Tópicos | Scott Derrickson

Quem assiste a "A Entidade 2" buscando estrutura e ritmo impressos pelo diretor Scott Derrickson ao filme original, lançado em 2012, frustra-se. Mas isso não necessariamente faz da continuação do irlandês Ciaran Foy um produto dispensável.

O cineasta, responsável pelo exitoso Citadel (2012), carrega a experiência de ter trabalhado com crianças em seu filme de estreia e faz delas o centro da narrativa na sequência. Bagul, o demônio, torna-se figurante de luxo e sua presença é evocada com, apenas, uma intenção: gerar sustos na plateia. Alguns muito semelhantes aos do primeiro filme, é fato, mas outros que, mesmo ocasionalmente previsíveis, divertem com certo ar de desprentensão, não sendo esta, entretanto, uma característica da obra como um todo. 

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A produção dispensa uma abordagem "naturalista" e arrisca um realismo fantástico, realçado pela fotografia e direção de arte do longa, que, se acerta na subversão parcial de algumas das convenções do gênero, erra em martelar recursos em demasia durante o filme, reduzindo a intensidade do que é projetado em tela. Os vídeos de violência em Super 8 gravados pelas crianças, por exemplo, são imersos em tensão na obra original e na sequência funcionam com dificuldade e muitas vezes não se justificam.

Em linhas gerais, a narrativa traz uma mãe, Courtney, que tenta manter os filhos, Dylan e Zach, sob sua guarda, enquanto sofre com a perseguição do marido agressor, na busca de reaver os garotos e fazê-la voltar para casa. Para não ser encontrado, o trio passa a morar numa propriedade onde toda uma família foi assassinada e uma criança desapareceu. O roteiro usa o drama familiar para criar conflitos psicológicos e desencadear cenas de tensão à parte do mote principal do filme, e inseridos nele, ao mesmo tempo. A sequência do supermercado, logo no início da projeção, já mostra a personalidade do diretor em dar vida, através de movimentos estranhamento aprazíveis, ao que sua câmera mostra. O espectador parece ver um dos filmes em Super 8, que ao invés da violência, expõe uma ameaça ao arranjo familiar, introduzida como se em um dos filmes Super 8 estivesse, com o metafórico passar da fita representado pelas rodinhas do carrinho de compras.

O personagem de James Rasone, de volta do filme original como um detetive particular, evidencia que a obra parte de uma interessante desconstrução de si própria. Em nenhum dos personagens há traços do introspectivo Ellison, vivido por Ethan Hawke no primeiro longa. Por outro lado sobram boas inserções de humor, que se misturam com atuações e trejeitos "naturalmente desajeitados", que só reafirmam a intenção do filme de se enxergar como um mero produto de entretenimento. E assim o sendo, alguns bons elementos da película de origem são abandonados - como o clima de tensão constante - em prol da superexposição dos recursos de horror da trama, que até chegam a agradar, mas enjoam, não pouco antes do fim do filme. 

Cotação: Regular  

Confira o trailer do filme:

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Está cada vez mais difícil encontrar bons filmes de terror. Mais e mais as produções do gênero se limitam a sustos e muito sangue, enganando-se ao pensar que deixar o espectador com nojo é o mesmo de deixá-lo com medo. Por isso, Livrai-nos do Mal, dirigido por Scott Derrickson, um filme que envolve o sobrenatural com uma camada de realismo, é uma estreia bem vinda. O filme é construído como uma investigação, e conta com uma atmosfera que vai ficando cada vez mais tensa até alcançar o ápice do horror com um dos exorcismos mais memoráveis dos últimos anos.

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A narrativa segue o sargento Ralph Sarchie (Eric Bana), da polícia de New York. Sarchie é uma pessoa real e escreveu um livro detalhando os eventos adaptados pelo filme através do roteiro de Derrickson com Paul Harris Boardman, e é conhecido por ter um "radar", apelido dado pelo seu parceiro quase-hiperativo Butler (Joel McHale), para encontrar criminosos em crimes considerados rotineiros, além disso, ele deixou suas crenças cristãs para trás e mal passa tempo com a família em casa. Em uma noite, Sarchie se depara com três crimes que aparentemente não têm relação nenhuma, mas enxerga uma possível conexão. Logo, ele percebe que essa conexão desafia suas noções do que é e não possível. 

Falar mais é estragar um dos melhores elementos de Livrai-nos do Mal, a investigação. Ao assistir os primeiros 30 minutos deste filme, é possível julgá-lo como uma história policial, o que não é surpresa já que o filme foi produzido por Jerry Bruckheimer, responsável pelas séries de TV CSI: Investigação Criminal e CSI: Miami. Mais do que isso, o primeiro ato lembra muito o gênero buddy-cop, já que Bana e McHale tem uma ótima química do tipo "amigões" e transparecem isso durante os momentos na cena do crime. O ar policial é o que deixa o filme num ambiente realista. Livrai-nos do Mal não envolve adolescentes indo para uma floresta, casas assombradas ou bonecos fantasmas, mas um mistério de assassinato.

Só que, claro, o assassino não é um criminoso comum. É então que entra em cena o padre Mendoza (Édgar Ramírez), que também não é nada comum. Ramírez é quem se destaca no filme, especialmente porque ele é o único que tem total certeza do que realmente está acontecendo. Mendoza nunca se apresenta surpreso ou assustado, e a atuação de Ramírez transparece alguém que está no controle, mas que luta diariamente para mantê-lo.

Há também um ar de tristeza, como se o personagem estivesse cansado diante do que ele já viu. É interessante ver como Derrickson joga Mendoza e Sarchie na mesma cena, já que ambos enfrentam o mal diariamente em suas vidas, mas são dois tipos diferentes de forças maléficas. Sarchie conhece o mal humano, enquanto Mendoza conhece o que chama de "mal primário". Livrai-nos do Mal não perde a chance de explorar isso, levantando questões sobre a existência do mal, porque Deus o permite existir e como nós, humanos, lidamos com isso.

É fascinante ver como Derrickson lida com os elementos sobrenaturais. Eles nunca parecem ser o centro do filme, glorificados com efeitos especiais escandalosos. Por mais estranho que isso soe, o sobrenatural de Livrai-nos do Mal é quase natural. O que o diretor faz de especial é trazer uma visão realista de como seria o encontro com o oculto, e Sarchie é a janela pela qual o espectador descobre o mundo. Conforme o enredo vai se desenvolvendo, o público faz a mesma escolha de Sarchie, aceitar essa nova realidade. No Ato 3, chega o climax da história, em forma de um exorcismo.

É uma sequência brutal que não tem pressa, cada estágio do processo é lento e passar para o próximo requer sangue, suor e sofrimento dos personagens. É um dos momentos em que Mendoza é mais desafiado e onde Sarchie tem que provar ser um novo homem. Conforme o exorcismo é executado, os personagens vão se gastando emocionalmente e no fim da cena, os espectadores estão tão cansados quanto os protagonistas. Também é o momento mais gráfico do filme que, apesar de nunca ser explícito, requer estômago em certas partes, incluindo essa.

Livrai-nos do Mal sofre apenas com um clichê de família policial, mas é difícil imaginar a história funcionando sem ele, o que é um mérito do roteiro, porque esse tipo de coisa pode rapidamente se tornar irritante e cansativo. Por outro lado, a presença da cultura latina e do linguajar espanhol adicionam, como em um filme do Del Toro, um elemento exótico à atmosfera. Derrickson se prova um cineasta competente, e para os fãs da Marvel isto é uma boa notícia.

Ele vai, afinal de contas, dirigir a esperada estréia do Doutor Estranho na telona, e a julgar por este filme, ele vai se sentir em casa. Se a Marvel for esperta, o que já provou ser, vai atrás de Édgar Ramírez para o papel principal. Sua atuação aqui emana misticismo, e esta é uma característica forte do Doutor Estranho.

Para os fãs de terror, Livrai-nos do Mal é uma garrafa de água gelada no meio de um deserto. O filme nunca se preocupa em ser uma espécie de blockbuster ou apelar para todas as audiências. Ele sabe muito bem o que é e não desvia do seu caminho em nenhum momento. 2014 já teve ótimos filmes em praticamente todo gênero, mas estava faltando algo no terror. Bom, agora não está mais.

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