Tópicos | inclusivismo

Nesta quinta-feira (2), a Comissão de Edução aprovou a convocação do minstro da Educação, Milton Ribeiro, para esclarecimentos sobre as recentes declarações acerca da inclusão de estudantes com deficiência em escolas regulares e acesso à universidades. O autor do requerimento foi o senador Veneziano Vital do Rêgo (MDB), vice-presidente do Senado.

A audiência está prevista para 16 de setembro. Em agosto, o responsável pela pasta, durante participação no programa 'Sem Censura, da TV Brasil, afirmou que crianças com deficiência "atrapalhavam" os demais alunos quando colocados na mesma sala de aula.

##RECOMENDA##

“O que é inclusivismo? A criança com deficiência é colocada dentro de uma sala de alunos sem deficiência. Ela não aprendia, ela atrapalhava”, disse na época. A colocação de Ribeiro repercutiu negativamente e causou reação de políticos como o senador Romário. Os dois chegarma a discutir em uma rede social.

Outra fala do ministro da Educação também é motivo da convocação por parte da Comissão. No início do mês passado, ele declarou, também ao 'Sem Censura, que o acesso à universidade deveria ser "para poucos". "Tem muito engenheiro ou advogado dirigindo Uber porque não consegue colocação devida. Se fosse um técnico de informática, conseguiria emprego, porque tem uma demanda muito grande", disse na ocasião. No Recife, Milton Ribeiro ressaltou que as falas foram tiradas do contexto.

Em entrevista concedida ao programa 'Direto ao Ponto', da 'Jovem Pan', nessa segunda-feira (23), o ministro da Educação, Milton Ribeiro, voltou a comentar suas declarações a respeito de alunos com deficiência. “Sou ministro, mas não tenho toda essa expertise”, disse, ao explicar suas falas que geraram polêmica. Na semana passada, Ribeiro afirmou que existem crianças cuja deficiência impossibilita a convivência.

O assunto foi abordado pelo âncora Augusto Nunes. Tentando esclarecer as declarações, o ministro afirmou que o universo de educação inclusiva é sensível, e que não possui expertise para lidar com determinados temas. Por isso, o gestor argumentou que foi mal interpretado.

##RECOMENDA##

Apesar das tentativas de esclarecimento, o ministro sustentou sua opinião: "Nós não queremos o inclusivismo”. Segundo Milton Ribeiro, 12% dos alunos brasileiros sofrem algum tipo de deficiência.

O Ministério da Educação (MEC) pretende implantar salas próprias para os alunos com deficiência. Especialistas criticam os depoimentos do ministro e explicam por que as falas geram consequências negativas na educação brasileira.

A fala do ministro da Educação, Milton Ribeiro, que crianças com deficiência "atrapalhavam" o ensino de outros estudantes, foi amplamento criticada. O gestor chamou o processo de aprendizagem de "inclusivismo". Nesta quinta-feira (19), na tentativa de explicar a declaração dada no programa 'Sem Censura', da TV Brasil, Ribeiro afirmou que seu discurso foi tirado de contexto.

O LeiaJá ouviu especialistas que explicam o porquê de a declaração do ministro da Educação ser considerada problemática e até mesmo preconceituosa. Para Rafaella Asfora, professora do Centro de Educação da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), do Departamento de Psicologia e Orientação Educacionais, e docente da área de educação inclusiva, a declaração do ministro viola os direitos humanos das pessoas com deficiência.

##RECOMENDA##

“A declaração recente do ministro da Educação Milton Ribeiro, ‘de que alunos com deficiência ‘atrapalham’ o aprendizado de outros estudantes’, configura uma violação aos direitos humanos das pessoas com deficiência. Fere os preceitos da Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência (2007), na qual o Brasil é signatário e que equivale à emenda constitucional. Tal convenção reafirma ‘a universalidade, a indivisibilidade, a interdependência e a inter-relação de todos os direitos humanos e liberdades fundamentais, bem como a necessidade de garantir que todas as pessoas com deficiência os exerçam plenamente, sem discriminação’.”, afirma a professora.

Segundo a educadora, uma escola inclusiva deve garantir a educação de todas as crianças, atender as necessidades específicas de qualquer criança, independente de ter deficiência ou não. Várias pesquisas apontam que pessoas com deficiência que tiveram acesso a ambientes escolares inclusivos passam a ter mais autonomia,  independência, inserção, participação social e qualidade de vida. “A inclusão na educação favorece o desenvolvimento humano. Nessa direção, as crianças devem aprender juntas com seus pares de igual idade, e precisam ser ensinadas a respeitar e valorizar a diferença, ter empatia e respeito ao outro”, completa Rafaella Asfora.

Vera Braga, gerente de políticas educacionais de educação inclusiva, direitos humanos e cidadania, da Secretaria de Educação e Esportes de Pernambuco, afirma: “Uma escola inclusiva é um local onde todos os estudantes se sentem pertencentes. Não existe estudante que atrapalha, a escola deve se adequar às singularidades do estudante, não o estudante que deve se adequar à escola. A gente compreende que os estudantes com deficiência devem ser vistos a partir das suas potencialidades. A escola e todos devem, antes de visualizar a deficiência do estudante, vê-lo como ser-humano”, pontua.

“Não tem como a gente primar por uma sociedade inclusiva se você estigmatiza e exclui qualquer pessoa. Não tem como pensar em uma educação ou escola democrática se a gente não inclui no processo todos os estudantes. Isso está ligado a capacitismo, o estigma, à discriminação de uma pessoa por ter deficiência não ser capaz. Eles possuem suas capacidades. Precisa apenas não ter barreiras e a pior barreira que existe para o aprendizado de um estudante, sobretudo aquele com deficiência, é a barreira atitudinal, aquela ligada aos comportamentos”, completa Vera Braga.

Luciana Góes, professora de inglês especializada em educação inclusiva, atua com alunos autistas. Ela reforça que a fala do ministro, além de ir contra ao inclusivismo, é preconceituosa. “Essa fala mostra também uma certa ausência ou lacuna de conhecimento sobre o que de fato é uma educação inclusiva e uma estrutra sócio-inclusiva para o aluno que necessita de ferramentas educacionais mais direcionadas. O termo deficiência por si só já é preconceituoso.”, afirma a professora.

Luciana também lembra que de fato as escolas não estão equipadas adequadamente e que não é a primeira vez que cometem esse erro nas declarações. “É fato que as escolas em sua grande maioria não estão preparadas para uma inclusão como deve ser, todavia, isso não é culpa da escola, é falta de preparo na grade curricular da educação hoje. Não é a primeira vez que as falas do ministério da Educação não vão de encontro a vários tópicos importantes ou valores, abrindo margem para pensar se de fato quem está no comando tem preparo na área de educação de uma maneira geral”, pontua Luciana.

A psicóloga especializada em atenção a pessoas com deficiência, Ivalda Marinho, destaca a importância da convivência entre alunos em prol das diferenças. De acordo com a especialista, reforçar a seletividade pode prejudicar e até retroceder o modelo de ensino.

“Lei da seletividade adicionada a um pensamento ultrapassado além do entendimento deturpado do que é inclusão. Como consequências, teremos o retorno daquela prática de 'normais', a velha discussão da separação dentro das escolas. O que avançamos, retrocede dentro de um modelo obsoleto do que é educação. Esqueceu-se ou se desconhece a riqueza da troca, do aprendizado com socialização, do conhecimento sobre deveres que temos uns com os outros, da criatividade dentro do ensino e, principalmente, que a criança não nasce com preconceito, ela aceita os outros como são”, afirma a psicóloga.

Rafaella Asfora pontua que a consequência da declaração vinda de um ministro pode fomentar a segregação e exclusão social. “Sobretudo, uma declaração vinda de um ministro que integra um governo que lançou uma nova Política Nacional de Educação Especial: equitativa, inclusiva e com aprendizado ao longo da vida (2020), a qual se configura como um retrocesso para a inclusão educacional das pessoas com deficiência com perda de direitos adquiridos. Tal política propõe a volta às escolas e instituições especializadas para as pessoas com deficiência”, explica a professora.

Vera Braga completa: “Isso tem a ver com violência estrutural, a exclusão gera violência e a gente tem que aprender a trabalhar no coletivo, trabalhar de forma interdependente que todo mundo pode aprender com todo mundo. Esse posicionamento excludente gera violência e a gente tem que buscar incluir para construir uma sociedade mais equitativa, mais harmônica”.

Para Ana Claudia Palhares de Lima, licenciada em educação física, a fala do ministro já causa repulsa e indignação, mas se de fato ela estiver sendo colocada em prática, torna a situação mais grave. "Se além da fala houver uma prática que promova a exclusão desses estudantes, aí sim as consequências serão mais graves do que o sentimento desagradável que ele já causou, pois não apenas os estudantes sofrem as consequências, mas também os pais. É uma reação em cadeia", afirma Ana Claudia.

“A escola, além de desenvolver a sociabilidade e intelectualidade deles, mostra aos demais estudantes que qualquer pessoa é capaz de aprender, independente da deficiência. Então, além de educarmos, também aprendemos com eles e ensinamos a todas as pessoas envolvidas na instituição e na família que o aprender é inato ao ser humano. O único detalhe é que existem diferentes maneiras de aprender. Cada pessoa tem uma especificidade”, completa a profissional de educação física.

Com informações de Rachel Andrade

LeiaJá também

--> Ter diploma não é garantia de emprego, diz Milton Ribeiro

Leianas redes sociaisAcompanhe-nos!

Facebook

Carregando