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“Desde que o governo Bolsonaro começou, já havia um clima de apreensão interna em relação a como trabalhar essas questões dos arquivos da Ditadura, mas, com o tempo, as chefias traziam várias orientações em várias áreas. Alguns assuntos deviam ser evitados”.

Funcionários do Arquivo Nacional, órgão responsável por preservar e divulgar documentos históricos do Brasil, relataram ao Brasil de Fato um cenário de "censura não escrita", mas presente na rotina interna: ordens para evitar ao máximo divulgação de datas e documentos do regime militar.

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A reportagem ouviu três servidores de carreira do órgão, sob a condição de anonimato. Além do clima de vigilância e de possíveis retaliações, os três apontaram manobras nas gestões ligadas ao presidente Jair Bolsonaro (PL) para minar o trabalho em temas considerados incômodos.

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Uma delas é a mudança nas regras de gratificações, consideradas diferenciadas no funcionalismo público, que "ficaram maiores para cargos de chefia e menores para quem realmente toca o trabalho do dia a dia".

Eles também comentaram as consequências do Decreto 10.148, assinado pelo ex-ministro Sergio Moro em 2019, quando ainda estava à frente do Ministério da Justiça e Segurança Pública, que retira do Arquivo Nacional a prerrogativa de decidir sobre a eliminação, ou não, de documentos produzidos pelos diferentes órgãos públicos.

Nenhum dos profissionais disse ter conhecimento sobre a destruição deliberada de documentos públicos que já constam na base de dados de arquivos relativos à Comissão Nacional da Verdade (CNV) ou outros que possam ser considerados ameaçadores, mas temem pela integridade dos que ainda estão em posse dos diferentes ministérios e órgãos de governo.

Decreto esvaziou atribuição do órgão para avaliar eliminação de documentos

Jaime Antunes, ex-diretor do Arquivo Nacional e longevo ex-presidente do Conselho Nacional de Arquivos (Conarq), explica que a norma retira da entidade a função de arbitrar sobre as decisões de preservação, ou não, de documentos em ministérios como o da Defesa, por exemplo.

Em sua opinião, esse decreto é um "balão de ensaio para um outro que ainda não saiu, mas que já está no governo federal" e que fere o conteúdo do artigo 18 da lei 8.159 de 1991. 

"A intenção está no porvir. Eles querem que o órgão passe a ser o que produz o documento, aplica uma tabela de temporalidade criada pelo Arquivo Nacional e que também passe a ser o guardião da documentação considerada permanente", comenta o arquivista que também alerta para o fato de os documentos digitais serem mais vulneráveis a interferências que os documentos físicos. "Eu não sei se os ministérios estão dando conta de fazer uma boa gestão desse volume de informação".

Bruno Morasutti, advogado e membro do Fórum de Acesso a Informações Públicas, critica que uma decisão "tão importante" tenha sido tomada sem ser debatido com a sociedade, que é a maior interessada no controle da administração pública, inclusive por fóruns de controle externos, como os tribunais de contas regionais ou federais.

"Nos preocupa que a gestão e destinação de documentos públicos estejam sendo tomadas por pessoas que, em muitos casos, não possuem qualificação adequada para isso e que não observam critérios reconhecidamente importantes para fins de preservação de conhecimento”, protesta.

Por sua vez, a direção do Arquivo Nacional refuta as acusações de desvio de finalidade e argumenta em seu site oficial que o decreto possui o aval do corpo técnico e visa dar "maior autonomia técnica e responsabilidade para os órgãos e entidades da APF [administração pública federal] na análise e destinação final dos documentos públicos por elas produzidos e recebidos".

Ex-diretor vê "descontinuamento" de ações de memória da Ditadura

Antunes, que já está desvinculado de suas antigas funções, relembra os esforços que envolveram a busca, catálogo e muitas vezes restauração de documentos relacionados à ditadura militar (1964-1985), que fazem parte do acervo da Comissão Nacional da Verdade, cujos trabalhos ocorreram entre 2011 e 2014.

Ele acredita que o material está sendo pouco aproveitado e menciona o prêmio bianual Memórias Reveladas, que tradicionalmente seleciona e publica as melhores monografias com base em fontes documentais desse período, mas que tem sido ignorado. A quarta e última edição do prêmio ocorreu em 2018.

“Eles não fecharam o Memórias Reveladas, que tem uma base de dados disponível, mas nunca mais convocaram o conselho deliberativo. Ou seja, descontinuaram. Isso significa definir critérios para a visão de cada gestor de que aquilo não tem significância para o momento. Então, se são capazes disso, me parece que são capazes de outras coisas. Não creio que seja de eliminar documentos, porque, como eles estão na base de dados, isso seria mais visível", reforça.

Decisão judicial retirou trechos de relatório da Comissão da Verdade 

A ameaça real sobre a preservação da memória sobre os ditos "Anos de Chumbo" ficou escancarada em um episódio que veio a público em fevereiro deste ano. A Justiça Federal de Pernambuco determinou que o nome do ex-coronel da Polícia Militar Olinto de Souza Ferraz fosse retirado de relatórios da Comissão da Verdade. Tarjas pretas foram dispostas em pelo menos três páginas do relatório sobre o nome dele.

Ferraz era listado como autor de graves violações aos direitos humanos enquanto dirigia a Casa de Detenção do Recife. Em 1971, a morte de Amaro Luiz de Carvalho (1931-1971), militante do Partido Comunista Revolucionário (PCR), no presídio foi relatada à época como envenamento "por seus pares".

Mais tarde, a Comissão da Verdade concluiu que Amaro foi morto "por ações impetradas pelo Estado", tendo em vista que o atestado de óbito apontava para uma "hemorragia pulmonar decorrente de traumatismo de tórax por instrumento cortante".

Bruno Morasutti considera que a decisão "isolada de um juiz" abre um precedente que pode ser explorado em outras situações no futuro. "Ela é bem equivocada do ponto de vista da legislação, representa um retrocesso, mas é importante deixar claro que o próprio Supremo Tribunal Federal [STF] já possui entendimento de que no Brasil não existe direito ao esquecimento”.

Antunes também lamenta não apenas a decisão em uma matéria que correu "anonimamente" no âmbito do Arquivo Nacional, mas também a postura da Advocacia-Geral da União (AGU) no episódio, que determinou a execução imediata do apagamento do arquivo.

Segundo ele, há outras soluções já previstas que poderiam ser tomadas para preservar a integridade dos documentos. “Se a pessoa se sente atingida, o mais correto seria a documentação não ceder parte alguma e possibilitar que seja anexada a versão da pessoa que se sentiu lesada", elucida o ex-diretor no que considera ser a saída mais democrática. "Ao consultar as informações, o pesquisador pode confrontar as informações e ter acesso ao contraditório", detalha.

*Por Paulo Motoryn e Alex Mirkhan, para o Brasil de Fato

A ex-presa política Iara Xavier, que perdeu os irmãos Iuri e Alex e o companheiro Arnaldo Cardoso nos anos da ditadura militar, acredita que a Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos tem muita coisa a fazer, mas poucos recursos e nenhuma estrutura à disposição. "Um primeiro trabalho seria sistematizar todos os documentos já existentes sobre os mortos e desaparecidos, o que ainda não foi feito", afirma. "As dificuldades são tão grandes que eu tive que esperar 42 anos para conseguir a identificação de um dos meus irmãos, enterrado com nome falso."

Segundo Iara, a comissão, além de não ter recursos, não dispõe de pessoal. "Os membros honorários são pessoas que não ficam em Brasília, têm atividades paralelas e só aparecem de vez em quando. Existe um coordenador executivo, que é sempre uma indicação política da Secretaria de Direitos Humanos. É preciso trabalhar mais, destravar as buscas."

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Ivan Seixas, que também foi preso político e já atuou como assessor da Comissão Especial, coordenando buscas de desaparecidos em diferentes partes do País, concorda com as queixas da atual presidente sobre falta de recursos e de pessoal. "Ela é comissão de Estado, criada por lei, mas que tem sido tratada como uma comissão de governo", afirma. "Não tem funcionários nem dotação orçamentária. Não tem vida própria, enfim. Foi isso que a procuradora Eugenia Gonzaga, que já criticava a comissão quando estava fora dela, percebeu ao entrar."

Segundo Seixas, é possível avançar mais do que já foi feito na busca dos mortos e desaparecidos políticos.

Em seu mandato-tampão na Secretaria de Direitos Humanos, a ministra Ideli Salvatti (que foi mantida no cargo pela presidente Dilma Rousseff) deu prioridade às buscas dos mortos e desaparecidos políticos nos anos da ditadura. Ela se empenhou particularmente no caso das ossadas retiradas de uma vala clandestina do Cemitério Dom Bosco em São Paulo, que há 24 anos esperam para ser analisadas. Acredita-se que no meio delas estejam os restos mortais de mais de uma dezena de desaparecidos políticos.

A análise das ossadas está sendo realizada por meio de um convênio com a Universidade Federal de São Paulo (Unifesp). Embora apoie e elogie a iniciativa da ministra, a procuradora Eugenia, ressalva que ela não ajuda a fortalecer a Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos. "Esse convênio se refere a um caso específico, o das ossadas de Perus. Ele vai deixar um legado para a Unifesp, que pode se oferecer para prestar outros serviços semelhantes no futuro. Mas a equipe não está vinculada à Comissão Especial. Se, no futuro, disser que o seu trabalho vai se resumir ao das ossadas, ele pode fazer isso. Nós queremos uma equipe técnica vinculada à nossa comissão."

Segundo a presidente da comissão, o governo também precisaria redefinir a questão das buscas dos restos mortais dos guerrilheiros desaparecidos no conflito ocorrido na região do Rio Araguaia, na década de 1970, e que ficou conhecido como Guerrilha do Araguaia. Hoje as buscas naquela área são realizadas por um grupo de trabalho do qual fazem parte os ministérios da Defesa, Justiça e Direitos Humanos, com uma pequena participação da Comissão Especial. "Eu questiono esse formato", diz a procuradora. "O governo deveria dar condições à Comissão Especial para encabeçar as buscas." As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

A Comissão Nacional da Verdade (CNV) e a Comissão Estadual da Memória e Verdade Dom Helder Câmara (CEMVDHC) vão comandar atividades conjuntas no Recife, nesta segunda (13) e terça-feira (14). Na primeira atividade, as Comissões vão ouvir agentes de repressão, durante uma audiência pública, para esclarecer episódios ocorridos durante o regime militar. A oitiva acontecerá hoje a partir das 15h, no Centro de Convenções, em Olinda. Cinco integrantes do grupo nacional participam da audiência. 

Já nesta terça, os grupos vão visitar às antigas instalações do Dops e do DOI-CODI, onde hoje funcionam o Hospital Militar de Área do Recife e a Associação dos Delegados de Polícia de Pernambuco, respectivamente. Esta é a primeira vez que o colegiado federal realiza a visitação em unidade das Forças Armadas utilizadas como centros de tortura no estado. Ex-presos políticos também devem participar do evento no local para ajudar na identificação das instalações. 

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O empresário Humberto Costa Pinto prestou depoimento espontâneo à Comissão Nacional da Verdade (CNV) na tarde desta terça-feira, 29, para denunciar o enriquecimento ilícito de militares e pessoas ligadas à ditadura militar brasileira.

Ele contou que em 1982, sua empresa S.A. Costa Pinto, que atua no ramo açucareiro, teve o contrato com o Instituto do Açúcar e do Álcool (IAA) rescindido unilateralmente. A empresa, que vendia açúcar para o IAA, foi substituída pela empresa Mapa, que era comandada por pessoas ligadas ao governo.

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De acordo com Costa Pinto, a rescisão do contrato foi possível por meio de "uma suposta dívida, que jamais existiu, combinada com o Banco de Comércio e Indústria de São Paulo (que não existe mais)". O banco "iniciou uma cobrança indevida, em conluio com a administração do IAA, com fim específico e claro de cancelar o contrato de quatro anos (conosco), já que no momento que o Instituto assinou o contrato com a Mapa, não havia condições físicas de atender aos dois contratos".

O advogado José Neves Filho, que acompanhou o depoimento do empresário, ressaltou que o contrato com a Costa Pinto "era muito benéfico para a União e para o próprio IAA, mas o novo contrato, ao contrário, era maléfico para ambos", possuía "cláusulas altamente duvidosas", além de causar "prejuízos para a União".

Na época, o IAA era controlado pelo coronel Confúcio Pamplona, que substituiu um especialista civil e, em seguida, mudou o contrato. A mudança foi alvo de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) e de um parecer da Procuradoria da República. "(A Costa Pinto) era uma empresa importante e com bastante credibilidade na época, que foi destruída em muito pouco tempo para beneficiar a empresa ligada a eles (militares)", desabafou o empresário.

Para José Carlos Dias, um dos membros da CNV, o depoimento de Costa Pinto é relevante porque elimina "o mito de que os militares não tinham envolvimento econômico e interesse de enriquecer". Ele ressaltou que o empresário apresentou documentos e fatos que comprovam as irregularidades cometidas pela Mapa na venda de açúcar para o IAA.

"Na venda se produz um modelo que sempre deixava dinheiro nas mãos de uma empresa controlada por gente que era ligada à comunidade de informações (dos militares)". "Eu devia (esse esclarecimento) à minha família, ao meu pai. Trinta anos depois tenho a oportunidade real e concreta de colocar as coisas como realmente aconteceram", disse Costa Pinto, emocionado.

Apontado como próximo aos militares que atuaram na Casa da Morte, em Petrópolis, na região serrana do Rio, durante a ditadura militar, o delegado Mauro Magalhães negou à Comissão Nacional da Verdade (CNV) que tivesse intimidade com os agentes.

Ele confirmou, no entanto, que conheceu o então capital do Exército Paulo Malhães, morto em abril, por meio do comissário de polícia Luiz Cláudio Azeredo Viana, o Luizinho, identificado pela revolucionária Inês Etienne como Laurindo, um de seus torturadores na Casa da Morte.

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Quando perguntado sobre os presos políticos que foram levados para a cidade quando ele chefiava a delegacia local disse que "nunca soube de nada". Magalhães também negou a existência da Casa da Morte. "Não confirmo até hoje porque não sei nem onde fica", disse.

O delegado disse que Malhães, torturador confesso de presos políticos, foi à delegacia "no máximo quatro vezes" para "tomar um cafezinho". No depoimento, o policial chegou a afirmar que foi considerado "subversivo" pelos militares. "Eles não me tinham como homem de confiança. Iam me revelar o quê, que estavam matando, batendo e prendendo? Nunca fariam isso".

Magalhães também disse que conheceu Ailton Guimarães Jorge, o Capitão Guimarães, apontado por violações de direitos humanos no DOI-Codi, no Rio e na 1ª Cia da Polícia do Exército da Vila Militar. O militar foi convidado para também prestar depoimento nesta terça-feira, 29, mas alegou problemas de saúde.

Após o depoimento, o membro da CNV José Carlos Dias disse que Magalhães perdeu uma oportunidade para contar sua versão sobre os atos cometidos durante a ditadura militar. "Não se pode admitir que ele tendo sido delegado (de Petrópolis) quando a Casa da Morte fazia suas vítimas na cidade não saiba de nada. Acho impossível, mas ele tem o direito de mentir em sua defesa". Ele lembrou, porém, que o delegado "está sendo desmentido por várias testemunhas e documentos".

O capitão do Exército Jurandyr Oschendorf e Souza se manteve calado durante depoimento à Comissão Nacional da Verdade (CNV). "Vou me manter calado. Nada a declarar", disse ao coordenador da CNV, Pedro Dallari. O advogado Rodrigo Roca, que também defende o general reformado Nilton Cerqueira e Jacy Oschendorf (que prestaram depoimento mais cedo), afirmou que orientou seus clientes a permanecerem calados.

"Acredito no trabalho da Comissão, mas o açodamento de alguns declarantes acaba induzindo a Comissão a erro, como na questão da fotografia do coronel (Freddie) Perdigão". Na semana passada o delegado Claudio Guerra afirmou que uma das pessoas na foto do acidente de carro que matou a estilista Zuzu Angel, em 1976, seria o coronel Freddie Perdigão. "Senhor Presidente, não era ele na fotografia. Isso foi um erro histórico", completou Roca.

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O advogado alega que "esse engano provocou um transtorno para os familiares e companheiros de farda" de Perdigão e que a informação é "uma inverdade que a população acredita ser verdadeira". "É por essa razão que eles estão ficando em silêncio." Roca também alega que as informações dadas por seus clientes à CNV têm sido usadas em ação movida pelo Ministério Público Federal (MPF) por crimes cometidos durante a ditadura militar.

O coordenador Pedro Dallari disse que o silêncio dos militares "é uma manifestação completamente contraditória, porque, se há um erro, o erro só pode ser corrigido com depoimentos, com elementos, com documentos e não com o silêncio".

O presidente da Comissão Nacional da Verdade, Pedro Dallari, disse nesta sexta-feira, 25, que o ex-agente da ditadura Freddie Perdigão está associado à morte da estilista Zuzu Angel, na estrada da Gávea, no Rio de Janeiro, na madrugada de 14 de abril de 1976. Ele chegou à conclusão após analisar uma fotografia, publicada pelo jornal O Globo um dia após o carro dela colidir na mureta de um viaduto na saída do Túnel Dois Irmãos e cair de um ribanceira. Perdigão, que atuou na "Casa da Morte", um centro de torturas de Petrópolis, seria um dos homens à paisana que aparecem próximos ao carro capotado da estilista. Ele morreu em 1997.

Quem associou Perdigão ao homem fotografado foi o ex-agente da Polícia Civil do Espírito Santo Cláudio Guerra. Em depoimento na última quarta-feira, ele contou que ouviu histórias do período do próprio Perdigão, morto em 1997. Guerra chegou a apresentar a fotografia recortada, em que aparece apenas o rosto do suposto participante na morte da estilista. À comissão, Guerra disse que obteve a imagem numa pesquisa recente no acervo do Globo. Na tarde de hoje, o jornal informou que a imagem foi publicada no dia 15 de abril de 1976.

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Desde 1998, o Estado reconhece que Zuzu Angel foi assassinada por agentes do regime militar. Naquele ano, a Comissão Especial de Mortos e Desaparecidos avaliou que um carro possivelmente ocupado por militares fechou o carro Karmann Ghia guiado pela estilista na estrada da Gávea. Ela morreu no local. Na época, Zuzu fazia campanhas para exigir o corpo de seu filho, o estudante de economia e militante de esquerda Stuart Angel Jones, morto em 1971, na Base Aérea do Galeão.

Um ano e meses após ser criada, a comissão mantém seus trabalhos apenas com material já divulgado pela imprensa e por grupos de famílias de mortos pela ditadura. Os comandantes das Forças Armadas se recusam a entregar os arquivos oficiais dos centros de inteligência relativos ao período da ditadura. Até agora, membros da comissão tentam convencer o Planalto a intervir para garantir um relatório final com novos dados sobre a repressão, especialmente a localização dos corpos de guerrilheiros ainda não entregues às famílias.

A Comissão Nacional da Verdade classificou nesta quarta-feira (2) como "deplorável" os relatórios entregues pelas Forças Armadas que negam a existência de torturas e outras violações em sete das suas unidades durante a ditadura militar. Os documentos, entregues por Marinha, Exército e Aeronáutica na semana passada, informam que, nos sete locais sobre os quais a Comissão pediu informações, os "presos tinham boas condições para o cumprimento das penas que lhes foram imputadas".

Em nota, a comissão revelou que está elaborado e enviará nos próximos dias ao Ministério da Defesa um pedido de esclarecimento sobre as conclusões das sindicâncias, "diante da completa incorreção dessa conclusão". O texto lembra, ainda, que a própria comissão, ao pedir os relatórios, enviou informações detalhadas e que o próprio Estado brasileiro já reconheceu a responsabilidade por "condutas criminosas de militares e policiais praticadas durante a ditadura, incorrendo inclusive no pagamento de indenizações por conta justamente de fatos agora surpreendentemente negados".

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A Comissão pediu informações sobre sete unidades: três unidades do Destacamento de Operações de Informações, a Ilha das Flores, em São Gonçalo (RJ), a Base Aérea do Galeão, o Quartel do 12º Regimento de Infantaria do Exército, em Belo Horizonte, e 1ª Companhia de Polícia do Exército da Vila Militar, no Rio de Janeiro. Nos seus relatórios, as Forças Armadas responderam que não houve desvio de função dos órgãos citados, incluindo a base aérea e os quartéis. Na Ilha das Flores, a Marinha informa que foi transformada em prisão em um aviso ministerial, mas que os presos tinham boas condições de acomodação.

Sobre as unidades do DOI, criadas pelo Exército para levantar informações e que foi o principal centro de tortura das Forças Armadas, os militares informaram que não há registro da sua criação formal, mas que eram "legalmente constituídos" - mesmo sem nenhum registro - e que por isso a destinação de espaços para que funcionassem estavam dentro da lei. Não há nenhuma citação aos casos de tortura que teriam acontecido nesses locais.

O corpo de Stuart Angel, militante do grupo de guerrilha urbana MR-8 morto e desaparecido em maio de 1971, pode ter sido enterrado na cabeceira da pista da Base Aérea de Santa Cruz, na zona oeste do Rio. A revelação foi feita pelo capitão reformado da Aeronáutica Álvaro Moreira, que prestou depoimento à Comissão Nacional da Verdade (CNV) em setembro de 2013 e fevereiro de 2014.

O capitão contou ter ouvido do sargento José do Nascimento Cabral, já morto, a versão a respeito do enterro do corpo de Stuart Angel. Cabral era controlador de voo na Base Aérea de Santa Cruz e estava de plantão na noite em que houve uma visita de um grupo de oficiais comandado pelo brigadeiro José Paulo Moreira Burnier (1919-2000). Burnier teria ordenado o fechamento da pista.

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Nascimento afirmou que, a partir da torre de controle, conseguiu observar o enterro de uma pessoa. "À época, os colegas de José do Nascimento Cabral na Base Aérea de Santa Cruz presumiram tratar-se do corpo de Stuart", informa relatório da CNV divulgado nesta segunda-feira, 09, no Rio.

O capitão Álvaro Moreira foi cassado logo após o golpe militar e não teve contato com José do Nascimento Cabral até sua morte, provocada por câncer. O capitão reformado procurou a CNV para narrar o episódio.

A CNV confirmou que José do Nascimento Cabral trabalhava na Base Aérea de Santa Cruz em maio de 1971.

De acordo com André Saboia, secretário-executivo da CNV, a comissão agora busca informações mais precisas para localizar os restos mortais de Stuart. A pista da base aérea passou por reformas. A construtora responsável pela ampliação da pista informou à CNV que não guardou os diários de obra do período da reforma.

Para o coordenador da CNV, Pedro Dallari, o depoimento de Álvaro Moreira "parece bastante verossímil". "Essa forma de dar tratamento ao corpo parece condizente com o padrão que se adotava à epoca, de buscar locais ermos", afirmou Dallari. Ele citou o caso do ex-deputado federal Rubens Paiva, cujo corpo foi enterrado inicialmente no Alto da Boa Vista.

A jornalista Hildegard Angel, irmã de Stuart Angel, reagiu emocionada à divulgação do relatório da CNV. "Enfim tenho informações que me parecem objetivas a respeito do paradeiro dos restos mortais do meu irmão", afirmou. Ela disse esperar "o espírito colaborativo" do Ministério da Defesa e do Comando da Aeronáutica para obter informações que permitam a localização do corpo. "Esse espírito colaborativo não é para comigo nem para a família do Stuart. Essa impunidade, essa falta de valores humanos, é resultado da falta de esclarecimento. É tempo de corrigir esse erro de percurso", afirmou.

Hildegard disse esperar que os oficiais que atuavam na época e estão sendo localizados pela CNV contem o destino dado a seu irmão. "Eles não são patriotas? Não julgam que estavam cometendo atos patrióticos? Que revejam os erros, os equívocos e cometam atos patrióticos, que é revelar a verdade. Façam um revisão de consciência, contem o que sabem, deem sossego às famílias brasileiras, à memória, à história brasileira. Um país sem história não é um país digno, uma pátria. Temos que dar aos nossos heróis a honra de sua verdadeira história", afirmou, muito emocionada.

Pela manhã, integrantes da CNV ouviram o depoimento do capitão Lucio Valle Barroso, chefe de operações do 3º Comar (Comando Aéreo Regional) em 1971. Ele negou ter visto Stuart Angel na unidade, ao contrário do que havia admitido à Comissão Estadual da Verdade do Rio.

Parte da Comissão Nacional Verdade viajou para a cidade de Santiago, no Chile, no intuito de buscar provas de que militares brasileiros instruíram técnicas de tortura ao governo de Augusto Pinochet. O colegiado suspeita que os chilenos também sofreram com a ditadura no Brasil.

Segundo documentos obtidos pela Comissão, existem vestígios de que Brasil e Chile já firmavam um pacto de cooperação antes da criação da Operação Condor, na década de 1970. 

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A Operação Condor foi uma aliança político-militar entre os países da América do Sul para perseguir os grupos que faziam oposição aos sistemas ditatoriais instalados na região.

O encontro com líderes de dez centrais sindicais, realizado no último sábado (1°), no Paço Municipal de São Paulo, homenageou sindicalistas e trabalhadores perseguidos pelo regime militar, 50 anos depois da instauração da ditadura civil militar no país. No ato coordenado pelo diretor da Associação dos Metalúrgicos Aposentados Anistiados do ABC (AMA-A/ABC), Djalma Bom, que também foi vítima do regime militar, houve a entrega de diplomas, encenações de teatro, vídeos, discursos de convidados e de líderes da classe trabalhadora, além da  distribuição de uma carta.

Presente no evento, a coordenadora da Comissão Nacional da Verdade, Rosa Cardoso, relevou o papel dos trabalhadores desde o século passado como motivador de mudanças em favor do bem coletivo. 

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Na lista de quase 500 homenageados estavam nomes como o de Virgílio Gomes da Silva, operário da indústria química, morto durante a perseguição durante o regime militar e que foi representando no ato pela mulher, Hilda Gomes da Silva. Em meio aos discursos, foi exibido um vídeo com depoimentos sobre as perseguições.

Integrantes da Comissão Nacional da Verdade querem transformar o projeto de resgate e reconstrução histórica, entre os anos de 1946 a 1985, em um projeto permanente de pesquisa e memória por conta do volume de material que ainda falta ser analisado pelo grupo. O prazo das atividades do colegiado é de dois anos podendo ser prorrogado por mais dois.

Uma das principais ações da CNV foi à autorização para a realização da exumação do corpo do presidente João Goulart. Há uma hipótese que Jango possa ter sido envenenado. Outros personagens históricos estão sendo analisados por grupos dissidentes do colegiado. A Comissão da Verdade de São Paulo estuda a versão de que o acidente que levou a morte do ex-presidente Juscelino Kubitschek tenha sido planejado pelos militares no período da ditadura.

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Integrantes da Comissão Nacional da Verdade, da Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República, peritos da Polícia Federal e do Instituto de Medicina-Legal de Ribeirão Preto (SP), além de familiares, exumaram os restos mortais de Arnaldo Cardoso Rocha, integrante da Aliança Libertadora Nacional (ALN) morto em 1973. O procedimento é o mesmo já feito com pelo menos outros quatro militantes de esquerda mortos por agentes do governo no período da ditadura militar e que será realizado em outubro com os restos mortais do ex-presidente João Goulart, deposto pelo golpe militar de 1964, para verificar suspeita de que ele teria sido envenenado.

Arnaldo foi morto em 15 de março de 1973, em São Paulo. Pela versão oficial, ele teria sido atingido na perna, no supercílio e na mão em troca de tiros com agentes comandados pelo coronel reformado Carlos Alberto Brilhante Ustra, então comandante do Destacamento de Operações de Informações - Centro de Operações de Defesa Interna (DOI-Codi) do II Exército. Porém, segundo o coordenador da Comissão sobre Mortos e Desaparecidos, Gilles Gomes, uma análise preliminar após a exumação já revelou perfurações no ombro e no abdome do militante e a família de Rocha suspeita que ele tenha sido executado em uma emboscada.

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"O corpo foi pré-examinado no local e foram encontrados projetis", contou Gilles Gomes. O procedimento foi realizado no cemitério Parque da Colina, em Belo Horizonte (MG), na segunda-feira, 12, e os restos mortais foram encaminhados para o Instituto Nacional de Criminalística (INC) da Polícia Federal, em Brasília (DF). "Serão feitos exames patológicos e outros. Não há como prever um prazo para o laudo final, porque não se sabe o que será encontrado. (Mas) acreditamos que em 15 ou 20 dias já se tenha um resultado preliminar", observou.

A análise realizada no cemitério indicou também que o corpo de Rocha não foi submetido a necropsia, como afirmavam os documentos oficiais. O corpo foi entregue à família em caixão lacrado pelo DOI-Codi e a arma que estaria com o militante só foi formalmente apreendida quatro dias depois da morte. "Há indicativo de que houve uma execução e de que a cena foi montada", salientou Gomes. Ele observou que as características são as mesmas dos outros 360 opositores da ditadura militar que foram mortos ou dados como desaparecidos. "Em 99% dos casos, a versão propagada é de que foi uma troca de tiros com agentes do governo. Curioso que quase nunca houve mortes entre esses agentes", ressaltou o coordenador da Comissão Especial de Mortos e Desaparecidos.

Ex-presidente

Gilles Gomes espera que, assim como Arnaldo Rocha, a exumação dos restos mortais do ex-presidente João Goulart possam acabar com qualquer dúvida sobre as circunstâncias de sua morte. Laudo oficial aponta que ele foi vítima de um ataque cardíaco em 6 de dezembro de 1976, em Corrientes, na Argentina. Porém, o ex-agente do serviço secreto do Uruguai Mario Neira Barreto afirmou que Jango - como o ex-presidente era conhecido - foi vítima da Operação Condor, organizada pelos governos militares do Brasil, Argentina, Paraguai, Uruguai e Chile para combater opositores dos regimes.

Segundo Barreto, o ex-presidente teria sido envenenado por ordem do delegado Sérgio Paranhos Fleury, do Departamento de Ordem Política e Social (Dops) de São Paulo, com concordância do então presidente Ernesto Geisel. "Há provas de que João Goulart foi monitorado por sete anos, mesmo no exílio. Há fotos da casa dele, por exemplo. A exumação é só mais uma prova. Mesmo que exames toxicológicos não revelem nada, é possível concluir que os outros elementos sejam suficientes para confirmar que ele foi assassinado", concluiu Gomes. A Comissão Nacional da Verdade também investiga a possibilidade de outro ex-presidente, Juscelino Kubitschek, ter sido morto pelo governo militar.

Dois militares perseguidos pela ditadura prestaram depoimento nesta segunda-feira (12) a integrantes da Comissão Nacional da Verdade (CNV) e da Comissão Estadual da Verdade do Rio de Janeiro. Os filhos de três militares que também se opuseram ao regime também foram ouvidos.

José Bezerra da Silva, ex-cabo da Aeronáutica, contou que foi torturado na Base Aérea do Galeão, onde serviu entre 1971 e 1979. Ele disse ainda ter visto o militante Stuart Angel, filho da estilista Zuzu Angel, chegar preso à base. Stuart morreu em decorrência das torturas.

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"Os carros que entravam lá eram viaturas da Polícia do Exército, da Marinha e da Aeronáutica. Havia dois opalas, um bege e um cinza, que também entravam. Nós tínhamos que deixar eles passarem. Desses carros, saiam os presos, às vezes com capuzes, outras vezes dentro de sacos. Eles eram levados para o subterrâneo, e eram submetidos a torturas terríveis", contou Silva.

Ele apontou, em uma foto aérea da base, os pontos em que os presos políticos eram torturados. Hoje o local é um parque. "Eu acredito que esse presídio esteja coberto só por grama. Mas está lá, está tudo lá. Não tem nada queimado. Funcionário público não queima documento público".

Também foram ouvidos Belmiro Demétrio, que serviu em Canoas, e foi perseguido por ter manifestado apoio ao presidente João Goulart; Cláudia Gerpe Duarte, filha do major-brigadeiro Fausto da Silveira Gerpe, Carlos Augusto da Costa Rodrigues, filho do coronel Dagoberto Rodrigues, e Pedro Moreira Lima, filho do brigadeiro Rui Moreira Lima depuseram às Comissões. Estão previstos para esta terça-feira os depoimento outros seis militares perseguidos.

A greve geral de 1983, quando o movimento sindical convocou a população para uma paralisação contra o regime militar, vai ser relembrada no próximo dia 22. A Comissão Nacional da Verdade e o Coletivo Sindical anunciaram na última terça-feira (16) a realização do ato público. A mobilização deve relatar o papel de diversas empresas que apoiaram a ditadura.

“É importante lembrar que nós não estamos querendo um regresso a 64 (ano do golpe militar), e sim lembrar o que significou a repressão com a classe sindical. O movimento (de 83) foi um ato unitário. Ela foi fundamental para deslanchar a luta no final do período ditatorial”, explicou a coordenadora da Comissão Nacional da Verdade, Rosa Cardoso.

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O evento é organizado principalmente pelo Coletivo Sindical, composto por nove centrais: Central Única dos Trabalhadores (CUT), Força Sindical, Central Geral dos Trabalhadores (CGTB), União Geral dos Trabalhadores (UGT), Nova Central, Intersindical, Central Sindical Popular (Conlutas), Central dos Sindicatos Brasileiros (CSB) e Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil (CTB), que formou um grupo de trabalho chamado A Verdade e a Memória dos Trabalhadores por Justiça e Reparação.

“É uma oportunidade de reconstituir a história da violação de direitos dos trabalhadores em geral. Essa pauta vem desde a ocupação dos sindicatos, da cassação de líderes sindicais, da prisão, tortura e assassinato de lideranças sindicais, restrições de direitos, arrochos salariais e um pedido de reparação de uma análise das formas de reparação da vida. Há uma critica em relação a isso, vamos relacionar as questões do passado com a questão da falsa-democracia no presente” detalhou Rosa.

Os membros da Comissão Estadual da Memória e Verdade Dom Helder Câmara particiam de um encontro com o presidente da Comissão Nacional da Verdade, Claúdio Fonteneles, às 10h, no Recife Praia Hotel de Boa Viagem. Na reunião será discutido o intercâmbio de informação e o método de trabalho utilizado para se pesquisar assuntos relacionados aos crimes políticos praticados pelos agentes da Ditadura Militar. 

Ambas as comissões já assinaram em 2012 um Termo de Cooperação Técnica (TCT) com o objetivo de promover a mútua colaboaração para se apurar violações dos direitos humanos. A Comissão Dom Helder Câmara já repassou à Fonteneles documentos sobre o caso Padre Henrique.

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Nos arquivos revelados foram divulgadas informações de que na época que o padre Henrique foi assassinado, o Ministério da Justiça manipulou as investigações condizidas pelo Ministério Público e a Polícia Civil de Pernambuco.

Rio de Janeiro – Um debate nesta sexta-feira (7) em Petrópolis aprofundou as discussões sobre o tombamento da chamada Casa da Morte, no Quarteirão Suíço, imóvel que foi usado como centro de tortura durante a ditadura militar.

A integrante do Coletivo RJ Memória, Verdade e Justiça, uma das entidades que organizaram o debate, Ana Miranda, disse que a ideia é transformar o local em um centro de memória onde se discuta a vida, e não a morte.

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“O objetivo é discutir a importância dos lugares de memória hoje no Brasil, em especial o caso da Casa da Morte, tentar alavancar essa discussão e acelerar a implantação do centro. Também fazer com que as investigações sobre a Casa da Morte sejam feitas o mais rápido possível”.

Antes do debate, as organizações da sociedade civil promoveram um ato em frente ao imóvel, para lembrar os 165 mortos e desaparecidos no estado do Rio de Janeiro.

A advogada Rosa Cardoso, integrante da Comissão Nacional da Verdade (CNV), participou do debate e disse que um dos projetos da CNV, instalada em maio deste ano, é justamente transformar esses locais, onde foram cometidas atrocidades, em centros de preservação da memória, a exemplo do que ocorre em outros países.

“Essa política pública de preservação de espaços é um negócio que a gente tem visto não só na América Latina, na Europa, também em Israel. Há um movimento forte nesse sentido, aqui, no Cone Sul, mas próximo da gente, na Argentina, no Chile.”

De acordo com ela, para transformar os locais em centros de memória, primeiro é necessário que seja editado um decreto para transformar o lugar em espaço de utilidade pública. Depois, ele deve ser tombado e desapropriado para, então, ser feito o projeto de preservação com o levantamento da história do imóvel. No caso da Casa da Morte, a prefeitura de Petrópolis publicou em agosto o decreto. Rosa cita o modelo que funciona em São Paulo desde 2008.

“Lá em São Paulo foi criado o Museu da Resistência, no espaço onde funcionava o Departamento de Ordem Política e Social (Dops). Lá tem uma série de projetos políticos, culturais. Um levantamento foi feito sobre tudo que ocorreu naquele lugar”, disse.

A advogada informou que a CNV pediu a mudança de destinação do Destacamento de Operações de Informações - Centro de Operações de Defesa Interna (DOI-Codi) do Rio e de São Paulo, do Dops do Rio, que hoje abriga o Museu da Polícia Civil, do Dops de Minas Gerais e do chamado Dopinha de Porto Alegre.

São Paulo – A Comissão Nacional da Verdade fez nesta quinta-feira (8) a primeira reunião do grupo de trabalho que vai investigar o papel das igrejas na ditadura militar. Durante o encontro, especialistas e membros da comissão analisaram estudos acadêmicos existentes sobre o tema. “Estamos fazendo um primeiro balanço do estado da arte com especialistas e teremos que definir prioridades, porque não podemos tratar de todos os temas que envolvem essa questão”, apontou o professor Paulo Sérgio Pinheiro, coordenador do grupo.

Entre os casos que devem ser analisados está o do jornalista e ex-preso político Anivaldo Pereira Padilha. Ele foi delatado, no início da década de 1970, pelo pastor e pelo bispo da igreja da qual fazia parte. “Fui denunciado por minha atuação dentro da própria igreja. Na época, ocupava os cargos de diretor do Departamento Nacional de Juventude e editor de uma revista da igreja dirigida a esse público”, explicou. Padilha foi torturado e exilado, tendo retornado ao Brasil somente após a Lei de Anistia, em 1979.

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A criação do grupo foi proposta pela sociedade civil em audiências públicas promovidas pela comissão, informou a assessoria de imprensa do órgão. “As igrejas são instituições da maior relevância na sociedade e é evidente que, ao lado das Forças Armadas, do empresariado, dos organismos do Estado, ela deve ser investigada”, reforçou Paulo Sérgio Pinheiro. Ele ressaltou que serão igualmente analisados fatos ligados à colaboração das igrejas ao regime e também relacionados à resistência.

“É importante resgatar essa memória para compreender melhor o presente e o futuro e para que essas instituições deem conta do quão nefasto isso foi para a sociedade brasileira em termos de atraso para a construção de uma sociedade democrática. O não esclarecimento desses crimes contribui para que a tortura continue a existir na sociedade brasileira”, avaliou Anivaldo Padilha.

A comissão ouvirá testemunhas e irá analisar documentos nos próximos meses. O material servirá de base para um relatório, com primeira versão prevista para janeiro de 2013. “Não vamos privilegiar nenhuma igreja. Isso vai ser mapeado pela documentação e pelos casos que nós vamos levantar”, disse o coordenador.

A comissão é formada por pesquisadores que estudam diversas igrejas, como a metodista, presbiteriana, luterana, batista e Católica.

Para Anivaldo Padilha, que atualmente é líder ecumênico metodista, alguns setores das igrejas não devem reagir bem às investigações, mas descarta empecilhos às pesquisas. “Setores mais conservadores ou que são remanescentes de grupos que apoiaram a ditadura, esses setores não vão estar muito contentes”, avaliou.

O coordenador do grupo, no entanto, destaca que não houve manifestação formal de nenhum grupo religioso.

A Comissão Nacional da Verdade começou a analisar o inquérito e o processo sobre a morte do ex-presidente Juscelino Kubitschek, ocorrida em agosto de 1976. O documento foi encaminhado ao grupo encarregado de investigar crimes ocorridos durante o regime militar pela Comissão da Verdade da seção mineira da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-MG), que pede uma nova apuração do caso.

Segundo a advogada Rosa Cardoso, integrante da Comissão Nacional da Verdade, a documentação sobre a morte do ex-presidente já foi analisada por um assessor do grupo e pelo ex-procurador-geral da República Cláudio Fonteles, que também integra a comissão, mas ainda não há uma "interpretação conclusiva" a respeito do caso. "Já fizemos uma primeira leitura, mas é uma questão tão séria que vai ter que ser submetida a um conjunto de comissários, não apenas a um", observou Rosa.

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Como o jornal O Estado de S. Paulo revelou em maio, a OAB-MG contesta a versão de que JK foi vítima de um acidente automobilístico e aponta diversos "furos" por parte dos responsáveis pelas investigações oficiais nas 2.629 páginas divididas em quatro volumes que compõem o processo de apuração da morte. Para os integrantes da Comissão da Verdade da entidade mineira, o ex-presidente foi assassinado, opinião partilhada pelo secretário particular e amigo de JK, Serafim Jardim.

Nesta terça-feira (23), Rosa Cardoso, além de Maria Rita Kehl e José Carlos Dias, também integrantes da comissão, se reúnem com representantes da OAB-MG em Belo Horizonte. Nesta segunda, o trio participou de audiência na Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) para ouvir relatos de três vítimas da ditadura militar: o professor Apolo Heringer, ex-dirigente do Comando de Libertação Nacional (Colina), preso, torturado e exilado; a socióloga Magda Neves, expulsa do mestrado em Ciência Política da UFMG pelo regime; e Mariluce Moura, viúva de Gildo Macedo Lacerda, morto sob tortura em 1973.

Araguaia

Ao chegar para a audiência, Maria Rita Kehl, responsável da comissão pela investigação de violações de direitos de indígenas e camponeses, revelou que o grupo encontra dificuldades de investigar um dos mais notórios episódios do regime militar, a Guerrilha do Araguaia, ocorrida no sul do Pará do fim da década de 1960 até meados da década de 1970.

Recém-chegada da região, onde acompanhou as atividades dos Grupo de Trabalho do Araguaia (GTA) e do Grupo de Trabalho do Tocantins (GTT), Maria Rita informou que familiares de guerrilheiros que desapareceram na região têm se recusado a fornecer material para comparação genética com restos mortais encontrados na área. Até o momento, só foram identificadas as ossadas dos guerrilheiros Bergson Gurjão Farias e Maria Lúcia Petit. "Tem alguns casos que já tem ossos para comparação de DNA. (Mas) nem todas as famílias querem oferecer o DNA, para não sofrer. Fica mais difícil ainda, porque tem uma ossada, tem a possibilidade (de identificação) e a família não quer fazer o exame", disse, sem entrar em detalhes.

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