e Priscila Krause, a estrela da legenda para fisgar o voto urbano concentrado no Recife e Região Metropolitana, não teve desempenho satisfatório na disputa pela Prefeitura da capital, em 2016. Armando gostaria de atrair Mendonça para à disputa ao Senado, mas a cabeça do ministro da Educação se move em direção ao Palácio das Princesas. Não dando certo, a reeleição de deputado federal, para ele, seria mais confortável.

Desgarrado do PT, com quem se aliou em 2014 e 2016, Armando dá margem para o partido construir voo solo numa majoritária. Este é o cenário mais provável para os petistas, que já têm uma candidata na cabeça: a vereadora Marília Arraes, líder da oposição na Câmara do Recife. Ex-PSB, brigada com a família Arraes e com o prefeito do Recife, Geraldo Júlio, Marília só tem a lucrar entrando na disputa e por cima ainda contribui para o partido recuperar espaço na Câmara dos Deputados, com as candidaturas de João Paulo e Humberto Costa, os mais competitivos.

Além desses fatores locais, os nacionais se sobrepõem. A crise está no seu ápice, não se sabe se o presidente Michel Temer terá gorduras suficientes para queimar por mais tempo. As alianças dependerão, igualmente, de um projeto de reforma política, que tende a não andar por falta de tempo. O que se diz em Brasília é que se houver alguma mudança nas regrais atuais seriam o fim das coligações, a exigência da cláusula de

barreira e a criação do fundo de financiamento eleitoral. Outra expectativa diz respeito ao distritão, que fragiliza os partidos e a acaba as coligações, estabelecendo como regra a eleição dos proporcionais mais votados.

MAIA QUER DISTRITÃO – Em relação ao distritão, que se traduz, também, como a verdade eleitoral, na medida em que seriam eleitos os mais votados, mais de 400 deputados já assinaram compromisso pela sua aprovação. Maior defensor da proposta, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), cabala votos a favor e está tentando acelerar a sua tramitação na comissão especial da reforma política para ser colocada em votação no plenário da Casa até 15 de setembro. A rigor, o que se ouve no Congresso é que a reforma política se restringiria a dois itens: o distritão e o fundo eleitoral.

O adversário de Sileno – Dissidentes do PSB, o senador Fernando Bezerra Coelho e os deputados federais João Fernando Coutinho e Marinaldo Rosendo estão tentando criar uma candidatura para bater chapa com presidente estadual da legenda, Sileno Guedes, na eleição de renovação da executiva. O nome mais cotado é o do prefeito de Paulista, Júnior Matuto. “Há uma insatisfação geral com o atual comando do partido. Eu diria que essa má vontade vai do litoral ao sertão”, diz o senador Fernando Coelho, principal liderança que não engole a continuidade de Sileno.

Nem sinal do BB - Em seu blog O Abelhudo, Paulinho Muniz bateu duro, ontem, no descaso do Banco do Brasil com o município. Segundo ele, há exatamente um ano a população do município deixou de contar com os serviços da instituição financeira devido à explosão do caixa eletrônico que funcionava na agência local. “Há um profundo silêncio, pois nem os funcionários têm informação de qualquer providência para a sua reabertura. A população sanharoense, cliente e usuária do sistema, só resta esperar. Reclamar, não se sabe a quem de direito”, diz ele.

Enfrentando a violência – O governador Paulo Câmara (PSB) sancionou lei que cria duas Companhias Independentes da Polícia Militar (CIPM) para os municípios de Tamandaré, no Litoral Sul, e Araripina, no Sertão do Araripe. Ao todo, segundo o governo, as duas companhias vão fazer o policiamento em regiões em que vivem cerca de 300 mil pessoas. De acordo com o levantamento da Secretaria de Defesa Social (SDS), no primeiro semestre deste ano Pernambuco contabilizou 2.875 homicídios. O número é 39,3% maior do que a quantidade de assassinatos registrados no mesmo período do ano anterior. Foram 2.063 crimes contra a vida.

Renovação na bancada socialista – Dentro dos quadros novos do PSB na disputa por uma vaga na Câmara dos Deputados em 2018, o secretário de Administração, Milton Coelho. Trata-se de um dos históricos do grupo mais próximo ao ex-governador Eduardo Campos e tem garimpado com sucesso o apoio de prefeitos e lideranças num raio territorial que vai do Litoral ao Sertão. Uma das suas virtudes é conhecer as lideranças do interior uma a uma pelo nome, graças ao trabalho competente quando presidiu o partido no Estado. Pelas projeções de quem conhece a aritmética das eleições, das 25 cadeiras de Pernambuco na Câmara Federal uma é de Milton Coelho.

CURTAS

IMPOSTOS – O anúncio do novo aumento de imposto será, hoje, e com uma reviravolta: o governo também vai elevar o contingenciamento do Orçamento. Serão bloqueados mais R$ 5 bi temporariamente. Pelas contas feitas pela equipe econômica, mesmo com o aumento do PIS/Cofins não se chega a cobrir a diferença entre a meta fiscal e o déficit apurado até o momento.

INTERROGATÓRIO – O juiz federal Sérgio Moro marcou novo interrogatório do ex-presidente Lula para 13 de setembro, agora na ação penal sobre supostas propinas da Odebrecht. Este é o segundo processo na Operação Lava Jato, no Paraná, em que o petista será ouvido. Moro abriu, ontem, a Lula, a possibilidade de ser ouvido por videoconferência. Neste caso, o petista prestaria depoimento na Justiça Federal em São Paulo.

Perguntar não ofende: Do jeito que vai, o PT conseguirá eleger no Estado algum deputado federal em 2018?

Marcado por incertezas, o mercado mundial não deve apresentar uma forte recuperação para o comércio pelos próximos dois anos. Dados apresentados pela OMC indicam ainda que, em 2016, a taxa de expansão do comércio foi de apenas 1,3% em volume e uma contração de 3% em termos de valores.

De acordo com Roberto Azevedo, diretor da entidade, o desempenho de 2016 é o pior desde o início da crise mundial de 2009 e, pelo segundo ano consecutivo, o comércio internacional sofreu uma contração em dólares.

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Entre suas previsões, a OMC estima que 2017 terá um melhor resultado para o comércio internacional. Mesmo assim, ele pode chegar a 2,4% neste ano, com uma margem de variação de 1,8% a 3,6%. Para 2018, o comércio pode se expandir entre 2,1% e 4%.

Ainda que o crescimento seja identificado, nem o melhor dos cenários aproxima o desempenho do comércio ao que era conhecido no mundo nas últimas décadas.

Segundo a OMC, o resultado de 2016 foi em grande parte afetado pelo desempenho negativo dos mercados emergentes, como Brasil, China ou Rússia. Mas a própria entidade estima que o mercado global hoje está "profundamente imprevisível" diante da falta de clareza dos governos sobre suas políticas econômicas, monetárias e comerciais.

"A incerteza é acima de tudo política. O comércio internacional fraco dos últimos anos reflete a debilidade da economia global", disse Azevedo.

Segundo ele, o comércio tem o potencial de ajudar na recuperação da economia mundial. Mas o protecionismo pode aprofundar ainda mais a crise. "Se políticos tentarem lidar com a perda de empregos com restrições severas ao comércio, ele pode se constituir em um peso para a recuperação", alertou.

Azevedo ainda usou o anúncio sobre os dados para alertar sobre os riscos de uma onda protecionista. "As preocupações das pessoas são legítimas. Mas não adianta resolver um problema e criar outro em outro lugar do mundo. O comércio deve fazer parte da solução", defendeu. "Fechar as fronteiras não vai trazer empregos de volta. Apenas vai destruir mais postos de trabalho. Precisamos resistir", disse.

O brasileiro continua a evitar a falar diretamente sobre Donald Trump. "Ainda estamos aguardando para saber qual será a política comercial", completou. Mas admitiu: as incertezas são "ruins" ao comércio.

No mercado de juros futuros os DIs exibem alta consistente desde a abertura nesta segunda-feira, 30, em reação à piora da percepção de risco. Às 9h27, o DI para janeiro de 2017 indicava 15,80%, ante 15,66% no ajuste de sexta-feira e o DI para janeiro de 2021 tinha taxa de 16,04%.

O mercado acompanha durante a manhã os desdobramentos da prisão do banqueiro André Esteves, com destaque para a informação de que o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), teria recebido propina de R$ 45 milhões do BTG Pactual para aprovar emenda em medida provisória que beneficiaria o banco.

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No âmbito fiscal, os investidores processam o corte no Orçamento de 2015 e o congelamento nos gastos do governo em dezembro. O contingenciamento ocorre no último dia para a publicação do novo decreto com a programação orçamentária e financeira do ano e o governo foi obrigado a fazê-lo uma vez que ainda não tem a aprovação do Congresso para entregar um déficit fiscal.

No exterior, os juros dos Treasuries também operam em alta, numa semana em que a presidente do Federal Reserve, Janet Yellen, discursa na quarta-feira, 2, e na quinta-feira, 3, e pode reforçar a expectativa de uma alta nos juros nos EUA em dezembro. Além disso, o payroll sai na sexta-feira, 4, e um resultado forte também pode contribuir para essa expectativa.

Passada a trégua dos últimos dias, o mercado de câmbio voltou a dar sinais de estresse e levou o dólar à vista a fechar cotado a R$ 3,872, com alta de 3,23%, nesta terça-feira (13). Foi a maior variação porcentual de fechamento desde 13 de março deste ano.

A disparada da moeda norte-americana ocorreu em meio a fatores internos e externos. Na Europa, pesou o índice ZEW de expectativas econômicas da Alemanha, que caiu de 12,1 em setembro para 1,9 em outubro, ante previsão de 6,9. Mas a pior notícia veio da China, que registrou queda de 20,4% nas importações do país, acima da expectativa dos analistas, de queda de 16,5%.

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O número ruim das importações chinesas sinalizou desaceleração da segunda maior economia do mundo, com reflexos em diversos mercados, inclusive os de câmbio, com valorização do dólar frente a moedas de diversos países emergentes, entre elas o real. Na máxima do dia, registrada à tarde, o dólar à vista atingiu os R$ 3,883, com alta de 3,52%.

No cenário interno, as atenções estiveram focadas nos desdobramentos da disputa em torno da possibilidade de impeachment da presidente Dilma Rousseff. O foco central da batalha é o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), que tem em suas mãos os pedidos de impeachment da presidente e, ao mesmo tempo, se vê encurralado pelas evidências de que recebeu propina em negócios envolvendo a Petrobras.

Dentro da disputa em torno do impeachment, três mandados de segurança obtidos pela base governista dificultam as estratégias de Cunha de fazer avançar o processo na Câmara. Com as liminares obtidas no STF, deputados ficam impedidos de recorrer quando houver rejeição de pedido de impeachment feito por Cunha.

Na prática, a decisão de levar à frente um processo de impeachment fica somente nas mãos do presidente da Câmara. Entre os principais pedidos de impeachment em análise por Cunha está aquele elaborado pelo ex-petista Hélio Bicudo e pelo jurista Miguel Reale Junior. O deputado afirmou que retomaria hoje a análise dos pedidos, mas que o requerimento de Bicudo seria o último da lista.

Ao participar da abertura do I Congresso Nacional do Movimento dos Pequenos Agricultores (MPA), o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva criticou a oposição, sobretudo o PSDB, que tem defendido a tese do impeachment ou a renúncia de Dilma. "A oposição deveria criar vergonha e deixar a Dilma governar este País", disse o ex-presidente.

Em meio à turbulência e ao clima de incerteza provocado pela demora na divulgação da lista do procurador-geral da República, Rodrigo Janot, a presidente Dilma Rousseff convocou alguns ministros da chamada coordenação política, para uma conversa, no Palácio do Planalto. O vice-presidente Michel Temer está em São Paulo, mas o encontro inclui os ministros da Casa Civil, Aloizio Mercadante, da Defesa, Jaques Wagner, da Justiça, José Eduardo Cardozo e da Secretaria Geral, Miguel Rossetto.

Este é a primeira reunião da presidente com a sua coordenação política depois de estourar a nova crise entre Congresso e Planalto, aliada às tensões com a expectativa da divulgação da lista com os nomes dos citados que poderão ser investigados pelo Supremo Tribunal Federal.

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Interlocutores da presidente consideram que o clima político não é bom e, por enquanto, não há solução para as crises que estão sendo enfrentadas, embora o Planalto esteja tentando criar novas pontes com os presidentes do Senado, Renan Calheiros, e da Câmara, Eduardo Cunha, que estão sob fogo cruzado por informações de que seus nomes constam da lista de Janot.

O ideal para o governo é que esta lista fosse logo divulgada para que ficasse claro quem é quem nesta questão e qual o tipo de acusação que existe, de fato, contra as pessoas.

A morte do ex-governador Eduardo Campos (PSB), após um acidente aéreo, na última quarta-feira (13), tem sido referência, para alguns socialistas, para garantir o êxito da campanha presidencial e estadual deste ano. Até então, Campos concorreria à presidência da República, ao lado da ex-senadora Marina Silva (PSB). 

O primeiro passo foi à transformação de uma das últimas frases de Campos, como slogan da nova campanha que começa a ser estruturada a partir desta semana. Na entrevista que concedeu ao Jornal Nacional, um dia antes de falecer, ele pontuou que não desistiria do Brasil. Nos bastidores, o PSB usará os dizeres para referendar a postulação de Marina. 

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Agora com a fatalidade e a divulgação de pesquisas que trazem de volta o ativo de votos da ambientalista, eles pontuam que a morte de Campos acelerou o processo de conhecimento já esperado. 

“Hora nenhuma ele tinha dúvida que iria para o segundo turno. Ele sabia que quando as pessoas prestassem atenção ao programa de governo através da imprensa e da propaganda eleitoral ele seguramente iria ter adesão suficiente para ir ao segundo turno”, frisou o coordenador do programa de governo da coligação, Maurício Rands, antes de um encontro da Frente Popular, nesta segunda-feira (18), no Recife.

“A tragédia acelerou este processo. O Brasil acorda com a tragédia, na percepção de um projeto de futuro que foi articulado por Eduardo Campos. Vai ser agora continuado por Marina”, completou o coordenador.

A expectativa deles é que em Pernambuco o cenário tenha a mesma desenvoltura nacional, ampliando as intenções de voto para o postulante ao governo do estado, Paulo Câmara (PSB). Durante o evento de hoje, Câmara adaptou a frase de comoção nacional trazendo-a para o âmbito estadual. “Eduardo Campos disse que não ia desistir do Brasil. E eu não vou desistir de Pernambuco. É trabalho e coração”, discursou, frisando que os próximos dias serão embasados em “bons sentimentos” e referendando o desejo de Campos em elegê-lo. 

Segundo Maurício Rands, o fator principal em Pernambuco é que antes do falecimento de Campos, a população não sabia que Câmara representava a continuidade e agora sabem. “Aqui em Pernambuco isso (a ampliação dos votos) também vai acontecer com Paulo Câmara, Eduardo queria que trivesse continuidade, mas nem todos sabiam que Paulo representava esta continuidade. Agora com a tragédia conhecem”, destacou. 

Lembrando da última conversa que teve com Eduardo Campos, o candidato a senador, Fernando Bezerra Coelho (PSB), também reforçou a utilização do conhecimento tão rápido de Campos como base fundamental para endossar candidaturas. “Veja que peça a vida nos pregou. Em 48 horas o Brasil conheceu o que nós já conhecíamos. Na última vez que nos vimos, em Bodocó, ele disse ‘o jogo vai começar quando eu sentar na bancada do JN. O povo vai me conhecer’”, frisou. 

Os socialistas agora têm pouco mais de 45 dias para reformular a agenda e voltar às ruas com as campanhas estadual e nacional. No palanque estadual, a voz de Eduardo Campos vai ecoar através de um vídeo onde ele pede votos para Paulo Câmara. No âmbito nacional, o apelo pela perda do presidenciável se unirá aos votos guardados para Marina, antes direcionados como nulos ou branco em pesquisas. 

A Bovespa tenta se recuperar da queda de 1,53% na quarta-feira, 13, mas as incertezas sobre como ficará a disputa eleitoral com a morte de Eduardo Campos (PSB) atrapalham esse processo, assim como o fôlego curto mostrado pelas bolsas de Nova York. As ações da Petrobras hesitam, após terem despencando na véspera. Na mesma direção, os papéis da Vale seguem em baixa. Na contramão, Banco do Brasil ON sobe 3,0% após divulgar balanço que agradou o mercado.

Conforme apurou o Broadcaste, serviço de informações em tempo real da Agência Estado, analistas internacionais avaliam que Marina Silva deverá ser a nova candidata do PSB à Presidência e que esse novo cenário levará o pleito ao segundo turno, com a ex-ministra conquistando parte dos votos em branco e nulo e dos indecisos. Para os analistas, o mercado brasileiro deve permanecer volátil até que haja uma definição sobre a candidatura, mas cresce a incerteza sobre quem desafiaria a presidente Dilma Rousseff em um segundo turno.

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Às 10h32, o Ibovespa subia 0,06%, aos 55.615,06 pontos. Em Nova York, o Dow Jones subia 0,15%, o Nasdaq 0,11% e o S&P 500 tinha alta de 0,12%.

As ações da Petrobras subiam 0,21% (PN) e 0,23% (ON). Já as da Vale registravam queda de 1,15% (PNA) e de 1,44% (ON). As do Banco do Brasil ON subiam 3,07% e eram destaque de alta do índice, após ter divulgado mais cedo que fechou o segundo trimestre com lucro líquido ajustado de R$ 3,002 bilhões, o que representa um aumento de 14% no confronto anual, superando as expectativas de analistas do mercado financeiro.

Em tempo: A presidente e candidata à reeleição, Dilma Rousseff, cancelou por três dias sua agenda de campanha por conta do falecimento do ex-governador Eduardo Campos. No entanto, manteve as atividades de presidente.

O Banco Central voltou a atribuir a incertezas externas e internas a cautela com a qual deve ser administrada a política monetária brasileira, segundo o Relatório Trimestral de Inflação divulgado na manhã desta quinta-feira. O trecho do documento repete o parágrafo mais importante da última ata do Comitê de Política Monetária (Copom), que manteve a Selic em 7,25% ao ano.

"O Copom avalia que a maior dispersão recentemente observada de aumentos de preços ao consumidor, pressões sazonais e pressões localizadas no segmento de transportes, entre outros fatores, contribuem para que a inflação mostre resistência", trouxe o documento.

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"Embora essa dinâmica desfavorável possa não representar um fenômeno temporário, mas uma eventual acomodação da inflação em patamar mais elevado, o Comitê pondera que incertezas remanescentes - de origem externa e interna - cercam o cenário prospectivo e recomendam que a política monetária deva ser administrada com cautela", continuou o documento. Estas foram as justificativas do Copom para a manutenção da taxa básica de juros por unanimidade.

"O Copom ressalta que a evidência internacional, no que é ratificada pela experiência brasileira, indica que taxas de inflação elevadas geram distorções que levam a aumentos dos riscos e deprimem os investimentos." Segundo o BC, essas distorções se manifestam, por exemplo, no encurtamento dos horizontes de planejamento das famílias, empresas e governos, bem como na deterioração da confiança de empresários.

O Comitê enfatizou, também, que taxas de inflação elevadas subtraem o poder de compra de salários e de transferências, com repercussões negativas sobre a confiança e o consumo das famílias. "Por conseguinte, taxas de inflação elevadas reduzem o potencial de crescimento da economia, bem como de geração de empregos e de renda", trouxe o documento. Nesse contexto, o comitê disse que irá acompanhar a evolução do cenário macroeconômico até sua próxima reunião, para então definir os próximos passos na sua estratégia de política monetária.

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