Escritores paraenses buscam romper isolamento literário

Autores consagrados enfrentam concorrência com best-sellers e travam batalha por leitores dentro e fora do Estado

sab, 20/03/2021 - 19:54

Segundo o dramaturgo Nelson Rodrigues, o brasileiro possui o “complexo do vira-lata”, ou seja, deprecia sua própria cultura e supervaloriza as culturas vindas do exterior. Esse conceito, apesar de ter sido desenvolvido em 1950, se aplica no cenário atual, principalmente em relação à literatura regional.

A produção literária paraense tem autores talentosos, mas sem a projeção que merecem no eixo Sul-Sudeste. Livros estrangeiros ou produzidos fora da região Norte tomam conta dos catálogos das livrarias. 

Para Filipe Larêdo, professor e escritor, filho do também escritor Salomão Larêdo, leituras globalizadas afastam os leitores das obras regionais. “O leitor, hoje, está cada vez mais direcionado para os grandes best-sellers, que são aqueles livros com comoção mundial (lançamentos de séries e filmes inspirados nesses livros). Então, a literatura vinda da Amazônia, fora dos grandes centros, faz com que se resuma a poucos autores”, afirma.

O premiado escritor e jornalista Edyr Augusto Proença conta sobre sua experiência com o público: ”Precisamos ser reconhecidos. Estou com o quinto livro na França e no entanto, aqui em Belém, ao chegar para falar para as pessoas, preciso sempre dizer ‘muito prazer, sou um escritor’”.

Além do desinteresse do público, a inserção dos livros paraenses no segmento jovem estudantil é ainda muito escassa. “É extremamente necessário que a literatura paraense, que não seja a folclorista, entre nas escolas, na formação dos alunos. Inserir, mostrar para a criança e para o adolescente, desde novos, que eles podem encontrar entretenimento na ficção feita no seu Estado é muito benéfico para a formação do leitor e do cidadão”, diz Filipe Larêdo.

Sem apoio estatal, as dificuldades aumentam. Edyr Proença considera essencial a literatura paraense para o desenvolvimento e integração do Estado. Além disso, o jornalista pontua a importância de projetar a região para o mundo. “Escolhi falar sempre da minha cidade, usar termos bem paraenses no texto, até nos títulos. É uma maneira de gritar para que saibam de onde eu sou. Internacionalmente também funciona. Estava em Saint Malo, Bretanha, me apresentando com dois outros escritores, eles do Rio e SP. Oitocentas pessoas na plateia de um teatro. Meus dois colegas falaram do Brasil deles. Na minha vez, comecei a contar de onde vinha, da perplexidade entre uma floresta de concreto fincada na maior floresta tropical do mundo”, conta.

Filipe conclui com um conselho: “É sempre importante que façamos nosso dever de casa. Se o povo paraense começar a consumir a literatura regional, naturalmente os de fora vão olhar para nós’’.

Por Haroldo Pimentel e Roberta Cartágenes.

 

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