Tópicos | marco temporal

O plenário da Câmara dos Deputados deve votar nesta terça-feira (30) o projeto de lei do marco temporal de demarcação de terras indígenas (PL 490/2007). Para lideranças indígenas, o projeto representa “grande ameaça” à sua vida e por isso eles se dizem dispostos a lutar e resistir contra a aprovação. Na manhã de hoje (30), indígenas guarani, que vivem no Pico do Jaraguá, em São Paulo, bloqueiam a Rodovia dos Bandeirantes, na altura do km 20, no sentido São Paulo, para protestar.

“Não sei dizer se vamos conseguir impedir essa votação. Mas o que posso afirmar é que nós estamos cansados de sofrer essa violência. Estamos cansados de ser ameaçados e de ter nossa vida sob todo esse impacto que o não indígena nos traz”, disse Thiago Karai Djekupe, uma das lideranças da terra indígena Jaraguá, em São Paulo, em entrevista nessa segunda-feira (29) à Agência Brasil.

##RECOMENDA##

“Recuar, para nós, não é uma opção. Vamos resistir, vamos nos posicionar e, se tentarem fazer reintegração de posse a qualquer terra indígena, é necessário entender que vão precisar tirar nossa vida. O território é o que nós somos. Se tiver que resistir, se tiver que lutar, se tiver que tombar para que outros continuem erguidos na luta, vamos fazê-lo. Recuar, para nós, não é opção. Independentemente de qualquer ameaça que se coloque à nossa vida, são mais de 500 anos sob essa violência, são mais de 500 anos dessa ignorância e não vai ser nessa geração, na minha geração, que vamos nos curvar”, acrescentou Karai Djekupe.

Segundo ele, os povos originários estão mobilizados em todo o país para acompanhar a votação no Congresso. Ontem (29), por exemplo, os guaranis de São Paulo fizeram atos no Largo São Francisco, na capital paulista, e uma grande vigília na terra indígena Jaraguá. Hoje (30), novos atos devem ser realizados em todo o país cobrando para que a lei não seja aprovada. “O Brasil todo estará se mobilizando e nós vamos nos mobilizar aqui em nossa base, nosso território”, disse o líder indígena.

O projeto de lei que cria o chamado marco temporal estabelece que serão consideradas terras indígenas os lugares ocupados por povos tradicionais até o dia 5 de outubro de 1988, data da promulgação da Constituição. A Carta Magna não prevê esse marco como critério, já que indígenas são povos originários que estão presentes no país muito antes da colonização europeia. Mas o tema também é objeto de análise pelo Supremo Tribunal Federal (STF), que deve decidir, no próximo dia 7 de junho, se a tese do marco temporal é válida ou não.

“Se isso acontecer [a tese do marco temporal for aprovada], significa que várias terras e povos indígenas, que não têm como comprovar o processo de demarcação conforme esse marco exige, vão sofrer a expulsão e a violência de seus territórios - e essa violência estará legitimada por uma ação de reintegração de posse baseada na tese do marco temporal”, afirmou Karai Djekupe. “[Esse projeto de lei é] para fragilizar nossas vidas, para tomar nossos territórios, para fazer reintegração de posse e para cometer violência”, acrescentou.

“Nós, povos indígenas, vamos resistir porque somos nossos territórios. Nosso entendimento de pertencimento à terra é diferente do entendimento do não indígena. O que vai acontecer se o marco temporal for aprovado é isso: eles vão iniciar o processo de reintegração de posse e nós iremos resistir a essas reintegrações”.

A votação do marco temporal não preocupa somente os povos originários. Nessa segunda-feira (29), o escritório da Organização das Nações Unidas (ONU) para Direitos Humanos na América do Sul divulgou alerta cobrando das autoridades brasileiras “medidas urgentes em prol dessas populações, conforme as normas internacionais de direitos humanos”. Segundo o órgão, iniciativas como essa, do Congresso Nacional, “arriscam a proteção dos povos indígenas no país”.

“Aprovar o projeto conhecido como marco temporal seria um grave retrocesso para os direitos desses povos, contrário às normas internacionais de direitos humanos”, disse Jan Jarab. chefe da ONU Direitos Humanos na América do Sul. “A posse das terras existentes em 1988, após o expansionismo da ditadura militar, não representa a relação tradicional forjada durante séculos pelos povos com o seu entorno, ignorando arbitrariamente os direitos territoriais e o valor ancestral das terras para o seu modo de viver”, diz a nota.

A organização internacional Human Rights Watch também manifestou grande preocupação com a votação do marco temporal. Em comunicado, a organização disse que “o Congresso brasileiro deveria rejeitar um projeto de lei que adota marco temporal arbitrário para o reconhecimento de terras indígenas”.

“O direito de povos indígenas a seus territórios não começa e nem termina em uma data arbitrária”, disse Maria Laura Canineu, diretora da Human Rights Watch no Brasil. “Aprovar esse projeto de lei seria um retrocesso inconcebível, violaria os direitos humanos e sinalizaria que o Brasil não está honrando seu compromisso de defender aqueles que comprovadamente melhor protegem nossas florestas”, acrescentou.

Um grupo de indígenas bloqueia a Rodovia dos Bandeirantes na manhã desta terça-feira (30) na altura do km 20, sentido capital. Barricadas com pneus em chamas foram montadas antes das 6h e interrompem totalmente o tráfego na via, provocando mais de 6 km de congestionamento.

A manifestação é realizada por indígenas guaranis, que protestam contra a votação do PL 490, que define a adoção do chamado marco temporal para a demarcação de terras indígenas no País. O texto, que pode ser votado nesta terça na Câmara dos Deputados, define que apenas as populações que comprovarem a ocupação de territórios até outubro de 1988, quando foi promulgada a Constituição, podem reivindicar a demarcação de terras.

##RECOMENDA##

[@#video#@]

Definição   

Marco temporal é uma tese jurídica segundo a qual os povos indígenas têm direito de ocupar apenas as terras que ocupavam ou já disputavam em 5 de outubro de 1988, data de promulgação da Constituição. A tese surgiu em 2009, em parecer da Advocacia-Geral da União sobre a demarcação da reserva Raposa-Serra do Sol, em Roraima, quando esse critério foi usado.

##RECOMENDA##

Em 2003, foi criada a Terra Indígena Ibirama-Laklãnõ, mas uma parte dela, ocupada pelos indígenas Xokleng e disputada por agricultores, está sendo requerida pelo governo de Santa Catarina no Supremo Tribunal Federal (STF). O argumento é que essa área, de aproximadamente 80 mil m²,  não estava ocupada em 5 de outubro de 1988. Os Xokleng, por sua vez, argumentam que a terra estava desocupada na ocasião porque eles haviam sido expulsos de lá.

A decisão sobre o caso de Santa Catarina firmará o entendimento do STF para a validade ou não do marco temporal em todo o País, afetando mais de 80 casos semelhantes e mais de 300 processos de demarcação de terras indígenas que estão pendentes.   

Argumentos favoráveis

Em 2021, o ministro do STF Nunes Marques votou a favor do marco temporal, no caso de Santa Catarina, afirmando que, sem esse prazo, haveria “expansão ilimitada” para áreas “já incorporadas ao mercado imobiliário” no País.

O ministro avaliou ainda que, sem o marco temporal, a “soberania e independência nacional” estariam em risco.  Ele destacou que é preciso considerar o marco temporal em nome da segurança jurídica nacional.

“Uma teoria que defenda os limites das terras a um processo permanente de recuperação de posse em razão de um esbulho ancestral naturalmente abre espaço para conflitos de toda a ordem, sem que haja horizonte de pacificação”, disse. [Esbulho é a perda de uma terra invadida.]

Segundo Marques, a posse tradicional não deve ser confundida com posse imemorial. Marques citou que a Constituição deu prazo de cinco anos para que a União efetuasse a demarcação das terras. Para ele, essa norma demonstra a intenção de estabelecer um marco temporal preciso para definir as áreas indígenas.

O ministro também entende que a ampliação da terra indígena de Santa Catarina requerida pela Funai é indevida, por se sobrepor a uma área de proteção ambiental. 

Argumentos contrários   

Representantes dos povos indígenas afirmam que o marco temporal ameaça a sobrevivência de muitas comunidades indígenas e de florestas.  Afirmam também que trará o caos jurídico ao País e muitos conflitos em áreas já pacificadas, por provocar a revisão de reservas já demarcadas. 

 O ministro Edson Fachin é o relator do caso e foi o primeiro a votar. Ele foi contrário ao marco temporal.  Para ele, a proteção constitucional aos direitos originários sobre as terras que os indígenas tradicionalmente ocupam independe da existência de um marco temporal e da configuração de renitente esbulho. 

 O ministro também afirmou que a Constituição reconhece que o direito dos povos indígenas sobre suas terras de ocupação tradicional é um direito originário, ou seja, anterior à própria formação do Estado.   Fachin salientou que o procedimento demarcatório realizado pelo Estado não cria as terras indígenas – ele apenas as reconhece, já que a demarcação é um ato meramente declaratório. 

 

*Da Agência Câmara de Notícias

​O plenário da Câmara dos Deputados pode votar nesta terça-feira (30) o projeto de lei do marco temporal de demarcação de terras indígenas (PL 490/2007). A proposta determina que somente serão demarcadas as terras indígenas tradicionalmente ocupadas por esses povos na data da promulgação da Constituição Federal, em 5 de outubro de 1988.

Em tramitação na Câmara desde 2007, o texto teve sua análise acelerada após aprovação de requerimento de urgência, por 324 votos favoráveis e 131 contrários, na semana passada. A matéria retira a demarcação de terras de povos originários da Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai) e devolve a atribuição ao Ministério da Justiça e Segurança Pública. 

##RECOMENDA##

A proposta estabelece que, para serem consideradas terras ocupadas tradicionalmente, deverá ser comprovado objetivamente que elas, na data de promulgação da Constituição, eram, ao mesmo tempo, habitadas em caráter permanente, usadas para atividades produtivas e necessárias à preservação dos recursos ambientais e à reprodução física e cultural. 

O relator da proposta, deputado Arthur Oliveira Maia (União-BA), argumenta que o texto busca “deixar claro que os indígenas devem ser respeitados em suas especificidades socioculturais, sem que isso sirva de impedimento ao exercício de seus outros direitos fundamentais”.

  “Dessa forma, enxergando os indígenas como cidadãos brasileiros que são, pretendemos conceder-lhes as condições jurídicas para que, querendo, tenham diferentes graus de interação com o restante da sociedade, exercendo os mais diversos labores, dentro e fora de suas terras, sem que, é claro, deixem de ser indígenas”, afirma o deputado. 

O texto prevê, entre outros pontos, que é proibida a ampliação de terras indígenas já demarcadas, além de anular a demarcação que não atenda aos preceitos da lei. Os processos administrativos de demarcação de terras indígenas ainda não tenham sido concluídos serão adequados ao que prevê a nova legislação. 

"Institucionalização do genocídio" Em audiência na Câmara dos Deputados, a assessora jurídica do Conselho do Povo Terena, Priscila Terena, citou 156 terras, oito etnias e mais de 80 mil indígenas impactados, em caso de aprovação desses textos. “A aprovação é a declaração do nosso extermínio e o início da institucionalização do nosso genocídio”, disse.

A presidente da Comissão da Amazônia e coordenadora da Frente Parlamentar em Defesa dos Povos Indígenas, deputada Célia Xakriabá (PSOL-MG), afirmou que a proposta facilitaria, entre outros pontos, a grilagem de terras ao permitir obras sem consulta aos indígenas. 

  “Trata de transformar o marco temporal em lei, com o objetivo de inviabilizar a demarcação dos territórios indígenas; permite a construção de rodovias, hidrelétricas e outras obras em terras indígenas sem consulta livre, prévia e informada aos povos afetados, facilitando a grilagem em terras indígenas”, apontou.

Na avaliação do Ministério dos Povos Indígenas, o texto pode "inviabilizar demarcações de terras indígenas, ameaçar os territórios já homologados e destituir direitos constitucionais, configurando-se como uma das mais graves ameaças aos povos indígenas do Brasil na atualidade". 

Defensoria

A Defensoria Pública da União (DPU) apontou a necessidade de rejeição integral do projeto de lei do marco temporal na demarcação de terras indígenas. A recomendação foi encaminhada pelo defensor público-geral federal em exercício, Fernando Mauro Junior, ao presidente da Câmara, deputado Arthur Lira (PP-AL).  Segundo o documento, a Constituição não pode ser utilizada como referência para a ocupação indígena, que tem parâmetros diferentes dos requisitos da posse do direito civil.

  “O que se sabe é que o território – quando transformado em terra – é o espaço físico necessário para que determinada sociedade indígena desenvolva suas relações sociais, políticas e econômicas, segundo suas próprias bases culturais. É o elo subjetivo dos povos indígenas com seu território tradicional que permite serem quem eles são e, dessa feita, o espaço tem verdadeiro valor para assegurar a sobrevivência física e cultural, sendo por isso de vital importância para a execução dos seus direitos fundamentais", ressalta o documento. 

Entenda

A tese sobre o marco temporal de demarcação surgiu em 2009, em parecer da Advocacia-Geral da União (AGU) sobre a demarcação da reserva Raposa Serra do Sol, em Roraima, quando esse critério foi usado.

Atualmente, o Supremo Tribunal Federal (STF) discute o tema em razão da disputa sobre a Terra Indígena Ibirama-Laklãnõ. Parte da área de 80 mil metros quadrados (m²), ocupada pelos indígenas Xokleng, é questionada pelo governo de Santa Catarina. O estado argumenta que na data de promulgação da Constituição não havia ocupação na área. Por outro lado, indígenas argumentam que, naquela ocasião, haviam sido expulsos do local.

O procurador-geral do Estado de Santa Catarina, Márcio Vicari, defendeu que a realidade de Santa Catarina é diferente da de outras unidades federativas. 

“Há localidades em que a demarcação envolve um latifúndio de um único proprietário, mas, no nosso estado, isso impacta na realidade de centenas de famílias, muitas delas de produtores rurais. Por isso, no dia 7 de junho estaremos em Brasília para, conforme a determinação do governador Jorginho Mello, defender a tese de marco temporal”, afirmou, durante audiência na Assembleia Legislativa de Santa Catarina (Alesc). 

No dia 7 de junho, a Corte analisará se há validade ou não do marco temporal em todo o país, o que alcançará mais de 80 casos semelhantes e mais de 300 processos de demarcação de terras indígenas pendentes. 

*Com informações da Agência Câmara

A presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Rosa Weber, prometeu, durante visita a uma aldeia indígena, que o julgamento sobre o marco temporal para demarcação de terras indígenas será retomado ainda no primeiro semestre.

Como presidente da Corte, cabe a Rosa Weber elaborar a pauta de julgamentos do plenário. O caso é discutido em um recurso extraordinário, com repercussão geral reconhecida, isto é, que servirá de parâmetro para todos os outros processos semelhantes.

##RECOMENDA##

Ao visitar a Aldeia Paraná, do povo Marubo, no Vale do Javari (AM), a ministra ouviu queixas e pedidos dos indígenas. Em documento elaborado pela União dos Povos Indígenas do Vale do Javari (Unijava), e lido pelas lideranças, foi solicitado que o Supremo resolva a questão do marco temporal.

“Pedimos que o Supremo Tribunal Federal adote a correta interpretação da Constituição Federal, que garante que o governo federal proteja nosso território. Antes de 1500 a gente já estava aqui, não podemos estar submetidos a um marco temporal”, diz o documento. “A não aprovação da tese do marco temporal é importante para a manutenção dos direitos conquistados pelo movimento indígena ao longo da história”, acrescenta o texto.

De acordo com o Supremo, Rosa Weber ouviu dos indígenas sobre ameaças de morte por parte de garimpeiros. “Eles agradeceram a presença do Estado na aldeia, afirmaram ter um grande respeito pelo STF, mas pediram que a Corte faça com que os direitos indígenas sejam efetivados na prática”, diz nota do tribunal.

Em janeiro, a presidente do STF já havia indicado que colocaria o tema do marco temporal em julgamento ainda durante sua permanência no cargo. Ela se aposenta em outubro, ao completar 75 anos, quando atinge a idade para aposentadoria compulsória.

Tese

No julgamento, os ministros discutem a tese, defendida por proprietários de terras, de que os indígenas somente teriam direito aos territórios que estavam efetivamente ocupados no dia 5 de outubro de 1988, data da promulgação da Constituição Federal, ou que já estavam em disputa judicial nesta época.

O processo que motivou a discussão trata da disputa pela posse da Terra Indígena Ibirama, em Santa Catarina. A área é habitada pelos povos Xokleng, Kaingang e Guarani, e a posse de parte da TI é questionada pela procuradoria do estado.

O placar do julgamento está empatado em 1 a 1. O relator do caso, ministro Edson Fachin, votou contra o marco temporal para demarcação de terras indígenas. Já o ministro Nunes Marques abriu divergência a favor do marco temporal para limitar a expansão de terras indígenas no país.

 

O presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Luiz Fux, retirou da pauta do plenário o julgamento sobre o marco temporal para demarcação de terras indígenas. A decisão do ministro gerou o quarto adiamento consecutivo do caso, que estava marcado para ir à votação no próximo dia 23. A Articulação dos Povo Indígenas do Brasil (Apib) havia convocado uma marcha até Brasília nesta data para acompanhar a análise do processo.

O coordenador jurídico da Apib, Eloy Terena, disse ao Estadão que a decisão de Fux não desmobiliza o movimento organizado contra o marco. "O julgamento era bastante esperado pelos povos indígenas, isto porque muitos processos demarcatório estão pendentes esperando decisão do STF", afirmou.

##RECOMENDA##

"Infelizmente, o tempo corre a favor do agronegócio. Esperando que o STF siga firme e comprometido com o que a Constituição garante aos povos indígenas, pois sabemos que o presidente Jair Bolsonaro estava pressionando, inclusive ameaçando não cumprir decisão do Supremo, caso a decisão fosse contra o marco temporal", completou.

O julgamento é tido como crucial por lideranças indígenas e por agentes do agronegócios porque pode impor um fim à tese do marco temporal, que defende a demarcação de terras indígenas apenas se ficar comprovado que as comunidades tradicionais ocupantes da área em disputa na Justiça estavam, de fato, naquele território na data da promulgação da Constituição, em 5 de outubro de 1988. Na prática, o reconhecimento do marco impede que milhares de aldeados tenham suas terras registradas pelo Estado, ficando sujeitos à expropriação.

Em junho do ano passado, o julgamento do recurso extraordinário sobre o marco temporal foi interrompido por um pedido de destaque (encaminhamento ao plenário físico) do ministro Alexandre de Moraes. O caso começou a ser votado presencialmente ainda naquele mês, mas precisou ser suspenso por causa do recesso no Poder Judiciário. A votação foi retomada em setembro, porém, houve nova interrupção, dessa vez por um pedido de vista (mais tempo de análise) apresentado por Moraes.

O julgamento do marco temporal se tornou um dos principais argumentos do presidente Jair Bolsonaro (PL) para atacar o Supremo. Nesta terça-feira, 31, o chefe do Executivo criticou a possível votação dos prazos legais para demarcação das terras indígenas no País e disse que "alguns" tentam mudar o regime democrático brasileiro, em referência aos ministros da Corte.

No final do ano passado, Bolsonaro chamou o relator da ação, ministro Edson Fachin, de "leninista" por votar contra a tese de que a data de promulgação da Constituição de 1988 serviu de baliza para definir todas as comunidades tradicionais com direito à demarcação. O termo se refere aos apoiadores do líder comunista Vladmir Lenin, líder da Revolução Russa de 1917. O presidente tem argumentado que a rejeição ao marco temporal pode inviabilizar o agronegócio brasileiro e afetar a segurança alimentar no País.

O plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) encerrou nesta quarta-feira, 8, o quarto dia de julgamento do chamado "marco temporal" para a demarcação de terras indígenas, ainda sem dar início à votação da tese. A expectativa é que o ministro Edson Fachin, relator do caso, faça a leitura de seu voto na sessão de amanhã.

O julgamento foi suspenso cerca de uma hora e meia antes do previsto. De acordo com a assessoria do tribunal, os ministros foram consultados e concordaram em deixar o voto do relator para a próxima sessão, em razão da extensão da fundamentação.

##RECOMENDA##

A análise foi retomada após o discurso do presidente da Corte, ministro Luiz Fux, em resposta ao "ultimato" do presidente Jair Bolsonaro nas manifestações do feriado de 7 de Setembro. Coube a Fachin, na condição de relator, resgatar os pareceres e sustentações orais das entidades e associações que se inscreverem para contribuir com os votos dos ministros.

Pelo entendimento do marco temporal, uma terra só pode ser demarcada se ficar comprovado que os indígenas estavam naquele território na data da promulgação da Constituição, em 5 de outubro de 1988. Os defensores da tese, muitos deles ligados ao agronegócio, argumentam que o uso do verbo "ocupar" no tempo presente no texto da Constituição Federal é a prova de que as comunidades indígenas só poderiam reivindicar a posse sobre as terras que ocupavam no momento da aprovação da Carta. Já as lideranças indígenas afirmam que a Assembleia Constituinte trabalhou com critérios de tradicionalidade. Caso os povos originários interessados na demarcação não consigam provar a posse das terras, eles poderão ser submetidos a remoções e impedidos de solicitar novos territórios.

Fachin chamou atenção para a importância do tribunal bater o martelo sobre o direito à posse de terras pelas comunidades indígenas. "Se faz necessário que este tribunal desempenhe sua tarefa de guardião da Constituição", afirmou.

Na avaliação do ministro, apesar da previsão constitucional,os direitos possessórios das comunidades indígenas ainda encontram entraves.

"A despeito dessa tutela das terras e do próprio modo de vida indígena pelo texto constitucional vigente, e mesmo pelas previsões constitucionais e legais a ele anteriores, o contexto social e político jamais espelhou referida proteção. Ao revés, é fato notório as condições graves e de por vezes trágicas nas quais, até os dias atuais, vivem os índios em nosso País", disse.

Ele já havia se manifestado contra o marco temporal no julgamento iniciado no plenário virtual, mas precisará reler a fundamentação da decisão, e até poderá mudá-la, porque houve um pedido de destaque, apresentado em junho pelo ministro Alexandre de Moraes, para levar a discussão para a sessão por videoconferência.

Os primeiros dias de julgamento ficaram restritos aos pareceres da Advocacia-Geral da União (AGU) e da Procuradoria-Geral da República (PGR), além das 39 manifestações de interessados no tema e partes no processo. Antes disso, houve ainda uma sessão reservada à leitura do relatório do processo.

Até aqui, o advogado-geral da União, Bruno Bianco Leal, defendeu o marco temporal sob argumento de que a derrubada da tese poderia gerar insegurança jurídica. Em sentido oposto, o procurador-geral da República, Augusto Aras disse ser contra a aplicação do entendimento. Ele defendeu que a Constituição registrou a importância do reconhecimento dos indígenas como os primeiros ocupantes das terras e que o reconhecimento da 'posse permanente e usufruto das riquezas', garantido constitucionalmente aos indígenas, dispensa até mesmo a necessidade da demarcação - que, em sua avaliação, funciona mais como um instrumento para facilitar a reivindicação das terras em eventuais conflitos de posse.

O Supremo Tribunal Federal (STF) retoma nesta quarta-feira (8) um julgamento que pode colocar em xeque centenas de terras indígenas pendentes de demarcação no país.

No chamado 'julgamento do século' sobre os indígenas, caberá ao STF decidir se é válida a tese do 'marco temporal', defendida pelo agronegócio com o apoio do presidente Jair Bolsonaro.

Nela, apenas as terras ocupadas por esses povos quando a Constituição brasileira foi promulgada em 1988 devem ser reconhecidas como terras ancestrais.

Especificamente, o STF debate um caso no território Ibirama-Laklano, no estado de Santa Catarina, que em 2009 perdeu sua condição de reserva depois que um tribunal de primeira instância aceitou o argumento de que os grupos não viviam ali em 1988.

Mas, por decisão do próprio tribunal, o veredicto terá repercussão geral e poderá afetar muitas outras terras em disputa. O julgamento pode se prolongar por várias sessões e ser adiado a pedido de um dos 11 juízes.

- O que dizem as partes? -

Os indígenas sustentam que a Constituição reconhece seus direitos sobre suas terras ancestrais, sem prever nenhum "prazo".

E afirmam que em muitos períodos foram deslocados de seus territórios, principalmente durante a ditadura militar (1964-1985), o que tornaria impossível determinar sua presença em 1988.

Os grandes produtores rurais afirmam que no Brasil, com uma população de 213 milhões de habitantes, os 900 mil indígenas já possuem um vasto território - 13% da enorme superfície do país - e que se o 'horizonte temporal' não for adotado, esse número chegará a 28%, projeções ainda questionadas.

O setor tem o apoio de Bolsonaro, que até o momento cumpriu sua promessa eleitoral de não demarcar "mais um centímetro" de terras indígenas.

A FPA, lobby agropecuário do Congresso brasileiro, afirma que as terras indígenas atualmente em estudo "estão se expandindo em áreas que geram os maiores valores produtivos" do agronegócio, o que pode ter um grande impacto em um setor vital para a economia do Brasil.

"A bancada não é contra a demarcação de terras indígenas, defendemos que o produtor rural não seja prejudicado no processo", declarou o presidente da FPA, o deputado Sérgio Souza.

- Que impacto a decisão poderia ter nas terras indígenas?

Se o STF aprovar a tese do marco temporal, os povos indígenas podem ser expulsos de suas terras se não comprovarem que estavam assentados no local na data da promulgação da Constituição.

Segundo dados do Instituto Socioambiental (ISA), que defende os direitos dos povos indígenas, das 725 terras indígenas existentes - a grande maioria na Amazônia - o caso pode afetar pelo menos 237 que estão em processo de demarcação. Uma parte das que ainda não estão demarcadas é analisada pela Justiça.

"A perversidade do caso é que os povos indígenas, que costumam ter tradição oral, terão que provar fatos que aconteceram há 32 anos", Juliana de Paula Batista, advogada do ISA, explicou à AFP.

Além disso, os indígenas argumentam que as reservas, vitais para conter o crescente avanço do desmatamento no Brasil, estariam ainda mais expostas aos invasores de terras e garimpeiros ilegais.

- Em que fase está o projeto de lei?

Bolsonaro e seus aliados do agronegócio promovem simultaneamente um projeto de lei que visa também estabelecer o "marco temporário" e que abre espaço para a exploração econômica das reservas.

O texto precisa ser debatido na Câmara dos Deputados, para o qual ainda não há data. E se for aprovado, será analisado pelo Senado.

Uma decisão contra o "marco temporal" no STF "não invalida automaticamente a decisão do parlamento, mas seria temerário que o congresso edite uma lei com conteúdo já declarado inconstitucional pelo STF. Possivelmente a lei será declarada inconstitucional", explicou a advogada do ISA.

O Supremo Tribunal Federal (STF) retomará, nesta quarta-feira (1º), o julgamento sobre a aplicação da tese de "marco temporal" em demarcações de terras indígenas. O caso deve começar a ser votado pelos ministros, mas não há perspectiva de quando o processo será concluído. Todos os sinais são de que algum integrante da Corte pedirá mais tempo para análise. A avaliação nos bastidores é de que o País vive uma crise entre os poderes, e a situação exige cautela.

A decisão da Corte, seja ela qual for, terá impacto nas relações entre as instituições. A bancada ruralista no Congresso aposta na suspensão do julgamento como forma de ganhar tempo para correr em paralelo com um projeto de lei (PL 490) que trata do mesmo assunto, na Câmara. Acampados em Brasília desde 22 de agosto, cerca de 6 mil indígenas aguardam o encerramento do processo iniciado em 2016.

##RECOMENDA##

Na avaliação da Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA), a palavra final sobre a demarcação de terras deve ser do Congresso, e não do Supremo. O texto em tramitação na Câmara admite a tese do marco temporal e permite a exploração de territórios indígenas por iniciativas do agronegócio, da mineração e da infraestrutura. Caso o julgamento seja suspenso, a FPA pretende avançar com esse projeto.

Pelo entendimento do marco temporal, uma terra indígena só pode ser demarcada se ficar comprovado que os índios estavam naquele território na data da promulgação da Constituição, em 5 de outubro de 1988.

Ana Patté, do povo Xokleng, afirmou que o eventual pedido de suspensão do julgamento, por tempo indeterminado, seria um duro revés à mobilização indígena. "Querem deixar a gente no cansaço para ver se a gente desiste, mas não vai ser o pedido de vista que vai enfraquecer a nossa luta", disse ela.

O povo Xokleng está no centro da disputa de um território que hoje envolve uma reserva ambiental. A etnia divide a tutela da Reserva Indígena de Ibirama-La Klanõ com os povos Kaigang e Guarani, mas a Fundação Amparo Tecnológico ao Meio Ambiente, do governo de Santa Catarina, pede a reintegração de posse das terras.

É neste contexto que a Procuradoria-Geral de Santa Catarina passou a adotar a tese do marco temporal. Por ser uma pauta de repercussão geral, os ministros do Supremo também vão discutir a validade de um parecer editado pela Advocacia-Geral da União (AGU), em julho de 2017, que obrigou todos os órgãos do governo federal a seguir o entendimento do marco temporal, restringindo as demarcações de terras indígenas.

"O marco temporal não significa a extinção dos direitos dos indígenas. Pelo contrário: denota que as reivindicações das comunidades indígenas para demarcação de novas áreas deverão ser precedidas de prévia e justa indenização das propriedades privadas eventualmente afetadas, ou seja, reconhecendo o direito de todos os envolvidos, o que propiciará a solução pacífica dos conflitos", afirmou Rudy Ferraz, chefe da assessoria jurídica da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA).

O julgamento já foi postergado três vezes seguidas, desde que foi levado ao plenário do Supremo, antes do recesso no Judiciário. Há tanta divergência sobre o assunto que alguns ministros podem abandonar posições adotadas recentemente em decisões favoráveis aos indígenas. No ano passado o STF decidiu, por unanimidade, que o governo federal é obrigado a fornecer ajuda às comunidades indígenas no enfrentamento da pandemia de Covid-19. Além disso, reconheceu que o processo de demarcação é de competência exclusiva da Fundação Nacional do Índio (Funai), e não do Ministério da Agricultura.

Como mostrou o Estadão, porém, a Funai mudou de lado na polêmica do marco temporal. Antes, pregava a demarcação da terra do povo Xokleng, em Santa Catarina. No governo de Jair Bolsonaro, porém, já se mostrou a favor da tese defendida pelos produtores rurais.

Para a deputada Aline Sleutjes (PSL-PR), presidente da Comissão de Agricultura, Pecuária, Abastecimento e Desenvolvimento Rural da Câmara e integrante da FPA, a ação mais "responsável" a ser adotada pelo Supremo é a de reconhecer a constitucionalidade da tese do marco temporal. "É necessário dar segurança jurídica para quem detém a posse da terra", disse.

Os indígenas, porém, já planejam outro recurso, caso sejam derrotados. "Buscaremos o nível internacional, porque há necessidade de preservar", afirmou o líder Brasilio Pripra Xokleng.

Autora do recurso que deu origem ao julgamento do "marco temporal" das terras indígenas no Supremo Tribunal Federal (STF), a Fundação Nacional do Índio (Funai) mudou de lado na polêmica. Quando apresentou o recurso, em 2017, a Funai pregava a demarcação da terra do povo Xokleng, em Santa Catarina. Hoje, sob Jair Bolsonaro, já se manifestou a favor da tese defendida pelos produtores rurais.

O caso é considerado um dos mais importantes da história da Corte no que diz respeito às terras indígenas e, a partir desta quarta-feira, dia 1º, os ministros do Supremo vão se debruçar sobre o assunto, na tentativa de diminuir os conflitos. O critério do marco temporal prevê que só podem ser consideradas terras indígenas aquelas já ocupadas por eles no dia 5 de outubro de 1988, quando foi promulgada a Constituição.

##RECOMENDA##

Ao longo da semana passada, mais de 6 mil indígenas acamparam na Praça dos Três Poderes, em Brasília, para acompanhar o julgamento do caso no Supremo. O que for decidido ali pode provocar impacto nos processos de demarcação de 303 terras indígenas, em todo o País. Somente no Supremo a análise afetará ao menos 82 processos similares, que estão paralisados à espera de uma decisão.

O julgamento é sobre um recurso especial apresentado pela Funai contra uma decisão do Tribunal Regional Federal da 4.ª Região (TRF-4), sediado em Porto Alegre (RS). A outra parte do processo é representada pelo Instituto do Meio Ambiente de Santa Catarina (IMA). No recurso original, a Funai contestou decisão do TRF-4 que deu ganho de causa ao IMA contra os Xokleng. Eles retornaram a um território que hoje envolve uma reserva ambiental.

Em janeiro de 2017, a Funai argumentava que os Xokleng tinham direito imprescritível à terra, ainda que tivessem ficado fora do local por um tempo. Hoje, no entanto, houve uma guinada de posicionamento do órgão. Em maio do ano passado, atendendo a um pedido do ministro do STF Edson Fachin, relator do caso, a Funai pediu que seu próprio recurso fosse rejeitado.

O Supremo também discutirá a validade de um parecer editado pela Advocacia-Geral da União (AGU), em julho de 2017, que obrigou todos os órgãos do governo federal a seguir o entendimento do marco temporal, restringindo as demarcações de terras indígenas.

Para Renato Ribeiro de Almeida, advogado e doutor em Direito do Estado pela Universidade de São Paulo (USP), a mudança de posição da Funai tem mais importância política do que jurídica, uma vez que o julgamento diz respeito à tese do marco temporal. "O julgamento do STF não versa sobre uma questão de fato, mas sobre uma questão de direito. Então, o que importa é a tese jurídica, e não os fatos em si. A discussão é sobre se deve-se aplicar o marco temporal da Constituição de 1988 às terras indígenas ou não; e não sobre a questão específica dos indígenas de Santa Catarina", disse Almeida ao Estadão.

Mesmo que a Funai tenha mudado de posição, os dois lados da controvérsia estarão representados no julgamento do STF: ao todo, 39 entidades foram admitidas como partes interessadas. O grupo inclui desde entidades ligadas aos indígenas até sindicatos de produtores rurais, além de governos estaduais.

'Segurança jurídica'

O atual presidente da Funai, o delegado da Polícia Federal Marcelo Xavier, foi ouvido em audiência na Câmara, no começo deste mês, e reafirmou o apoio à tese do marco temporal como forma de promover a segurança jurídica nas disputas por terras no País.

Xavier disse que o órgão está aguardando o julgamento no Supremo para dar sequência aos processos de demarcação. Desde o início da gestão do presidente Jair Bolsonaro, o governo não concluiu o processo de demarcação de nenhuma terra indígena.

Entidades representativas de indígenas alegam que o reconhecimento do marco temporal impedirá a concretização de um direito protegido pela Constituição. Já os representantes do agronegócio e dos produtores rurais argumentam que a derrubada da tese prejudicaria a economia do setor e criaria insegurança jurídica, uma vez que a União não teria mais um critério objetivo para decidir o que é ou não terra indígena.

Na avaliação de Julio José Araujo Junior, procurador da República e doutorando em direito público pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj), a Funai restringiu o conceito de terra indígena. "O curioso é que é um círculo vicioso. O mesmo Estado que deixa de demarcar é o que vai dizer que aqueles casos pendentes não são terras indígenas", afirmou o procurador da República.

A Funai foi criada em 1967, ainda durante a ditadura militar (1964-1985), em substituição ao antigo Serviço de Proteção ao Índio (SPI). Formalmente, tem a missão de proteger e atender os indígenas, buscando seu desenvolvimento. O Estadão procurou a Funai, mas não obteve resposta.

Bancada Ruralista

Enquanto o Supremo Tribunal Federal discute a tese do marco temporal para demarcação de terras indígenas, a Frente Parlamentar Agropecuária (FPA), dona de uma das maiores bancadas de parlamentares no Congresso, tenta fazer valer o instrumento por meio de projeto de lei. Trata-se do PL 490, de 2007, que já foi tema de conversas reservadas entre a bancada ruralista e o presidente da Câmara, Arthur Lira (Progressistas-AL), que se comprometeu em dar prioridade à sua votação pelo plenário da Casa.

O texto, basicamente, impõe a mesma tese do marco temporal, além de abrir a possibilidade de exploração de projetos do agronegócio, mineração e empreendimentos de infraestrutura em terras indígenas.

"Continuaremos com a tramitação do Projeto de Lei 490, que já tem sua admissibilidade aprovada na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania da Câmara dos Deputados, por entender que é o Congresso Nacional o Poder com a atribuição e legitimidade para legislar, conforme prevê a Constituição Federal", declarou a FPA à reportagem.

"Entendemos que o direito de propriedade não pode ser preterido em detrimento da demarcação de terras indígenas. O produtor rural deve ser ressarcido quando houve desapropriação da terra pela qual pagou. O direito de um não pode retirar o direito do outro."

No dia 22 de junho, indígenas e policiais entraram em confronto em frente ao Congresso devido à aprovação do PL pela CCJ. Desde a semana passada, cerca de 6 mil indígenas estão acampados na Praça dos Três Poderes em protesto contra a tese do marco temporal.

Pelo entendimento do marco temporal, que é defendido por ruralistas, uma terra indígena só poderia ser demarcada se for comprovado que os índios estavam sobre a terra requerida na data da promulgação da Constituição, ou seja, no dia 5 de outubro de 1988. Quem estivesse fora da área nesta data ou chegasse depois deste dia, não teria direito a pedir sua demarcação.

Atualmente, o Brasil tem 421 terras indígenas devidamente homologadas, que somam 106,6 milhões de hectares e onde vivem cerca de 466 mil indígenas. Há, porém, outras 303 terras indígenas que ainda não conseguiram obter a homologação presidencial, ou seja, que estão em alguma fase do processo de demarcação, sem que este tenha sido concluído. Essas terras somam 11 milhões de hectares, onde vivem cerca de 197 mil indígenas. Os dados se baseiam em publicações feitas no Diário Oficial da União e que são monitoradas pelo Instituto Socioambiental (ISA).

O presidente Jair Bolsonaro voltou a criticar, ontem, o STF e sobre a discussão e afirmou não ser atribuição da Corte mudar a Constituição. Para ele, uma decisão contrária "mataria o campo e sufocaria as cidades".

Em entrevista à Rádio Rede Fonte de Comunicação, o presidente voltou a defender que, se o "marco temporal" for rejeitado, o Brasil terá uma decisão judicial que permitirá a demarcação de uma área do tamanho da Região Sul. "Vai afetar em cheio o agronegócio", disse, pontuando que será necessária a construção de novas rodovias para que o escoamento de alimentos não fique prejudicado.

A apoiadores, o presidente disse ontem que o reconhecimento legal das áreas de tradicionais "acabou" com o Estado de Roraima.

O STF retoma amanhã o julgamento do marco temporal, mas sem previsão de encerramento. Setores ligados aos ruralistas pressionam para que a Suprema Corte entenda que indígenas só podem ter direito sobre terras que já estavam ocupadas até a promulgação da Constituição, em 1988. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

Em meio à discussão no Supremo Tribunal Federal (STF) sobre a possibilidade de se adotar um "marco temporal" para a demarcação de terras indígenas, o presidente Jair Bolsonaro afirmou nesta segunda-feira (30) que o reconhecimento legal das áreas de tradicionais "acabou" com o Estado de Roraima. "Acabaram com Roraima por causa das demarcações. Tem alguma favela de índio lá? Tiraram o índio do local dele? Aqui tudo é complicado", disse Bolsonaro a apoiadores em frente ao Palácio da Alvorada.

O STF retoma o julgamento do marco temporal, tese defendida pelo Palácio do Planalto, na próxima quarta-feira (1º), mas sem previsão de encerramento. Setores ligados aos ruralistas pressionam para que a Suprema Corte entenda que indígenas só podem ter direito sobre terras que já estavam ocupadas até a promulgação da Constituição, em 1988. Bolsonaro também vem afirmando que uma decisão contrária do STF pode inviabilizar o agronegócio brasileiro e afetar a segurança alimentar.

##RECOMENDA##

Especialistas, contudo, criticam a tese e dizem que ela despreza o histórico de expulsões de indígenas de suas terras tradicionais.

Governador 'gordo'

Em uma conversa de cerca de 20 minutos com apoiadores, Bolsonaro voltou a fazer críticas ao governador do Maranhão, Flávio Dino (PSB), e disse que o Estado é como um "carro bom, mas com um mau motorista". Reiterando ataques pessoais a Dino, Bolsonaro voltou a falar que, "quanto mais pobre o Estado, mais gordo é o governador".

'Imbrochável'

A conversa também contou com uma oração feita por um apoiador. Na fala, o aliado disse que tanto Bolsonaro quanto sua família são perseguidos e classificou o presidente como "salvador da Pátria". Após uma apoiadora garantir voto nas próximas eleições e desejar saúde a Bolsonaro, o presidente repetiu: "Sou imbrochável".

O presidente Jair Bolsonaro voltou a defender neste sábado, 28, que o Supremo Tribunal Federal (STF) declare como válido o marco temporal de terras indígenas. Para ele, uma decisão contrária da Suprema Corte pode inviabilizar o agronegócio brasileiro e afetar a segurança alimentar. Ele ainda destacou que, se o marco temporal for rejeitado, "sob o arrepio da Constituição", o Brasil terá uma decisão judicial que permitirá a demarcação de uma área do tamanho da região Sul.

"Essa nova área, somando aquilo que seria equivalente aos Estados do Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul. Isso simplesmente inviabilizaria o nosso agronegócio, praticamente deixaríamos de produzir, de importar e entendo, pela dimensão do fato, sequer teríamos como garantir a nossa segurança alimentar", disse o presidente após participar de culto alusivo ao 1º Encontro Fraternal de Líderes Evangélicos em Goiânia (GO).

##RECOMENDA##

O julgamento no Supremo sobre a tese das demarcações está previsto para ser retomado na próxima quarta-feira, 1º de setembro, mas ainda não há previsão de encerramento. A Corte decidirá se uma terra indígena só pode ser demarcada se for comprovado que as comunidades originárias já estavam estabelecidas sobre o território requerido na data da promulgação da Constituição, ou seja, em 5 de outubro de 1988. As centenas de povos que não conseguirem comprovar legalmente a ocupação das terras nesta data não terão direito a pedir demarcação e poderão ser removidas compulsoriamente dos territórios. A possibilidade do marco temporal é defendida pelo governo e por ruralistas.

Sem detalhes, o presidente afirmou que, se a tese for chancelada pelo STF, terá "duas opções". "Não vou dizer agora, mas já está decidido qual é a opção. É aquela que interessa ao povo brasileiro, é aquela que está ao lado da nossa Constituição", afirmou. "Pior do que uma decisão mal tomada, é uma indecisão. O que for decidido lá pelo outro Poder, tem reflexos nos outros dois Poderes, Legislativo e Executivo, e nós representamos, sim, de verdade, de fato, pelo voto, a população brasileira", afirmou.

O presidente Jair Bolsonaro (sem partido) e o seu filho, o vereador Carlos Bolsonaro (Republicanos-RJ) foram às redes sociais para criticar os atos realizados em Brasília nesta sexta-feira (27), contra o marco temporal para a demarcação de terras indígenas e outras pautas envolvendo os direitos dos povos originários. Manifestantes atearam fogo em uma espécie de “caixão” feito de papelão, em frente ao Palácio do Planalto, na Praça dos Três Poderes.

Bolsonaro ironizou, falando que “esse tipo de gente” tem a intenção de retomar espaços de poder com o apoio “daqueles que censuram, prendem e atacam os defensores da Constituição Federal e da liberdade”, alfinetando o ministro Alexandre de Moraes e o Supremo Tribunal Federal.

##RECOMENDA##

[@#video#@]

No mesmo fio, Carlos respondeu: “Haverá inquérito para MAIS este absurdo? Depois da esquerda, com políticos e conhecidos incentivarem, fatos vistos por todos, com depredações de bens públicos e privados e nada acontecer, fica mais essa questão”.

[@#podcast#@]

Indígenas de diversas regiões do país têm se reunido em diferentes localidades de Brasília para pressionar os parlamentares sobre o andamento do marco temporal no Congresso. O tema chegou a entrar na pauta de julgamentos do Supremo Tribunal Federal (STF), na quinta-feira (26), mas foi adiado para o dia 1º de setembro.

A fumaça preta podia ser vista de longe, atrás do Congresso Nacional. O Corpo de Bombeiros esteve no local e apagou as chamas. Ninguém se feriu.

O presidente Jair Bolsonaro saiu de Brasília para cumprir agenda em Goiânia (GO). Este é o quarto dia consecutivo de protestos na capital federal.

Com aproximadamente 6 mil indígenas aguardando a decisão em frente ao prédio do Supremo Tribunal Federal (STF), o julgamento sobre a tese do "marco temporal" das demarcações de terras tradicionalmente ocupadas por povos originários foi novamente adiado. A pauta será retomada na quarta-feira, 1º, mas ainda sem previsão de encerramento a curto prazo.

Até que os ministros possam finalmente votar, os 39 advogados e instituições inscritas na Corte para orientar o processo terão direito a fazer sustentação pelo tempo regimental de 15 minutos. O presidente do Supremo, Luiz Fux, afirmou no encerramento da sessão desta quinta-feira, 26, ser impossível que todos se manifestem a tempo de finalizar o julgamento em um só dia. Dessa forma, um arranjo deve ser feito para encurtar as manifestações. A pauta é vista como prioridade no STF.

##RECOMENDA##

Esta é a terceira vez seguida em que o julgamento acaba postergado, desde que foi levado ao plenário do Supremo, sem nem mesmo um voto proferido. O ministro Edson Fachin, relator da ação, teve tempo de ler o relatório, mas não conseguiu dar novamente o voto já manifestado contra a constitucionalidade da tese do marco temporal.

Fachin argumentou no voto proferido ainda no plenário virtual da Corte que a tese promove um progressivo "etnocídio" entre os povos indígenas, com a eliminação de elementos culturais de determinado grupo.

A frase dura e a mobilização de indígenas na última semana pela Esplanada dos Ministérios dão dimensão do que está em disputa no Supremo. O julgamento é aguardado desde julho, quando foi pautado e suspenso por falta de tempo para análise em razão do recesso no Judiciário. O recurso extraordinário a ser analisado pelos ministros gira em torno de uma disputa entre a Fundação Nacional do Índio (Funai) e o governo do Estado de Santa Catarina.

A Fundação Amparo Tecnológico ao Meio Ambiente (Fatma), do governo de Santa Catarina, pede a reintegração de posse das terras sob tutela das etnias Xokleng, Kaigang e Guarani, que exigem a demarcação da Reserva Indígena de Ibirama-La Klanõ.

O argumento principal que embasa o pedido é a tese do Marco Temporal, na qual seus defensores, muitos deles ruralistas, argumentam que uma terra indígena só pode ser demarcada se for comprovado que as comunidades originárias já estavam estabelecidas sobre o território requerido na data da promulgação da Constituição, ou seja, em 5 de outubro de 1988. As centenas de povos que não conseguirem comprovar legalmente a ocupação das terras nesta data não terão direito a pedir demarcação e poderão ser removidas compulsoriamente dos territórios que ocupam há décadas.

A decisão a ser tomada pelos ministros do Supremo na próxima semana deve impactar o futuro de 303 demarcações de terras indígenas em andamento no País, um direito fundamental dos povos originários, previsto na Constituição. Dados publicados no Diário Oficial da União (DOU) mostram que essas terras ainda não foram analisadas pelo poder público, a fim de obter homologação presidencial. Diante da falta de avaliação, o processo de demarcação está pendente para cerca de 197 mil indígenas que ocupam os 11 milhões de hectares de terras não demarcadas.

A tese do marco temporal é há muito tempo aplicada em casos diversos de disputas contra comunidades indígenas. Em 2013, por exemplo, o ex-procurador-geral de Mato Grosso Jenz Prochnow Junior entrou com ação no Supremo pela anulação de um decreto assinado pela então presidente Dilma Roussef (PT), que homologou a demarcação da terra indígena Kayabi. O caso segue em tramitação na Corte.

"O marco temporal de ocupação: a Constituição Federal trabalhou com data certa - a data da promulgação dela própria (5 de outubro de 1988) - como insubstituível referencial para o dado da ocupação de um determinado espaço geográfico por essa ou aquela etnia aborígene", escreveu o procurador-geral. O termo aborígene é geralmente usado com conotação pejorativa.

Os defensores da tese apontam o uso do verbo "ocupar" no tempo presente para justificar a necessidade de os indígenas estarem ocupando as terras no momento da promulgação do texto constitucional.

A Procuradoria-Geral do Estado de Santa Catarina, que defende o governo estadual contra o povo Xokleng na disputa pela reintegração de posse, diz que, caso a tese do marco temporal se torne inconstitucional, cerca de 2 mil pessoas, dentre eles produtores rurais, que vivem na área desejada serão atingidas.

"Este julgamento pode ser capaz de equacionar as questões sociais, culturais, antropológicas e federativas que envolvem a matéria. A Constituição incentiva o resgate da dignidade dos povos indígenas, superando a ‘diretriz de integração’ e constituindo o ‘paradigma da interação’, mas sem que para isso se violem outros direitos fundamentais igualmente relevantes à sociedade brasileira e decorrentes da Carta", declarou a Procuradoria-Geral de Santa Catarina, por meio de nota.

Em análise mais ampla dos impactos, Eloy Terena, advogado da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), afirma que o reconhecimento da legitimidade faria com que povos isolados fossem "condenados ao extermínio" no processo de tomada das terras que ocupam. Segundo Terena, o marco temporal pode intensificar os assassinatos no campo.

"Nos tempos em que estamos vivendo, eu não duvido que no dia seguinte os fazendeiros, os garimpeiros não iriam nem esperar a publicação da decisão e, tampouco, uma decisão da Funai. Eles iriam com as próprias mãos fazer a retirada de comunidades inteiras", disse o advogado.

O ministro Luís Roberto Barroso, do Supremo Tribunal Federal (STF), negou nesta quarta-feira, 25, um pedido do governo federal para adiar a manifestação indígena que acontece em Brasília às vésperas do julgamento que vai decidir sobre a demarcação de terras no País.

A Advocacia-Geral da União (AGU), que representa judicialmente os interesses do Planalto, acionou o tribunal na semana passada pedindo que a mobilização fosse transferida para uma ‘data futura e mais prudente, em um momento de maior segurança epidemiológica’, em razão da pandemia.

##RECOMENDA##

"Seria razoável a adoção de providências para se evitar o agravamento de prejuízos à saúde pública e à integridade dos próprios povos indígenas", disse a pasta. A AGU defendeu, junto ao próprio STF, a rejeição de pedidos de investigação contra o presidente Jair Bolsonaro por falta de máscara e promoção de com aglomeração.

Depois de pedir esclarecimentos para a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), que coordena o acampamento com mais de seis mil pessoas, Barroso concluiu que a entidade adotou ‘protocolos sanitários cuidadosos’. As exigências vão desde comprovação de vacinação e testagem de participantes na chegada e na saída até uso de máscaras.

"Não está demonstrado, portanto, qualquer risco ou interesse contraposto de ordem a autorizar que se restrinja o direito de expressão, reunião e associação de tais cidadãos. Ao contrário, parece ter havido grande cuidado e preocupação com as condições sanitárias da organização do evento", escreveu o ministro.

A manifestação em Brasília acontece próximo ao julgamento, incluída na pauta desta semana do STF, que vai decidir sobre o futuro de centenas de demarcações de terras indígenas em andamento. O ato protesta contra a tese do marco temporal, segundo a qual as terras só podem ser demarcadas se for comprovado que os índios estavam na região na data da promulgação da Constituição, ou seja, no dia 5 de outubro de 1988.

O encontro de mais de 6 mil indígenas em Brasília, reunidos para protestar contra a aprovação do marco temporal, que vai à votação pelo Supremo Tribunal Federal, passou a contar com a presença do DJ e produtor musical Alok Petrillo.

Alok, que é reconhecido internacionalmente pelo mundo dos DJs, fez uma defesa da causa indígena e ligou as picapes na Praça dos 3 Poderes.

##RECOMENDA##

"Primeiro eu quero começar dizendo que é uma enorme satisfação em estar aqui com vocês. Eu estou junto de vocês. Ao longo da minha vida, eu nunca fui profundamente conectado com a cultura indígena, assim como muitos que conviveram comigo. Eu aprendi na minha vida, na escola, uma narrativa totalmente distorcida de um legado colonizador", declarou Alok, em um palco que foi montado em uma das tendas dos indígenas. "A gente aprende que o Brasil foi descoberto em 1.500, quando ele foi, na verdade, invadido. Os valores são totalmente distorcidos no olhar do colonizador. O que eu descobri foi que, por mais de cem anos, o que vocês fizeram foi socorrer os brancos que chegavam flagelados e doentes."

O DJ citou a passagem que fez em junho, pela aldeia dos Yawanawá, no Acre. No local, ele gravou um álbum inspirado nas origens sonoras dos povos originários. "Fui até a aldeia dos Yawanawá, no Acre. Eu tinha vários olhares de julgamentos e preconceitos. Enquanto eu estava fazendo música para me encaixar na indústria da música, vocês estavam fazendo musica para trazer a cura. Aquilo ressignificou tudo em minha carreira", disse Alok. "Eu passei a entender a minha relação com a natureza."

 [@#video#@]

Nas mãos dos ministros da Corte está a decisão sobre o futuro de 303 demarcações de terras indígenas em andamento no País, um direito fundamental dos povos originários, previsto na Constituição Federal.

O processo vai determinar se cabe ou não aplicar sobre as demarcações novas ou em andamento a regra do "marco temporal". Trata-se de uma linha de corte. Pelo entendimento do marco temporal, que é defendido por ruralistas, uma terra indígena só poderia ser demarcada se for comprovado que os indígenas estavam sobre a terra requerida na data da promulgação da Constituição, ou seja, no dia 5 de outubro de 1988. Quem estivesse fora da área nesta data ou chegasse depois deste dia, não teria direito a pedir sua demarcação.

Atualmente, o Brasil tem 421 terras indígenas devidamente homologadas, que somam 106,6 milhões de hectares e onde vivem cerca de 466 mil indígenas. Há, porém, outras 303 terras indígenas que ainda não conseguiram obter a homologação presidencial, ou seja, que estão em alguma fase do processo de demarcação, sem que este tenha sido concluído. Essas terras somam 11 milhões de hectares, onde vivem cerca de 197 mil indígenas.

Em sessão única nesta quarta-feira (23), iniciada às 9h, o Projeto de Lei Nº 490/2007 volta à ordem do dia na Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania (CCJC) da Câmara dos Deputados. O projeto, apresentado à época pelo deputado Homero Pereira (PR-MT), prevê a demarcação de terras indígenas através de leis, com base na documentação existente do dia da promulgação da Constituição Federal.

Durante a discussão, deputados governistas tentaram adiantar e concluir a votação da matéria, enquanto a oposição pediu arquivamento ou realização de audiência pública, para que seja feito um diálogo com as lideranças indígenas, principais interessados na não-aprovação. Apesar do assunto interessar aos povos originários, não houve, até o momento, qualquer debate conjunto com os povos interessados.

##RECOMENDA##

A deputada Bia Kicis (PSL-DF), presidente da Comissão, liderou a sessão que teve andamento lento e com conflitos entre a presidente e os demais parlamentares. Após tentativa de alguns deputados da oposição, como Fernanda Melchionna (PSOL-RS), Perpétua Almeida (PCdoB-AC) e a deputada indígena Joenia Wapichana (Rede-RR), Kicis passou a indeferir qualquer questão de ordem que voltasse a mencionar a audiência pública. O mesmo foi aplicado para qualquer outra questão “superada”, como também foi considerado o arquivamento da matéria. Foram cobrados requerimentos formalizados da oposição, caso o interesse seja qualquer ação que adie a votação.

“Toda medida legislativa que interessa aos povos indígenas deve ser precedida de consulta prévia, livre e informada. A questão de ordem é no sentido de suspender a tramitação desse projeto de lei, para que os povos indígenas sejam devidamente consultados. Essa é a ideia de uma audiência pública”, contestou Wapichana, durante seu tempo de questionamento da ordem.

No entanto, a deputada foi interrompida por Bia Kicis com mais da metade do tempo de fala restante. Kicis voltou a mencionar que a matéria estava superada, apesar do direito ao questionamento. Joenia Wapichana, que é representante indígena na Casa, foi apoiada por outros parlamentares, que discutiram com Kicis para a conclusão da fala. Wopichana recebeu de volta um minuto e 24 segundos de questionamento, mas voltou a ter pedido indeferido.

A pauta foi alterada por volta das 21h dessa terça-feira (22). Segundo o regimento da Casa, alterações nas pautas devem ser feitas com, no mínimo, 24h de antecedência, para que os parlamentares tenham ciência das mudanças para a ordem do dia seguinte. Após a matéria ser cancelada na terça, devido aos conflitos entre a polícia e indígenas que protestam em frente à Câmara há duas semanas, a votação foi anulada e foi então acordado que a mesma pauta voltaria à sessão seguinte. A deputada Erika Kokay (PT-DF) foi quem questionou a mudança, feita na “calada da noite”, segundo ela.

“O ato da mesa é claro, diz que nenhuma pauta pode ser alterada com menos de 24h. No dia de ontem, foi dito, quando se cancelou a reunião, que era a mesma pauta. A pauta contempla vários itens que precisam ser discutidos com a Comissão. Dormimos e tínhamos a consciência de que hoje estaríamos com a mesma pauta. Na calada da noite, por causa de covardes, que não querem trazer lideranças indígenas aqui para escutá-las e que querem rasgar o item 169, que assegura o direito de consultas (populares). Está se mexendo na Constituição e nos direitos das terras, possibilitando a entrada de exploradores econômicos em terras originárias. A pauta ambiental está sendo destruída pelo Ministério do Meio Ambiente”, argumentou a parlamentar.

O argumento foi apresentado durante tempo de contrarresposta à Bia Kicis, que três minutos antes, havia argumentado, em sua interpretação como chefe da Comissão, que o ato prevê alterações de inclusão de matérias na ordem do dia seguinte, e não retirada de itens. Nesse caso, a sessão única seria legítima, mas não houve consenso. O requerimento para adiantar a votação do PL foi de Carlos Jordy (PSL-RJ).

“Não temos que votar em requerimento aqui. Temos que seguir a ordem natural do dia. É passar a boiada, é impedir que possamos discutir a memória desta Comissão, e simplesmente tentar arrancar os territórios dos povos indígenas para colocá-los em uma bandeja e entregá-los ao latifúndio. Inclusive a exploração de mineração ferindo a Constituição de forma absolutamente nítida”, continuou Kokay.

O deputado Hiran Gonçalves (PP-RR), em fala única durante sessão, se opôs ao posicionamento da ala progressista e relatou que a ocupação indígena no seu estado, Roraima, é vista como uma ameaça. Ele também comentou o confronto do dia anterior, o chamando de “vandalismo”, mas a versão é diferente da apresentada por lideranças indígenas.

“A gente não pode falsear os fatos e as verdades. Ontem tivemos aqui gestos de vandalismo fora dessa casa e que não foram iniciados pela segurança da Casa e nem pela Polícia Militar, mas pelos indígenas lá fora. Membros da segurança foram feridos, mas a mídia distorce isso. A deputada (Perpétua Almeida) fala que estamos discutindo aqui o futuro dos indígenas que terão seus direitos contrariados. No nosso estado (Roraima) estamos sendo prejudicados por essa política indigenista e ambientalista, que cerceia o desenvolvimento e prejudica a vida e o bem estar de mais de 500 mil pessoas não indígenas no nosso estado. Aqui é o fórum adequado para discutir a demarcação. Temos que acabar com essa conversa de estudar regimento e temos que votar”, relatou o deputado.

O Projeto de Lei 490/2007

O texto busca consolidar em lei um ponto polêmico, que é a tese do marco temporal. A proposta garante como terras tradicionalmente ocupadas pelos indígenas brasileiros apenas aquelas que, na promulgação da Constituição de 1988, eram simultaneamente: por eles habitadas em caráter permanente; utilizadas para suas atividades produtivas; imprescindíveis à preservação dos recursos ambientais necessários a seu bem-estar; e necessárias à sua reprodução física e cultural, segundo seus usos, costumes e tradições.

A comprovação desses requisitos deverá ser devidamente fundamentada e baseada em critérios objetivos. A ausência da comunidade indígena na área pretendida em 5 de outubro de 1988 impede o direito à terra, salvo em caso de conflito possessório, fato que deverá ser devidamente comprovado.

Segundo o texto, a demarcação contará obrigatoriamente com a participação dos estados e municípios em que se localize a área pretendida e de todas as comunidades diretamente interessadas, sendo franqueada a manifestação de interessados e de entidades da sociedade civil, desde o início do processo administrativo demarcatório, a partir da reivindicação das comunidades indígenas.

É assegurado aos entes federados o direito de participação efetiva no processo administrativo de demarcação de terras tradicionalmente ocupadas pelos índios.

Áreas reservadas

O texto cria as “áreas indígenas reservadas”, destinadas pela União à posse e ocupação por comunidades indígenas, de forma a garantir sua subsistência digna e preservação de sua cultura, que poderão ser formadas por: terras devolutas da União discriminadas para essa finalidade; áreas públicas pertencentes à União; e áreas particulares desapropriadas por interesse social.

As reservas, parques ou colônias agrícolas indígenas constituídas nos moldes do Estatuto do Índio serão consideradas áreas indígenas reservadas.

As áreas indígenas reservadas são de propriedade da União, ficando a sua gestão a cargo da comunidade indígena, sob a supervisão da Fundação Nacional do Índio (Funai).

Caso, em razão da alteração dos traços culturais da comunidade ou por outros fatores ocasionados pelo decurso do tempo, seja verificado não ser a área indígena reservada essencial à garantia da subsistência digna e preservação da cultura da comunidade, a União poderá retomar a terra, dando outra destinação de interesse público ou social; ou destiná-la ao Programa Nacional de Reforma Agrária.

São áreas indígenas adquiridas as havidas pela comunidade mediante qualquer forma de aquisição permitida pela legislação civil, tais como a compra e venda ou a doação.

Mineração e garimpo

Com relação ao uso e à gestão das terras indígenas, a proposta estabelece que o usufruto da terra pelos povos originários não abrange:

- O aproveitamento de recursos hídricos e potenciais energéticos, que dependerá sempre de autorização do Congresso Nacional;

- A pesquisa e lavra das riquezas minerais, que também dependerão de autorização do Congresso, assegurando-lhes a participação nos resultados da lavra, na forma da lei;

- A garimpagem nem a faiscação, devendo se for o caso, ser obtida a permissão da lavra garimpeira; e

- As áreas cuja ocupação atenda a relevante interesse público da União.

Páginas

Leianas redes sociaisAcompanhe-nos!

Facebook

Carregando