Tópicos | ANADEP

Oitenta e sete entidades, entre as quais o Instituto Brasileiro de Ciências Criminais (IBCCrim), a Associação Nacional das Defensoras e Defensores Públicos (Anadep), o Núcleo Especializado de Situação Carcerária da Defensoria Pública de SP e o Instituto de Defesa do Direito de Defesa (IDDD), encaminharam, na quarta-feira (20), a uma série de autoridades do Governo Federal, uma nota técnica conjunta contra a privatização do sistema prisional, solicitando o fim dos incentivos para a transferência da gestão de presídios à iniciativa privada por meio do BNDES e de isenções fiscais previstas no Decreto 11.498/2023.

As entidades entendem que é preciso, com urgência, “a revisão do posicionamento do Governo Federal nesse tema, sobretudo considerando que há procedimento licitatório em andamento para a privatização do Presídio de Erechim, no Rio Grande do Sul, cujo leilão está previsto para o dia 06.10.2023. Com base na nova política de incentivo às privatizações do Governo Federal, estipulou-se o dispêndio de recursos públicos, via BNDES, de valor estimado em 150 milhões de reais para subvencionar a construção desse presídio pela iniciativa privada. Ainda, por meio de celebração de parceria público-privada, a empresa vencedora será remunerada pela gestão de uma concessão pública com 30 anos de duração, incluindo os serviços de manutenção das instalações, limpeza e apoio logístico na movimentação das pessoas presas”.

##RECOMENDA##

Um dos riscos desse processo, argumenta a nota, é que “as empresas privadas absorvam a gestão prisional e a transformem em um mercado lucrativo. Os contratos firmados com a iniciativa privada parecem querer favorecer o encarceramento em massa, com a aposição de cláusulas contratuais que exigem taxas mínimas de lotação das unidades prisionais, aliadas à remuneração da empresa por cada pessoa encarcerada, com a submissão dos corpos negros a trabalhos forçados e aumento das margens de lucro com a precarização ainda maior do sistema prisional”. 

A nota foi encaminhada, entre outros, aos Ministros da Fazenda, da Justiça e Segurança Pública, do Planejamento e ao Presidente do BNDES. 

“É inadmissível que violações de direitos humanos se agravem, de forma crônica, sob o manto de um discurso ressocializador que conta com incentivos fiscais e investimentos milionários do atual Governo Federal, dentro de um sistema carcerário cujo estado de coisas já é reconhecidamente ilegal e inconstitucional pela própria Suprema Corte Brasileira na Medida Cautelar da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental nº 347/2015.” 

*Da assessoria 

O Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu, nesta quinta-feira (30), rejeitar uma ação que pedia, entre outras coisas, o direito de aborto para grávidas infectadas pelo vírus da zika. A Corte já havia formado maioria no sábado (25). O último a votar foi o ministro Luís Roberto Barroso, que acompanhou a relatora, Cármen Lúcia, mas, com ressalvas, reiterando posicionamento pela descriminalização do aborto.

O processo, movido pela Associação Nacional de Defensores Públicos (Anadep), e foi analisado no plenário virtual da Corte, uma ferramenta online que permite aos magistrados votarem sem se reunir presencialmente. A relatora do caso, ministra Cármen Lúcia, votou por rejeitar a ação - no jargão jurídico, "não conhecer" a ação, sem analisar o mérito.

##RECOMENDA##

Único a apresentar ressalvas, Barroso afirmou que, diante da maioria que já se formou no plenário virtual para negar seguimento à ação, não abriria divergência.

Barroso contra a criminalização

Por outro lado, disse entender que a Anadep tinha legitimidade para entrar com a ação e considera que 'a extinção das ações adia a discussão de um tema que as principais supremas cortes e tribunais constitucionais do mundo em algum momento já enfrentaram'.

"A reflexão que se segue, portanto, parece-me necessária e, em rigor, transcende a questão da Zika e da microcefalia, alcançando os direitos reprodutivos das mulheres de maneira geral", afirma.

Barroso ressaltou que 'o aborto é um fato indesejável, e o papel do Estado e da sociedade deve ser o de procurar evitar que ele ocorra, dando o suporte necessário às mulheres'. "Essa é a premissa sobre a qual se assenta o raciocínio aqui desenvolvido".

O ministro reiterou posicionamento externado durante durante julgamento na Primeira Turma, em 2016, em que se manifestou pela descriminalização do aborto na análise de prisão preventiva de médicos e funcionários de uma clínica. Na ocasião, por maioria, a turma concedeu habeas corpus para soltura dos envolvidos.

Segundo Barroso, 'o tratamento do aborto como crime não tem produzido o resultado de elevar a proteção à vida do feto'. "Justamente ao contrário, países em que foi descriminalizada a interrupção da gestação até a 12ª semana conseguiram melhores resultados, proporcionando uma rede de apoio à gestante e à sua família".

"Esse tipo de política pública, mais acolhedora e menos repressiva, torna a prática do aborto mais rara e mais segura para a vida da mulher", afirmou.

Barroso disse ainda que o 'acesso aos serviços públicos de saúde, aconselhamento adequado, informações sobre métodos contraceptivos e algumas gotas de empatia produzirão melhor impacto sobre a realidade do que a ameaça de encarceramento'.

"Atirar no sistema penitenciário mulheres que já vivem um quadro aflitivo, quando não desesperador, é não compreender a grandeza do sofrimento de quem se encontra em tal situação. Ninguém faz aborto por prazer ou por perversidade", escreveu.

O ministro ainda afirmou ser importante 'registrar que praticamente nenhuma democracia desenvolvida do mundo combate a interrupção da gestação com direito penal. "Justamente porque existem alternativas menos traumáticas e mais eficientes". "Há de haver alguma razão para isso".

Por outro lado, disse que se deve ter um 'profundo respeito pelo sentimento religioso das pessoas', ao lembrar que a 'tradição judaico-cristã condena o aborto'. "E, portanto, é plenamente legítimo ter posição contrária ao aborto, não o praticar e pregar contra a sua prática".

"Mas será que a regra de ouro, subjacente a ambas as tradições - tratar o próximo como desejaria ser tratado - é mais bem cumprida atirando ao cárcere a mulher que passe por esse drama? Pessoalmente, não creio. Portanto, sem abrir mão de qualquer convicção, é perfeitamente possível ser simultaneamente contra o aborto e contra a criminalização", concluiu.

'Não haverá aborto'

Na última quinta-feira (30), o presidente Jair Bolsonaro disse que enquanto for presidente "não haverá aborto". Na saída do Palácio da Alvorada, o presidente parou para falar com apoiadores e ouvir um coral de crianças coordenadas pelo padre polonês Pedro Stepien. As crianças cantaram uma música religiosa e fizeram um pedido ao final: "Senhor presidente, temos um pedido para o senhor, não queremos aborto".

O Código Penal prevê que a interrupção da gravidez no Brasil é permitida apenas nos casos em que a gestante corre risco de vida ou quando a gravidez decorre de estupro. Em 2012, o STF decidiu que não é crime a interrupção da gravidez em casos de anencefalia.

Omissões

Ao entrar com a ação no STF, a Anadep apontou falhas do Poder Público no acesso à informação, a cuidados de planejamento familiar e aos serviços de saúde no enfrentamento do zika, além de omissão sobre a possibilidade de interrupção da gravidez para mulheres grávidas infectadas pelo vírus.

A Anadep também pede a obrigação de haver médicos capacitados para o diagnóstico clínico de infecção por zika em unidades do SUS e a imediata disponibilidade nos hospitais de exames para a detecção da infecção.

Em 2016, em manifestação encaminhada ao Supremo, o então presidente do Senado, Renan Calheiros (MDB-AL), por meio da Advocacia do Senado Federal, alegou que o aborto nessas circunstâncias "diz respeito a um dissenso moral profundo", sobre o qual dificilmente os parlamentares vão adotar uma "uniformidade de posições". Para o Senado, a "repulsa ao aborto está profundamente arraigada na cultura brasileira".

Leianas redes sociaisAcompanhe-nos!

Facebook

Carregando