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O papa Francisco completa nesta segunda-feira (13) quatro anos na liderança da Igreja Católica. O aniversário deste 13 de março de 2017, porém, ocorre em um momento que deixa cada vez mais em evidência a oposição às reformas de Jorge Mario Bergoglio, o papa originário do "fim do mundo". Apesar de ter sido considerado, desde o início, um Pontifíce reformista e disposto a mexer nas estruturas da Igreja, somente agora Franscisco enfrenta a ira de conservadores na prática.

Em fevereiro, cartazes criticando as mudanças propostas pelo Papa foram espalhados por Roma, expondo as divergências dentro do clero. A oposição começou a ganhar força há um ano, em 8 de abril, durante o Jubileu Extraordinário da Misericórdia e a publicação da exortação apostólica "Amoris Laetitia", na qual o Papa escreveu suas conclusões sobre os dois sínodos convocados por ele para discutir questões familiares e o posicionamento da Igreja Católica. No documento, Francisco abriu espaço para que os sacerdotes analisem "caso por caso" de divórcios ou outras separações matrimoniais, assim como a confissão de crimes de aborto, propondo que os religiosos "acompanhem" e "acolham" as famílias.

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Em setembro passado, quatro cardeais conservadores, Raymond Burke, Carlo Caffarra, Walter Brandmuller e Joachim Meisner, escreveram uma carta a Francisco questionando seus posicionamentos e pedindo explicações sobre pontos que "colocavam em dúvida a doutrina católica", sobretudo em relação à possibilidade de comunhão de casais divorciados. A carta foi divulgada publicamente pelo grupo, mas Francisco nunca respondeu a ela. Mesmo assim, a briga entre Bergoglio e o norte-americano Raymond Burke perdurou. O cardeal ameaçou o Papa com um "ato formal de correção" e protagonizou uma rebelião inédita na cúpula da Ordem de Malta. Cardeal patrono da Ordem, Burke se negou a instituir uma comissão ordenada pelo Papa para investigar o grão-chanceler Albrecht von Boeselager.

Apesar de toda oposição dentro do Vaticano, Bergoglio segue adiante em seu pontificado, participando de momentos históricos, como o acordo de retomada de relações entre Cuba e Estados Unidos, o encontro com o patriarca de Moscou e a participação nas celebrações dos 500 anos da Reforma Luterana e o apoio às negociações de paz na Colômbia e na Venezuela. A recente demissão da Marine Collins, vítima de pedofilia, da comissão vaticana contra abusos sexuais, porém, comprova que Francisco ainda tem muito trabalho a fazer dentro e fora do Vaticano.

O cardeal camerlengo, o italiano Tarcisio Bertone, será, após o fim do papado de Bento XVI, um "Papa interino", encarregado de gerenciar a Igreja até que o novo pontífice seja eleito. Seus poderes, no entanto, serão reduzidos.

Todos os mais altos cargos do governo da Igreja, isto é, a Cúria Romana, devem se demitir de suas funções quando o Papa morre, segundo a Constituição Apostólica promulgada em 1996 por João Paulo II.

A regra também vale em caso de demissão. Somente o cardeal camerlengo continua a postos para administrar o que acontece na Igreja.

"Na morte do pontífice, todos os chefes dos dicastérios da Cúria Romana, o cardeal secretário de Estado, os cardeais prefeitos, os bispos presidentes, assim como os membros desses ministérios, deixam seus cargos. As únicas exceções são o Camerlengo da Santa Igreja e o Grande Penitenciador, que continuam resolvendo o que acontece diariamente", indica o artigo 14 da Constituição.

A palavra "camerlengo" é derivada do italiano "camera", que significa câmara, quarto. Ela equivale, em português, à expressão "adido à câmara". O camerlengo é uma função puramente administrativa, que só ganha importância na morte ou, no caso, na demissão de um Papa.

Ele é encarregado de gerenciar o Vaticano e, com a ajuda dos cardeais presentes, reunidos em congregação geral, ele marca a data do funeral, no caso da morte do Papa, e convoca o Conclave.

Mas o camerlengo e os cardeais não podem tomar nenhuma decisão que exceda a duração do período de vacância do trono de São Pedro, onde imperam prerrogativas exclusivas do Papa, como por exemplo a nomeação de novos cardeais.

É o camerlengo que é encarregado de constatar e notificar a morte do Papa. Até Pio XII, morto em 1958, o camerlengo constatava o óbito do chefe da Igreja batendo com um pequeno martelo de prata em sua testa, para garantir que o pontífice estava, de fato, morto.

Monsenhor Bertone deverá simbolicamente tomar posse das funções papais, o Palácio Apostólico do Vaticano, os palácios do Latrão, sedes da diocese de Roma, onde o Papa é por tradição o bispo, e de Castel Gandolfo, residência de verão dos papas.

Esta última será, contudo, ocupada do Joseph Ratzinger, situação inédita na história recente da igreja.

Número dois do Vaticano, Bertone, 78 anos, foi nomeado camerlengo em abril de 2007.

Originário de Romano Canavese, uma pequena região italiana do Piemonte, o salesiano Tarcisio Bertone colaborou durante sete anos (1995-2002) com Ratzinger quando ele foi prefeito da Congregação para a Doutrina da Fé, antes de ser nomeado em 2006 Secretário de Estado do Vaticano, espécie de "chefe do governo" da Santa Sé.

Os oito anos de Bento XVI à frente do Vaticano significaram para a América Latina, região com as maiores disparidades entre ricos e pobres e que concentra 46% dos católicos do mundo, a consolidação do conservadorismo imposto por seu antecessor, João Paulo II, como parte de sua ofensiva contra a Teologia da Libertação (TL), consideram analistas.

O papado de Joseph Ratzinger projeta em sua reta final a imagem de um pontífice pouco transcendente para a região, que cumpriu com menos agressividade o roteiro traçado por seu antecessor, João Paulo II (1978-2005), e que lidou com os escândalos de pedofilia do clero no México, nos Estados Unidos e na Europa.

"Ratzinger não queria gerar conflitos na Igreja na América. Foi um papa de transição, que não fez grandes mudanças e manteve as coisas em seu lugar", disse à AFP o professor Jeffrey Klaiber, historiador de religiões na Universidade Católica de Lima.

Segundo Klaiber, "Bento XVI seguiu na América Latina a pauta de João Paulo II, só que foi menos agressivo porque em certo sentido a Teologia da Libertação já havia passado como movimento intelectual".

"Para além da Teologia da Libertação, é difícil falar de um legado específico de Bento XVI para a América Latina", disse à AFP o especialista americano John L. Allen, vaticanista para o semanário National Catholic Reporter e para a rede CNN.

"Bento provavelmente consolidou uma forma madura de teologia da libertação, que esteve tomando forma durante muito tempo", indicou Allen sobre quem foi o executor como prefeito da Fé da ofensiva conservadora de João Paulo II contra os partidários desta teologia na década de 1980.

"O maior impacto foi a consolidação da linha conservadora que João Paulo II impôs durante seu papado", afirmou à AFP Luis Pásara, pesquisador sobre o catolicismo e professor da Universidade de Salamanca.

"Ratzinger foi o teórico por trás desta guinada para a direita, dando um voo intelectual do qual o polonês Karol Wojtyla carecia; como Bento XVI, aprofundou o caminho adotado", disse Pásara.

"Sua herança - acrescenta - pode ser medida em termos das nomeações de bispos na América Latina. Ao colocar como pastores do rebanho católico personagens conservadores ou ultraconservadores, Bento XVI buscou perpetuar esta característica que prevalece na Igreja Católica de hoje".

Segundo o vaticanista Allen, Bento XVI deixou ao seu sucessor a abordagem do "desafio ao catolicismo na América Latina representado pelo crescimento dos movimentos pentecostais e evangélicos, e pela indiferença religiosa básica".

"Na América Latina, as pessoas não saem da igreja por seu conservadorismo, e sim porque os sermões dos padres são tediosos. É uma mistura de um clero que não desperta atenção, pouco carismático, com um discurso ultrapassado", alerta Klaiber.

"Cuidado - afirma Klaiber - ao enfatizar apenas a questão doutrinal, como fez Bento XVI, porque, por exemplo, as igrejas pentecostais atraem muita gente pela maneira de realizar seus serviços, e não por sua doutrina".

Allen ressaltou as únicas viagens do pontífice à região: Brasil 2007 e México-Cuba 2012, para afirmar que ambas traçaram um perfil público dos temas que o interessaram e guiaram em torno de uma recuperação de algumas premissas da TL.

No Brasil, Bento XVI se "identificou com as aspirações básicas da Teologia da Libertação, com a crítica de um sistema econômico injusto e em colocar a igreja do lado dos pobres, mas insistiu na primazia da fé em oposição à análise sociológica", disse Allen, autor de "Dez coisas que o papa Bento XVI quer que saibas", entre outros livros.

A resistência em abordar temas capitais para o futuro da Igreja Católica em uma região considerada reduto do catolicismo por seu maior número de fiéis "deixa a impressão de que não é um homem dogmático, mas um homem desconectado do mundo real", afirma o historiador Klaiber.

Klaiber ressaltou que, no escândalo de pedofilia que atingiu a Igreja nos últimos anos, o Papa atual "não encobriu os fatos, mas não se deu conta de como a situação era grave".

"Teve a valentia de pedir perdão pessoalmente a muitas das vítimas nos Estados Unidos e na Europa", admitiu Klaiber.

A TL surgiu na América Latina há mais de quatro décadas para renovar a mensagem do catolicismo com a ideia central de que "os pobres eram a opção preferencial" desta religião. A reflexão foi acusada de desvios marxistas por João Paulo II.

O paradoxo na posição de Roma é que foram o Concílio Vaticano II (1962) e a Conferência Episcopal Latino-Americana de Medellín (1968) os que serviram de inspiração à TL.

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