Uma prova, várias possibilidades

Por meio da nota do Enem, brasileiros podem participar de vários programas educacionais. Só o ProUni e o Sisu somam mais de 3 milhões de estudantes atendidos

por Nathan Santos qua, 01/11/2017 - 10:10
Paulo Uchôa/LeiaJáImagens Talina fez o Enem e realizou o sonho de cursar medicina de graça Paulo Uchôa/LeiaJáImagens
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O acesso à educação de qualidade sempre foi mote de discussão no contexto das desigualdades sociais do Brasil. Chegar à universidade, por exemplo, não contemplava a grande massa da população brasileira. A oportunidade era para poucos. No entanto, por meio de uma política de democratização do ensino superior, o Enem tornou-se uma ferramenta mais do que fundamental e abriu portas para jovens que, até então, viam o sonho do diploma em um patamar distante.

Em 2010, o governo federal criou um processo seletivo destinado à entrada de brasileiros em universidades públicas. Gerenciado pelo Ministério da Educação (MEC), o Sistema de Seleção Unificada (Sisu) surgiu em meio a polêmicas e dúvidas sobre se beneficiaria ou não os candidatos, até então submetidos a diferentes vestibulares que permitiam o ingresso nas instituições de ensino superior; o debate girava em torno de uma mudança drástica nas seleções, que eram independentes e apresentavam critérios seletivos diferentes de uma para outra universidade. Além do Sisu, o sistema de cotas também representou um marco importante e necessário na educação brasileira. Todos esses recursos têm em comum a utilização das notas do Enem para selecionar os candidatos.

Todos os candidatos interessados em participar do Sisu devem ter feito Exame Nacional do Ensino Médio. Quando o Sistema abre inscrições pela internet, o candidato precisa escolher, por ordem de preferência, até duas opões de cursos e em qual universidade pretende estudar. Caso o participante não se encaixe no sistema de cotas, ele concorrerá no grupo de ampla concorrência.

A depender da nota obtida no Enem – divulgada geralmente no mês de janeiro -, o estudante pode ocupar a primeira opção de curso e realizar a matrícula na universidade. Caso seja selecionado para a segunda opção, ele também pode mostrar o interesse de tentar ingressar na primeira graduação almejada participando de uma lista de espera; havendo desistências ou perca de prazos dos selecionados nas primeiras opções, as vagas serão repassadas aos candidatos da relação de espera.



As primeiras inscrições para as edições do Sisu abrem sempre no início de cada ano. As vagas iniciais são para entrada no primeiro semestre e, na metade do ano, o processo seletivo destina oportunidades para o segundo semestre. As universidades federais adotaram o Sistema para o ingresso de novos estudantes, porém, utilizam pesos diferentes nas notas a depender da graduação. Confira todas as informações sobre o processo seletivo no site oficial do Sisu.

Direito à educação pública

Aos 26 anos, Eduardo Cavalcanti comemora duas importantes conquistas em sua vida. A primeira, uma formação superior no curso de serviço social. A segunda e mais recente é motivo de orgulho não apenas para ele, mas também para os amigos de infância que acompanharam o jovem recifense se dedicar a horas e horas de estudo. Em 2016, após ter participado do Enem, foi aprovado para a graduação de direito via Sisu na Universidade Federal de Pernambuco (UFPE). Um marco, segundo ele, que representa bem mais do que um novo diploma.

Eduardo viu de perto os resquícios de uma comunidade periférica do Recife onde nem todas as pessoas tiveram a oportunidade de se dedicar aos livros. Mas nesta mesma comunidade onde nasceu e construiu sua família, acompanhou a evolução do Enem como principal porta de entrada no ensino superior brasileiro; durante toda sua vida escolar, Eduardo foi aluno de escola pública e afirma, sem dúvidas, que o Exame Nacional do Ensino Médio democratizou a educação brasileira.

Na Faculdade de Direito do Recife, uma das mais importantes instituições de ensino do Brasil, o jovem relembra os momentos de dificuldade. Revive seu árduo caminho na educação, pois depositou nos livros a esperança por uma vida melhor para ele e seus familiares. Hoje, já está no segundo período do curso e participa de projetos de extensão que têm o objetivo de levar contribuições para a sociedade; ele presta serviços jurídicos para pessoas privadas de liberdade.

“Quando o Enem abriu oportunidades e graças ao sistema de cotas, democratizou bastante a educação. Antes a gente tinha pequenos percentuais de negros e pobres na universidade e hoje, por meio do Enem, temos uma população bem maior no ensino superior. Quando uma pessoa de origem pobre, como eu, chega à universidade, acaba virando um exemplo de superação para as outras pessoas de comunidades periféricas”, relata o estudante.

“Acredito que o Enem, atrelado ao Sisu, foi muito importante para os brasileiros. Sem ele, acredito que a gente estaria com a população de baixa renda ainda distante do ensino superior. Ainda não somos 100% contemplados, mas já temos um acesso interessante das camadas mais pobres nas universidades”, complementa Eduardo, que traz mais detalhes da sua trajetória no vídeo a seguir:

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Enem também levou brasileiros às universidades privadas

Outra importante ferramenta nacional de fomento à educação de nível superior, o Programa Universidade Para Todos (ProUni), criado pelo governo federal em 2005, também é fundamental para o processo de entrada dos brasileiros nas universidades. De acordo com MEC, só neste ano foram ofertados mais de 63 mil cursos em instituições privadas de ensino. Assim como o Sisu, o ProUni seleciona candidatos por meio das notadas obtidas no Enem.

Com oportunidades distribuídas em todo o território nacional, o ProUni oferece bolsas integrais e de 50% em universidades privadas. Podem ser beneficiados brasileiros que finalizaram o ensino médio em escolas públicas ou em unidades de ensino particulares na condição de bolsistas, e até então não cursaram uma graduação; também devem ter feito o Enem do ano imediatamente anterior à edição do Programa, bem como é necessário nota mínima de 450 pontos. Na redação, em nenhuma hipótese, deve ter nota zero; Veja essas e outras exigências no site oficial do ProUni.

Natural da cidade de Surubim, no Agreste de Pernambuco, a jovem Talina Tassi, de 20 anos, expressa no sorriso a alegria em chegar ao ensino superior. E não é para menos. Há três anos, ele conseguiu realizar o sonho de cursar medicina de maneira gratuita; foi aprovada na UNINASSAU – Centro Universitário Maurício de Nassau – localizado no Recife -, por meio do ProUni.

“Fui bolsista de escola privada, a minha mãe era professora. Mesmo mais nova, já sabia que queria cursar medicina. Sempre ficava incomodada em ver uma pessoa passando mal e não poder ajudá-la. No entanto, foi muito complicado ingressar no curso pela ampla concorrência, mas, graças a Deus, meus pais nunca deixaram de me apoiar”, diz a jovem estudante.

De acordo com Talina, a única forma de estudar medicina seria em uma universidade pública ou na condição de bolsista integral na rede privada. Ela afirma que sua família não teria condições financeiras de arcar com os custos da graduação. A pernambucana resolveu focar nos conteúdos pedagógicos do Enem e não se prendeu às características dos processos seletivos. “Eu aprendia o conteúdo do Enem e não estudava para vários vestibulares. O foco sempre foi o Enem, porque se eu fizesse um bom exame, teria chances de entrar no ProUni ou Sisu, por exemplo”, explica.

A estratégia adotada por Talina teve êxito. Depois de ter feito um bom Enem, conseguiu a bolsa integral no curso de medicina da UNINASSAU. “Foi uma sensação incrível, é muito bom ver essa forma de inclusão social por meio do Enem. Estou satisfeita, é muito gratificante”, comenta a universitária, que pretende se especializar em pediatria.

O Enem também é o processo seletivo do Fundo de Financiamento Estudantil (Fies). Estudantes brasileiros podem ter seus cursos de graduação financiados pelo governo federal e, apenas depois da formação concluída, arcarão com os pagamentos do financiamento.

Os candidatos interessados no Fies devem ter tido nota tido nota mínima no Enem de 450 pontos. Eles também não podem ter zerado a prova de redação. Outra exigência, de acordo com o MEC, é que os participantes do Fies precisam comprovar renda familiar mensal de até três salários mínimos. Mais informações podem ser obtidas no site do Fundo.

Reportagem integra o ‘Especial Enem: da prova ao sonho do ensino superior’, produzido pelo LeiaJá. As matérias abordam a história do Exame e de que forma ele se tornou uma das principais provas educacionais do Brasil. A seguir, leia as demais reportagens:

--> A origem do Enem e o trajeto evolutivo da prova

--> A popularização do Enem e o caminho rumo à universidade

--> Enem mudou características dos cursos preparatórios

--> Uma prova em busca de inclusão

--> Exame como porta de entrada para Portugal

--> Enem 2017: entenda a dinâmica da prova

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