Uma espera de mais de 80 anos e marcada por 32 tentativas fracassadas está perto chegar ao fim para a seleção da Finlândia. O país do mundo que há mais tempo tenta se classificar para um torneio internacional tem a grande chance de ser premiado pela persistência na próxima sexta-feira. Se vencer em Helsinque o frágil Liechtenstein, a nação conhecida pela tradição nos esportes de inverno e pelas bandas de heavy metal vai garantir presença na Eurocopa de 2020, que será disputada em 12 sedes diferentes.
Chamar a Finlândia de uma seleção tradicional e fracassada não é exagero. A Federação Finlandesa de Futebol foi fundada em 1908, seis anos antes da CBF, e tem como feito mais marcante a regularidade de se frustrar. Nenhum país busca há tanto tempo se classificar para uma Copa do Mundo. São 19 tentativas seguidas frustradas desde o Mundial de 1938. Em Eurocopas, a situação é parecida. São 13 quedas consecutivas em Eliminatórias. A primeira delas foi em 1968.
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"Jogar um torneio é um sonho para todos os finlandeses há muito tempo. Conseguir a classificação seria para nós como conquistar o mundo", resumiu ao Estado o volante e capitão finlandês Tim Sparv. No grupo J das Eliminatórias, a Itália já está com a vaga garantida, enquanto a Finlândia precisa só de uma vitória nas duas rodadas finais: ou diante de Liechtenstein ou fora de casa contra a Grécia. Armênia e Bósnia têm de vencer os dois jogos restantes e torcer por duas derrotas finlandesas para avançar. Pouco provável.
A Finlândia está prestes a fazer história graças à combinação de defesa forte, entrosamento e aos gols do artilheiro Teemu Pukki, destaque do Norwich, da Inglaterra, e autor de sete gols nas Eliminatórias. "Quando se trata de um país pequeno, é preciso marcar bem os adversários. E temos conseguido. Nosso elenco pensa coletivamente, toma decisões junto com o treinador e tem jogadores competitivos", disse Sparv.
O capitão concilia a carreira de jogador com estudos e a participação como colunista do jornal finlandês Pohjalainen. Sparv fala finlandês, inglês, alemão, sueco e holandês e gosta de ler sobre liderança e gestão de grupo. O volante fez categorias de base na Inglaterra e é um exemplo de como a atual geração se formou no futebol. A maioria deixou o país logo cedo e adquiriu experiência em outras ligas.
O treinador é Markku Kanerva, um ex-zagueiro e ex-professor de ensino básico. Como foi anteriormente técnico das seleções de base, conhece boa parte do elenco e conseguiu formar uma equipe entrosada. A fase positiva da Finlândia mexe com o país. A procura por ingressos aumentou. Um dos torcedores mais famosos é o primeiro-ministro finlandês, Antti Rinne, que tem presenteado outros chefes de Estado com a camisa da seleção, como foi o caso em encontro com o presidente da França, Emmanuel Mácron.
Os gols de Pukki fazem a Finlândia sonhar alto e brincar com trocadilhos. Pukki em finlandês quer dizer bode. O país até ganhou recentemente um fã clube do Norwich, criado na cidade de Tampere para acompanhar os jogos do Campeonato Inglês. Nesta temporada ele tem 11 partidas e seis gols marcados na competição.
FINLÂNDIA INTERNACIONAL - Quem atua no futebol finlandês aposta que a boa campanha nas Eliminatórias da Eurocopa e a grande chance de vaga será o primeiro de muitos sucessos da seleção do país. O atacante brasileiro Lucas Rangel jogou as duas últimas temporadas do campeonato local e acaba de ser campeão e destaque do KuPS, onde acompanha de perto a reação da torcida e a evolução da equipe.
"O futebol daqui deu uma crescida legal. Os jovens saem cedo para a Dinamarca, Noruega e Suíça, para depois voltar com experiência. Os treinadores locais fazem muitos cursos na Inglaterra e aplicam o aprendizado. Os times finlandeses melhoraram, têm movimentação e bom toque de bola", explicou. Rangel contou que vários clubes têm nas comissões técnicas profissionais portugueses e espanhóis, presenças que também agregam conhecimento.
Segundo o atacante, a Finlândia se inspira inclusive no estilo do futebol brasileiro para marcar de vez o nome da história. "Vários jogadores daqui vão de férias para o Brasil e acompanham demais o Brasileirão. Até chamam o Flamengo de 'Máquina Vermelha'", comentou. Se confirmar a vaga na Eurocopa, a Finlândia certamente não vai brigar pelo título ou aparecer em fase decisivas, mas certamente merecia um prêmio pela persistência.
DECEPÇÃO EM 1997 - O elenco mais badalado da seleção se formou nos anos 1990 e começo dos anos 2000, quando chegou a ficar perto de vaga das principais competições e tinha como craque o meia Jari Litmanen.
O principal nome da Finlândia teve uma carreira vencedora. Campeão da Liga dos Campeões pelo Ajax e com passagens ainda por Liverpool e Barcelona, o jogador estava em campo na partida mais triste da história. Em 1997, a Finlândia precisava vencer em casa a Hungria para garantir vaga na repescagem final para a Copa da França, no ano seguinte. O placar era de 1 a 0 a favor até os acréscimos, quando o time sofreu um gol contra.
Quem também fazia parte desse elenco era o zagueiro Sami Hyypiä, ídolo do Liverpool, onde ganhou a Liga dos Campeões, em 2005. Durante a mesma era fizeram parte da seleção nomes como os goleiros Niemi e Jääskeläinen e o atacante Forssell, todos com passagens pelo futebol inglês.
"Todo mundo esperava que a geração de ouro, a do Litmanen, conseguisse se classificar para um torneio. Nós não temos os mesmos grandes nomes e estrelas, mas temos conseguido jogar bem", disse o capitão da atual seleção, o volante Tim Sparv, ao Estado. "Até hoje na Finlândia as pessoas tratam o time do Litmanen como o melhor da história da Finlândia. Mas quem sabe agora isso possa ser superado pela seleção atual", afirma o atacante Lucas Rangel.
A boa chance de vaga para a próxima Eurocopa tem ainda como aliada a sorte. A Finlândia escapou de cair em um grupo forte nas Eliminatórias, sina que se repetiu por muitos anos. O único concorrente tradicional foi a Itália. De resto, Grécia, Armênia, Bósnia e Liechtenstein não foram páreos até agora na disputa da campanha.