Covaxin: aliado diz que Bolsonaro sabia de irregularidades

Em áudio, o deputado Luís Miranda (DEM-DF) confirma não apenas a notificação, mas também que o presidente o agradeceu e estava convencido a tomar providências

por Vitória Silva qua, 23/06/2021 - 14:24
Reprodução/Instagram O deputado Luís Miranda ao lado de Jair Bolsonaro. Reprodução/Instagram

O deputado Luís Miranda (DEM-DF) revelou ter informado pessoalmente ao presidente Jair Bolsonaro sobre as suspeitas de irregularidades no contrato de compra da vacina Covaxin. Em áudio, o parlamentar, que era bolsonarista, afirma ter entrado diretamente no conflito após a imagem do seu irmão, servidor do Governo, passar a sofrer calúnia a nível nacional. Durante ligação telefônica, ele ainda afirmou que o presidente, além de ciente, se dispôs a levar a denúncia imediatamente à Polícia Federal, o que nunca aconteceu. O contrato com o laboratório da vacina indiana acabou sendo fechado em março deste ano, apesar dos valores estarem inflados em cerca de 1000%.

O parlamentar é irmão de Luís Ricardo Fernandes Miranda, chefe da divisão de importação do Ministério da Saúde, e também a pessoa que deveria assinar a liberação do contrato supostamente irregular com a empresa. Ricardo relatou ao Ministério Público Federal (MPF), em depoimento no dia 31 de março, ter sofrido pressão incomum para assinar o documento.

“Eu levei para o presidente baseado no contrato e no pedido de pagamento. Primeiro falei que estavam acontecendo coisas no Ministério da Saúde que o senhor (presidente) vai precisar agir. Ele falou com todas as letras ‘deputado, é grave. Obrigado por trazer isso para mim, isso é grave, gravíssimo. Vou entrar em contato agora com o DG (delegado geral) da Polícia Federal e encaminhar a denúncia para ele’. Era caso de polícia, não de investigação”, afirmou o deputado, que está junto ao irmão durante ligação.

A notificação foi feita ao presidente após a assinatura do contrato, ainda em março, quando ainda era possível revogar o documento antes da tramitação ocorrer. Segundo Miranda, há também uma confusão sobre o destino do dinheiro, que não vai para empresas diretamente envolvidas no contrato. Miranda possui a mesma base que o chefe do Executivo, a de ser "anti corrupção", e já participou de diversas reuniões com o PR.

“Confio tanto nele no combate à corrupção que levei para ele. A bandeira, a plataforma do presidente é o quê? O combate à corrupção. Quando vi corrupção clara ali, indícios de algo errado, enviei ao PR. Quando entrego para ele, eu comento que é o mesmo grupo econômico que recebeu por medicamentos do Ministério da Saúde e não entregou. Só por isso aí não deveriam fazer negócio com eles. Mas, além de tudo, emitiu invoice (nota fiscal) de pagamento, meu irmão tava recebendo uma p*ta pressão de coronéis, gente da cúpula do governo, para fazer o pagamento de uma invoice, por uma vacina que não tem Anvisa, um pagamento em descompasso com o contrato”, esclareceu.

E continua: “E pior, o nome da empresa que vai receber o pagamento não é nem a que tem contrato com o Ministério da Saúde e nem a intermediária. É uma loucura. Fora as quantidades, o contrato previa quatro milhões na primeira entrega e só tem 300 mil nessa invoice”.

A compra das vacinas

Documentos do Ministério das Relações Exteriores mostram que o governo comprou a vacina indiana Covaxin por um preço 1.000% maior do que, seis meses antes, era anunciado pela própria fabricante. Telegrama sigiloso da embaixada brasileira em Nova Délhi de agosto do ano passado informou que o imunizante produzido pela Bharat Biotech tinha o preço estimado em 100 rúpias (US$ 1,34 a dose).

Em dezembro, outro comunicado diplomático dizia que o produto fabricado na Índia "custaria menos do que uma garrafa de água". Em fevereiro deste ano, o Ministério da Saúde pagou US$ 15 por unidade (R$ 80,70, na cotação da época) — a mais cara das seis vacinas compradas até agora.

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