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As regras sobre registro, posse e comercialização de armas de fogo para caçadores, atiradores e colecionadores (grupo conhecido como CACs) devem ser tema de discussão no Senado em 2022. O PL 3.723/2019, projeto de lei que trata do assunto, estava na pauta da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado em dezembro de 2021, mas um pedido de vista coletivo acabou fazendo com que a sua votação fosse adiada. A expectativa é de que o texto volte a ser discutido após o recesso parlamentar, que termina em fevereiro.  

O projeto foi apresentado pelo Poder Executivo em junho de 2019. A matéria foi aprovada pela Câmara dos Deputados (onde passou por alterações) no final daquele ano, quando foi enviada para o Senado. Entre seus pontos mais polêmicos está a eliminação da exigência de marcação de munições. O texto revoga o artigo do Estatuto do Desarmamento (Lei 10.826, de 2003) que exige a venda de munições em embalagens com código de rastreio e a venda de armas com dispositivo de segurança e identificação, gravada no corpo da arma.

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O texto também autoriza a aquisição de no mínimo 16 armas para CACs, sendo até seis de uso restrito. Não está indicado o limite máximo de aquisição, que poderá ser expandido em regulamentação do Comando do Exército. Outro ponto da proposta que vem recebendo críticas é a autorização automática de recarga caseira de munição para todos os CACs.

Os defensores do projeto argumentam que há necessidade de segurança jurídica para o grupo ao qual se refere o texto. Segundo o relator da matéria, senador Marcos do Val (Podemos-ES), cresce cada vez mais o número de armas registradas no país e todas essas novas armas seguem as regras previstas em decretos presidenciais. Ele afirma que o tema precisa estar consolidado em lei, já que grande parte desses decretos está sendo questionada no Supremo Tribunal Federal (STF).

"Achei ser ideal o momento agora por causa do que vem acontecendo, a interferência do STF em legislar, em tomar decisões monocráticas e, em pleno recesso, quando os ministros do STF podem tomar decisões monocráticas, não do colegiado, ser possível derrubar os decretos que estão hoje em vigor", declarou Marcos do Val durante a última discussão do projeto no Senado, em dezembro.

Decretos

Já os senadores e as instituições que são contra o projeto argumentam que a insegurança jurídica existe justamente porque o Executivo extrapola a sua competência ao tratar do tema por meio de decretos e portarias, em vez de promover uma discussão ampla para aprovar projetos sobre o assunto. Vários dos instrumentos utilizados pelo governo são questionados por projetos de decreto legislativo que buscam sustar seus efeitos.

Em setembro passado, o Supremo Tribunal Federal julgaria 14 ações sobre decretos e portarias do governo federal relacionadas a posse, compra, registro e tributação de armas e munições. O julgamento, no entanto, foi suspenso após pedido de vista do ministro Kassio Nunes Marques. Com isso, até que o assunto seja julgado pelo plenário do STF, ficam valendo as decisões individuais tomadas pelos ministros Alexandre de Moraes, Edson Fachin e Rosa Weber, relatores dos processos, que suspenderam parte das modificações feitas pelo governo.

"O que está acontecendo na prática, e eu respeito quem pensa diferente, é dar um balão, no linguajar futebolístico, fazendo alterações por decretos, que foram parar no STF. Eu tenho minhas discordâncias com o STF, todo mundo sabe disso, mas respeito as decisões que vêm da Corte", disse o senador Eduardo Girão (Podemos-CE) ao defender uma maior discussão do projeto.

Chancela

O relatório de Marcos do Val foi favorável à aprovação do texto com as mudanças feitas pelos deputados federais. Ele argumentou que havia pressa para tratar dessa regulamentação, e que eventuais alterações no Senado fariam o projeto voltar à Câmara dos Deputados. Mas, para muitos dos parlamentares que defendem uma discussão mais ampla da matéria, o Senado não pode simplesmente aprovar as alterações feitas pela Câmara no projeto do Executivo. 

"Eu entendo que o senador Marcos do Val está fazendo um esforço, mas, veja, é um esforço para manter o projeto do jeito que veio da Câmara. Se tiver de voltar [à Câmara], não tem problema. É um tema que precisa ter as digitais dos senadores e das senadoras. A gente precisa aprofundar isso, até porque a gente pode trazer um equilíbrio federativo da compreensão dos diversos estados. É para isso que a gente existe como Casa Revisora", registrou o senador Rogério Carvalho (PT-SE).

CACs

Para o senador Lucas Barreto (PSD-AP), não aprovar o projeto poderá colocar em risco clubes de atiradores e outras empresas relacionadas ao setor. Ele afirma que é preciso tirar o debate sobre os CACs da “polarização política” e garantir segurança jurídica a esse grupo, o que levaria a resultados positivos na economia.

"A gente está defendendo o direito do cidadão de bem. A gente tem de fazer que se fiscalize na fronteira para que não se contrabandeiem armas, porque o bandido está lá, armado; ele não passa por controle de munição, de nada", declarou Lucas Barreto.

De acordo com o senador Luiz do Carmo (MDB-GO), não se trata de uma liberação irrestrita de armas, mas de permitir a diversão de pessoas de bem.

"Esse projeto trata, simplesmente, de diversão para as pessoas. As pessoas não podem se divertir? Eu nunca vi um CAC ser mau elemento. Nunca vi! Todas as pessoas que chegam perto de mim são pessoas do bem", afirmou Luiz do Carmo.

O senador Carlos Viana (PSD-MG), por sua vez, argumentou que o projeto não altera as regras para o porte de armas e nem incentiva sua compra. Segundo ele, a discussão é apenas sobre a questão dos CACs.

"Não se está aqui, em momento algum, incentivando a compra de armas ou a facilitação para que a pessoa possa portar uma arma no meio da rua. Não é disso que estamos falando. Quem levantar essa polêmica está, infelizmente, desinformando as pessoas", disse.

Momento

Os senadores contrários ao projeto, além de afirmarem que o texto flexibiliza o Estatuto do Desarmamento, criticam a pressa para aprovar o texto no momento de dificuldades que o país enfrenta.

"Nós temos aí uma desigualdade: 80 milhões de brasileiros em situação de pobreza ou de extrema pobreza; e o 1% mais rico possui quase a metade da fortuna brasileira. E nós estamos aqui debatendo flexibilização no Estatuto do Desarmamento! Eu não acho que seja razoável", protestou o senador Fabiano Contarato (PT-ES).

O senador José Aníbal (PSDB-SP) também ressaltou que o texto precisa ser debatido com profundidade no Senado.

"Eu ouvi uma manifestação do senador relator da matéria [Marcos do Val], e ele disse que o pessoal dos clubes de tiro está reclamando, porque eles não vão ter as armas necessárias para fazer seus treinamentos e que, com o projeto, eles poderão adquirir essas armas. Eu fiquei aqui imaginando se esta nossa conversa tem sentido de realidade ou é surrealista, e a impressão que me dá é que ela é surrealista", criticou José Aníbal.

Ainda não há data prevista para a votação do projeto.

*Da Agência Senado

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