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As chuvas recentes que caíram sobre o Recife serviram para revelar traços vilanescos de um símbolo aparentemente inofensivo da cidade: as árvores. A princípio incapazes de trazer malefícios aos seres humanos, elas têm causado transtornos com suas quedas. Enquanto as árvores vão se apresentando à sociedade como um mal, vai desaparecendo do problema justamente a raiz da questão: o descaso aliado ao crescimento urbano.
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Perder o equilíbrio é um dos motivos que pode fazer uma árvore tombar. As maiores delas situadas nos passeios públicos recifenses levam entre 30 a 50 anos para ficarem naquele estado. Na época de suas plantações, as calçadas eram maiores e as pistas menores. Hoje, é privilegiado o transporte individual é evidenciado nas curtas calçadas, capazes de desestabilizar o equilíbrio da raiz.
Para evitar as quedas responsáveis, muitas vezes, por fechar ruas e destruir patrimônios públicos e privados, o ideal seria a manutenção e prevenção. Os funcionários da Empresa de Manutenção e Limpeza Urbana (Emlurb) são responsáveis por verificar o estado das árvores das ruas. Técnicos da empresa têm como ferramenta o boroscópio, sonda capaz de encontrar as doenças contidas no interior das plantas, não visível por fora. Mas a grande barreira para um serviço de manutenção bem feito é a falta de informação. Não há dados sobre a quantidade de árvores presentes no Recife. Mensalmente são plantadas pela Emlurb entre mil e 1,5 mil mudas, mas não há indicadores sobre quais as árvores já plantadas nos bairros, suas idades, estado de saúde, etc.
De acordo com o chefe da Sementeira da Emlurb, Fernando Bivar, a poda mal feita também compromete a estabilidade da árvore, fazendo com que ela comece a pender para um lado, e aí basta uma chuva para deixá-la com a copa pesada. Bivar aprova o serviço feito pela Emlurb, mas se diz preocupado com as podas realizadas pela Companhia Energética de Pernambuco (Celpe). “Temos essa convivência conturbada com a Celpe. Ouvimos muito da companhia a frase ‘livrar a rede’, como se todo o foco fosse apenas os cabos”, critica.
A professora de desenvolvimento urbano da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), Fátima Furtado, sugere uma alternativa para mudar esta situação, usada em outros locais. “Preocupados com os fios, as pessoas fazem podas criminosas. Bastaria uma proteção entre a fiação que impedisse os galhos das árvores de mexê-la. E esta resolução é de baixo custo”, comenta a especialista.
Por meio de nota, a Companhia Energética de Pernambuco (Celpe) rebateu as críticas e afirma ter feito a substituição de cerca de 400 quilômetros de fiação convencional nua por rede protegida ou isolada, neste ano. "O controle da vegetação urbana que se aproxima da rede elétrica é executado por profissionais capacitados sob a supervisão de engenheiros florestais e agrônomos", garante.
Mas a atual situação arbórea da cidade também é fruto de atos cometidos pela própria população. A cada 100 árvores plantadas pela Emlurb, 40 são vandalizadas. Bivar já ouviu muitas histórias de pessoas que vão até a sementeira pedir que a muda plantada na frente de sua casa seja retirada, desde a comum reclamação “as folhas vão cair e sujar a calçada” a um caso de uma senhora que pedia a remoção da planta pois faria sombra e o vizinho estacionaria o carro na sua porta. “Uma atitude importante a ser tomada é justamente investir na juventude e na conscientização do valor da arborização urbana”, comenta Bivar. Ele também sente a ausência de campanhas que deem este enfoque.
O chefe da sementeira também destaca que a sociedade é importante no processo de manutenção. Através da Central de Atendimento da Emlurb, no telefone 156, as pessoas podem notificar sobre árvores que aparentam estar doentes ou próximas da queda. Entre os sinais de perigo que as pessoas devem estar atentas estão: ataques severos de cupins ou pragas, apodrecimento de galhos, inclinação exagerada do tronco e raízes emergentes do solo.
A árvore traz benefícios térmicos, acústicos, paisagísticos, de drenagem e de combate à poluição, além de ser habitat para muitas espécies. Quando situada em calçadas apertadas, além do risco de cair, ela também aflora a discussão da acessibilidade, pois não permite o trafegar de cadeirantes e carrinhos de bebê, por exemplo.
A professora Fátima Furtado também observa uma saída para isto. “Se os edifícios e lojas tivessem um estímulo do governo para deixar mais um metro de calçada já resolveria a derrubada de uma árvore de 50 anos”, comenta. Apesar da discussão, privilegiar o andar na mobilidade urbana e a educação na construção da ideia de coletividade soam como alternativas essenciais na relação árvore-cidade, sendo talvez capaz de cortar o mal pela raiz sem de fato cortá-la.