Tópicos | assédio moral no ambiente de trabalho

Um operador de máquinas será indenizado em R$ 10 mil após ficar de 'castigo' em seu local de trabalho. O trabalhador sofreu assédio moral em um pequeno município da região oeste do estado de Santa Catarina, tendo que ficar de “castigo” por três dias durante o expediente.  

A decisão favorável ao empregado veio da 3ª Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça de Santa Catarina (TJSC), obrigando o município a pagar adicional de periculosidade sobre a diferença entre o que o servidor deveria receber (30% sobre o vencimento-base) e o que efetivamente recebeu (20% sobre o salário mínimo nacional). 

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O caso ocorreu entre janeiro de 2015 e julho de 2017, período em que o funcionário atuou como operador de máquinas. O prefeito do município aplicou uma punição ao servidor por não gostar da forma que ele trabalhava. O trabalhador ficou sem trabalhar por três dias, mas ainda teve de ir ao local de trabalho, onde sofreu humilhações de colegas e passou por constrangimento. 

A cidade e o trabalhador ficaram inconformados com a sentença e recorreram ao TJSC. O município defendeu que teria sido apenas um aborrecimento e não caso de assédio moral, além de questionar o pagamento do adicional de periculosidade. Já o trabalhador queria o aumento dos valores pagos. 

O TJSC negou os dois recursos.  “Restou, portanto, consolidado nos autos que o autor foi constrangido publicamente quando foi obrigado a comparecer no local de trabalho sem autorização para desenvolver a sua atividade, apenas para que fosse exposto perante todos os colegas de trabalho, causando-se abalo moral”, anotou o desembargador relator em seu voto.

“Não relaxo mais no atual trabalho e qualquer crítica me coloca para baixo. Quanto mais me cobram, menos consigo produzir. Minha auto estima foi para o chão, eu ia para o antigo trabalho realmente infeliz”. As palavras de uma jovem profissional retomam a uma fase angustiante. Vítima de assédio moral no ambiente de trabalho, hoje, mesmo em outra empresa, ela arrasta efeitos da sua antiga função, em que recebia, constantemente, reclamações da chefia.

Em tom alto e diante de outros funcionários, a chefe insistia em reclamar da jovem durante o experiente. Por mais que a profissional se esforçasse para desempenhar as atividades, a gestora reprovava o trabalho, expondo as incorreções para os demais colaboradores. “Ela realmente reclamava sempre alto, e dizia coisas como ‘eu já falei isso muitas vezes’, por que você não aprende’? Eu me sentia humilhada”, relata a profissional, que preferiu preserva sua identidade em entrevista ao LeiaJá.

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De acordo com a trabalhadora, mesmo deixando o antigo trabalho e automaticamente cortando contato com a derradeira chefia, há traumas que, até hoje, persistem em sua rotina profissional. “Não fiquei mais de boa quando saí de lá. Meu chefe seguinte disse que eu parecia alerta sempre, como se ele fosse gritar comigo ou reclamar a qualquer instante”, revela.

Pesquisa realizada pelo site 'Vagas.com' apontou que 52% dos profissionais brasileiros já foram vítimas de assédio moral no ambiente de trabalho. Segundo o levantamento, e mesmo entre as pessoas que não sofreram esse tipo de opressão, 34% delas já presenciaram um companheiro de equipe ser assediado moralmente.

Documento publicado pelo Senado Federal, no âmbito do Programa Pró-Equidade de Gênero e Raça, descreve em detalhes de que forma se configura o assédio moral no ambiente de trabalho: “O assédio moral consiste na repetição deliberada de gestos, palavras (orais ou escritas) e/ou comportamentos de natureza psicológica, os quais expõem o(a) servidor(a), o(a) empregado(a) ou o(a) estagiário(a) (ou grupo de servidores(as) e empregados(as) a situações humilhantes e constrangedoras, capazes de lhes causar ofensa à personalidade, à dignidade ou à integridade psíquica ou física, com o objetivo de excluí-los(as) das suas funções ou de deteriorar o ambiente de trabalho. A habitualidade da conduta e a intencionalidade (o fim discriminatório) são indispensáveis para a caracterização do assédio moral. Ainda que frequentemente a prática do assédio moral ocorra no local de trabalho, é possível que se verifique em outros ambientes, desde que o seu exercício esteja relacionado às relações de poder desenvolvidas na seara profissional”.

Saiba identificar e combater o assédio moral

A procuradora do Ministério Público do Trabalho (MPT) em Pernambuco, Melícia Carvalho, condena o assédio moral no ambiente corporativo, ao mesmo tempo em que alerta para as trágicas consequências dessa postura. “É uma conduta praticada de forma repetida e sistemática com a vontade de prejudicar o outro. Conduta abusiva; é uma perversão”, crava a procuradora.

De acordo com Melícia, o assédio causa consequências que maltratam as vítimas ao ponto de elas sentirem vontade de largar o emprego, bem como se tornam propícias a sofrer problemas psicológicos e até físicos. “O objetivo é tão danoso que, às vezes, no mundo trabalho, se deseja mesmo que aquela vítima saia daquele mundo, que ela peça demissão ou transferência, para você ver como é uma direção maléfica. São gestos, palavras, atitudes, são omissões quando você ignora uma pessoa. A vítima tem consequência de toda ordem. O assédio moral contamina a organização como um todo. As vítimas sofrem consequências físicas, elas acabam desenvolvendo crises de choro, depressão, se isolam dos grupos”, alerta.

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Um trabalhador, ao ser ver constrangido pelo assediador, precisa de imposição apesar das dificuldades. “No ambiente de trabalho, a gente diz que muitas das ações do assédio moral poderiam ser paradas por uma atitude da própria vítima. Se verificou que, nas situações em que a vítima se colocou frente ao agressor, 30% dos casos de assédio moral pararam ali. A vítima tem um papel fundamental na continuação ou não desse assédio, e o grupo também”, diz a procuradora.

Nos episódios em que as vítimas conseguiram conter a violência sistemática, elas expressaram para os opressores que as atitudes se tratavam de assédio moral, reiterando que não aceitavam tais ações. No entanto, também é fundamental que as pessoas ao redor das vítimas se posicionem conta o assédio, para não configurar o que a procuradora chama de “pacto nefasto da solidariedade e do silêncio”. “Você está sendo solidário ao agressor quando você faz silêncio”, alerta Melícia.

Segundo a procuradora, o grupo precisa intervir em prol das vítimas, pois, do contrário, o assédio moral espalhará consequências opressoras por outros profissionais. “O assédio é ruim para a corporação como um todo, porque se o grupo vê que uma pessoa está sendo vítima de assédio moral, ele entra em um sentimento de temor, de revolta, de indignação. A corporação adoece junto. Você não pode falar de assédio moral como se não fosse um problema seu”, orienta a representante do MPT.

Alarmante, um estudo da Organização das Nações Unidas (ONU), mencionado pela procuradora Melícia Carvalho, revela dados assustadores sobre assédio moral. De acordo com o estudo, os casos de assédio levarão, até 2020, 40% dos trabalhadores à aposentadoria precoce, porque as vítimas querem se ver livres da violência corriqueira. Ainda conforme a pesquisa, 20% dessas pessoas poderão tentar suicídio.

Caminhos da denúncia e as consequências jurídicas

A procuradora do MPT em Pernambuco enfatiza que existem diversos meios para denúncias. Nos episódios em que há um problema coletivo, por exemplo, o site do Ministério Público do Trabalho pode receber as reclamações. Ouças as orientações no áudio a seguir:

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Segundo Melícia, hoje, o grupo LGBT, negros, mulheres, pessoas com deficiência ou diagnosticadas com algum problema de saúde são as que mais sofrem assédio moral no ambiente corporativo. Por meio da Justiça, as vítimas podem receber indenizações por danos morais, quando comprovado impacto psicológico em decorrência dos atos violentos, bem como há a possibilidade de danos materiais, uma vez que as vítimas também podem receber indenizações para suprir furos financeiros ocasionados pela violação.

Proposta - A Câmara dos Deputados aprovou, em março deste ano, projeto de lei que criminaliza o assédio moral no ambiente de trabalho. De autoria do deputado federal Marcos de Jesus (PL-PE), a proposta seguirá para o Senado.

"A pena estipulada será de detenção de um a dois anos e multa, aumentada de um terço se a vítima for menor de 18 anos. Isso sem prejuízo da pena correspondente à violência, se houver. A causa somente terá início se a vítima representar contra o ofensor. Essa representação é irretratável, ou seja, a pessoa não pode desistir dela posteriormente. O texto ressalta que, na ocorrência de transação penal, esta deve ter caráter educativo e moralizador. A transação penal é um mecanismo pelo qual, em crimes e contravenções de menor potencial ofensivo (pena máxima não superior a dois anos), o acusado aceita uma forma de acordo em que ele opta por não enfrentar um processo criminal para não correr o risco de sair condenado ao final, se considerado culpado", explica a Câmara dos Deputados, por meio da Agência Câmara de Notícias. Veja a proposta na íntegra.

Situações em que não há assédio

É importante lembramos que nem todos os embates no âmbito profissional são considerados assédio moral. Divergência de opiniões em uma reunião ou discussões, desde que respeitosas, fazem parte do universo corporativo.

“Nem tudo a gente pode colocar no caldeirão do assédio moral. A relação humana é uma relação de pessoas que pensam de forma diferente, então é natural que existam conflitos individuais. Não é assédio moral quando a gente não consegue identificar uma situação sistematizada”, finaliza a procuradora do Ministério Público do Trabalho.

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