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O governo Jair Bolsonaro, que a todo instante repete a promessa de erguer novas usinas nucleares pelo País, corre para encontrar um destino para armazenar nada menos do que 1.179 toneladas de rejeitos radioativos - um lixão nuclear que, para surpresa de muita gente, está hoje guardado em velhos galpões localizados no bairro de Interlagos, na zona sul de São Paulo. O material não poderá mais ficar no local, que é cercado por prédios residenciais, e terá de ser remanejado. A questão é para onde levar as centenas de tonéis de lata que guardam os rejeitos.

A estatal federal Indústrias Nucleares do Brasil (INB), responsável pelo lixão radioativo e dona do terreno em Interlagos, já manifestou sua intenção ao Ministério Público Federal de São Paulo de, preferencialmente, enviar o material para a pequena cidade de Caldas, município mineiro de 15 mil habitantes. A INB tem uma base em Caldas e já guarda rejeitos por lá. Uma segunda opção seria deslocar o lixo perigoso para a estrutura da estatal em Itu (SP). Só falta combinar com as cidades.

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O lixão nuclear da INB virou praticamente um assunto proibido nos dois municípios, que não querem saber de virar depósito de rejeito radioativo. Os prefeitos prometem uma batalha contra a empresa. "A Prefeitura da Estância Turística de Itu, mesmo sem ter sido notificada oficialmente sobre esta intenção da INB, se opõe totalmente ao recebimento do material", disse à reportagem o prefeito Guilherme Gazzola (PL). "As instalações da INB em Itu ficam em um terreno que, em 1991, foi declarado área de proteção ambiental, o que torna a possibilidade da vinda desse material para a cidade ainda mais absurda."

Gazzola diz ainda que, assim como o município mineiro, Itu é uma estância turística e tem neste setor uma de suas principais atividades econômicas. "A vinda de rejeito radioativo só causaria reflexos negativos para Itu, que vive um momento de franco desenvolvimento urbano e econômico. O poder público municipal declara que se mobilizará de maneira rígida para impedir qualquer ação neste sentido."

A resistência ao plano da estatal ganha traços ainda mais fortes quando se trata de Caldas. A cidade é o destino preferido da INB, porque já abriga uma boa quantidade do mesmo lixo nuclear em suas dependências. "A INB nunca respeitou o município e tem uma péssima relação com a cidade. Não há nenhuma transparência sobre nada, sequer nos informam sobre a qualidade da água que tratam aqui. Agora, em vez de fazer o descomissionamento (desmonte) da base deles na cidade, que prometeram, mas não fizeram, querem fazer de Caldas um depósito de rejeito", diz o prefeito Ailton Goulart (MDB).

Para tentar impedir que o plano avance, Goulart diz que vai acionar o governo estadual, INB, Ibama e Ministério de Minas e Energia para tentar derrubar o projeto. "A INB nunca pagou nenhum royalty pelo que faz no município, isso sem contar que temos um alto índice de câncer na região. A gente sabe que são péssimas as condições de armazenagem aqui, mas eles nem mandam relatórios para nós. Então, não vou aceitar isso de forma passiva. O que eu puder fazer para impedir esse lixo de vir para o município, vou fazer", afirma o prefeito, que é nascido e criado em Caldas.

Contagem regressiva

Sem saber qual será o destino de seu rejeito radioativo, a INB tem de iniciar o plano nos próximos meses, que inclui a preparação de uma área específica, com infraestrutura para guardar esse tipo de material. Seja qual for o destino, a estatal pretende liberar a área de Interlagos até 2025. Para isso, já começou a fazer o processo de descontaminação da área externa do terreno de 60 mil m². Quando liberar o espaço, este será entregue à Prefeitura, para uso irrestrito.

Das 1.179 toneladas de rejeitos radioativos guardados nos galpões de Interlagos, 590 toneladas são do material conhecido pelo nome de "Torta II". O restante inclui resíduos e materiais diversos associados a esse produto. A Torta II é um rejeito extraído no tratamento químico da monazita, um fosfato que combina metais pesados de terras raras, urânio e tório. Esse material pertencia à antiga empresa Nuclemon, a Usina de Santo Amaro, que funcionava em São Paulo até os anos 1980. Com o fechamento, todo seu rejeito foi transferido para a INB, que distribuiu o lixo radioativo entre Caldas e o bairro de Interlagos.

Atualmente, a unidade da INB em Caldas armazena 12.534 toneladas de Torta II, quase 11 vezes o volume guardado nos galpões de Interlagos. A cidade mineira aguarda, na realidade, o desmonte e a retirada do material de seu território, e não o aumento do lixo confinado ali. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

A União foi condenada em dezembro pela Justiça Federal a incluir no orçamento os recursos necessários para a construção de um depósito final para os rejeitos radioativos produzidos pelas usinas nucleares de Angra dos Reis, no litoral sul do Rio. A decisão estabelecia prazo de um ano para a definição do local de armazenamento, mas a União recorreu e conseguiu suspender provisoriamente os efeitos da sentença.

De acordo com o Ministério Público Federal (MPF), que moveu a ação civil pública, o lixo nuclear das usinas de Angra é armazenado em depósitos provisórios desde 1982, "representando riscos à vida da população". Em nota, a Eletronuclear afirma que "tem total controle da gestão dos rejeitos" e que as instalações do Centro de Gerenciamento "asseguram o atendimento à exigência de guarda segura dos rejeitos pelo menos até 2020".

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No entanto, de acordo com reportagem publicada pelo jornal O Globo na segunda-feira (12), a usina Angra 2 corre o risco de ser desligada em 2017 por causa da saturação dos depósitos provisórios de rejeitos, conforme avaliação remetida ao Tribunal de Contas da União (TCU). O mesmo poderia ocorrer com a usina Angra 1 em 2018 ou 2019. Já Angra 3, que está em construção, não entraria em operação conforme o previsto, porque uma das condicionantes para a concessão da licença ambiental da usina é justamente a necessidade de se resolver a questão do acúmulo de resíduos radioativos.

Até 2007, ano do último levantamento divulgado, a quantidade de lixo atômico produzido por Angra 1 e Angra 2 era de aproximadamente 3 mil toneladas. O resíduo fica armazenado em dois galpões. Procuradora da República em Angra dos Reis, Monique Cheker questiona a ampliação do programa nuclear brasileiro, com a construção de Angra 3, sem que haja uma definição sobre o armazenamento definitivo dos rejeitos. "Custa caro. A questão é puramente econômica", diz ela.

Na nota, a Eletronuclear afirma que "está implantando uma Unidade de Armazenamento Complementar de Combustível Irradiado (UFC), com previsão de inicio de operação em 2018", mas reconhece a "possibilidade de atrasos". "Para fazer frente a eventuais atrasos, a Eletronuclear vem tomando providências no sentido de otimizar tanto o uso do combustível como a ocupação das unidades de armazenamento existentes. Essas providências poderão postergar a necessidade da UFC até pelo menos 2020."

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