Trava federal atrapalha desenvolvimento ambiental em PE

Políticas públicas voltadas para a questão ambiental são colocadas na gaveta do Governo Federal

por Pedro Bezerra Souza ter, 04/06/2019 - 15:14
Chico Peixoto/LeiaJa Imagens/Arquivo A parceria entre o Governo Federal e o Estadual precisa acontecer para que políticas ambientais tenham efetividade Chico Peixoto/LeiaJa Imagens/Arquivo

O Dia Mundial do Meio Ambiente é lembrado nesta quarta-feira, 5 de junho, e, neste período, a importância da preservação e conservação da fauna e flora brasileira ganha mais evidência nos holofotes nacionais. Porém, o que nem todo mundo percebe é que meio ambiente e política andam lado a lado e o desenvolvimento de uma, muitas vezes, depende diretamente da outra.

O governo do presidente Jair Bolsonaro (PSL) é marcado por polêmicas diversas desde o seu início, inclusive com relação ao meio ambiente. Por exemplo, um dos decretos assinados por Bolsonaro, na cerimônia que marcou os 100 dias de governo, trata do sistema de conversão de multas aplicadas pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente (Ibama).

A norma mantém os sistemas de conversão de multas possíveis, a conversão direta, quando o próprio autuado propõe um projeto e executa o serviço de recuperação do meio ambiente; e a conversão indireta, quando o autuado adere a um projeto pré-selecionado pelo Ibama e colabora com uma cota-parte para sua realização. Ambientalistas criticaram a medida porque essas mudanças no sistema de multas do Ibama pode inviabilizar recuperação estrutural de áreas degradadas.

Em entrevista ao LeiaJá, o cientista ambiental e professor de Infraestrutura do Departamento de Saneamento do Instituto Federal de Educação Ciência e tecnologia de Pernambuco (IFPE), Felipe Alcântara, disse que a legislação ambiental brasileira é extensa, completa e abrangente.

“Atualmente o que está no foco das discussões são as áreas protegidas. Há as de preservação (que isola a sociedade do convívio direto) e as de conservação (que é possível a convivência). Normalmente um governo de direita não entende a perspectiva do espaço que tem valor ambiental econômico estando ele conservado, preservado e protegido”, explicou.

O professor destaca que a questão da ideologia de um governo de direita atrapalha os avanços ambientais. “Os governos têm uma dificuldade de interpretar a importância de preservar e conservar mesmo nos dias atuais. Eu acho que a questão ideológica atrapalha um pouco a rever o que é realmente importante na política de estado”, pontuou.

Os impactos dessa falta de atenção dos gestores federais a esse tipo de pauta são notados a curto prazo. De acordo com Felipe, o momento é complicado para o meio ambiente. “Há a desconstrução de arquitetura, falta de fiscalização, ausência de desenvolvimento de programas efetivos de preservação. Sem falar nas questões do saneamento básico e recursos hídricos”, detalhou.

Avanços em Pernambuco

Diferentemente do caminho seguido nacionalmente, Pernambuco tem tomado outro rumo quando se fala em meio ambiente. Os avanços no estado são percebidos por meio das atividades realizadas com o objetivo de dar uma maior atenção às necessidades urbanas e naturais, respeitando sempre a preservação ambiental.

“Aqui criamos unidades de conservação estaduais e municipais nos últimos anos. Também houve a expansão de fronteiras de áreas de preservação ambiental e conservação. Vivemos uma agenda efetiva ambiental em Pernambuco”, citou Felipe.

Porém, nem tudo é bônus. Como uma reação em cadeia, o Brasil todo está interligado economicamente e, se o Governo Federal não cumpre seu papel financeiramente com a área, os estados e municípios são penalizados. É isso que atrapalha o desenvolvimento ambiental em Pernambuco.

“Vai chegar um momento em que vamos nos limitar por causa dos recursos, porque parte deles é da Federação. Os recursos de onde esses programas buscam apoiam também precisam de apoio do Governo Federal e, se ele não apoiar nessas mesmas perspectivas, os programas não vão ter mais a efetividade. Se a Federação não está disponível para o diálogo, ficará difícil avançar”, lamenta Felipe.

Cidades do interior de Pernambuco têm agendas municipais comprometidas com a questão ambiental. No Sertão do Pajeú, há áreas de preservação que são cuidadas com atenção pela gestão e comunidade local. Afogados da Ingazeira e Serra Talhada são exemplos de municípios que propagam a relevância dessas pautas.

“Porém, essas cidades dependem do estado e, principalmente, da articulação com o Governo Federal. Eu tenho medo que todos os projetos e perspectivas comecem a sofrer impacto por causa dessa despreocupação federal. A gestão do presidente Bolsonaro está indo no caminho contrário ao esperado. Eles diminuem fronteiras de áreas de preservação e fiscalização ambiental. Isso é muito preocupante”, comenta o ambientalista.

Floresta Amazônica: entender para cuidar

Um dos principais bens ambientais do Brasil, a Amazônia, está sempre no foco das atenções quando o assunto é a preservação ambiental. A área da floresta inclui territórios pertencentes a nove nações. A maioria das florestas está contida dentro do Brasil, com 60%; seguida pelo Peru, com 13%, e com partes menores na Colômbia, Venezuela, Equador, Bolívia, Guiana, Suriname e Guiana Francesa.

“A Amazônia faz parte de um grande mecanismo mundial de transferência de unidade. Ela não é um bem que pode ser discutido em uma única mesa. Ela tem que ser discutida de forma globalizada, numa perspectiva científica para a gente entender o benefício e a importância pra tomar boas decisões que a envolvam. As pessoas não entendem como funcionam esses mecanismos e terminam metendo os pés pelas mãos em suas opiniões e atitudes”, afirma Felipe.

Segundo o professor, é preciso conhecer o funcionamento da floresta para entender o que ela nos proporciona. Os governos não costumam repassar essas informações com propriedade, gerando, assim, uma população com pouca preocupação ambiental.

“Os processos naturais e os serviços ambientais promovidos pela Amazônia, como a purificação do ar, são importantíssimos. Se a gente não se apropriar disso, cairemos na ideia de que aquilo é um espaço a ser utilizado livremente, mas não é assim que funciona. Não podemos transformar numa a Floresta Amazônica em uma área de exploração”, esclarece o ambientalista.

Preço pago por não preservar

As consequências por não dar a devida atenção à preservação ambiental, como deveria ter sido dada enquanto era tempo, são sentidas nos dias atuais no âmbito local e nacional. Em Pernambuco, um dos principais problemas enfrentados tem a ver com a questão da água.

O professor Felipe Alcântara explana que “85% da água de superfície em Pernambuco não apresenta condições de uso direto. Para piorar, o estado não tem previsão de água subterrânea, que é uma água melhor. Hoje em dia nós não temos como ter um abastecimento pleno e saudável e isso é fruto de um impacto ambiental acumulado ao longo do tempo”.

A questão do uso de agrotóxicos, que constantemente anda sendo falada dentro do Ministério da Agricultura, liderado pela ministra Tereza Cristina, também é outro ponto a ser lembrado. No último mês de maio, o Ministério liberou 31 novos agrotóxicos. Já são, no total, 169 registros autorizados em 2019 - mais de um por dia. Nenhum deles tem princípio ativo novo, são igualmente tóxicos aos já usados no país.

“Existe uma falta de fiscalização sobre o uso de agrotóxico. Gastamos muito hoje em dia para tratar a água, por exemplo. Estamos vivendo dentro de uma perspectiva de consumir água de má qualidade de olhos fechados e sem saber efetivamente o que está causando algumas doenças recorrentes. É preciso ficar atento porque o agrotóxico mata”, alertou.

 

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