Tópicos | Polêmica momesca

O investimento em camarotes e espaços VIPs durante o Carnaval pernambucano tem sido uma tendência nos últimos anos, principalmente em focos de animação como a Cidade Alta de Olinda e o Bairro do Recife. Tais eventos estão dividindo opiniões de produtores, artistas, foliões e representantes do poder público. Se de um lado há os que acreditam que estes espaços retiram a essência da festa momesca do Estado, do outro estão os que defendem as áreas VIPs como atrativos turísticos para o carnaval local.

Na Cidade Alta de Olinda, por exemplo, mais especificamente nos 10.000m² de área do Colégio São Bento, será realizado o Carvalheira na Ladeira, instalação que conta com atrações locais e nacionais nos quatro dias de folia. Segundo o empresário Eduardo Carvalheira, há um certo preconceito quando o assunto é evento privado no carnaval. “Isso soa com um ar meio separatista, como se quiséssemos nos afastar da multidão. É bom deixar claro que não queremos isso. Nossa proposta é tentar montar em primeira mão um evento nacional. Nosso foco é o turista, não o público nativo, e pra se ter ideia quase 50% dos ingressos foram vendidos para pessoas de fora do Estado”, revela o produtor ao LeiaJá

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“Existe um folião turista que tem medo de ficar na rua em Olinda, assim como ele tem medo de ficar na rua em Salvador e em outras cidades. Mas vamos oferecer para eles uma estrutura que pode ser usada como base e com acesso controlado. Ou seja, o turista vai poder conhecer o Carnaval de Olinda em segurança e com conforto, bem como assistir às apresentações de atrações nacionais, como Jorge Ben Jor, e locais, como Eddie e Otto, além de vários grupos carnavalescos”, completa Eduardo.

O Carvalheira na Ladeira não é o único evento particular no Carnaval de Olinda. Estão confirmados outros quatro eventos privados de grandes proporções na Cidade Alta. Um deles é a Casa da Brahma, com shows de Nação Zumbi (1º de março) e O Rappa (3 de março). Tem também o Casarão do Bonfim, a ser realizado nos dias 2 e 4 de março, e que segundo a assessoria vai seguir os moldes dos carnavais de Salvador, Rio de Janeiro e São Paulo. Já a Casa da Skol conta com uma programação durante os quatro dias de folia. E, por fim, a Casa Esquenta vai levar ao público shows de axé, brega e orquestras de frevo nos dias 2 e 3 de março.

De acordo com Maurício Galvão, secretário de Turismo de Olinda, estes espaços são importantes porque aumentam a circulação de turistas pela cidade. “É mais do que um camarote. A pessoa pode sair e participar do carnaval e isso faz com que seja possível trazer o turista pra cá, principalmente aquele de maior poder aquisitivo e que quer mais conforto”, opina o secretário. “Isso existe muito em Salvador, mas em Olinda estes eventos também já estão se consolidando”, conclui Maurício. 

Segundo a Secretaria de Planejamento e Controle Urbano de Olinda, alguns produtores ainda não deram entrada na documentação necessária para liberação do alvará de funcionamento. Se as solicitações não forem atendidas, os eventos podem deixar de ser realizados e, caso aconteçam sem o alvará, os responsáveis responderão a um Termo Circunstanciado de Ocorrência (TCO) ou até criminalmente. A licença de funcionamento, no entanto, só será liberada quando os produtores apresentarem, com até uma semana de antecedência ao evento, uma série de documentos como certificado do Corpo de Bombeiros, planta e projeto acústico e de segurança do imóvel – destacando as saídas de emergência. Um detalhe é que a portaria de número 3.083/2013 do Ministério da Justiça determina que o número do alvará e a validade do documento devem estar presentes nos materiais de divulgação, ingressos e na entrada do estabelecimento onde acontecerá a festa.

Também produtor de eventos, Jarmeson de Lima, do Coquetel Molotov, acredita que a 'camarotização' nas festas de momo é um fenômeno desnecessário. “Já existe muita festa gratuita durante este período e tornar a prática sedutora ao público é uma tendência negativa para o carnaval em si. Essas coisas prejudicam o carnaval, que fica povoado de pequenas ilhas de camarotes. Tem também a área VIP no Marco Zero, que só faz aumentar. Pra mim, tais eventos não acrescentam em nada porque carnaval é essencialmente uma festa de rua”, comenta Jarmeson.

A 'camarotização' do carnaval pernambucano

A publicitária e produtora cultural Andréa Luna também discorda da realização de eventos privados duarnte o período carnavalesco e diz que a Prefeitura de Olinda colocou os interesses comerciais acima dos valores culturais. “Ela não paga bem as subvenções para os blocos no carnaval. Eles tocam, gastam, se organizam e recebem só no São João. O carnaval é lindo mesmo assim, mas a Prefeitura deveria se preocupar mais com a cidade e com a preservação dos nossos valores culturais, ao invés de incentivar essas festas fechadas excludentes”, argumenta.

No Recife, de acordo com a Secretaria de Controle Urbano da cidade, foi realizada na última quarta-feira (22) uma reunião com mais de 30 produtores envolvidos com os camarotes do Carnaval da cidade, concentrados no Galo da Madrugada e no Bairro do Recife. Até o dia 14 de fevereiro eles devem entregar um termo de regularidade do Corpo de Bombeiros atualizado, o laudo de liberação da Vigilância Sanitária, laudo do técnico responsável pela parte elétrica, apresentação do termo de responsabilidade e capacidade máxima de pessoas. Sem esses requisitos, não serão concedidas licenças para funcionamento. Caso algum camarote descumpra alguma dessas regras estará sujeito a multa e interdição do espaço.

Um camarote que estava para ser realizado na Praça do Marco Zero, o Camarote Seu Boteco, no Armazém 12, pode não acontecer mais segundo a assessoria da produtora Onzex - que também não deu mais detalhes. De acordo com o Porto do Recife S/A, o armazém, que agora é de uso privado e faz parte do consórcio Porto Novo Recife, está em obras e não há previsão de quando elas serão concluídas porque falta a liberação de algumas licenças ambientais.

Felipe Carreras, secretário de Turismo e Lazer do Recife, não vê problemas na realização destes espaços. “A gente tem o carnaval mais democrático do Brasil e os eventos privados são uma opção, não só para os turistas, mas para a população em geral. Na medida em que a iniciativa privada coloca opções de conforto eu vejo com bons olhos e acho que só tem a somar, até porque os camarotes não atrapalham a mobilidade das pessoas”, avalia o secretário.

Já o maestro Ademir Araújo não compartilha da mesma ideia. Conhecido como maestro Formiga, ele é uma sumidade do frevo e da música local. “Eu acho que tem que diminuir essa quantidade de camarotes. Tem que colocar o povo na rua. O Frevo é que nem construção e se não tiver uma base forte quando começar a colocar mais camarote vai abrir espaço para a chegada dos trios elétricos. Eu não tenho nada contra o trio, só acho que o artista e o Frevo têm que estar mais próximos do público. Como é que pode você querer levantá-lo como Patrimônio Cultural Imaterial da Humanidade fazendo essas coisas?”, questiona o maestro, referindo-se ao título concedido pela UNESCO para o ritmo pernambucano.

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