Obama participa do 50° aniversário da marcha de Selma

Repressão brutal da passeata de 7 de março de 1965, exibida ao vivo pela televisão, comoveu a população dos Estados Unidos

sab, 07/03/2015 - 16:40
SAUL LOEB A família Obama desembarca em Montgomery, Alabama SAUL LOEB

Cinquenta anos após os passos dados por aqueles que lutaram pelos direitos civis nos Estados Unidos, e que tornaram possível sua chegada à Casa Branca, o presidente americano, Barack Obama, visita neste sábado (7) a cidade de Selma, Alabama, para recrutar uma nova geração nesta luta.

O primeiro presidente negro dos Estados Unidos lembrará o 50° aniversário da ousada marcha pacífica pelos direitos civis passando pela ponte Edmund Pettus, onde os manifestantes foram violentamente atacados pela polícia. A repressão brutal da passeata de 7 de março de 1965, exibida ao vivo pela televisão, comoveu a população dos Estados Unidos.

Acompanhado por sua esposa Michelle e suas filhas Sasha e Malia, Obama insistirá no fato de que os acontecimentos de meio século atrás não estão confinados em um único tempo ou lugar. No aniversário de "Selma não se trata apenas de comemorar o passado", declarou Obama na véspera da sua visita. "É sobre honrar, por meio da ação aqui e agora a imagem daqueles que ajudaram a mudar este país".

Há 50 anos, o combate tinha relação com o próprio funcionamento da democracia. Nos início dos anos 60, um grande número de obstáculos minava o caminho dos afro-americanos até o registro eleitoral: dos 15.000 habitantes de Selma, apenas 300 tinham direito a voto. A repressão da polícia, armada com cassetetes e gás lacrimogêneo, marcou a história da democracia americana.

Duas semanas mais tarde, milhares de pessoas lideradas pelo pastor Martin Luther King saíram novamente de Selma para seguir até Montgomery, a 90 km de distância, onde chegaram em um longo cortejo após vários dias de uma marcha entrou para história.

Em 6 de agosto de 1965, o presidente democrata Lyndon B. Johnson, que sucedeu John F. Kennedy, assinou a Lei de Direito ao Voto, garantindo a todos o direito ao sufrágio.

Antes da aprovação da lei, era mais fácil para estados como Alabama restringir o recenseamento eleitoral por meio de intimidação violenta e racismo burocrático. "Selma mostrou a coragem de pessoas comuns fazendo coisas extraordinárias em defesa de sua convicção de que poderiam mudar o país", disse o presidente. "Selma desafia cada um de nós sobre o que podemos fazer para tornar a América melhor. Historicamente, foram jovens como vocês que ajudaram a liderar essas marchas", ressaltou.

A história do que aconteceu em Selma no "Domingo Sangrento" voltou a ganhar destaque graças ao filme indicado ao Oscar que leva o nome da cidade e que foi estrelado por David Oyelowo como Martin Luther King.

Mas este sábado é particularmente relevante para a luta atual travada pelos líderes dos direitos civis contra os escândalos provocados pela brutalidade policial contra membros da comunidade negra nos Estados Unidos.

A poucos dias da data histórica, o Departamento de Justiça divulgou um relatório que aponta o racismo cotidiano e o comportamento discriminatório da polícia em Ferguson, que fica quase 1.000 km ao norte de Selma.

"Eu não acredito que o que acontece em Ferguson seja típico", disse Obama na sexta-feira, mas "também não é um incidente isolado". Apesar do "relatório contundente" sobre o Departamento de Polícia de Ferguson, o governo não processará a polícia pelo assassinato do adolescente negro Michael Brown. Obama declarou que apoiava a decisão do Departamento de Justiça.

- 'Luta contra a pobreza' -

Se a lei assinada em 6 de agosto de 1965 pelo presidente Lyndon Johnson permitiu a aplicação com mais eficiência da 15ª emenda à Constituição americana, que proíbe negar o direito ao voto a qualquer cidadão "com base em sua raça ou cor", o debate, no entanto, não foi encerrado.

O texto, base dos direitos civis, foi parcialmente colocado em julgamento em 2013 pela Suprema Corte, que considerou que o país "não está mais dividido como em 1965", e que a lei deveria evoluir.

Os democratas acusam sistematicamente os republicanos de acenarem com a alegação de fraude eleitoral para introduzir em alguns estados dificuldades adicionais à identificação de eleitores, com o objetivo de desestimular as minorias - que votam, majoritariamente, nos democratas - a comparecer às urnas.

"Não proteger energicamente o que foi conquistado (o direito ao voto, à informação) é desrespeitar os que fizeram estes sacrifícios", assinalou o pastor Al Sharpton, defensor dos direitos civis, ao chegar à ponte Edmund, onde uma multidão aguardava Obama.

"Avançamos muito, mas é hora de protestar, mais do que celebrar", acrescentou o pastor Jesse Jackson. "Devemos proteger o direito ao voto e discutir a questão da pobreza, que é uma arma de destruição em massa", defendeu o pastor, outro ativista dos direitos civis.

Em Selma, que registra uma taxa de desemprego superior a 10%, o dobro da média nacional, e onde cerca de 40% dos lares permanecem abaixo da linha de pobreza, a luta atual também é pela igualdade de oportunidades.

"Esta região experimentou muitos períodos de recessão, as pessoas precisam ter esperança", assinalou Dane Shaw, que dirige a Arsenal Place Accelerator, organização dedicada a ajudar e criar empresas. "Selma recebeu grande atenção por seu papel na luta pelos direitos civis. Mas seus moradores atuais querem o direito ao crescimento econômico".

Para Letasha Irby, 36, que trabalha em uma fábrica de autopeças, "há outras lutas para acontecerem no Alabama". "Se eles se uniram e formaram uma frente conjunta há 50 anos, isso pode acontecer hoje", comentou a operária, que ganha 12 dólares por hora e pede prioridade à luta "por salários decentes".

"Espero que as celebrações voltem a chamar a atenção para Selma, e que, uma vez mais, haja mudanças positivas", diz.

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