Como a tecnologia mudou a vida de quem aderiu a quarentena

No Dia do Trabalhador, profissionais de diferentes áreas contam como a tecnologia mudou sua rotina social e de trabalho durante o isolamento

por Katarina Bandeira sex, 01/05/2020 - 13:42
Arquivo Pessoal/Cortesia Professora da UFPE, Carlla Lyra, acredita que algumas mudanças de trabalho são positivas Arquivo Pessoal/Cortesia

Há pouco mais de um mês, quando começou a quarentena em Pernambuco, ninguém esperava que o isolamento social, criado para evitar a disseminação do novo coronavírus, fosse durar por tanto tempo. A quarentena, da forma como estamos vivendo, parecia uma realidade distante e que, quando chegou, obrigou milhares de pessoas a adaptarem seus modos de vida social e de trabalho. 

Um grande aliado do isolamento tem sido uso de dispositivos e ferramentas tecnológicas, que já estavam presentes em nossa rotina, mas que - neste momento de pandemia - viraram peças essenciais para que certas áreas de trabalho continuassem funcionando. Nesta sexta-feira (1º), Dia do Trabalhador, três profissionais, de diferentes áreas, contam como a quarentena alterou suas rotinas e - também - sua relação com a tecnologia.

“As primeiras semanas foram as mais difíceis”

Formadora de Língua Portuguesa do IQE (Instituto Qualidade no Ensino), Aline Alves viu um trabalho que era 100% de contato presencial, se transformar quase que completamente. Trabalhando com formação de professores de escolas públicas, ela ajudou a adaptar a rotina de outros profissionais e descobriu em ferramentas como o Teams, da Microsoft, um aliado.

“Os primeiros dias foram bem confusos, todos ficaram meio perdidos. Depois de uma semana, comecei a organizar melhor e planejar encontros virtuais para estabelecer algum tipo de comunicação com os formadores”, explica. No começo, os encontros aconteciam em vídeo chamadas pelo WhatsApp e Skype, feitos por iniciativa própria, e levados à empresa através de relatórios. “Depois de um tempo, após umas três semanas de quarentena, a empresa começou a se organizar quanto ao novo formato de formação o que foi um bafafá porque ninguém nunca tinha feito algo do gênero, não tínhamos recursos nem experiência para uma produção legal”, conta.

A dificuldade estava, principalmente, nos colaboradores que não tinham tanta intimidade com as ferramentas. “Para os funcionários jovens, tem sido mais tranquilo. Para os mais velhos, muitas vezes, um martírio”, desabafa. Depois dos tropeços iniciais a adaptação encontrou seu próprio ritmo. “Minha rotina, hoje, consiste em estudar sobre estudo remoto, a distância, produzir materiais voltados para esse formato associando ao que já trabalhávamos em Língua Portuguesa e planejar e executar formações via Teams. Daí estamos seguindo esse modelo, que consiste em quatro horas de estudos prévios à distância e quatro horas de formação virtual”, explica.

Microsoft Teams e Google Meet- A plataforma, usada por Aline, e por centenas de outras empresas, reúne bate-papo, videoconferências, armazenamento de arquivos e integração de aplicativos no local de trabalho. A própria Microsoft realizou diversas atualizações no produto, no mês de abril, para atender a demanda crescente de profissionais. Quem também aumentou a capacidade de usuários em uma mesma videochamada e melhorou a qualidade das transmissões foi o Google Meet. A ferramenta de videoconferências do Google, voltada para empresas, não apenas permite chamadas com 100 pessoas, mas também acesso a outros aplicativos da gigante, permanecendo gratuita até setembro.

VPN e a transformação da área de trabalho

Para Vinícius Xavier, faturista, a migração para o ambiente home office acabou sendo mais tranquila. “O setor de informática disponibilizou o acesso ao sistema e rede que a empresa utiliza. Em casa, consigo fazer exatamente tudo que eu fazia no escritório com relação ao trabalho, o que muda é a forma de contato com as pessoas, que agora é por mensagem ou ligação”, disse. 

Isso foi possível graças ao uso de uma VPN, ou Virtual Private Network (Rede Privada Virtual). A ferramenta permite o tráfego de dados de forma segura e também o acesso a uma rede interna da empresa, podendo criar o mesmo ambiente que era visto no computador do escritório, no ambiente domiciliar. Mesmo assim, foi essencial para o faturista que a organização que faz parte se disponibilizasse a fornecer os materiais necessários ao trabalho em casa. 

“Trouxe um celular da empresa para casa (que utilizo exclusivamente para o trabalho). O notebook é o meu pessoal, porém a empresa iria disponibilizar uma máquina, caso eu não possuísse ou preferisse”, afirma. Ele também explica que, como a companhia é integrada com outras filiais no Nordeste, o sistema já possuía uma versão remota. 

Começando do zero

Dentista e professora substituta da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), Carlla Lyra precisou começar do zero. “Tive que aprender a usar as ferramentas de reunião online, pois não tinha esse costume”. Doutoranda da Universidade de Pernambuco (UPE), ela conseguiu apenas manter as atividades de pesquisa, que já eram feitas remotamente, as aulas - muitas com necessidades presenciais - não tiveram como ser migradas para o ambiente virtual.

“A possibilidade de aula remota não foi aderida pela UFPE porque não há como se exigir que todos os alunos tenham acesso à internet e acesso a computadores em sua residência”, conta. Ela expõe outra dificuldade social que é: nem todos têm condições financeiras suficientes para adquirir computadores ou dispositivos eletrônicos que sejam compatíveis ao novo momento, principalmente alunos de instituições públicas. Muitas vezes, os estudantes possuem apenas o smartphone para dar andamento ao aprendizado.

“Atividades como planejamento, pesquisa, orientação, extensão, capacitação e qualificação, puderam ser mantidas e seguem sendo realizadas. As atividades que foram mantidas, são realizadas de forma individual e de forma coletiva através de reuniões com o departamento e com grupos de pesquisa”, conta. Nesses casos, a Carlla Lyra diz que aplicativos como o Hangouts e o Zoom, além do WhatsApp e do Gmail têm auxiliado no processo de elaboração coletiva.

O legado da quarentena

Dada das mudanças de rotina, a professora da UFPE acredita que, apesar das dificuldades que ainda são encontradas na migração das atividades presenciais para as virtuais, nem tudo é negativo. “Eu acho que funciona muito bem. Sempre foi difícil encontrar um horário comum para reuniões de pesquisa e extensão, principalmente com os alunos da graduação. As ferramentas que permitem que isso seja realizado remotamente, facilitarão bastante esse tipo de encontro. Acho que conhecer esse tipo de domínio e poder incorporar na rotina será um importante aprendizado dessa quarentena”, pondera.

Na concepção da pesquisadora a internet trouxe mais soluções do que problemas, porém, o momento criado pelo isolamento causado pela Covid-19 pede uma reflexão, principalmente na construção das relações sociais. “Ela [a internet] sempre nos afastou porque tínhamos a opção de estar perto e escolhíamos estar longe. Hoje, não podemos estar perto e ela se tornou a única forma de nos conectarmos. A internet virou a solução dessa aproximação, mesmo que virtual. Por outro lado, ela nos faz perceber o quanto isso não basta e o quanto isso nunca bastou e a gente não sabia. Acho que após esse isolamento daremos muito mais valor ao toque e aos encontros físicos. Temos percebido o quanto eles não podem ser substituídos nem pela melhor tecnologia do mundo”, finaliza

COMENTÁRIOS dos leitores