Esperança se renova para vendedores na Festa da Conceição

Sem autorização para barraqueiros, ambulantes e comerciantes tentam chamar atenção de fiéis com artigos religiosos para superar a crise financeira

por Victor Gouveia seg, 07/12/2020 - 17:59
Arthur Souza/LeiaJá Imagens Para enfrentar o desemprego, os ambulantes precisaram ter fé na fé dos adeptos de Nossa Senhora da Conceição Arthur Souza/LeiaJá Imagens

"Terço a partir de R$ 3, cinco fitas por R$ 1, R$ 5 faço dois calendários e a vela sai por R$ 2", é a proposta oferecida pelo ambulante Edvaldo Neto aos devotos de Nossa Senhora da Conceição. Em meio à crise financeira agravada pela pandemia, o desemprego é atenuado com a venda de artigos religiosos na 116ª Festa do Morro da Conceição, na Zona Norte do Recife. A oportunidade é recebida com a esperança de melhores condições em 2021. 

Em seu primeiro ano de vendas na Festa do Morro, Edvaldo trocou a rotina dentro dos coletivos pelo sol quente dos arredores do santuário. Sem certeza do retorno, investiu apenas R$ 800 e, mesmo com o público reduzido, sentiu potencial para seguir no ramo após o término da celebração. "Graças a Deus as vendas estão boas, pensava que ia ser ruim por causa da pandemia, mas a gente tá vendendo. Eu tô pensando em investir nisso daqui para continuar trabalhando", garantiu.

Sem emprego formal há três anos, Edvânia Rodrigues divide espaço com outros vendedores de calendário na saída da Imagem. Nos últimos cinco anos, ela alterna os 11 dias da Festa com o marido e consegue vender até 150 calendários nos fins de semana mais movimentados. "Eu nunca ia imaginar que ia tá isso tudo, mas tá ótimo. O pouco com Deus é muito", agradeceu.

Assim como Edvaldo, o objetivo de Edvânia é aproveitar a movimentação de pessoas na visita à Virgem Imaculada. O dinheiro das vendas será investido no próprio negócio, após o abatimento das dívidas de início de ano. "Vou pagar as coisas dos meus quatro filhos e do meu netinho, e vou botar um negocinho para mim de pastel", almeja a moradora do bairro do Cordeiro, na Zona Oeste do Recife.

Por outro lado, os tradicionais barraqueiros reclamam da proibição deste ano imposta pela Diretoria Executiva de Controle Urbano do Recife (Dircon). "Eu sei que essa doença voltou com toda a carga, mas acontece que a pandemia só é pra gente? A gente podia colocar uma barraca aqui, outra com dois metros, mas ninguém colocou", criticou Nanci Fernandes.

Ela trabalha na limpeza de uma unidade de saúde e conta que monta seu comércio todos os fins de semana do ano para complementar a renda. Com a restrição da Prefeitura, Nanci precisou alugar um terreno próximo a um dos acessos da igreja para não perder parte do seu rendimento habitual. "Não vai ser como eu vendo todo ano. Tá muito fraquinho, num tá vendendo nada. Tá pingando uma vela, uma água, uma santa" lamentou.

Com as dificuldades já previstas e o gasto fora do esperado, a comerciante conta que até os fornecedores espantaram-se durante as negociações. Em anos anteriores, ela lembra que comprava cerca de R$ 800 em artigos religiosos e, para 2020, adquiriu apenas R$ 257. "Ele chega falou assim, 'Nanci, só vai comprar isso?', eu disse 'claro, que não vou investir numa coisa que não sei como vou pagar'", relatou.

Para quem encerrava a comemoração com cerca de R$ 2.500 no bolso, Nanci faz planos, mas acredita que esse ano será difícil de alcançar o lucro projetado. "Sempre quando chega uma festa, a gente quer comprar uma televisão ou um objeto pra dentro de casa e fazer uma ceia mais reforçada, mas esse ano, infelizmente, não vai acontecer isso", queixou-se.

Em virtude da Covid-19, que já infectou 190.415 pessoas e matou 9.148 em Pernambuco, os administradores do santuário chegaram a enviar um ofício às paróquias da Região Metropolitana do Recife para que não haja romarias. Além da entrada restrita a cerca de 540 fiéis por missa, o acesso só é permitido com máscara de proteção e aferição da temperatura.

Os velários estão fechados ao público, oito pias foram instaladas na área interna e as cinco celebrações diárias são transmitidas simultaneamente no YouTube. Para esta terça (8), nove missas serão dedicadas à Santa.

As celebrações estão marcadas às 0h, 2h, 4h, 6h, 9h, 12h, 14h, 16h e o encerramento às 19h, com o culto presidido pelo arcebispo Metropolitano de Recife e Olinda, Dom Fernando Saburido.

COMENTÁRIOS dos leitores