Tópicos | operação La Casa de Papel

A Polícia Federal, em atuação conjunta com a Receita Federal e a Agência Nacional de Mineração (ANM), deflagrou nesta quarta-feira, 19, a Operação "La Casa de Papel". A ação prendeu seis pessoas acusadas de operar um esquema de pirâmide financeira que funciona pelo menos desde 2019, opera em mais de 80 países e causou prejuízo de R$ 4,1 bilhões a 1,3 milhão de pessoas. O grupo chegou a criar duas criptomoedas, que foram supervalorizadas artificialmente e depois perderam todo o valor. O nome da operação é uma referência à "Casa da Moeda própria" de que os investigados dispunham e também a uma série de streaming de mesmo nome. O esquema segue funcionando, segundo a PF.

A investigação e a operação desta quarta-feira foram realizadas pela Superintendência da PF em Mato Grosso do Sul. As ordens de prisão preventiva foram expedidas pela 3ª Vara da Justiça Federal de Campo Grande (MS). O juízo também expediu 41 mandados de busca e apreensão, a serem cumpridos nos estados de São Paulo, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul, Goiás, Maranhão e Santa Catarina.

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Os policiais também cumprem mandados de bloqueio no valor de US$ 20 milhões (cerca de R$ 105 milhões) e sequestros de dinheiro depositado em contas bancárias, além de imóveis de alto padrão, gado, veículos, ouro, joias, artigos de luxo, uma mina de esmeraldas, lanchas e criptoativos que estavam com as pessoas físicas e jurídicas investigadas.

O esquema

A investigação começou na cidade de Dourados (MS) em agosto de 2021. Foi quando a Polícia Federal prendeu em flagrante dois homens que seguiam com escolta armada rumo à fronteira com o Paraguai. Nessa abordagem, foram encontradas esmeraldas avaliadas em US$ 100 mil (cerca de R$ 525 mil). As pedras estavam escondidas e não tinham origem legal. Também estavam amparadas em nota fiscal cancelada.

Durante a investigação, a PF descobriu a pirâmide financeira - esquema no qual os depósitos dos clientes mais recentes bancam os lucros dos mais antigos. A quadrilha apresentava uma empresa (inexistente) que teria sede na Estônia e parceria com dois bancos. A suposta companhia oferecia investimentos com aportes financeiros periódicos a de 15 a até 100 mil dólares, com promessa de ganhos mensais de até 20% e anuais de 300%, conforme o valor investido. O dinheiro seria aplicado no mercado de criptoativos por supostos traders a serviço da empresa.

Quem entrava no negócio era incentivado a captar novos investidores, em mecanismo que chamavam de binário: oferecia ganhos porcentuais sobre os valores investidos por novos clientes atraídos para o esquema. A empresa era divulgada pelas redes sociais, em reuniões presenciais em diversos estados e países, por meio de "team leaders" arregimentados. Tinha até o apoio e a estrutura de uma entidade religiosa pertencente a um dos envolvidos.

A falsa empresa do grupo já tinha sido alvo de alertas de órgãos financeiros em diferentes países, como Espanha e Panamá. Os avisos denunciavam a inexistência de autorização de atuação e que se tratava de esquema de pirâmide financeira, que é ilegal, entre outros motivos, por ser insustentável.

Segundo a PF, a prática ilegal tornou-se mais sofisticada com o tempo, englobando supostos investimentos decorrentes de lucros advindos de minas de diamantes e esmeraldas que a empresa teria no Brasil e no exterior, em mercado de vinhos, de viagens, em usina de energia solar e usina de reciclagem, entre outros.

Moedas virtuais próprias

No fim de 2021, os investigados criaram duas criptomoedas, lançadas sem nenhum lastro financeiro. Foi identificada manipulação de mercado para valorizar uma das moedas artificialmente em 5.500% em apenas 15 horas, com pico de até 38.000% dias depois. O objetivo, segundo a PF, era manter a pirâmide financeira o mais tempo possível em atividade, pois as criptomoedas foram também utilizadas para pagar os investidores. Mas, depois de alta meteórica e especulativa promovida pelos investigados, as criptomoedas perderam todo o valor de mercado. A cotação caiu para menos de um centavo de dólar, resultando em perda quase completa da liquidez.

O grupo também se valia de muita ostentação nas redes sociais. Tinha milhões de seguidores em todo o mundo, demonstrando o sucesso pessoal e de investimentos, com demonstração de viagens internacionais para Dubai, Cancún e outros destinos turísticos famosos.

Para movimentar o dinheiro foram usadas contas bancárias dos investigados, de seus parentes e de terceiros ligados ao grupo, além de empresas de fachada. A entidade religiosa de um dos envolvidos movimentou mais de R$ 15 milhões e foi usada para captar investidores, buscando a ocultação e lavagem de dinheiro dos recursos.

Quando um dos responsáveis pela pirâmide financeira foi preso em Cuba, a empresa interrompeu o pagamento dos valores aos cubanos. A justificativa, divulgada nas redes sociais foi que o governo cubano teria impedido a empresa de ajudar o país. Depois, ante o volume de dinheiro subtraído pelo esquema criminoso, os investigados começaram a impor dificuldades para realização dos pagamentos aos investidores lesados. Como forma de garantir seus lucros, passaram a estabelecer prazos cada vez maiores para resgate da aplicação.

Segundo a investigação, no fim de 2021 os investigados anunciaram que um ataque hacker (falso) causara um imenso prejuízo financeiro. Essa foi a justificativa usada para reter o dinheiro dos investidores e suspender os pagamentos, sob o argumento da necessidade de uma auditoria financeira. Meses depois, comunicaram a conclusão da auditoria e anunciaram uma reestruturação da empresa, mantendo o esquema e migrando para uma nova rede, a fim de que os investidores efetuassem novos aportes e continuassem o negócio. Nesse momento, o suposto presidente da empresa ameaçou quem fizesse denúncias à Polícia ou à Justiça de ser processado e não receber qualquer valor investido de volta.

Crise

Diante de reclamações registradas nas redes sociais, os organizadores do esquema criaram novas versões. Para postergar os pagamentos, alegaram dificuldades no mercado de criptomoedas, prejuízos financeiros, problemas no site da empresa. Mas também divulgavam notícias falsas, afirmando que investidores estariam aplicando e recebendo valores regularmente. O objetivo era convencer outros a manter a aplicação no esquema.

Os investigados vão responder pela prática dos crimes de organização criminosa; crimes contra o sistema financeiro, por operar sem autorização; evasão de divisas; lavagem de dinheiro; usurpação de bem mineral da União Federal; execução de pesquisa, lavra ou extração de recursos minerais sem a competente autorização, permissão, concessão ou licença; falsidade ideológica e estelionato por meio de fraude eletrônica. Se condenados, as penas podem chegar a 41 anos de prisão, sem prejuízo da perda dos bens e de multas ambientais e tributárias a serem apuradas.

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