Um tribunal de Moscou determinou na terça-feira (2) a prisão do opositor russo Alexei Navalny por quase três anos, um caso que provocou manifestações em massa a seu favor em toda Rússia e novas tensões entre o Kremlin e o Ocidente.
A juíza Natalia Repnikova disse que Navalny, o principal crítico do Kremlin, violou as condições de um controle judicial e terá que cumprir a pena suspensa de prisão de 2014.
Para isso, terá de cumprir a pena original de três anos e meio, descontados os meses que passou em prisão domiciliar naquele ano.
Sua advogada, Olga Mijaylova, indicou que seu cliente terá de cumprir "cerca de" dois anos e 8 meses de prisão. Ele vai apelar da decisão, acrescentou.
Pelo menos 1.377 pessoas foram presas durante a terça-feira em manifestações pró-Navalny em 10 cidades, especialmente em Moscou (1.116) e São Petersburgo (246), de acordo com a ONG OVD-Info.
À noite, a polícia se mobilizou rapidamente na proximidade do Kremlin e em outros locais da capital.
Correspondentes da AFP viram dezenas de manifestantes moscovitas agredidos a golpes de cassetete.
A mídia russa também publicou vídeos em que se vê a polícia perseguindo manifestantes no metrô ou tirando outros à força de dentro de um táxi. Também foi registrada violência contra jornalistas.
"Putin, ladrão!", repetiam centenas de manifestantes em Moscou. "Não há justiça neste país", disse à AFP Oksana, de 36 anos.
Trata-se da primeira sentença longa do ativista anticorrupção de 44 anos.
Após o anúncio da sentença, sua organização, o Fundo Anticorrupção, convocou uma manifestação diante do Kremlin.
União Europeia, Estados Unidos, Alemanha, Reino Unido, França, entre outros, pediram a libertação imediata do adversário político do presidente Vladimir Putin. O Conselho da Europa juntou-se a eles, chamando a condenação de "contrária às obrigações de direitos humanos da Rússia".
Moscou tachou estes apelos de "ingerência".
- "O envenenador de cuecas" -
Navalny ouviu a sentença de pé, com as mãos nos bolsos, no cubículo de vidro reservado aos detidos. Ele fez um gesto em forma de coração para sua esposa, Yulia. Durante a audiência, ele denunciou um caso destinado a amordaçar os oponentes de Putin.
"O mais importante neste julgamento é assustar um enorme número de pessoas. Prendem uma delas para assustar milhões", disse o opositor na audiência.
Ele também denunciou as milhares de detenções durante as concentrações da oposição mais importantes dos últimos anos.
"Não podem prender todo país!", acrescentou.
Em seguida, repetiu que Putin era quem tinha ordenado aos serviços de segurança matá-lo, envenenando-o em agosto na Sibéria com ajuda de um agente neurotóxico.
Putin "entrará para a História como o envenenador das cuecas", disse.
Em dezembro, Navalny afirmou em um vídeo que havia desmascarado um agente do FSB por telefone, que revelou que o veneno havia sido colocado em sua cueca.
O julgamento de terça-feira foi sobre uma demanda dos serviços penitenciários, segundo a qual Navalny não respeitou seu controle judicial no contexto de sua pena suspensa.
O ativista disse que não poderia ir aos controles devido à convalescença na Alemanha, mas o juiz avaliou que ele havia faltado a outras consultas antes de sua internação. Ele foi preso em 17 de janeiro, ao retornar à Rússia.
Sua tentativa de assassinato e sua detenção provocaram novas tensões entre Rússia e o Ocidente. O chefe da diplomacia europeia, Josep Borrell, planejava viajar para Moscou na sexta-feira e pediu para ver Navalny.
O governo russo afirmou nesta terça-feira acreditar que a União Europeia (UE) não vai cometer a "insensatez" de condicionar suas relações com Moscou ao destino de "um preso em um centro de detenção", segundo palavras do porta-voz do Kremlin, Dmitri Peskov.
O presidente francês, Emmanuel Macron, denunciou o encarceramento de Navalny e reforçou que "um desacordo político nunca é um crime".
A chanceler alemã, Angela Merkel, pediu o fim da repressão às manifestações, e primeiro-ministro britânico, Boris Johnson, denunciou um veredicto "covarde".
- Vários processos judiciais -
Navalny é alvo de vários processos judiciais.
Na sexta-feira ele comparecerá por "difamação" contra um ex-combatente. Ele também é acusado em investigação de fraude, crime passível de punição com até dez anos de detenção, por ter se desviado, segundo as autoridades, de doações direcionadas à sua organização.
Desde seu retorno a Moscou, a justiça russa multiplicou as ações contra Navalny e seus aliados políticos, dos quais quase todos estão em prisão domiciliar, presos ou processados por algumas semanas.
O adversário conseguiu mobilizar seus apoiadores por dois finais de semana consecutivos de manifestações em uma centena de localidades, não só em Moscou e São Petersburgo.
A resposta da polícia foi massiva: no domingo, houve mais de 5.400 prisões em todo o país, um recorde na história recente da Rússia, de acordo com a ONG OVD-Info.
Esses protestos também são alimentados pela disseminação de uma investigação da oposição acusando Putin de lucrar com um "palácio" nas margens do Mar Negro, um vídeo visto mais de 100 milhões de vezes no YouTube.