Tópicos | Dupla Maternidade

A busca por uma certidão de nascimento para a filha, o que seria normal para qualquer casal, foi cheia de obstáculos para duas recifenses. O resultado da luta de Roberta*, de 40 anos, e Bianca*, 50, para registrarem a menina, que hoje tem quatro meses, não mudou apenas a vida da família, mas modificou também as estatísticas do estado de Pernambuco. Elas são o primeiro casal de mulheres a conseguir na justiça o direito a Dupla Maternidade. 

As duas se conheceram em 2001 e moram juntas há três anos. Atualmente estão em união estável. No entanto, a orientação sexual nunca foi um problema para o desejo materno. “Toda mulher quer ser mãe. Acontece em um momento da vida de cada pessoa. Eu queria ter filho, mas não queria ter marido", conta Roberta. "Já eu cuidava dos meus pais doentes e não tinha como ter um filho, mas depois eles descansaram e eu pude pensar no meu sonho", acrescentou Bianca. 

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Em 2012, o sonho das duas começou a torna-se realidade. Era o começo de uma história de lutas e conquistas que ainda não terminaram. “Pensamos primeiro em adotar uma criança, mas depois resolvemos que Bianca poderia gerar nosso filho. Foi quando veio nossa primeira batalha”, relata Roberta.

Ao fazer o primeiro exame, Bianca ouviu da médica que a gravidez não seria aconselhável porque a paciente já passava dos 40 anos de idade. A profissional, no entanto, disse que seria melhor usar o óvulo de uma mulher mais nova para gerar a criança. O que parecia empecilho fortaleceu a relação e a maternidade das duas, porque elas resolveram que o óvulo seria doado por Roberta, enquanto Bianca geraria a criança.

A primeira consulta foi em dezembro de 2012 e em maio do ano seguinte Bianca já estava grávida. “Foi a melhor notícia que poderíamos ter recebido. Depois disso chegaram outras alegrias como o primeiro ultrassom, momento emocionante. Sem falar no dia do parto, que eu saí gritando pelo corredor: Nasceu, nasceu!”, se emociona, Roberta. 

Com o nascimento, a luta continuou. Roberta queria poder usar dos direitos trabalhistas que possuía, como licença maternidade e a inclusão da filha em alguns benefícios. Mas sem ter o nome de mãe registrado na certidão, isso não seria possível. Apenas Bianca, que gerou a criança, poderia usufruir dos direitos. “Na verdade não são só direitos meus, mas da minha filha também e nós quisemos lutar por eles”, explica Roberta.

As duas contrataram uma advogada e deram início aos trâmites judiciais para conseguirem o direito de registrar a filha com duas mães. “Foram três tentativas até conseguirmos o aval da justiça. Nesse dia fomos tão desanimadas, mas o Juiz João Guedes Alcoforado, da 4° Vara da Família da Capital, nem entendeu porque estávamos ali. Ele disse que o direito era nosso, e ninguém podia negar isso. Foi uma vitória. Depois do nascimento da nossa filha, esse foi o segundo dia mais feliz da minha vida”, enfatiza Roberta. 

"Fiquei super feliz em ajudar, já que ainda não existe legislação que autorize o cartório a fazer esse tipo de registro e para isso precisamos pedir a autorização ao judiciário", afirma Edilene Simões, advogada responsável pelo caso. 

Com a ordem judicial nas mãos, Roberta só esperou acabar a audiência e foi direto para o cartório registrar a criança. Mas não bastassem tantas pedras no caminho, uma ainda estaria por vir – O preconceito. “No cartório, os funcionários olhavam com desdém para a ordem judicial, e ficaram durante a tarde inteira colocando empecilhos para eu não registrar minha filha, dizendo que o sistema do computador não estava preparado para colocar o nome de duas mães mesmo com ordem judicial, mas eu persisti ali. Lembro que saí do cartório e não tinha mais ninguém, além dos funcionários. Já era muito tarde, mas eu consegui a certidão”, relata Roberta. 

A criança foi registrada e as mães já pensam nas batalhas futuras. A preocupação é tanta que as mães não quiseram mostrar o rosto, nem divulgar os nomes para que a filha não sofra preconceito mais na frente. “Sei que nossa filha vai crescer, vai pra uma escola e vamos ter que mostrar a certidão de nascimento, mas eu queria que as pessoas vissem isso com naturalidade. Hoje eu não estou preparada pra responder algumas perguntas que virão dela, como eu não estava preparada pra primeira cólica, o primeiro choro, mas sei que o tempo vai me preparar. Nunca vou esconder a história dela, e também nunca a deixarei sem resposta. Ela foi gerada com muito amor. Todo mundo diz que ela é uma criança de sorte por ter duas mães”, se emociona Bianca.

Entenda o processo judicial para conseguir o direito à dupla maternidade - Com a conquista dos direitos para casais homossexuais, as mulheres, por exemplo, podem realizar procedimentos como a fertilização in vitro, e garantir judicialmente o registro das duas mães na certidão de nascimento da criança.

Para alcançar esse direito da Dupla Maternidade, a advogada, que defendeu a causa de Roberta e Bianca, Edilene Simões, explica que o processo não é tão difícil. "Primeiro é necessário contratar um advogado ou solicitar um defensor público para propor uma ação ao judiciário. É recomendável que tudo seja feito no início da gestação, por causa da morosidade da justiça. Depois, as requerentes devem se munir de documentos pessoais, da inseminação artificial, laudo ou parecer médico e três testemunhas para afirmar que a gestação está dentro do que a lei autoriza. Depois disso vem a audiência e a resposta da justiça".

"Se as mães tiverem uma resposta negativa, elas ainda devem esperar e persistir, porque a causa será levada para o TJPE (Tribunal de Justiça de Pernambuco), no qual um colegiado de desembargadores julgam novamente o pedido", esclarece Edilene. 

**Os nomes são fictícios para preservar as identidades das personagens

A juíza Ana Beatriz do Amaral, da 13ª Vara do Trabalho de Brasília, decidiu manter decisão que reconheceu dupla maternidade de um casal homoafetivo, e concedeu licença integral para a funcionária do Banco do Brasil Fabiane Leite acompanhar os cuidados da companheira com os trigêmeos, fruto de fertilização.

Fabiane entrou com recurso na Justiça do Trabalho para garantir a licença maternidade de 120 dias, prorrogados por mais 60, além de salário integral, para auxiliar na amamentação e nos cuidados dos três recém-nascidos de sua companheira, Ana Cristina Araújo. Ela recorreu à Justiça por ter reconhecido licença-paternidade de cinco dias.

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Na decisão tomada nessa sexta-feira (9), a juíza entendeu que existem novos modelos de constituição de famílias e que o sistema jurídico não consegue acompanhar as mudanças, gerando lacunas normativas. “A conceituação de família vem sofrendo alargamento ao longo dos tempos, com profundas alterações em sua constituição, não estando mais adstrita a uma única estrutura, mas com modelos alternativos de convivência, sendo entrelaçada por unidades diversas”, disse.

Para a juíza Ana Amaral, “essas modificações e pluralidades não podem deixar na orfandade jurídica os novos núcleos que surgiram. Famílias monoparentais, pluriparentais, recompostas ou mosaicos, todas as formações familiares devem ser respeitadas e são dignas de tutela, pois são norteadas pelo ideal da felicidade”.

Em uma união estável há quase três anos, duas mulheres conseguiram obter, na Justiça, o direito à dupla maternidade da filha, no Recife. E a conquista veio após uma gestação, de fato, compartilhada. Uma das mulheres doou o óvulo, enquanto outra geriu a criança, através de uma inseminação artificial. As duas são consideradas mães da menina em sua certidão do nascimento.

A decisão favorável, divulgada nesta segunda (14), foi proferida pelo juiz da 4ª Vara de Família da Capital, João Maurício Guedes Alcoforado. Para o magistrado, negar às autoras o direito de registrar a filha, neste caso, seria discriminação. 

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“A primeira requerente forneceu seu óvulo. Isto é, se fosse realizado exame de DNA, seria comprovado que, geneticamente, é a mãe da criança. A segunda requerente gestou a criança, ou seja, foi em seu útero que o feto se desenvolveu e é medicamente inegável a troca de interações físicas e psíquicas entre gestante e feto”, afirmou Alcoforado. 

Na concepção do juiz, é essencial levar em consideração a dignidade das pessoas, um dos principais fundamentos da Constituição Federal. Para o juiz João Maurício Guedes, independente da decisão, a dupla maternidade ocorrerá de fato. 

“A criança será criada pelas duas requerentes. As duas serão suas mães de fato e, quando aprender a falar, certamente chamará as duas de mãe. O juiz de nosso século não é um mero leitor da lei e não deve temer novos direitos. Haverá sempre novos direitos e também haverá outros séculos”, ressaltou. 

No mês de março, outras duas mulheres, companheiras há mais de dez anos, também conseguiram registrar os filhos, um casal de gêmeos, com dupla paternidade. A decisão foi proferida pelo juiz da 1ª Vara de família do Recife, Clicério Bezerra.

Duas mulheres, companheiras há mais de 10 anos, conseguiram na Justiça o direito de ter seus nomes nos registros de nascimento dos seus filhos, um casal de gêmeos. Os bebês agora possuem duas mães e quatro avós maternos.

As crianças nasceram no dia 6 de fevereiro de 2014 após serem geradas através de inseminação artificial no útero de uma das mulheres. O sêmen foi doado por um homem desconhecido.

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A decisão da concessão foi proferida pelo juiz da 1ª Vara de família do Recife, Clicério Bezerra, no dia 20 de fevereiro, mas só foi divulgada nesta sexta-feira (14). O magistrado, na sentença, reconheceu a existência de mais de um tipo de entidade familiar, e consequentemente, os mesmos direitos e deveres de companheiros de relações homoafetivas. 

Na sentença, o juiz escreveu: “Em um mundo onde incontáveis pequenos seres humanos são privados do despertar de sentimentos nobres, como o amor, o afeto, agraciados são aqueles aos quais é permitida uma convivência saudável, verdadeira, edificante, experimentada no cotidiano em família. Há que se resignificar a realidade social. Traçar novos paradigmas”. 

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