Locadora de filmes resiste ao tempo e ainda tem lucro

Fortalecimento de novas mídias e decadência do segmento fizeram muitas locadoras fecharem. As poucas que resistiram tiveram que se reinventar para os clientes

por Camilla de Assis dom, 31/05/2015 - 09:41

Com o passar do tempo, alguns negócios vão saindo da cena mercadológica, pois são substituídos por outros tipos mais tecnológicos e práticos para os consumidores. As locadoras de vídeos passaram por momentos de glórias entre os anos 90 e 2000, mas com a ascensão dos tipos de conteúdo televisivo on demand – em que o telespectador é agente ativo naquilo que quer assistir, com a vantagem da praticidade de ter tudo virtualmente – e o fortalecimento de novas mídias, as casas de aluguel de filmes foram perdendo espaço no mercado. Entretanto, ainda existem aquelas que resistiram ao tempo e continuam se reinventando para não saírem de cena. 

Localizada no bairro do Rosarinho, na Zona Norte do Recife, um estabelecimento comercial colorido e com a entrada repleta de pôsteres de filmes recém-lançados revela sua persistência no mercado. A locadora de filmes Loc Point está no mercado há cerca de 20 anos. O dono do estabelecimento, Jurandir França, revelou, em entrevista ao Portal LeiaJá, que é apaixonado pelo segmento cinematográfico e por isso continua com o funcionamento do local. “Para quem ama cinema é mais fácil de manter o estabelecimento funcionando, porque sempre há novas ideias e a forma de atendimento é personalizada”, conta.

Serviços como Netflix e Pop Corn Time, que permitem o conteúdo on demand, não assustam o negócio de Jurandir. “Uma coisa é estar na frente do computador, onde não há interação. Estar em uma locadora, onde você pode tocar na capa do filme, vê-la em detalhes e ainda discutir com os funcionários sobre o enredo, o que contém, entre outras coisas, é o que dá vida e faz de uma locadora um local mágico”, diz. 

Apesar dos cerca de três mil clientes ativos, que podem escolher mais de sete mil títulos, dos mais diversos, a Loc Point precisou ser reinventada e se adaptar nas vendas. Além dos DVDs e Blu-Rays, a locadora também prepara o cliente para uma sessão de cinema. “Aqui também vendemos os aperitivos, como num cinema: doces, salgadinhos, refrigerantes. Isso tudo, quando aliado às locações, ajuda no lucro da empresa”, conta França. 

O movimento da locadora de filmes é bem ativo. Por semana, a estimativa é que saiam cerca de 800 títulos. O valor do aluguel vai de R$ 5 a R$ 7. O cliente pode ficar com o filme por pelo menos um dia. “Nosso atendimento é diferenciado, porque só trabalham aqui pessoas que gostam de cinema e entendem do assunto. Acho que isso é um grande ponto para ter o estabelecimento ainda funcionando. A clientela que vem aqui é da mais variada possível, desde crianças e adolescentes, até ex-governadores”, comenta Jurandir França. Sobre como ter um negócio desse ramo nos dias atuais, França explica: “Só funciona para quem está no mercado há muito tempo, quem tem clientela fiel e um acerto realmente grande”.

A estudante de direito Ana Paula Teixeira consome os filmes alugados porque acha mais interessante. “É algo mágico pegar no filme, ver quem são os atores, os diretores, tudo”, opina. Ela frequenta locadoras principalmente por conta do acervo. “A quantidade de filmes é muito maior do que nesses locais como Netflix. Filmes estrangeiros também são difíceis de encontrar e em locadoras é tudo mais fácil nesse aspecto”, complementa.

O analista de Atendimento Individual do Serviço de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae), Vitor Abreu, explica que quem vai abrir ou tem um negócio em um ramo mais defasado mercadologicamente deve ficar atento ao que pode ser reinventado. “Primeiramente o empresário deve pensar qual o modelo sustentável para o negócio. Ou seja, como ele vai obter a forma mais reaproveitável possível. Ele também tem que ver a questão da praticidade. O que vai trazer de prático ao cliente? Quais rodutos devem ter que os outros locais não tenham? Tudo isso a pessoa tem que pensar e refletir”, explica. Sobre os exemplos de como manter o estabelecimento nessas condições, Abreu diz que o empresário deve dar valor ao estabelecimento oferecendo serviços diferenciados. “É interessante que a pessoa pense em agregar valor ao produto, associar com algum outro e ainda oferecer praticidade, muita praticidade. No caso das locadoras, por exemplo, pode ser oferecido o serviço de delivery, em que o cliente recebe o produto em casa. Ou ainda melhor: colocar os filmes em um acervo online. Da própria casa o cliente pode escolher e pagar por aquele título". 

A forma de ver filmes vem mudando desde sua criação até os dias atuais. O professor de cinema da Universidade Federal de Pernambuco, Rodrigo Carrero, explica que a forma de assistir filmes, desde a criação do cinema, passando pelas locadoras e chegando aos aplicativos on demand, vem mudando, mas ao mesmo tempo aproximando o sentimento de posse. “Antes a pessoa só podia assistir um filme se pagasse para ir a uma sala de cinema. O sentimento de coletividade era realmente algo enorme. Nos anos 90, com a ascensão das locadoras, quem locava o filme não era realmente dono daquele objeto, mas tinha a posse dele por alguns momentos. Com os anos 2000, a facilidade de comprar DVDs cresceu muito e, consequentemente, o consumidor se tornou dono daquilo que ele só tinha posse por certo tempo. Com o surgimento do Netflix e afins, o retorno da ideia de não ser dono voltou à mente dos consumidores”, explana o professor. 

 

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