UFPE compartilha nota contrária à declaração de Bolsonaro

UFRPE também divulgou posição da Andifes. Instituições não concordam com descentralização de investimentos nos cursos de Humanas

por Nathan Santos seg, 29/04/2019 - 17:42
Paulo Uchôa/LeiaJáImagens/Arquivo . Paulo Uchôa/LeiaJáImagens/Arquivo

Claramente, as declarações do presidente Jair Bolsonaro e do ministro da Educação Abraham Weintraub, sobre a descentralização de investimentos nos cursos de filosofia e sociologia, não foram bem aceitas por muitas entidades educadoras. Depois da Universidade de Pernambuco (UPE) repudiar a posição do governo federal, as Universidades Federal de Pernambuco (UFPE) e Federal Rural de Pernambuco (UFRPE) compartilharam, nesta segunda-feira (29), uma nota de autoria da Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior – Andifes.

De acordo com a nota da Associação, as instituições de ensino são “projetos do Estado” e não “simplesmente desse ou daquele governo”. No texto, a Andifes reage de maneira contrária à proposta do governo federal, referindo-se a essa sugestão como “medidas agressivas”.

Nas falas de Bolsonaro e do ministro da Educação, há a proposta de diminuir investimentos em sociologia e filosofia, passando os recursos para cursos como veterinária e medicina. “O objetivo é focar em áreas que gerem retorno imediato ao contribuinte, como: veterinária, engenharia e medicina”, disse o presidente por meio do Twitter.

Confira, a seguir, a nota na íntegra da Andifes compartilhada pela UFPE e UFRPE:

Cabe, pois, reagir às recentes notícias de que o governo federal pretende reduzir, com “medidas agressivas”, o financiamento para a área de humanas, nominando especificamente a Filosofia e a Sociologia. Ao tempo que reitera a necessidade de investimento adequado em todas as áreas do conhecimento, em conformidade com a história, a realidade e o plano de desenvolvimento de cada instituição universitária, a Andifes associa-se às manifestações de diversas associações científicas e de outros setores da sociedade civil que ora rejeitam com firmeza o anúncio de propósitos que antes denunciam desinformação, preconceito e estreita motivação ideológica, desconhecendo a autonomia universitária, a natureza da produção científica e a necessária colaboração entre as áreas do conhecimento.

Universidades são projetos de Estado e não simplesmente desse ou daquele governo. São, portanto, projetos de longa duração, para os quais colaboram todas as áreas do saber. Por isso, suas medidas elevadas respondem a interesses imediatos, mas também a interesses estratégicos da humanidade. Para realizar essa missão elevada, elas contam com autonomia consagrada na constituição federal – em particular, para a definição dos cursos que ministram, das pesquisas que realizam e das relações diversas que estabelecem com a sociedade.

 

Tendo a prerrogativa de decidir quais cursos devem ser ministrados, levam em conta, para isso, a especificidade do campo do saber, sua qualidade científica e acadêmica, a composição qualificada de seu corpo docente e, certamente, o interesse da sociedade, tanto imediato, quanto de longo prazo. Da mesma forma, é da essência das universidades procurarem a colaboração entre saberes disciplinares distintos, pois a cooperação íntima entre as diversas áreas do conhecimento encontra-se entre os valores definidores que distinguem as universidades e lhes permitem dar conta dos desafios colocados pela realidade. Cercear ou agredir uma área do conhecimento equivale, assim, a amesquinhar a própria ideia de universidade e a comprometer sua finalidade institucional.

Cabe, pois, reagir às recentes notícias de que o governo federal pretende reduzir, com “medidas agressivas”, o financiamento para a área de humanas, nominando especificamente a Filosofia e a Sociologia. Ao tempo que reitera a necessidade de investimento adequado em todas as áreas do conhecimento, em conformidade com a história, a realidade e o plano de desenvolvimento de cada instituição universitária, a Andifes associa-se às manifestações de diversas associações científicas e de outros setores da sociedade civil que ora rejeitam com firmeza o anúncio de propósitos que antes denunciam desinformação, preconceito e estreita motivação ideológica, desconhecendo a autonomia universitária, a natureza da produção científica e a necessária colaboração entre as áreas do conhecimento.

As universidades públicas são reconhecidas como um lugar fundamental de combate ao preconceito, à ignorância, ao atraso, à violência, sendo, destarte, instituições exemplares da civilização. A agressão à universidade por visões imediatistas desconhece sua tarefa permanente de produção de conhecimento e de formação de profissionais de nível superior, podendo significar um atraso tecnológico, cultural e científico em relação aos outros países, com prejuízos para as condições de vida e o bem-estar de nosso povo.

Nesse sentido, cabe registrar que a Andifes tem empreendido ações diversas de esclarecimento sobre o sentido e a importância das universidades públicas – instituições nas quais se realiza a quase totalidade da pesquisa em nosso país, sendo elas expressão de um ensino de qualidade e de laços fundamentais com a sociedade. Enfim, a Andifes saúda, em particular, a recente criação da Frente Parlamentar de Valorização das Universidades Federais, ao tempo que convida a comunidade universitária e os diversos setores da sociedade para a reflexão sobre o papel da universidade, que é, afinal, um patrimônio de todos e um símbolo característico de países que não comungam com o atraso econômico nem com o atraso cultural.

Brasília, 29 de abril de 2019

Reinaldo Centoducatte é reitor da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes) e presidente da Andifes – Associação dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior no Brasil

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