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Acompanhando o Twitter e o Facebook, o YouTube anunciou nesta quinta-feira (15) que está endurecendo suas regras contra a disseminação de teorias da conspiração para fins violentos, notadamente QAnon, um movimento conspiratório pró-Trump que avançou, em meio a protestos contra o racismo e antirracismo.

Os regulamentos da plataforma de vídeo do Google sobre mensagens de ódio e assédio agora proíbem "conteúdo direcionado a indivíduos ou grupos de pessoas com teorias de conspiração que foram usadas para justificar a violência na vida real", apontou o Youtube em comunicado.

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A rede social, que conta com 2 bilhões de usuários mensais, também afirmou ter removido dezenas de milhares de vídeos vinculados ao QAnon e baniu centenas de canais, notadamente por ter "ameaçado de usar violência" ou "negado a existência de grandes eventos violentos", como o Holocausto.

QAnon é um movimento de extrema direita que defende a ideia de que o presidente dos EUA, Donald Trump, trava uma guerra secreta contra uma seita liberal global composta de pedófilos satanistas.

Nascida nas redes sociais em 2017, ganhou popularidade graças a postagens viralizadas no Facebook e Instagram.

A gigante da tecnologia anunciou no dia 7 de outubro a remoção de todas as contas e conteúdos vinculados ao movimento em sua plataforma principal e no Instagram, incluindo páginas que "não contêm conteúdo violento".

Na verdade, o Facebook notou que os defensores dessas teorias da conspiração mudaram de usuário para usuário para atrair constantemente novos públicos.

Seus membros se passam por ativistas contra o tráfico de crianças e usam palavras-chave como #SaveTheChildren (save children).

A menos de três semanas de uma eleição presidencial em meio à alta tensão, as plataformas de tecnologia multiplicaram medidas para pacificar as trocas e demonstrar que não são veículos de mensagens de ódio e desinformação, após intensas críticas.

O Facebook anunciou nesta terça-feira (6) o bloqueio de todas as contas ligadas ao movimento conspiracionista QAnon, tanto na rede social, quanto em sua comunidade de compartilhamento de imagens, Instagram.

"Nós vamos remover quaisquer Páginas do Facebook, Grupos e contas no Instagram representando o QAnon, mesmo que não contenham conteúdo violento", anunciou o gigante das redes sociais em uma postagem em seu blog.

A medida acelera os esforços do Facebook de reprimir campanhas de desinformação, algumas endossadas pelo presidente Donald Trump, semanas antes das eleições presidenciais de 3 de novembro.

As ações, tanto do Facebook, quanto do Instagram, visaram contas vinculadas a "grupos anarquistas 'offline' que apoiam atos violentos em meio a protestos, organizações de milícias com sede nos Estados Unidos e QAnon", informou a plataforma na postagem.

Em agosto, o Facebook havia eliminado centenas de grupos vinculados à teoria da conspiração de extrema direita QAnon e impôs restrições a cerca de outras 2.000 como parte de uma ofensiva contra um aumento da violência.

O Facebook informou ter endurecido seu bloquei ao QAnon após notar que, apesar de eliminar publicações que promoviam a violência diretamente, as mensagens dos seguidores do movimento foram adaptadas para evitar as restrições.

Um exemplo: o QAnon usou a plataforma para afirmar que certos grupos iniciaram incêndios florestais que devastaram a costa oeste, desviando a atenção da polícia e dos bombeiros.

"As mensagens do QAnon mudam muito rapidamente e vemos que as redes de seguidores criam uma audiência com uma mensagem e depois mudam rapidamente para outra", informou o Facebook.

"Nosso objetivo é combater isto de forma mais efetiva com esta atualização que fortalece e expande nossos esforços contra o movimento de teoria conspiratória", acrescentou.

A rede social já proíbe conteúdos que incitam a violência e organizações que a promovem.

Os teóricos da conspiração do QAnon têm usado páginas e grupos públicos e privados no Facebook para difundir "desinformação, racismo e incitação à violência apenas velada", segundo a Liga Antidifamação.

A teoria da conspiração, popular entre diferentes grupos de extrema direita, sustenta que há uma elite global que opera como uma força controladora por trás de governos, bancos e outras instituições.

Em julho, o Twitter tomou medidas enérgicas contra o QAnon quando o grupo aumentou seu alcance na corrente principal da política americana.

A partir de uma publicação anônima de 2017, que alega exploração infantil e conspirações estatais, o movimento sem líderes ganhou um lugar no fluxo do Twitter de Trump.

No ano passado, o FBI informou em um relatório que o QAnon era um dos vários movimentos que poderiam impulsionar "tanto grupos quanto extremistas individuais a realizar atos criminosos ou violentos".

Considerado ameaça doméstica de terrorismo nos Estados Unidos pelo potencial de incentivar violência por parte de extremistas, o movimento QAnon (sigla para "Q Anônimo") foi adaptado ao Brasil e ganha adeptos entre radicais nacionais. A versão brasileira da teoria da conspiração criada pela extrema-direita americana tem sido cultivada em fóruns bolsonaristas e alimenta campanhas de "fake news".

São alvos dessas campanhas ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) e mesmo estratégias sanitárias na pandemia, como o uso de máscaras de proteção e "termômetros de testa".

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Em síntese, os adeptos do QAnon acreditam que o presidente Donald Trump foi escolhido por um exército secreto para uma batalha contra governantes ocultos do mundo. É um herói patriota que aceitou enfrentar uma rede de tráfico humano e pedofilia que envolve desde políticos da esquerda e atores de Hollywood até o Vaticano e o bilionário húngaro George Soros.

A origem do movimento é obscura. Os adeptos seguem um anônimo que se identifica como "Q" para lançar mensagens cifradas em um fórum da deep web - parte da internet escondida de ferramentas de busca para preservação do anonimato.

A fonte primária da teoria jamais fez qualquer menção a Bolsonaro, mas apoiadores do presidente trataram de incluir o brasileiro entre os líderes mundiais escolhidos pelo "Q" para "salvar o mundo".

Em abril deste ano, por exemplo, o deputado Eduardo Bolsonaro (PSL-SP), filho do presidente, postou nas redes uma foto ao lado do pai e dos irmãos comendo milho. Para adeptos do movimento QAnon, mais do que uma mera reunião de família, a imagem era uma prova de que Bolsonaro é o escolhido. Dias antes, o "Q" havia publicado a cena de uma plantação de milho. "Junte as peças do quebra-cabeça", dizia a mensagem postada pelo perfil "Revelação Total".

Levantamento do Estadão identificou que, nos últimos 12 meses, ideias do movimento foram propagadas em páginas, grupos e canais de Facebook e YouTube que, juntos, somam cerca de 1,7 milhão de seguidores ou membros. Por meio da ferramenta CrowdTangle, a pesquisa considerou apenas as publicações em português. São contas que permanecem no ar, apesar das remoções de grupos de adeptos da QAnon anunciadas recentemente pelas plataformas.

Os "conspiracionistas" não estão restritos ao anonimato da internet. No ato de 21 de junho, na Esplanada dos Ministérios, apoiadores de Bolsonaro levaram cartazes ostentando a letra "Q" e também "wwg1wga", sigla que identifica o movimento e representa em inglês a frase "onde vai um vamos todos".

Outra manifestante carregava os dizeres "Pizzagate é real", em referência à conspiração que serviu de gatilho ao QAnon. Em 2016, trumpistas inventaram que Hillary Clinton, então adversária de Trump nas eleições americanas, e seus principais auxiliares controlavam um esquema de tráfico de crianças de dentro de uma pizzaria, em Washington. Influenciado pela farsa, um homem foi ao local e disparou uma metralhadora.

O crescimento no território americano acendeu um alerta. Relatório do FBI que veio a público em agosto de 2019 apontou que ideias como as do QAnon "muito provavelmente" cresceriam e levariam grupos e indivíduos extremistas a cometer atos criminosos ou violentos". A agência classificou o movimento como potencial ameaça interna de terrorismo.

Ataques

Integrantes do STF são alvos recorrentes dos fóruns conspiratórios no Facebook com informações caluniosas. Publicações buscaram ligar ministros a "orgias com garotas" organizadas pelo médium conhecido como João de Deus, sustentam que a força de Trump é capaz de influenciar decisões do Supremo e insinuam que o Judiciário conspira contra Bolsonaro.

Entre as páginas que reproduzem conteúdo QAnon estão algumas que se apresentam como "Aliança com o Brasil", "Brasil Acima de Tudo" e "Bolsonaro direitista". Em vídeos com "explicações" sobre a teoria é comum a defesa da "hidroxibolsonaro" no combate à covid-19. As páginas costumam ser mantidas por perfis falsos ou apócrifos.

A reportagem pediu entrevistas a quatro pessoas que são identificadas nas redes sociais como referências ao QAnon no Brasil, mas não obteve resposta. Em seus perfis, eles alegam que a "mídia mainstream" trabalha contra a "verdade secreta".

O movimento é político, mas não só. Reportagem de junho da revista The Atlantic classificou o fenômeno como "uma nova religião". No Brasil, o QAnon é disseminado em grupos que discutem temas esotéricos e místicos.

O psicanalista e professor da Universidade de São Paulo (USP) Christian Dunker afirma que teorias conspiratórias buscam a simplificação de fenômenos que as pessoas não conseguem explicar com o repertório que detêm. "A paranoia resolve as coisas porque ela vai dizer que existe um plano maior, um sentido. E diz indiretamente para a pessoa que ela é muito importante porque passou a saber que o mundo se divide, por exemplo, no combate entre as trevas e o bem. Esse efeito de relevância, de protagonismo, é muito tentador", disse o psicanalista.

Plataformas removem páginas ligadas a grupo

O Facebook informou, em nota enviada ao Estadão, agir constantemente contra grupos e páginas ligadas ao movimento QAnon e que violam as políticas da empresa. "Esses movimentos, no entanto, evoluem com rapidez, o que exige de nós um esforço contínuo. Portanto, seguiremos o tema de perto, estudando símbolos e terminologias e avaliando os próximos passos para manter a nossa comunidade segura", diz a nota.

A plataforma afirmou que no dia 19 deste mês removeu 790 grupos e 100 páginas ligados ao movimento.

‘Condutas violentas’. A rede conspiratória, porém, não foi banida da plataforma. A derrubada afetou somente contas que "celebravam condutas violentas, mostravam armas de fogo, sugeriram usá-las ou tinham seguidores com padrões comportamentais violentos".

Já o YouTube declarou que desde que atualizou sua política de discurso de ódio, em junho de 2019, removeu "dezenas de milhares" de vídeos relacionados ao QAnon e encerrou "centenas" de canais com conteúdo sobre o tema por violarem diretrizes de comunidade.

"Além disso, quando os usuários vêm ao YouTube e pesquisam tópicos sujeitos a desinformação, fornecemos contexto adicional e destacamos vídeos de especialistas ou fontes de notícias confiáveis." Procurado, o Palácio do Planalto não se manifestou. 

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