[@#galeria#@]
O último dia do mês de fevereiro foi escolhido para marcar o Dia Mundial das Doenças Raras, desde 2008, pela Organização Europeia de Doenças Raras (Eurordis). A data tem como maior objetivo dar visibilidade às doenças raras, além de chamar a atenção dos governantes, profissionais de saúde e da população sobre a existência dessas doenças. Também é a oportunidade para conscientizar as pessoas sobre a importância de políticas públicas, das dificuldades que os pacientes enfrentam no seu dia a dia e buscar incentivo para pesquisas e tratamentos.
##RECOMENDA##Neste ano, durante o Mês Mundial das Doenças Raras, uma campanha realizada pelo Unidos Pela Vida - Instituto Brasileiro de Atenção à Fibrose Cística, em parceria com o Instituto Vidas Raras, tem o tema "Ilumine com Solidariedade", com o objetivo de chamar a população a espalhar solidariedade, atenção e empatia às pessoas que vivem com uma doença rara no mundo, compartilhando informações para o conhecimento de todos. A campanha ganhou força nas redes sociais com as hastags #Iluminecomsolidariedade #DiaMundialdasDoençasRaras #RarediseaseDay2023.
Doença rara, segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), é aquela que afeta até 65 indivíduos em um grupo de 100 mil pessoas. O número exato de doenças raras existentes é incerto, mas estima-se que são de 6 a 8 mil tipos em todo o mundo, o que corresponde a cerca de 300 milhões de pessoas, em um universo de 7,88 bilhões de habitantes, uma média de 5% da população mundial. Mais de 70% das Doenças Raras se manifestam na infância e o diagnóstico precoce, logo no nascimento, pode ser realizado por meio da triagem neonatal, conhecida popularmente como o teste do pezinho, ou em exames do pré-natal.
O diagnóstico das doenças geralmente é complicado, demorado e muitos pacientes relatam passar por inúmeros profissionais de saúde, até conseguir ter um laudo conclusivo. Isso pode ocorrer pelo fato de os sintomas variarem de paciente para paciente, de doença para doença e se confundirem com outras doenças mais comuns, levando esses pacientes a um sofrimento na busca pelo diagnóstico, não só clínico, como psicossocial.
Esse é o caso da estudante de Odontologia Lia Leão Góes, de 21 anos, que possui o diagnóstico de uma doença rara, a Miastenia Gravis, e relata a dificuldade que foi chegar a ele. “O meu diagnóstico foi muito difícil, porque foram dois anos buscando vários profissionais, para ter um laudo e entender o que estava acontecendo, meus sintomas, até que encontrei um profissional que conseguiu me diagnosticar”, disse Lia. A estudante relata que chegou a passar por cerca de 10 profissionais em Belém e a realizar até mesmo uma viagem a São Paulo em busca do diagnóstico.
A Miastenia Gravis é uma doença autoimune que afeta as conexões entre os nervos e os músculos do corpo, levando o paciente a apresentar sintomas como fraqueza muscular e cansaços extremos. Pode afetar os músculos da face e respiratórios e a visão, causando queda de pálpebras e visão dupla, dificuldades para deglutição, fala, com comprometimento até mesmo dos movimentos de braços e pernas.
A doença se manifesta, na maioria das vezes, em mulheres entre as idades de 20 e 40 anos. No caso dos homens, menos frequentemente, entre 50 e 80 anos. Raramente é manifestada na infância. A Mistenia Gravios não tem cura, apenas tratamentos que melhoram o quadro do paciente para ter uma vida mais confortável.
O tratamento para a Miastenia Gravis é oferecido pelo Sistema Único de Saúde (SUS), conforme a Política Nacional de Atenção Integral às Pessoas com Doenças Raras, e também nos planos de saúde. Mas essa não é a realidade para todas as doenças raras: cerca de 95% delas não possuem tratamentos, apenas cuidados paliativos para os sintomas, é o que destaca o neurologista Antônio de Matos. “O paciente com doença rara em geral tem um cunho genético associado, não é comum nós mudarmos o gene do paciente, visando ao tratamento dele. Porém, com os avanços das pesquisas, nós já temos medicamentos hoje que conseguem realizar esse tratamento. Fazendo um acompanhamento multidisciplinar, o paciente com doença rara consegue melhorar o dia a dia, dessa família, fazendo com que ele receba uma inclusão social. O tratamento vai muito além de um remédio, o tratamento é abraçar o paciente na causa e nas demandas dele como indivíduo complexo”, observou o médico.
Atualmente tramita na Câmara dos Deputados um projeto de lei aprovado no Senado, e enviado para revisão na Câmara, o PL 4691/2019, da senadora Leila Barros (PDT-DF), que inclui uma ementa à Lei nº 6.259, de 10 de outubro de 1975, que “Dispõe sobre a organização das ações de Vigilância Epidemiológica, sobre o Programa Nacional de Imunizações, estabelece normas relativas à notificação compulsória de doenças, e dá outras providências”, para tornar obrigatória a notificação de doenças raras, visando assim ter um número correto de casos no Brasil e oferecer políticas públicas aos pacientes. O projeto está parado desde novembro de 2021.
Uma vida com ressignificação
Lia Leão relata que no início a falta de informações, o não entendimento dos sintomas e a falta de um diagnóstico chegaram a lhe provocar vergonha de se socializar com amigos e familiares. Para ela, o diagnóstico, além do tratamento adequado, permitiu o entendimento sobre sua condição e melhora no bem-estar psicológico. “Agora que eu tenho mais acesso à informação e sei muito mais sobre a minha doença, me sinto melhor pra falar com as pessoas, minha família, meus amigos, sair, socializar e perdi a vergonha sobre o assunto”, assinalou.
O médico Antônio de Matos explica também que pacientes com doenças raras costumam ter uma vida com dificuldades principalmente relacionadas ao desconhecimento da sociedade, ocasionando a não inclusão do paciente em tarefas do dia a dia. “Falar sobre as doenças raras faz com que esses pacientes sejam mais incluídos na sociedade, recebam adaptações no seu dia a dia para que eles possam ter o mais próximo do habitual de independência, qualidade de vida. O Dia das Doenças Raras vem nos trazendo mais informações sobre isso", destacou.
A vida de um paciente com doença rara requer cuidados de uma equipe multiprofissional que busca o bem-estar, qualidade de vida e equidade dos pacientes para um convívio em sociedade. A estudante de Odontologia, que há menos de um mês passou por internação devido a uma crise miastênica, quadro agudo da doença, em um hospital particular, pelo plano de saúde, relata que a maioria dos profissionais que a acompanham são particulares. “Faço pilates para melhorar a minha força muscular, faço acompanhamento também com fonoaudiólogo, uma vez por semana, que me ajuda nos sintomas da disfagia, e também terapia com psicólogo e neurologista. Quando fiquei internada, no hospital eles realizaram um tratamento com a imunoglobulina, que é um tratamento que regula os anticorpos da doença que atacam meu corpo, é um tratamento que tem tanto particular como no SUS, caríssimo, difícil de conseguir e que eu não teria condições de pagar, só é realizado em hospitais”, disse Lia.
A estudante conta que há dois anos passou por mudanças e adaptações em sua rotina diária. “Eu vejo o que consigo fazer, dentro dos meus limites em relação ao esforço físico. Quando tô com uma maior dificuldade de me alimentar, por exemplo, procuro alimentos mais pastosos, líquidos, mais fáceis de mastigar, deglutir, a proteína que seja mais fácil de ter, utilizo também suplementos alimentares”, afirmou.
Ela relata que, além da dificuldade para se alimentar, já apresentou momentos com visão dupla em períodos quando precisou estudar mais, como semanas de prova da universidade, e tem dificuldade na fala, nos membros superiores em atividades como levantar peso. Há dias, informa, em que até mesmo para tomar banho e escovar o cabelo ela sente dificuldade. Como também para realizar tarefas corriqueiras do dia a dia e até para sorrir.
A dentista Helen Damasceno, 40 anos, enfrenta situação complexa. Portadora de Lúpus e da Síndrome Rara de Anticorpo Fosfolípide, que causa distúrbios na coagulação, trombose e em casos mais extremos acidentes vasculares cerebrais, com diagnóstico há 20 anos, ela disse que saber o que estava tratando foi fundamental para buscar uma qualidade de vida e a diminuição das crises de dores na cabeça, anteriormente só tratadas como crises de enxaqueca.
Hoje, consciente do seu quadro, Helen conseguiu um carro adaptado às suas necessidades, uma vez que desenvolveu uma diminuição das forças nos membros superiores e inferiores, alterando também a sua forma de dirigir. "Hoje eu preciso dirigir um carro adaptado, eu sou considerada uma pessoa com deficiência (PCD)", disse.
A dentista deixa um recado para a sociedade nessa data: "Eu acho importante frisar um alerta para as pessoas estarem sempre atentas aos seus sintomas, procurarem médicos quando apresentarem sintomas de algum problema, porque nunca se sabe se pode chegar a um diagnóstico de doença rara. Algumas são mais complicadas, mas possíveis de serem controladas. Isso que é importante, a gente ter a consciência de realizar o tratamento adequado para ter qualidade de vida. Assim como a importância do diagnóstico precoce. Se você tiver o diagnóstico precoce de qualquer doença é mais fácil de realizar o controle e não sofrer as formas mais graves delas", orienta.
Diagnóstico e tratamento
Pacientes com doenças raras podem procurar atendimento, diagnóstico e acompanhamento nas Unidades Básicas de Saúde ( UBSs) ou em hospitais ou serviço de média e alta complexidades, como ambulatórios especializados e serviços de reabilitação. As Universidades federais e estaduais, com seus hospitais universitários, também oferecem serviços voltados para pacientes com erros inatos do metabolismo. Além disso, existem 21 estabelecimentos de saúde habilitados como Serviços Especializados e Centros de Referência no País.
Para maiores informações sobre a campanha nacional e global acesse https://vidasraras.org.br/sitewp/ , https://diamundialdoencasraras.unidospelavida.org.br/, http://www.rarediseaseday.org/ .
Por Monique Leão (sob a supervisão do editor prof. Antonio Carlos Pimentel).