Livro com notas pessoais de João Paulo II provoca polêmica

qua, 05/02/2014 - 13:31
Gabriel Bouys (1999) João Paulo II Gabriel Bouys

Um livro contendo anotações pessoais de João Paulo II, que seu ex-secretário particular Stanislaw Dziwisz não queimou, contrariando a última vontade do Papa, foi publicado nesta quarta-feira (5) na Polônia, e levantou polêmica sobre a atitude de seu ex-assessor.

Em seu testamento divulgado após sua morte em 2 de abril de 2005, o Papa polonês pedia para que suas anotações pessoais fossem queimadas. Mas Dziwisz, atualmente cardeal e arcebispo de Cracóvia (sul da Polônia), decidiu manter os documentos e entregar parte das anotações à editora local Znak.

As reflexões teológicas de João Paulo II foram reunidas sob o título "Estou bem nas mãos de Deus. Anotações pessoais 1962-2003" em um volume de 640 páginas, acompanhadas por fotos e facsímiles.

"O Papa revelou um pouco de sua alma, de seu encontro com Deus, a contemplação, sua devoção, e é aí que reside o maior valor desta publicação", afirmou o monsenhor Dziwisz ao anunciar o lançamento em janeiro deste livro, com base em dois cadernos em que Karol Wojtyla registrou suas reflexões durante retiros espirituais.

Estas anotações, escritas em polonês com passagens em latim, em um estilo livre e variado, incluindo palavras soltas, meditações mais desenvolvidas, muito ricas em referências bibliográficas e cuidadosamente classificadas e datadas pelo autor, foram publicados em sua totalidade.

Antes da publicação, elas foram examinados pela Congregação para as Causas dos Santos, como parte do processo de beatificação de João Paulo II.

"Eu não tive dúvida. Estas são coisas importantes, que falam da espiritualidade, do homem, de um grande Papa, que teria sido um crime destruí-las", declarou o ex- secretário particular de Karol Wojtyla por quase 40 anos.

Mas sua opinião está longe de ser unânime na Polônia.

"Estas são notas pessoais. Deveriam ter sido queimadas, de acordo com o testamento, ou depositadas no fundo dos arquivos do Vaticano ou do arcebispo" de Cracóvia, disse à AFP Pawel Boryszewski, sociólogo da religião.

Segundo o padre Tadeusz Isakowicz-Zalewski, "a decisão sobre a publicação de notas pessoais do Papa é prejudicial".

"Esta é a violação de uma vontade. Ainda hoje, na cultura europeia, a última vontade é obrigatória", disse o padre em um site.

Em resposta a seus críticos, Dziwisz assegurou que "as anotações e correspondência que deveriam ser queimadas foram queimadas, destruídas".

No entanto, ele reconheceu que ainda tem outros manuscritos de João Paulo II.

A imprensa polonesa acusa o arcebispo de Cracóvia de rentabilizar a memória de João Paulo II, com a publicação de suas próprias memórias ou por distribuir as relíquias do futuro santo.

Uma parte dos lucros da publicação das anotações pessoais do falecido Papa será utilizada para financiar a construção de um Centro João Paulo II perto do Santuário da Divina Misericórdia em Lagiewniki , nos arredores de Cracóvia.

Este centro terá como objetivo "imortalizar o imenso patrimônio" do Papa polonês e de seu pontificado que durou 27 anos, de 1978 a 2005.

A canonização de João Paulo II, marcada para 27 de abril no Vaticano junto a do Papa italiano João XXIII, que liderou a Igreja Católica entre 1958 e 1963, coincidirá com o 75º aniversário do cardeal Stanislaw Dziwisz.

João Paulo II, primeiro Papa polonês da história, conservador e muito popular em mais de cem países onde levou a palavra da Igreja Católica, será canonizado em tempo recorde, apenas nove anos depois de sua morte.

Seu sucessor, o Papa Bento XVI escolheu ignorar o período obrigatório de cinco anos para estabelecer a causa de beatificação (ele foi beatificado maio 2011 ) e de canonização de seu antecessor.

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