Uma saudade chamada Pátio de São Pedro

Espaço localizado no coração do Recife já foi um dos principais locais da cultura viva do Recife, com eventos como a Terça Negra, mas hoje carece de atenção e sofre com a falta de eventos e atrativos

por Paula Brasileiro sex, 01/09/2017 - 11:00
Chico Peixoto/LeiaJá Imagens Localizado no coração do Recife, o Pátio de São Pedro amarga o abandono Chico Peixoto/LeiaJá Imagens

Na última terça-feira, por volta das 18h, o Pátio de São Pedro, no Bairro de Santo Antônio, região central do Recife, estava em silêncio. As mesas do único bar que insistiu em se manter aberto até aquele horário já iam sendo recolhidas, pois ninguém viria sentar nelas. Essa tem sido a rotina no largo da Igreja de São Pedro há algum tempo, pois o espaço, que já foi um dos mais movimentados da vida cultural da cidade, já não abriga eventos ou qualquer atrativo noturno. O Pátio não parece mais atraente para os recifenses.

"Se fosse há uns dois anos isso aqui ia estar cheio de gente. Ainda mais hoje, que é terça, e tinha a Terça Negra". A afirmação em tom de pesar  é de Roberto Carlos, garçom do bar que funciona na casa 48 do Pátio. Ele arrumava o estabelecimento para encerrar o expediente, em pleno 'happy hour', enquanto relembrava do período em que começou a trabalhar no local. Ele diz que com a ausência de eventos os clientes não aparecem, o que prejudica o faturamento e altera o próprio horário de funcionamento do bar. Roberto, que antes de trabalhar no lugar costumava ser um dos seus frequentadores nos momentos de lazer, sentencia: "Agora isso aqui está abandonado".

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O evento mencionado por Roberto, a Terça Negra, foi responsável por lotar o largo de São Pedro por 16 anos. A noite que reunia atrações da cultura afro, como maracatus, cocos, afoxés e grupos de hip hop, já chegou a colocar cerca de três mil pessoas no Pátio. A festa parou de ser realizada desde o Carnaval de 2017 por falta de apoio da Prefeitura do Recife. Demir da Hora, produtor da Terça Negra, conta ao LeiaJá que já recorreu ao poder municipal três vezes, desde então: "Não tem dinheiro! É essa a resposta que eles sempre dão".

Demir afirma que para a realização da Terça Negra não é necessária uma grande estrutura. Apenas de um aparato de som, dois funcionários da PCR durante o evento para sua organização e a utilização da casa de apoio do local, que serve de camarim para os artistas. Essa foi a ajuda oferecida pela prefeitura até o último Carnaval, quando aconteceu a derradeira edição da festa. "A Terça Negra era uma opção de diversão num dia atípico, a terça-feira. Sem contar na importância de um evento como esse para a cultura negra, que ganhou visibilidade e espaço", lamenta o produtor.

Durante o dia, a situação no Pátio não é muito diferente. Alguns bares e restaurantes abrem as portas, mas são poucos os clientes. Em algumas casas, quatro, mais exatamente, equipamentos culturais da Prefeitura da Cidade do Recife (PCR) se mantêm à espera de visitantes, que precisam de algum esforço para identificá-los devido à ausência de indicações e placas. Atualmente, estão em funcionamento o anexo da Casa do Carnaval, o Núcleo de Cultura Afro, o Memorial Chico Science e Memorial Luiz Gonzaga e, em manutenção, segundo a assessoria da PCR, o Museu de Arte Popular, o Centro de Design do Recife e Mamam no Pátio.

Amor e resistência

Movidos por essas duas forças, a empreendedora Paula Santa, o jornalista Ronaldo Patrício e o consultor Zé Carvalho se uniram para movimentar o Pátio de São Pedro. Eles criaram o Pátio Criativo, um coletivo que, na casa 52 do largo, oferece brechó, oficinas de arte e eventos. O início dos trabalhos, em 2017, foi recebido com incredulidade pelos antigos comerciantes do local: "Eles diziam que estávamos loucos e que não ganharíamos dinheiro porque o Pátio está abandonado". Mas com espírito de resistência, o trio já realizou três edições do Fuá no Pátio, com artistas locais e a participação de todos os bares do entorno, que acabaram motivados a formarem também um coletivo para correr atrás da manutenção do espaço.

Paula conta que o espírito do coletivo é retomar a vida do Pátio, lugar cativo na memória afetiva dela e de seus companheiros de luta: "Ver o estado em que se encontra o Pátio hoje é triste. As pessoas chegam aqui sempre com saudosismo". Em setembro, o coletivo já tem agendado uma nova edição do Fuá no Pátio, para o último fim de semana do mês. Também está na pauta do coletivo articular uma audiência pública na Câmara dos Vereadores sobre o abandono do Pátio de São Pedro.

Poder público

Procurada pelo LeiaJá, a Prefeitura do Recife se manifestou sobre a situação atual do Pátio de São Pedro por meio de sua assessoria. Eles afirmaram que “todos os equipamentos, instalados em prédios históricos, estão passando por um processo de diagnóstico, reordenamento e avaliação para que a população continue dispondo de serviços culturais qualificados. A previsão é de que esse estudo seja concluído em breve.” E explicou a ausência de identificação no largo: “Por orientação da Diretoria de Preservação do Patrimônio Cultural (DPPC) não foram instaladas placas individuais para cada equipamento, a fim de preservar as características originais do conjunto arquitetônico do Pátio. Já existe uma nova proposta de sinalização sendo discutida pela Secretaria de Turismo, Esportes e Lazer e DPPC para o pátio.”

Sobre a paralisação das atividades da Terça Negra, a Prefeitura diz que “após um hiato de alguns meses, motivado por dificuldades orçamentárias, a programação da Terça Negra, oferecida mensalmente com apoio da Prefeitura do Recife, será regularizada a partir de novembro, mês em que se celebra a Consciência Negra” e disse estar “permanentemente aberta para o diálogo com os comerciantes da área”.

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