Desafios mundiais passam por intolerância religiosa

O dia 21 de janeiro marca o combate à intolerância religiosa no Brasil

sab, 21/01/2023 - 06:00
Fernando Frazão/Agência Brasil Religiosos participam de manifestação no Rio de Janeiro Fernando Frazão/Agência Brasil

O dia 21 de janeiro marca o combate à intolerância religiosa no Brasil. A data é uma forma de reforçar o diálogo inter-religioso e a troca intercultural como eixos fundamentais para solucionar os maiores desafios do mundo atual.

A data foi instituída em 2007 e homenageia a Iyalorixá Mãe Gilda. A ativista e líder candomblecista foi vítima de um infarto fulminante depois que o terreiro Abassá de Ogum, na Bahia, foi invadido duas vezes por membros de uma igreja cristã na virada dos anos 2000.

A religião católica chegou ao Brasil com a coroa portuguesa como a oficial do império e acabou marginalizando as práticas negras e originárias. Nessa realidade, índios e escravos precisaram recorrer ao sincretismo para que suas culturas sobrevivessem em meio à imposição da cultura dominante. 

"Foi-se gerando dentro do cristianismo uma certa dificuldade de respeitar e permitir que outras culturas vivessem a sua própria experiência religiosa. A ideia da conversão significa tirar o outro da sua religião, inserindo o cristianismo como sendo a única religião verdadeira", analisou o doutor e coordenador do curso de Teologia da Universidade Católica de Pernambuco, Sérgio Vasconcelos.

De acordo com o especialista, os maiores conflitos religiosos do mundo são provenientes do fundamentalismo. Apesar das diferenças naturais, o cristianismo, o judaísmo e o islamismo nasceram das raízes do patriarca Abraão. As três alimentam seus fieis com a ideia de missão e estão presentes na maioria desses conflitos. O cristianismo fala em anunciar a "verdade" ao mundo. O judaísmo defende a ideia do povo escolhido. Enquanto o islamismo cita a guerra santa.

Vasconcelos explica que apesar dos aspectos que podem culpabilizar essas religiões, a realidade dos ataques parte de dois pontos. O primeiro é a interpretação distorcida dos valores de cada religião e de suas escrituras. O segundo é a insegurança causada pelas revoluções que aceleraram o processo de globalização. 

O pesquisador define a religião como uma construção de estrutura de sentido para a existência humana. Antes, cada cultura construía seu sentido com a ilusão de que ele era único e universal. Entretanto, o mundo moderno fez com que a imensa pluralidade de ofertas de sentido tivesse contato.

"Uns vivem essa pluralidade com certa facilidade, mas outras pessoas, de outras culturas, dependendo dos seus contextos, vivem isso com muita insegurança. Quanto mais psicologicamente inseguro é uma pessoa ou um grupo, mais uma tendência fundamentalista ela tem. Por trás de todo fundamentalista há uma pessoal tipicamente insegura", observou o teólogo.

Nesse contexto, a religião acabou se distanciando da própria finalidade e expôs a necessidade de um diálogo comum na busca por respostas ao sofrimento humano. Mesmo com as estruturas diferentes, há temas que convergem na atual agenda mundial, como a luta por justiça social, a preservação da natureza e a paz. 

Esses assuntos são a válvula para mitigar os prejuízos da intolerância religiosa. Ao mesmo tempo, uma relação mais próxima vai promover um intercâmbio entre as riquezas éticas e simbólicas de cada crença.

"A maturidade psíquica convive com a pluralidade, o que não significa que eu aceito, mas eu sou capaz de respeitar que o caminho dele é outro", complementou Vasconcelos, que parafraseou o teólogo pós-moderno Hans Küng: "sem paz entre as religiões não haverá paz no mundo”.

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