Animais 'mudos' se comunicam vocalmente, diz estudo

O estudo, publicado na Nature Communications, identifica 50 espécies de tartarugas e três "animais muito estranhos" considerados mudos

ter, 25/10/2022 - 14:57
Aline Arruda Santos/Flickr Tartarugas 'conversam' na beira de lago Aline Arruda Santos/Flickr

Mais de 50 animais considerados mudos, incluindo tartarugas, na verdade têm alguma forma de expressão vocal, de acordo com um estudo publicado nesta terça-feira (25), que questiona o ancestral comum dessas espécies há mais de 400 milhões de anos.

Tudo começou durante uma viagem de pesquisa sobre tartarugas na floresta amazônica brasileira, explica o principal autor do estudo, o biólogo evolucionista Gabriel Jorgewich-Cohen.

"Quando voltei para casa, decidi gravar meus próprios animais", incluindo Homer, uma tartaruga que tinha desde criança.

Para sua surpresa, descobriu que Homer e outras de suas tartarugas emitiam sons vocais. Ele então começou a gravar outras espécies de tartarugas, às vezes com um hidrofone, um microfone que permite gravar debaixo d'água.

"Todas as espécies que gravei produziam sons (...) então nos perguntamos quantos outros animais considerados mudos produziam esses sons", explica Jorgewich-Cohen, pesquisador da Universidade de Zurique.

O estudo, publicado na Nature Communications, identifica 50 espécies de tartarugas e três "animais muito estranhos" considerados mudos. Entre eles estão o "lungfish" [peixe chamado dipnoico, que tem um pulmão além de suas brânquias] e as "cecílias", anfíbios em forma de verme.

A equipe também gravou os sons de uma espécie rara de réptil encontrada apenas na Nova Zelândia, a tuatara.

Todos esses animais produzem sons vocais estalando ou borbulhando, mesmo em repouso ou apenas algumas vezes ao dia, de acordo com o estudo.

- Ancestral comum -

Os pesquisadores cruzaram suas descobertas com dados sobre a história evolutiva da comunicação acústica de 1.800 outras espécies animais.

Para isso, usaram uma técnica conhecida como reconstrução ancestral, que calcula a probabilidade de uma característica ser comum a várias espécies no passado.

"Descobrimos que o ancestral comum desse grupo já produzia sons e se comunicava intencionalmente com a ajuda desses sons", disse o pesquisador.

Até agora, os cientistas pensavam que os tetrápodes - animais de quatro patas, como as tartarugas - e os peixes pulmonados evoluíram separadamente em relação às formas de comunicação vocal.

"Mas agora mostramos o contrário, eles vêm do mesmo lugar", explica.

Este ancestral comum viveu pelo menos 407 milhões de anos atrás, durante a era paleozoica, de acordo com o estudo.

A ideia de que "a comunicação acústica apareceu em um ancestral comum de peixes pulmonados e tetrápodes é interessante e surpreendente", disse à AFP John Wiens, professor de biologia evolutiva da Universidade do Arizona.

Mas, segundo ele, os autores do estudo não "distinguiram necessariamente entre o que é produção de som por parte dos animais e o que é comunicação acústica".

No entanto, o principal autor da pesquisa explica que os cientistas compararam as gravações de áudio e vídeo dos animais para verificar em que medida correspondiam a determinados comportamentos. O objetivo era garantir que "esses sons fossem realmente usados para comunicação", disse Gabriel Jorgewich-Cohen.

O professor Wiens, que em 2020 publicou um estudo sobre as origens da comunicação acústica em vertebrados, saudou esses novos dados sobre novas espécies, ao mesmo tempo em que pediu "análises mais rigorosas".

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