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A demora na instalação das tornozeleiras eletrônicas fez com que mais de 120 pessoas presas por participação nos atos golpistas de 8 de janeiro na Praça dos Três Poderes, em Brasília, sejam obrigadas a passar mais uma noite na cadeia. Os extremistas tinham recebido alvará de soltura expedido pelo ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes.

Os alvarás foram publicados entre a noite dessa segunda-feira (27) e essa terça-feira (28). No total, 173 denunciados ganharam direito de ficar em liberdade provisória. Porém, somente 48, ou seja, menos de um terço deles, foram definitivamente liberados até o momento.

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A Secretaria de Estado de Administração Penitenciária do Distrito Federal (Seape) explicou que a lentidão se deve à demora no trâmite processual. Segundo a pasta, cada instalação de tornozeleira eletrônica dura cerca de uma hora. A pasta ainda verifica se a pessoa tem outras pendências com a Justiça e se há algum erro documental.

Por sua vez, a Vara de Execuções Penais do Distrito Federal (VEP) informou que a Seape recebeu 143 alvarás expedidos hoje, um número menor que o publicado pelo STF.

A instalação da tornozeleira eletrônica é feita no Centro Integrado de Monitoração Eletrônica (CIME), em Brasília. Os presos são levados para o local escoltados. Os homens estão no Presídio da Papuda e as mulheres, na Penitenciária feminina chamada Colmeia.

O grupo liberado por Moraes foi preso em flagrante em 9 de janeiro deste ano, um dia após os atos, em frente ao Quartel General do Exército. O espaço foi palco de manifestações golpistas, em apoio ao ex-presidente Jair Bolsonaro - derrotado nas eleições de 2022 para o atual presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva - e a favor de uma intervenção das Forças Armadas.

Ao analisar os casos, o ministro do STF afirmou que a maioria tem a condição de réu primário e filhos menores de idade, além de já terem sido denunciados pela Procuradoria Geral da República (PGR) por incitação ao crime e associação criminosa. Pelas regras do STF, os denunciados foram notificados a apresentar defesa prévia no prazo de 15 dias.

Além do uso de tornozeleira eletrônica, o grupo está proibido de sair do país, de usar as redes sociais e de se comunicar com outros golpistas, além de terem quaisquer documentos de porte de arma de fogo ou certificados de registros de CACs suspensos.

Com as novas decisões de Moraes, 639 pessoas já foram liberadas para responder em liberdade com cautelares. Outras 767 permanecem presas.

A mesma tempestade política que afetou a economia deve fazer dobrar de tamanho neste ano o mercado de tornozeleiras eletrônicas. Hoje, três empresas brasileiras operam nesse mercado, os estrangeiros estão querendo entrar e a procura pelo equipamento só aumenta. A situação só não é melhor porque os principais clientes - os Estados - começaram a atrasar os pagamentos das empresas que monitoram presos com tornozeleiras eletrônicas.

Com os cofres vazios, o Estado do Rio atrasou por 15 meses o repasse dos recursos para a empresa que presta esse serviço, a Spacecom, maior companhia do setor, que acompanha os 705 monitorados no Estado, ao custo mensal de R$ 252, por pessoa. O governo fluminense fechou um acordo para parcelar o pagamento do serviço, como vem fazendo com a maior parte dos fornecedores e com os servidores, que estão com salários atrasados.

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Os governos de Goiás e do Piauí também atrasaram o pagamento pelo serviço. Os dois Estados contam com 318 e 920 equipamentos em funcionamento, ao custo unitário de R$283 e R$ 275 por mês, respectivamente.

Popularizados após a Operação Lava Jato, os equipamentos servem para controlar os detentos a distância e o seu uso tem aumentado no País. Os Estados atualmente têm licitações abertas para a inclusão de 40 mil monitorados. A fábrica da Spacecom, em Manaus, por exemplo, pode produzir até 50 mil tornozeleiras por ano.

"Os Estados não querem ficar sem o serviço, porque veem a tornozeleira como uma forma de ajudar a desafogar o sistema penitenciário, sempre lotado, e de evitar que aquele preso por um crime leve conviva com os mais perigosos", conta o diretor da empresa, Sávio Bloomfield. Quase todos os 19 Estados em que a empresa atua atrasaram o pagamento desde a crise.

Nas licitações de contratação do serviço, o Estado especifica o número de aparelhos que ficarão disponíveis para a Justiça durante determinado período e se a empresa vencedora também irá fazer o monitoramento dos usuários ou apenas treinar agentes públicos para essa função. O custo por mês de cada tornozeleira varia - em média, é de R$ 280.

Famosos

Além dos governos estaduais, a Spacecom fornece o equipamento para a Justiça Federal do Paraná, responsável pelos casos da Lava Jato. Entre os usuários mais famosos das tornozeleiras da fabricante paranaense estão o ex-ministro José Dirceu e o ex-deputado Rodrigo Rocha Loures.

"A Lava Jato não influenciou no crescimento do mercado, mas ajudou a tornar o produto mais conhecido pela população. Os magistrados já estavam acostumados com a tecnologia, pelas experiências internacionais", diz Marcelo Ribeiro de Almeida, da Synergye, que tem contratos em sete Estados e na Costa Rica.

"Hoje o mercado é dominado pelos brasileiros, mas há fabricantes de fora interessados em fornecer os equipamentos para o Brasil. Por enquanto, o preço das licitações e as especificidades técnicas, como a necessidade de ter dois chips, freiam a entrada de estrangeiros", diz Marcelo de Almeida, dono da UE Tecnologia.

O equipamento usa uma tecnologia de GPS para determinar a localização do usuário, um modem para transmissão de dados e dois chips de celular, para o caso do sinal de uma das operadoras ser interrompido. Mesmo quando o reeducando passa por um local sem sinal de telefonia, o aparelho deve registrar seus movimentos e os transmite para a central de monitoramento assim que ele passa por uma região com cobertura de celular.

A tornozeleira não é uma algema, é feita de material leve, mas um sinal é acionado na central, em caso de rompimento ou quando a área permitida de circulação é desrespeitada. Em média, a bateria do equipamento precisa ser recarregada uma vez por dia e a tornozeleira pesa cerca de 120 gramas, além de ser à prova d’água.

Desde 2010, os equipamentos podem ser usados para o controle de presos em liberdade condicional, no regime semiaberto ou em deslocamentos programados. Em 2011, a ex-presidente Dilma Rousseff sancionou uma lei que permite que a tornozeleira seja usada como medida preventiva.

Os aparelhos não são imunes a fraudes. Há registro de extravio de lacres e o caso de um preso no Rio Grande do Sul que prendia a tornozeleira no pescoço de um galo. Segundo as empresas, as falhas são pontuais e o sistema é seguro.

O Departamento Penitenciário Nacional (Depen) tem, atualmente, 22 convênios federais em vigência, em 22 Estados, cujo foco é a implantação de centrais de monitoramento eletrônico, com um total de investimento de R$ 34,3 milhões.

Em nota, a Secretaria de Estado de Administração Penitenciária (Seap) do Rio informou que vem se esforçando para honrar seus compromissos junto aos fornecedores. Além do caixa em baixa, fraudes e desvios deram prejuízo de mais de R$ 12 milhões, segundo o Ministério Público do Rio. Pela investigação, as irregularidades se deram na Seap.

O Piauí diz que está providenciando o pagamento das parcelas em atraso do contrato atual, que vai até dezembro, e que "está realizando novo processo licitatório que vai ampliar em 3 mil o número de tornozeleiras". Goiás diz ter efetuado os pagamentos até abril. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

O uso de tornozeleiras eletrônicas poderia levar a uma economia de R$ 3,3 bilhões por ano para o Brasil, segundo relatório da consultoria GO Associados. Com esse valor, seria possível criar 22,8 mil vagas em prisões ou instalar bloqueadores de celular em 1.650 unidades prisionais, de acordo com o estudo.

"Há um problema de encarceramento em massa no País, e não existe uma preocupação para avaliar qual a medida mais adequada", diz o professor da FGV Fernando Marcato, especialista em Direito Público, autor do estudo. "Essa política, um pouco cega, gera custos também. E é extremamente cara."

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Para chegar à cifra, o especialista considerou apenas os presos "que não deveriam estar atrás das grades". O cálculo partiu de um estudo do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), segundo o qual 37,2% dos presos provisórios não são condenados à prisão após julgamento, mas também usou dados do Levantamento Nacional de Informações Penitenciárias (Infopen) e do Ministério da Justiça e Cidadania.

Após cruzar informações, Marcato estima que pelo menos 91 mil presos não deveriam estar encarcerados, mas acabam custando R$ 3,3 mil por mês, cada um. O valor aplicado foi o da PPP de Ribeirão das Neves, em Minas, que nunca registrou rebeliões nem motins, e inclui custos de construção e operação do presídio.

Marcato demonstra que, com medidas alternativas, o Estado consegue economizar. "Segundo o Ministério da Justiça, o custo mensal médio para manutenção de um condenado com tornozeleira eletrônica é de R$ 300, muito menor do que o custo para manter um preso encarcerado", diz o relatório.

Investimento

Se os R$ 3,3 bilhões fossem investidos em educação pública, poderiam render quatro vezes mais. "Seriam gerados R$ 13,1 bilhões na economia como um todo, cerca de 271 mil novos empregos, R$ 3,6 bilhões em salários e R$ 866,3 milhões em arrecadação." As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

O monitoramento de detentos por meio de tornozeleiras eletrônicas é insuficiente para reduzir o número de presos provisórios no País, que são 41% do total e constituem um dos principais fatores de superlotação nas cadeias. A conclusão é de um estudo divulgado nesta terça-feira, 8, pelo Departamento Penitenciário Nacional (Depen), do Ministério da Justiça.

Em mais de 86% dos casos, de acordo com o levantamento, o sistema é utilizado em indivíduos que já foram condenados. A tecnologia ainda é pouco adotada por juízes para casos de medidas protetivas de urgência - como as enquadradas na Lei Maria da Penha, por exemplo - ou medidas cautelares diferentes da prisão.

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Dos 18.172 monitorados nos 17 Estados que já adotam a política, apenas 2.175 estão aguardando julgamento. "Observamos que a monitoração eletrônica não vem se configurando como uma alternativa à prisão, mas como um instrumento aliado aos movimentos de controle social e de recrudescimento do poder punitivo", diz o documento, uma parceria do Depen com o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud), com base em dados de fevereiro a julho deste ano.

Apesar de estar previsto em lei desde 2010, o sistema ainda não foi implementado em dez unidades de federação. Santa Catarina e Sergipe estão na fase de testes. Já Roraima, Tocantins, Distrito Federal, Mato Grosso do Sul, Bahia, Paraíba e Rio Grande do Norte têm projetos em andamento. O Amapá é o único Estado em que não há sequer prognóstico de funcionamento.

O diretor-geral do Depen, Renato de Vitto, aponta as tornozeleiras como um instrumento de desencarceramento e inserção social. "A política deve ter como destinatário o preso provisório, ou seja, aquela pessoa que não necessariamente precisa estar no ambiente carcerário. Ela pode ser monitorada de uma forma mais barata e inteligente, com possibilidade menor de reincidir".

O serviço custa, em média, R$ 301,25 mensais por pessoa. Nas cadeias, este valor é oito vezes maior. Porém, como o monitoramento prevalece na execução penal - isto é, presos já condenados -, isso pode implicar em gastos duplicados. "O projeto aumenta os custos com a execução penal sem auxiliar no reajuste da população dos presídios, uma vez que não retira do cárcere quem lá não deveria estar e não impede o ingresso de quem não deva ser preso", aponta a pesquisa.

O diagnóstico destaca, ainda, que a política de monitoramento no País poderia ser ampliada em cerca de 55%. Em todo o País, a capacidade máxima de pessoas que podem ser observadas simultaneamente é 40,4 mil pessoas, mas pouco mais de 18 mil usam a tornozeleira. O Maranhão, por exemplo, tem 1,8 mil "vagas", mas só 110 pessoas são monitoradas.

Segundo a consultora Izabella Pimenta, responsável por elaborar a pesquisa, para qualificar o serviço é necessário um modelo de gestão que supere "o viés repressivo" e coloque "a pessoa monitorada como sujeito central da política", disponibilizando equipe psicossocial para acompanhamento e estabelecendo novas formas de lidar com possíveis descumprimentos das normas.

O estudo traz exemplos de deficiências no atendimento aos presos, como falta de espaço e estrutura, e critica o fato de que, em alguns Estados, as centrais de monitoramento trabalham com metas de produtividade, desconsiderando o fato de que a saída do perímetro permitido para circulação pode ser "justificável" (como um hospital, fórum ou delegacia), evitando notificações e lançamento de fuga. Porém, "em algumas situações, um bom dia de trabalho (...) pode ser aquele que apresenta muitas violações e, portanto, muitos acionamentos da polícia", afirmam os pesquisadores no estudo.

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