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"Falo Mal de Chico e perco dúzias de Amigos"

Crisiano Ramos, | seg, 22/08/2011 - 09:11
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Nas segundas-feiras, a coluna Redor da Prosa traz crônicas, que não devem ser lidas por gente séria demais, sob hipótese alguma.

A voz do outro lado do telefone era mesmo de um senhor com 76 anos e bocado de desânimo. “Você quer mesmo me entrevistar?”, Moacir C. Lopes perguntou, mas não duvidava realmente que houvesse gente interessada em ouvi-lo. O autor de Maria de cada porto e A ostra e o vento estava era com bala já na agulha, queria usar a oportunidade para descascar a própria mídia.

Semanas antes, naquele 2003, ele se deu ao trabalho de contabilizar quantas críticas, resenhas e colunas foram dedicadas ao lançamento de Budapeste, de Chico Buarque. “Foram mais de dez textos, isso contando só os três primeiros jornais que li. Não digo que ele é mau escritor, mas essa coisa orquestrada é que não agüento”. E pediu: “Explique direito o que penso, porque, toda vez que falo mal do Chico, devo perder uma dúzia de amigos”.

Lembrei-me dessa conversa em evento recente, no Teatro Hermilo, quando Jomard Muniz de Britto me fez dura reprimenda – como de costume – porque eu havia dito que sou violentamente constrangido se confesso que não gostei de todos os filmes iranianos exibidos no Cinema da Fundação (teve um ou dois muito chatos, de dormir e babar).

E, por causa desta coluna Redor da Prosa, pelo texto publicado, que discute o tal “domínio da narrativa”, clichê repetido sempre que Raimundo Carrero sai com livro novo, umas cinco pessoas me excluíram de suas redes sociais. É uma sopa fria de números; se fico mexendo o caldo, imagino quantos outros desafetos juntei por coisas assim. Quantos, então, ainda posso conquistar?

Porque não gosto do João Bosco. Antigamente, eu tinha abuso quando conseguia entender o que ele cantava. Agora, com as letras todas na internet, agonia é de trincar os dentes. Como nessa música da novela (e não me venha explicar que é ironia, porque sei faz tempo, isso não me alenta): “Minha pedra é ametista / Minha cor, o amarelo / Mas sou sincero / Necessito ir urgente ao dentista”. Há canções dele de que não desgosto. Porém, nada que evite a dor de dente que as outras causam.

Também não sou chegado em Pablo Neruda. Verdade que tem uns versos bons, até porque escrevia em ritmo de mão-de-obra chinesa, algo tinha que se salvar. Quando estou apaixonado, até assomam outros bons sentimentos pelo bardo chileno. Ou seja, esta coluna veio em hora bastante amena.

Quem aí falou em Ferreira Gullar? Pelo poeta, tenho apreço mesmo! Ele escrevendo em prosa, contudo, deixa-me embrulhado. Seus textos saem crescendo como puxadinho, um cômodo torto aqui, outro ali, telhado se estica sem nada proteger direito. Só não me sinto solidário com Augusto de Campos porque sua pendenga com Gullar é coisa além, aonde não meto a colher de chá que são essas minhas crônicas.

Será que sobrou alguma amizade ainda para se desapontar comigo? Alguém para ficar sabendo que não gosto de balé? Na verdade, gosto de dança nenhuma. E tenho argumento não, só total falta de jinga e a mais absoluta ignorância – se um bailarino executa o sissone, não sei se devo ficar contente ou macambúzio.

Não é ódio. Guardo raiva não, jamais. Nem por essa menina que canta em aramaico ou klingon, a Paula Fernandes. De repente, se ela fizesse músicas feito Chico, tocasse violão como o João Bosco, fosse bem intencionada como Neruda, aparecesse menos na TV que o Gullar e se aposentasse cedo como dançarinas de balé...

Tenho algum leitor ainda? Alguém lendo esse finalzinho? Espero que você goste de Guimarães Rosa e Kubrick, senão aí quem corta os laços sou eu. Porque tudo tem limite, convenhamos!

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