No dia 7 de março de 2020, um sábado, Sport e Santa Cruz se enfrentavam na Ilha do Retiro, pela sexta rodada da Copa do Nordeste. Cerca de 14 mil espectadores estiveram presentes. Poucos sabiam, mas aquela vitória rubro-negra por 1 x 0, com um gol de Elton, seria o último clássico no Recife a contar com torcedores no estádio.
Após isso, decretos estaduais por todo o país suspenderam o futebol. O objetivo era conter o avanço da Covid-19. Quando as competições retornaram, em meados de julho, as partidas começaram a ser disputadas com os portões fechados. E vem sendo assim, desde então, deixando torcedores órfãos das arquibancadas, lugar que, para alguns, é como uma segunda casa.
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Ilha da Saudade
O rubro-negro Alberto Capela estava na Ilha, naquele 7 de março, e recorda das incertezas após o jogo. “Lembro que (a pandemia) já era um assunto. Não tinha definição sobre o futebol no Brasil, mas na Europa já tinham fechado os portões”, conta.
O rubro-negro Alberto Capela (centro) sempre vai à Ilha do Retiro e sente falta hoje
Frequentador das arquibancadas desde os quatro anos de idade, Alberto revela que a saudade de acompanhar seu time in loco está demais. “É até difícil falar. Um ano sem sequer pisar na Ilha. Sinto falta de basicamente tudo, pré jogo na sede, beber com os amigos, de ver a Treme Terra. Das filas enormes para entrar não sinto tanta falta, mas até isso faz parte”, brinca.
Para aplacar o vazio, as redes sociais ajudam um pouco. “Twitter, Whatsapp, mas não tenho me encontrado com ninguém, ainda estou seguindo o isolamento", garante. E mesmo contando as horas para o retorno do público, Alberto afirma que a cautela será a ordem da vez. “Ainda não penso em ir assim que abrir os portões. Enquanto não puder tomar a vacina, não devo voltar. E mesmo assim, tomarei o cuidado de usar máscara e não abraçar todo mundo. A não ser que tenha um gol no fim do jogo, aí não vou me conter”, diz.
Arruda querido
Após esse clássico, a torcida do Santa Cruz ainda teve mais uma chance de ver o time de perto. Cinco dias depois, em 12 de março, o clube tricolor recebeu o Botafogo da Paraíba, também pela Copa do Nordeste. Vitória por 3 x 0. O clima estava tão bom, que o torcedor Diogo Nascimento deixou o Arruda já pensando na partida seguinte. “A gente saiu falando ‘domingo, a gente vem de novo’”, relembra. Mal sabia ele, que já não teria mais ninguém nas arquibancadas do José do Rego Maciel.
O tricolor Diogo acredita que o retorno da torcida pode estar próximo
Diogo, assim como tantos, é mais um que aplacou a saudade usando a internet. “Como uso transporte público, não me sinto seguro de ir na casa dos outros. Vi os jogos sozinho em casa, me comunicando pelas redes sociais”. Porém, nem sempre a interação virtual é suficiente. “Às vezes, o entorno do estádio é o que alimenta mais o torcedor, é encontrar as pessoas, tomar uma cerveja. Tem amigos meus que não vejo há um ano, porque só os vejo no Arruda e isso faz muita falta”, lamenta.
Diogo acredita que o retorno da torcida pode estar próximo e ele estaria presente, se for de um jeito organizado. “Se definissem um protocolo, com o clube respeitando as medidas, eu voltaria sim. No Arruda, por exemplo, espalhando o público, dava para fazer”, garante.
Aflitos distante
O último clube a jogar com torcida no Recife foi o Náutico. Resultado ruim, derrota por 3 x 0 para o Fortaleza, pela Copa do Nordeste, no dia 14 de março. Lembranças boas dessa partida nenhum alvirrubro tem, mas o torcedor Nelson Melo se recorda que a Covid-19 era assunto naquele sábado. “Já tinha o anúncio da suspensão das aulas presenciais, a partir da quarta-feira seguinte. Mas, no início, a gente não imaginava que o coronavírus teria essa dimensão”, relembra.
Nelson Melo diz que a Covid-19 já era assunto no último jogo com torcida nos Aflitos
Mesmo conectado em dia de jogo, Nelson não esquece do estádio. “Sinto falta de tudo, gosto de reclamar, gritar, cornetar. Até porque, eu vejo o futebol como uma terapia. Consigo colocar muita coisa pra fora em uma partida de futebol. Em casa, não chega nem a um quinto da emoção de uma arquibanca”, relata.
Os Aflitos, no entanto, só terá a sua presença quando houver segurança total. Se os portões fossem abertos hoje, por exemplo, Nelson não iria. “Estamos com uma das maiores taxas de mortalidade, desde o início da pandemia e a proliferação do vírus está cada vez mais forte. Só vejo um retorno prudente com a vacina e a diminuição da taxa de contágio. No momento, não vejo perspectiva de volta”, lamenta.