"Tô nem aí para Lei Maria da Penha", diz juiz em audiência

Magistrado ainda afirma que aprendeu na vida de juiz que "ninguém bate em ninguém de graça"

por Jameson Ramos qua, 23/12/2020 - 20:16
Reprodução/Facebook Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara dos Deputado pediu apuração dos fatos Reprodução/Facebook

"Ninguém bate em ninguém de graça". Essa frase foi dita pelo juiz Rodrigo de Azevedo Costa, que atua na Vara de Família da Nossa Senhora do Ó, Zona Noroeste de São Paulo, para uma mulher, que participava da audiência de pensão alimentícia com guarda e visita aos filhos - ela já tinha sido vítima do ex-companheiro e tinha uma medida protetiva com base na lei Maria da Penha. 

Por conta da pandemia, as audiências estão sendo realizadas de forma online e sendo gravadas. O que deveria ser para resolver a vida dos filhos do ex-casal, acabou se tornando em um show de humilhação e machismo por parte do juiz.

Entre as colocações feitas pelo magistrado estão: “se tem Lei Maria da Penha contra mãe, eu não estou nem aí” e “uma coisa eu aprendi na vida de juiz: ninguém bate em ninguém de graça”, disse Azevedo Costa após ser informado pela advogada da vítima que ela já havia sido agredida pelo ex-companheiro.

O juiz prossegue: “eu não tô falando que esse de graça é porque a pessoa fez para provocar. De repente a pessoa que agrediu entende que a pessoa olhar pra ele de um jeito x é algo agressivo. Eu não sei o que passa na cabeça de cada um”.

Em um outro vídeo, onde Ricardo deveria tratar sobre a questão da guarda compartilhada, mais machismo e pouca importância para a realidade da mulher foi visto.

A audiência foi pedida por uma mulher, que não teve o nome revelado, e queria uma participação maior do seu ex-marido para cuidar das duas filhas do ex-casal, já que - por conta da pandemia e com as creches fechadas - estava complicado para ela deixar as meninas com alguém para poder ir trabalhar.

Em uma demonstração de preconceito, o juiz Rodrigo falou: "Ganha 1300 e quis ter dois filhos? Se não tem como cuidar, então dá para adoção, põe num abrigo".

Mesmo a guarda sendo compartilhada, o magistrado ainda culpou a mãe por ter ficado com a guarda das crianças. "Quem quis ficar com a guarda foi a mãe, tem que pagar este preço", disse. 

O juiz também faz uma declaração racista: "Se ele é mau pai, eu não tenho culpa. Eu vou fazer o que? Vou pegar este negão e encher ele de tapa? Não é meu trabalho este".

Comissão de Direitos Humanos

Nesta segunda-feira (21), Helder Salomão (PT), que é presidente da Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara dos Deputados (CDHM), pediu ao Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo a apuração da conduta do juiz durante a audiência. 

Segundo a assessoria, o documento foi enviado para o corregedor-geral de Justiça, Ricardo Anafe. “Repudiamos a atuação do juiz durante audiência virtual em um processo de guarda, pensão alimentícia e visita aos filhos menores no dia 9 de dezembro, que violou o direito à dignidade da mãe, vítima de violência doméstica, cujo agressor é o pai das crianças”, denuncia Salomão.

O ofício lembra que o “discurso do magistrado ignora o fato de que a cada 6 horas uma mulher é assassinada dentro de casa. Em 2018, foram mais de 3 mil mulheres mortas fora de casa e mais de mil e trezentas, assassinadas na própria residência, de acordo com números do Atlas da Violência 2020".

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