Tópicos | Vale

A mineradora Vale, responsável pela barragem Mina Córrego do Feijão em Brumadinho, a 57 quilômetros de Belo Horizonte (MG), tem até 4 de abril para apresentar em juízo um relatório parcial sobre os repasses de pagamentos para os atingidos pela tragédia, causada pelo rompimento em 25 de janeiro. Mas, antes, terá de apresentar informações detalhadas sobre pedidos de urgência e abastecimento da região.

A ordem foi definida durante audiência de conciliação na 6ª Vara da Fazenda Estadual de Belo Horizonte há cinco dias. No próximo dia 4 haverá outra audiência de conciliação, às 14h. As informações são do Ministério Público de Minas Gerais (MPMG).

##RECOMENDA##

No último dia 7, a audiência contou com a participação de representantes do MPMG, Ministério Público Federal, das defensorias públicas da União e do Estado, da Advocacia-Geral do Estado e do Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB), além dos representantes da mineradora.

Decisões

Na audiência ficou acordado que cada núcleo familiar do Córrego do Feijão e do Parque da Cachoeira receberá uma cesta básica por mês, durante 12 meses. A Vale e o estado de Minas Gerais fecharam um acordo para que a contratação de produtos ou serviços necessários, bem como as despesas emergenciais relacionadas ao rompimento, sejam feitas extrajudicialmente.

O valor de R$ 1 bilhão continua como garantia, dos quais  R$ 500 milhões foram depositados em juízo. Os outros R$ 500 milhões poderão ser substituídos por garantias com liquidez corrente, fiança bancária ou seguros.

Síntese

O promotor de Justiça do MPMG André Sperling fez uma síntese sobre os resultados da audiência, citando que a Vale concordou em receber e utilizar os documentos juntados pelas comunidades do Córrego do Feijão e do Parque da Cachoeira, entregues ao Ministério Público e à Defensoria Pública.

O material passará por análise para o início dos pagamentos. As partes informaram e-mail para recebimento da lista de eleitores da Comarca de Brumadinho, para cruzamento de dados e posterior pagamento às vítimas.

Datas

A Vale tem até o dia 19 para se manifestar sobre os pedidos de urgência, e a análise da necessidade dessas medidas será feita pelas partes na audiência do dia 21. Nessa etapa, a empresa deve apresentar um relato da documentação individual dos atingidos e demonstrar que não haverá falta de água.

No dia 21, a mineradora deve informar se o abastecimento de água pode ser suprido nas cidades que dependiam da captação do Rio Paraopeba. No mesmo dia, a empresa deve demonstrar a atuação nos acessos públicos atingidos pelo rompimento da barragem, incluindo a ponte da Fazenda José Linhares. 

Impactos

A tragédia ocorreu por volta do meio-dia de 25 de janeiro, quando muitos funcionários da Vale almoçavam. A barragem se rompeu e transformou a região da Mina Córrego do Feijão em um mar de lama. As buscas por desaparecidos continuam. Mais de 300 pessoas foram atingidas diretamente, e cerca de 190 corpos localizados.

Famílias residentes nas comunidades do Córrego do Feijão e do Parque da Cachoeira, em Brumadinho, atingidas pela lama que vazou de uma barragem de rejeitos da Vale em 25 de janeiro, receberão uma cesta básica mensal da mineradora pelo período de um ano. A medida, anunciada sexta-feira (8) pelo Ministério Público de Minas Gerais (MPMG), foi acordada em audiência judicial.

A garantia da cesta básica junta-se a outros compromissos pactuados em um termo de ajuste preliminar (TAP) firmado no dia 20 de fevereiro. O acordo prevê o pagamento de auxílio mensal emergencial aos atingidos conforme os seguintes critérios: um salário mínimo por adulto, meio salário mínimo por adolescente e um quarto de salário mínimo por criança. Têm direito a receber tais valores todos os residentes em Brumadinho e nas localidades que estiverem a menos de 1 quilômetro do leito do Rio Paraopeba até a cidade de Pompéu, onde fica a represa de Retiro de Baixo. As quantias serão pagas durante um ano.

##RECOMENDA##

Negociado em audiências públicas conduzidas pelo Tribunal de Justiça de Minas Gerais, o TAP foi proposto à Vale por instituições como o Ministério Público Federal, o Ministério Público de Minas Gerais (MPMG), Defensorias Públicas do estado e da União e Advocacia-Geral do estado e da União. O acordo também fixa a obrigação de a mineradora custear a contratação de assessoria técnica independente para fornecer suporte às pessoas atingidas pelo desastre ambiental.

As próprias vítimas escolherão as entidades que vão atendê-las. Assessorias técnicas independentes já prestam assistência aos atingidos pela tragédia de Mariana, em Minas Gerais, onde a obrigação de arcar com os custos da contratação é da Samarco, responsável pela barragem que se rompeu em novembro de 2015.

Outro compromisso assumido pela Vale diz respeito ao ressarcimento dos cofres do estado de Minas Gerais por todos os gastos emergenciais efetuados em decorrência do rompimento da barragem. A empresa concordou em depositar, em um prazo de 10 dias, o valor das multas aplicadas pela Secretaria de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável de Minas Gerais (Semad), que giram em torno de R$ 99 milhões.O Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) também aplicou multas, que somam cerca de R$ 250 milhões.

Justiça trabalhista

Conforme o último boletim da Defesa Civil de Minas Gerais, divulgado ontem (8), 197 pessoas já foram encontradas sem vida em decorrência do rompimento da barragem e 111 estão desaparecidas. Grande parte das vítimas eram empregados da Vale e de empresas terceirizadas que prestavam serviço para a mineradora.

Na Justiça trabalhista, em audiências realizadas dentro de ação movida pelo Ministério Público do Trabalho (MPT), a empresa também já assumiu alguns compromissos. Foi assegurada a manutenção do pagamento de dois terços dos salários de todos os empregados que morreram. Os valores serão repassados às famílias por um ano, ou até que seja fechado um acordo definitivo de indenização. Para os desaparecidos, por enquanto, está sendo pago o salário integral.

A Vale se comprometeu ainda a não realizar transferências para outras unidades em caso de discordância do trabalhador. Também garantiu o salário dos funcionários sobreviventes, inclusive dos terceirizados, até o fim deste ano. Outros compromissos assumidos pela mineradora com as vítimas estão relacionados com plano de saúde, atendimento psicológico e auxílios-funeral, creche e educação.

As divergência em torno do acordo definitivo de indenização persistem. A Vale mantém sua proposta, que inclui R$ 300 mil para cônjuges ou companheiros de trabalhadores mortos, R$ 300 mil para cada filho, R$ 150 mil para cada pai e mãe e R$ 75 mil para cada irmão. Além disso, para reparar os danos materiais, a empresa propõe manter o pagamento mensal correspondente a dois terços do salário do empregado até a data em que ele completaria 75 anos. A proposta da Vale foi recusada pelas famílias das vítimas que se reuniram em assembleia no mês passado.

Doações

Além dos pagamentos acordados na esfera judicial, a Vale anunciou, três dias após a tragédia, a doação de R$ 100 mil para cada família que perdeu um parente. Um balanço divulgado pela mineradora no dia 25 de fevereiro mostrava que, até então, 264 pagamentos tinham sido feitos. Outra doação, no valor de R$ 50 mil, está sendo assegurada para as famílias que residiam na área de alagamento. Esses repasses não poderão ser deduzidas das futuras indenizações, que ainda serão calculadas. 

A Vale prometeu também o pagamento de R$ 15 mil para pessoas que desenvolviam atividades produtivas ou comerciais na área atingida pela lama. As doações tiveram início de fevereiro, mas foram suspensas nove dias depois, a pedido da Defensoria Pública de Minas Gerais, que viu problemas na formulação dos termos de recebimento. Após ajustes por parte da mineradora, os repasses foram retomados no dia 20 de fevereiro.

Um mês e meio depois da tragédia do rompimento da barragem Mina Córrego do Feijão, em Brumadinho (MG), que causou mais de 300 vítimas entre mortos e desaparecidos, o Senado e a Câmara pretendem começar os trabalhos de apuração sobre o acidente. Os senadores devem instalar a Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) no dia 12.

Com 11 titulares e sete suplentes, a CPIe vai funcionar por 180 dias. Na mesma semana em que a comissão deve ser instalada, haverá no plenário do Senado uma sessão temática para discutir a tragédia. O requerimento já aprovado prevê a participação de autoridades, especialistas, ambientalistas, além de representante da mineradora Vale.

##RECOMENDA##

Negociações

O presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), vai aguardar até a véspera para a indicação de nomes que vão compor a comissão. “Eu vou aguardar até dia 11 para que os partidos façam suas indicações. A CPI do Senado está pronta. Já se passou um mês, e a gente vai ficar num impasse? Nós vamos cumprir nosso papel, o Senado vai instalar sua CPI a partir do dia 12”, afirmou.

O senador Carlos Viana (PSD-MG), que se lançou relator da comissão, diz que o objetivo é investigar como era a relação da Vale com as autoridades e as responsabilidades dos governos estadual e federal.

“Se não cuidarmos agora, vai acontecer em outras cidades e na próxima vez podem ser milhares”, alertou Viana.“Nós não queremos o fim da mineração, mas não podemos deixar que o setor se autorregule e que, depois de uma tragédia, venha pedir desculpas.”

Câmara

Na Câmara, na expectativa da criação de uma Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (formada por deputados e senadores), a comissão exclusiva de deputados, requerida pela deputada Joice Hasselmann (PSL-SP), está menos avançada do que no Senado. É necessário ler o requerimento em plenário pelo presidente da Casa, Rodrigo Maia (DEM-RJ), e os líderes indicarem seus membros.

Assim como no Senado, os deputados avaliam propor mudanças na política de segurança de barragens para aprimorar as regras gerais obrigatórias para construção e desativação de barragens de rejeitos de mineração.

Os recibos de ações (ADR) da Vale negociados em Nova York reduziram gradualmente a tendência negativa observada desde o início da manhã dessa segunda-feira (4) e passaram a operar em alta no fim da tarde. Após perder mais de 5% na abertura do pregão, o ADR fechou em alta de 0,24%, a US$ 12,42.

Logo na abertura dos negócios em Wall Street, o ADR registrou fortes perdas com a notícia publicada durante o fim de semana de que o presidente da mineradora, Fabio Schvartsman pediu afastamento temporário do cargo e foi substituído interinamente por Eduardo de Salles Bartolomeo. Outros três diretores da Vale também fizeram o mesmo pedido. O mercado de ações doméstico só deve repercutir a saída de Schvartsman no pregão de amanhã. Ontem e hoje a Bolsa de Valores de São Paulo segue fechada por conta do feriado de carnaval.

##RECOMENDA##

Uma das notícias positivas para o papel veio do banco JPMorgan, que revisou o cenário para o mercado de minério de ferro. A instituição financeira prevê que, após a tragédia de Brumadinho, a produção da Vale deve cair de 400 milhões de toneladas para montante entre 347 milhões e 360 milhões de toneladas em 2019/2020.

Com essa menor produção da Vale e expectativa de demanda melhor na China, a previsão para o preço da tonelada do minério no mesmo período subiu de US$ 65 a US$ 70 para intervalo entre US$ 70 e US$ 77. Ou seja, a produção da Vale poderá cair até 13,2%, mas o preço do minério aumentará até 18% em relação ao cenário inicialmente previsto pelo JPMorgan.

Substituto

Em comunicado, a mineradora informou que a escolha de Bartolomeo para o cargo seguiu o processo sucessório de acordo com o plano de interinidade previamente discutido pelo Conselho de Administração.

Bartolomeo possui experiência de 10 anos na Vale, já tendo exercido a posição de diretor executivo de Logística, Operações Integradas de Bulk Commodities (minério de ferro, carvão e manganês) e, mais recentemente, como diretor de Metais Básicos. Foi também membro do Conselho de Administração, do Comitê Financeiro e do Comitê de Governança, Conformidade e Risco da Vale entre 2016 e 2017, acrescentou a companhia. O executivo passou pela AmBev, entre 1994 e 2003.

O afastamento da direção da Vale se deu após pressão da força-tarefa ( Ministério Público Federal, Ministério Público Estadual de MG e Polícia Federal) que investiga o rompimento da barragem da Vale em Brumadinho, que deixou 186 mortos e 122 pessoas desaparecidas. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

Rio, 02/03/2019 - A assessoria de comunicação da Vale divulgou agora a carta em que o executivo Fábio Scharvtsman pede demissão da mineradora. No texto, entregue hoje ao conselho de administração da empresa, Scharvtsman declara que deixa a presidência em benefício da continuidade dos negócios da empresa. Mas sinaliza que o afastamento pode ser "temporário".

"É muito difícil para mim (...) retirar-me da linha de frente, ainda que temporariamente, quando o desafio mais agudo se apresenta. Mas essa frustração (...) é irrelevante quando comparada à dor que se espalha entre milhares de pessoas neste momento e deve ceder diante do valor maior de preservação dos interesses da nação que a Vale representa", declara.

##RECOMENDA##

O executivo abre a carta referindo-se a Recomendação nº 11/2019, enviada ao conselho de administração da Vale e assinada por Ministério Público Federal, Ministério Público do Estado de Minas Gerais, Polícia Federal e Polícia Civil do Estado de Minas Gerais, que integram a força-tarefa que investiga a tragédia de Brumadinho. No documento, entregue ontem, eles pedem o afastamento de Scharvtsman e dos diretores executivos de ferrosos e carvão, Peter Poppinga, de planejamento, Lúcio Flávio Gallon Cavalli, e de operações do corredor sudeste, Silmar Magalhães Silva.

A Vale ainda não confirmou se os outros diretores também estão deixando a empresa. De acordo com a assessoria de comunicação da empresa, uma nota com a confirmação dos afastamentos temporários de executivos deve ser divulgada ainda na noite de hoje.

Leia abaixo a íntegra da carta de Scharvtsman

Rio de Janeiro, 2 de março de 2019.

Ao Conselho de Administração da Vale S.A.

Senhores Conselheiros,

Tenho em mãos a Recomendação nº 11/2019, dirigida a esse Conselho pelo Ministério Público Federal em conjunto com o Ministério Público do Estado de Minas Gerais e em atuação coordenada com a Polícia Federal e a Polícia Civil do Estado de Minas Gerais, da qual consta recomendação do imediato afastamento de certos diretores e empregados da Vale, incluindo o meu próprio.

Como é do pleno conhecimento desse Conselho, desde os dramáticos eventos de 25 de janeiro, venho dedicando todos os minutos de meus dias e noites, no limite máximo de minhas forças, às frentes de reação da companhia àqueles eventos, determinadas por esse Conselho e por mim mesmo, em conjunto com os demais membros da Diretoria, com absoluta priorização do atendimento às vítimas e às suas famílias, à apuração direta e à cooperação com a apuração dos fatos e à preservação das atividades da Vale, cruciais para o Estado de Minas Gerais e para o Brasil.

Como esse Conselho de Administração também não desconhece, foram desde logo adotadas pela Diretoria, sob meu comando, todas as medidas necessárias à preservação da integridade da informação disponível, para que a apuração independente dos fatos, pelas autoridades e pelo Comitê imediatamente criado por esse Conselho por proposta da Diretoria, possa ser realizada com a maior brevidade e profundidade.

Desde o momento em que ocorreu a tragédia que se abateu sobre as vítimas, suas famílias e sobre esta companhia estratégica para os interesses do país, fiz questão de atender pessoalmente a todas as demandas, da imprensa e das autoridades, sem intermediação de quem quer que fosse, de maneira a transmitir diretamente às vítimas, a suas famílias, à opinião pública, aos acionistas e a todos interlocutores da Vale, o nosso compromisso com a atuação mais adequada e de alto nível possível da companhia, no momento mais grave de sua história.

Estou absolutamente convicto de que minha atuação pessoal e a dos demais membros de nossa Diretoria, cujo afastamento é agora solicitado, foi absolutamente adequada, correta e, principalmente, fiel aos nossos valores inegociáveis de proteção à segurança das operações da companhia, e às diretrizes nesse sentido emanadas desse Conselho. Assim como estou absolutamente convicto de que a continuidade de nossa atuação continuaria a ser a maneira mais eficaz de a Vale obter e promover os melhores resultados em sua reação à tragédia. Entretanto, há momentos em nossas vidas em que é preciso sacrificar as convicções pessoais em benefício de um bem maior. E este é um desses momentos, pois minha presença no comando da Vale passou a ser percebida como inconveniente por autoridades que seguirão interagindo diuturnamente com a companhia.

É muito difícil para mim, após décadas de atuação como executivo de algumas das maiores empresas do Brasil, e tendo colhido o reconhecimento de minha dedicação e apoio aos milhares de colegas, colaboradores, acionistas e demais constituintes com quem ombreei ao longo de todos aqueles anos na tarefa de gerar empregos, riqueza, tributos e governança de primeiro nível, retirar-me da linha de frente, ainda que temporariamente, quando o desafio mais agudo se apresenta. Mas essa frustração daquilo que percebo como meu dever de dedicação integral às vítimas, a suas famílias, a todos os colaboradores da Vale e ao país, é irrelevante quando comparada à dor que se espalha entre milhares de pessoas neste momento e deve ceder diante do valor maior de preservação dos interesses da nação que a Vale representa.

Por tudo isso, ainda que com a absoluta convicção da retidão de minha conduta e do dever cumprido até aqui, e certo de que a percepção dos fatos que levou à recomendação de afastamento não corresponde absolutamente à sua realidade, tomei a decisão, nesta hora, em benefício da continuidade das operações da companhia e do apoio às vítimas e a suas famílias, de solicitar a esse Conselho, respeitosamente, que aceite o pedido de meu afastamento temporário das funções de diretor presidente da Vale.

Atenciosamente,

Fabio Schvartsman

O presidente da Vale, Fábio Scharvtsman, e outros três diretores devem deixar a empresa oficialmente nas próximas horas. A mudança, dada como inevitável desde o rompimento da barragem de Brumadinho, que deixou mais de 300 mortos, ganhou ritmo ontem, quando integrantes da força-tarefa que investiga a tragédia pediram o afastamento de Scharvtsman e dos diretores executivos de ferrosos e carvão, Peter Poppinga, de planejamento, Lúcio Flávio Gallon Cavalli, e de operações do corredor sudeste, Silmar Magalhães Silva.

A Vale não confirmou a informação, publicada inicialmente pela coluna Radar, da Veja, mas o Broadcast apurou que um grupo importante entre os acionistas controladores já dava como certa a saída de Scharvtsman desde o acidente. O executivo, que foi recrutado no mercado, mas teve seu nome associado ao deputado Aécio Neves no episódio da delação premiada dos empresários Joesley Batista, estava sendo sustentado pela Previ (fundo de pensão do Banco do Brasil), maior acionista da Vale.

##RECOMENDA##

A pressão dos integrantes da força-tarefa foi motivada pela ação de executivos da empresa com empregados, o que estaria, segundo eles, atrapalhando as investigações. Além disso, a divulgação pela empresa do acordo para pagamento do auxílio emergencial para os atingidos como uma iniciativa da empresa causou forte desconforto. De acordo com o promotor de Justiça do Ministério Público de Minas Gerais (MPMG), André Sperling, a empresa pretendia pagar o auxílio apenas aos moradores das duas localidades mais atingidas - Parque da Cachoeira e de Córrego do Feijão -, mas foi obrigada a estender a indenização para todos os moradores de Brumadinho.

"Não foi bem uma questão de aceitação da Vale. A Vale viu-se compelida a fazer isso. Ela queria (pagar para os moradores) Parque da Cachoeira e Córrego do Feijão", disse o procurador.

Com a saída do grupo, a Vale deve ser conduzida, interinamente, pelos diretores remanescentes, sob o comando interino do diretor-executivo de Metais Básicos, Eduardo Bartolomeo. Fontes ouvidas pelo Broadcast dizem que não há nenhuma movimentação no mercado, nesse momento, em busca de um substituto.

A mudança definitiva só deve ocorrer em abril, após a Assembleia Geral Ordinária (AGO) de acionistas, quando também são esperadas mudanças no conselho de administração, com a redução do peso da Previ, que hoje ocupa quatro assentos no conselho e o aumento da presença de conselheiros mais ligados ao setor de mineração.

Até agora, a Vale não se pronunciou oficialmente. Por conta do Carnaval, os mercado brasileiros estarão fechados até quarta-feira de manhã, mas o mercado americano, onde são negociadas mais de 70% das ações da Vale na forma de ADRs (American Depositary Receipts) reabre na segunda-feira, o que obriga a empresa a se posicionar amanhã.

Na última semana, com a perda do grau de investimento pela agência Moody's, a situação da mineradora também começou a causar apreensão entre investidores brasileiros. Desde o acidente, analistas de casas estrangeiras observavam o descolamento das expectativas de investidores dos investidores domésticos, que pareciam mais otimistas. Um segundo rebaixamento, que pode vir da S&P, pode obrigar muitos fundos estrangeiros a se desfazerem de suas posições em ações da empresa, pressionando negativamente o papel, que já perdeu cerca 25% de seu valor desde 25 de janeiro, quando aconteceu a tragédia.

*Enviada especial do LeiaJá a Brumadinho (MG)

Na série de reportagens "Brumadinho - O que restou depois da lama", o LeiaJá viajou pela cidade de Brumadinho ouvindo relatos de pessoas afetadas pelo rompimento da barragem.

##RECOMENDA##

Conceição nunca imaginou viver esse momento, o qual ela considera "um filme de terror sem fim". Foto: Eduarda Esteves/LeiaJáImagens

“Isolados aqui para morrer no esquecimento”, resume Conceição Assis, 69, moradora do vilarejo Córrego do Feijão, localizado na área rural de Brumadinho, em Minas Gerais. A tragédia provocada pelo rompimento da barragem da mineradora Vale, no último dia 25 de janeiro, ainda assombra os pensamentos da aposentada, que nasceu, foi criada no bairro e não pretende se mudar. Ela teme, no entanto, que o ‘Feijão’ nunca mais será o mesmo e deve ir se esvaziando ao longo dos próximos meses.

“A gente tem o nosso quintal e plantamos as nossas coisinhas, era um lugar de sossego. Passei por todas as minhas dificuldades aqui e as superei, tenho uma relação muito forte com o córrego. Agora aqui acabou, não tem mais a nossa calmaria. Sei que meus filhos não vão me deixar ficar aqui sozinha, estou na esperança disso ter logo um fim para eu decidir meu rumo”, relatou Conceição, que segue angustiada desde o dia do rompimento da barragem.

Há anos que os 400 moradores do Córrego do Feijão não viam um enterro de alguém que vivia na pequena comunidade rural. Conceição, que já perdeu as contas de quantos amigos teve de enterrar após a tragédia, ainda espera pelo corpo da nora Angelita Cristiane Freitas De Assis, enfermeira que prestava serviços para a Vale. “Meu filho nem conseguiu falar com ela pelo telefone porque a lama veio de uma vez. Ela estava no refeitório e não teve tempo de nada, não acharam até hoje o corpo dela. Isso para mim está sendo um desastre”, desabafou a moradora do Feijão, que conta com a ajuda dos bombeiros para não perder as esperanças de localizar o corpo de Angelita.

Angelita Cristiane Freitas De Assis ainda não foi localizada. Foto: Eduarda Esteves/LeiaJáImagens

As lembranças do mar de lama, que invadiu sem pedir licença ou bater na porta dos moradores desse bairro, não devem se apagar nunca mais. Recomeçar é o que mais querem, porém os caminhos ainda estão escuros e interrompidos pela avalanche marrom que ceifou vidas e a moradia de muitas pessoas.

Conceição não esqueceu nenhum segundo do fatídico dia. Lembra como se fosse ontem que estava se organizando para ir à fisioterapia, quando percebeu que a energia da casa acabou. Não estava chovendo e apesar disso, ela se recorda de ter ouvido uma explosão. "Achei que tinha sido um transformador", falou. Poucos minutos depois, deixou a escova de cabelo de lado quando ouviu a vizinha da frente gritar por socorro. "Ela dizia 'socorro, me ajuda. A barragem da Vale rompeu'. Eu pedi para ela ter calma porque não estava acreditando. Eu tenho pressão alta, fiquei passando mal. Me dei conta de que era verdade quando muita gente se juntou e começou o inferno. Todo mundo correndo para os locais mais altos", disse.

Ela e seus vizinhos precisaram migrar de um canto para o outro até que ela decidiu voltar para sua casa, que fica localizada na região mais alta do bairro. “Estamos vivendo um filme de terror. A gente não se concentra porque fica esse assunto e não sabemos se vamos sobreviver ficando aqui. Eu não esperava viver uma passagem dessa na minha vida, ainda mais morando por aqui”.

O lamaçal, com até 30 metros de profundidade, borrou de marrom, para sempre, a história do vilarejo. Foto: Eduarda Esteves/LeiaJáImagens

Em abril de 2018, a Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) divulgou o estudo “Pesquisa sobre a Saúde Mental das Famílias Atingidas pelo Rompimento da Barragem do Fundão em Mariana”. O levantamento avaliou 271 pessoas, das quais quase um terço foi diagnosticado com depressão. A taxa é próxima à encontrada imediatamente após o acidente nuclear de Fukushima, no Japão, em 2011.

As consequências psicológicas para a população de Brumadinho também devem ser sérias, já o Corpo de Bombeiros contabiliza mais de 180 mortos identificados e 130 pessoas desaparecidas. O cemitério do vilarejo ficou pequeno. Os coveiros precisaram abrir covas às pressas porque todos os dias estavam sendo localizados corpos. Atualmente, após mais de um mês do ocorrido, o trabalho do Corpo de Bombeiros continua, mas encontrar os corpos ficou mais difícil diante da lama endurecida.

Dona Cota, o filho Rangel Henrique e o seu esposo Noé Henrique. Foto: Eduarda Esteves/LeiaJáImagens

As circunstâncias de tristeza e desespero que a onda marrom causou fez com que Maria das Dores, 52, se sentisse abençoada por localizarem o corpo de seu filho Rodrigo Henrique de Oliveira, 30, operador de máquinas na Vale. Após 16 dias do rompimento, Dona Cota, como é conhecida no bairro, recebeu a notícia num misto de alívio e agonia. Ela se sentiu feliz porque diante da situação em que muitas pessoas continuam embaixo da lama, realizar o velório formal de seu filho foi uma vitória.

“Eu pedia que Deus cuidasse dele seja lá onde estivesse. Na lama, no hospital ou no IML. Eu pedia demais para que quando o encontrassem, ele estivesse inteiro e não aos pedaços. Eu tenho quatro filhos e o Rodrigo era um filho da promessa. Fui abençoada, me entregaram o corpo dele inteiro, não do jeito que a gente queria porque com 16 dias a gente não ia encontrar o corpo normal. A decomposição estava avançada, mas ele estava completo”, explicou a mãe.

Dentre tantas consequências, a avalanche de lama ainda deixou cerca de 80 pessoas desabrigadas. O Rio Paraopeba foi contaminado e produtores rurais da região perderam tudo. "Eu não sei o que vai ser do Córrego do Feijão, na hora que todos forem embora, que acabarem as buscas. Eu acredito que será um vazio muito grande", afirmou Dona Cota. Ela é mais uma moradora que não pretende sair da sua casa pelas relações que construiu ao longo da vida no Feijão.

[@#video#@]

Rangel Henrique de Oliveira, 24, descreve o dia antes do rompimento da barragem. “O meu irmão era o melhor profissional que já conheci. Todas empresas o queriam pelo seu potencial. No dia 24, ele veio na casa dos meus pais, sempre fomos muitos unidos como família. Ele jantou, conversamos e foi embora. Nunca mais o vi”.

Após descobrir que o mar de lama tinha cedido, Rangel correu junto com outros moradores para a região da mineradora no intuito de encontrar sobreviventes. A lama é formada pelos restos deixados pela atividade de extração e beneficiamento do minério de ferro, principal metal explorado na mina Córrego do Feijão. “As famílias iam chegando desesperadas na frente da lama e parecia que não existia mais nada, destruiu tudo. Parecia outro local. Na hora eu me dei conta, cadê o meu irmão? Desabei em seguida”, relembra.

Meses antes, em 2018, Rangel, que é um dos membros da associação dos moradores do bairro, acompanhou visitas estratégicas dentro da comunidade para a apresentação de uma projeto emergencial, caso tocasse a sirene. “Eles vieram aqui, a Defesa Civil, e informaram que em caso de vazamento, deveríamos ir para um local seguro. A gente suspeitava de um certo risco, mas eu penso que eles sabendo disso, deixar essas construções embaixo da área da barragem seria muita insensatez. E foi o que aconteceu. Não deu tempo de correr. Nós que estamos a três quilômetros dela sentimos um grande impacto, imagina  quem estava a poucos metros. Hoje a lágrima pode até ter secado, mas não é algo que se esquece”, frisa.

O neto de Vicentina é Wesley Eduardo de Assis, 37 anos. Ele trabalhava como operador de máquinas e estava na barragem no momento do rompimento. Foto: Eduarda Esteves/LeiaJáImagens

O povoado começou a ser habitado na década de 1940 e Vicentina Gomes, 83, assistiu a tranquilidade de seu bairro perder espaço para o motor das aeronaves. Ela mora com o seu marido, também idoso, o aposentado José Maria das Candeias, 72. Ele em dificuldades de se locomover e conta com a ajuda da esposa para viver. “Imagina eu ter que correr caso essa sirena toque um outro dia, eu não vou conseguir com ele”, lamenta.

Vicentina sente saudades do neto Wesley Eduardo, 37, que também faleceu após o rompimento da barragem. Em tom saudoso, ela chora ao lembrar do cuidado que o falecido tinha com ela. “Ele vinha sempre me ver, cuidava de mim. Eu o criei, sabe? Fui como uma mãe e de repente, a pessoa partir assim por falta de organização da Vale, é uma sensação horrível, minha filha”.

Ela teme ficar sozinha no bairro com medo de adoecer e não ter a quem pedir socorro. “Peço a Vale que resolva essa situação, se ela quiser comprar a minha casa, eu me mudo para Brumadinho para ficar perto de outros filhos. Meu marido não anda e os nossos vizinhos estão partindo. Com quem vamos ficar?”, questiona.

[@#podcast#@]

Neiva Ferreira, 60, sentada na escadaria que dá acesso à Estação do Conhecimento de Brumadinho, que se tornou provisoriamente um centro de acolhimento para as demandas dos moradores da região que foram afetados com o rompimento da barragem, observa a movimentação. Ela tinha ido à localidade para resolver demandas burocráticas e pedir ajuda após perder a filha Jussara Ferreira dos Passos, 35, camareira da Pousada Nova Estância, coberta pela lama.

Ela admite estar parada no tempo desde o último dia 25 de janeiro. "Não apagou nada. Eu tinha um filho trabalhando na barragem e uma filha na pousada. Só um escapou", relembra. Ela destaca ainda que apesar da Vale divulgar que está apoiando os moradores, muitos estão passando necessidades. Neiva precisava da água proveniente do Rio Paraopeba para sobreviver, cuidar das plantas, alimentar seus bichos. "Quero que eles coloquem uma caixa d'água potável na minha casa porque estou numa situação desumana".

O corpo de Jussara foi localizado poucos dias depois do ocorrido. "Já enterrei a minha filha e sei que ela não vai voltar. Agora quero os meus direitos, não é questão de ganância, mas é pensar com a razão. Espero que aqui não fique no esquecimento como foi em Mariana. As pessoas seguem desorientadas, esperando marmita. Quase todo dia tem um enterro. A gente ficava cinco, seis anos sem ir a um velório e agora só esperamos o corpo chegar".

Neiva aguarda por respostas da Vale. Foto: Eduarda Esteves/LeiaJáImagens

Ao lado de Neiva, está o seu genro. Ele já conseguiu se despedir oficialmente de sua esposa Jussara, mas ainda não enterrou a mãe Giomar Custódio, que também trabalhava na pousada. "O ser humano hoje em dia prefere filmar a desgraça dos outros do que ajudar o próximo. Já pensou se as pessoas que estavam com o celular na mão tivessem gritado para todo mundo correr. A história poderia ser um pouco diferente", criticou o morador do Córrego do Feijão.

Gelson entrou dentro dos matos, correu, burlou os guardas e não conseguiu localizar a mãe e a esposa. A pousada já estava coberta de lama. Ele lamenta ter perdido as duas mulheres de sua vida e ainda não sabe por onde recomeçar.

[@#galeria#@]

Confira mais reportagens clicando nas fotografias abaixo:

 

Subiu para 186 o número de mortos pelo rompimento da barragem da mina Córrego do Feijão, da mineradora Vale, em Brumadinho, na região metropolitana de Belo Horizonte. Há ainda 122 desaparecidos, segundo informação divulgada na tarde desta quinta-feira (28) pela Coordenadoria Estadual de Defesa Civil.

De acordo com o Corpo de Bombeiros de Minas Gerais, as buscas pelas vítimas da tragédia seguiram, nessa quinta-feira, com 15 frentes de trabalho.

##RECOMENDA##

Segundo a corporação, por causa do tempo instável e desfavorável para uso de drones, a operação segue intensa com 62 maquinários pesados nas escavações. Ao todo, trabalham no local 124 bombeiros.

O Corpo de Bombeiros informou que a operação em Brumadinho não será prejudicada em função do reforço para as operações de Carnaval, que começam a partir desta sexta-feira (1°) em todo o Estado de Minas Gerais.

A barragem 1 da mina Córrego do Feijão em Brumadinho se rompeu no dia 25 de janeiro. Os rejeitos atingiram a área administrativa, uma pousada e comunidades que moravam perto da mina.

As causas da tragédia ainda não foram esclarecidas. A principal linha de investigação sobre as causas do colapso é o acúmulo anormal de água e a falha no sistema de drenagem da barragem.

O ministro Nefi Cordeiro, do Superior Tribunal de Justiça (STJ), concedeu um habeas corpus para soltura de oito funcionários da Vale presos no último dia 15, por ordem da Justiça de Minas Gerais, a pedido do Ministério Público estadual.

Os presos são quatro gerentes e quatro técnicos diretamente envolvidos na segurança e estabilidade da barragem da Mina do Córrego do Feijão, em Brumadinho, que se rompeu em 25 de janeiro.

##RECOMENDA##

Todos são suspeitos de responsabilidade criminal, incluindo homicídio qualificado, pelo rompimento da barragem.

Na decisão, o ministro Nefi Cordeiro reconheceu haver fortes indícios de que os funcionários da Vale sabiam dos riscos de rompimento e mesmo assim não tomaram as providências cabíveis, mas que a prisão preventiva deles não se justifica, pois colaboram com as investigações.

“Ao contrário, os servidores agora presos encontravam-se em liberdade desde a tragédia ocorrida, vários vieram a depor e revelaram até fatos que agora justamente valora o magistrado como indicadores inicial da culpa”, argumentou Cordeiro.

“Em síntese, prende-se para genericamente investigar, ou colher depoimentos. Nada se aponta, porém, que realizassem os nominados empregados da Vale S.A. para prejudicar a investigação”, acrescentou o ministro.

Esta é a segunda vez que o STJ manda soltar funcionários da Vale indicados como responsáveis pelo rompimento da barragem em Brumadinho. Em fevereiro, a Sexta Turma do STJ ordenou a soltura de cinco pessoas.

Segundo balanço mais recente divulgado pelo Corpo de Bombeiros de Minas Gerais, o número de mortos na tragédia já chega a 179, enquanto 129 pessoas continuam desaparecidas. Além disso, as águas do Rio Paraopeba continuam turvas em razão da contaminação pelos rejeitos da mineradora.

Os depoimentos dados por funcionários presos da Vale indicam que diretores da mineradora sabiam de problemas envolvendo a barragem de Brumadinho (MG), que se rompeu há um mês. Na segunda-feira, 25, quatro executivos já haviam solicitado habeas corpus preventivo ao Superior Tribunal de Justiça (STJ). Até esta terça-feira, 26, a tragédia havia deixado oficialmente 179 mortos e 129 desaparecidos.

O Jornal Nacional, da Rede Globo, relatou na noite desta segunda ter conseguido acesso aos depoimentos dados pelos oito funcionários da Vale detidos há 12 dias em Contagem. São quatro gerentes e quatro integrantes de áreas técnicas diretamente relacionados ao controle da barragem de Brumadinho.

##RECOMENDA##

No depoimento, Felipe Figueiredo Rocha afirmou que os riscos de operação na chamada Barragem 1 foram discutidos em um painel interno com especialistas, do qual participaram os diretores Silmar Silva e Lúcio Cavalli. Essa declaração foi corroborada pelo gerente executivo Alexandre Campanha, que disse ainda acreditar que os relatórios finais - nos quais se apresentavam detalhamentos dos problemas - eram encaminhados para Lúcio Cavalli e demais diretores operacionais.

A mesma citação foi feita por Marilene Christina, outra detida. Ela foi além, dizendo que reportou ao diretor Silva - sobre a barragem B1 - a instalação de um DHP (drenos horizontais profundos, utilizados normalmente para a retirada de água da instalação). Na sequência, declarou ter alertado Cavalli de problemas em DHPs.

Uma das principais hipóteses investigadas pela força-tarefa formada para Brumadinho é que o excesso de água na barragem levou ao rompimento. Segundo o Jornal Nacional, um vídeo, incluído na investigação e gravado próximo da barragem depois da tragédia, mostra que havia uma tubulação de captação de água rompida, lançando água em direção à estrutura que desmoronou. As autoridades também localizaram nascentes acima da barragem e isso pode ter contribuído para a tragédia - esses eventos teriam sido acusados por piezômetros (medidores de volume de água).

STJ

Silva e Cavalli entraram com o pedido de habeas corpus preventivo, ao lado dos também diretores da Vale Peter Poppinga - cuja prisão já havia sido solicitada e negada - e Luciano Siani Pires. Seus advogados alegaram que eles "se encontram todos ameaçados de sofrer patente constrangimento ilegal ao seu direito de locomoção, em razão de ordem de prisão que está na iminência de emanar de autoridade incompetente no curso das investigações sobre o rompimento da barragem I da mina do Córrego do Feijão".

Procurada pela Globo, a Vale declarou que a diretoria está "colaborando com as autoridades para esclarecer as causas do rompimento", ressaltando que a presunção de culpa não pode decorrer apenas do posto que um executivo ocupa na empresa, e, por isso, pediu os habeas corpus para os diretores. Diz ainda que os depoimentos dos funcionários não indicam que a Vale soubesse previamente de um cenário de risco iminente de ruptura da barragem. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

Na série de reportagens "Brumadinho - O que restou depois da lama", o LeiaJá viajou pela cidade de Brumadinho ouvindo relatos de pessoas afetadas pelo rompimento da barragem.

##RECOMENDA##

Letreiro fica na entrada da cidade. Foto: Eduarda Esteves/LeiaJáImagens

Há um mês, a pacata cidade de Brumadinho se tornava palco da maior tragédia humana da história da mineração no Brasil. Era o horário do almoço para alguns moradores e para outros o momento do descanso, que só seria cessado com os gritos por todos os lados. "A barragem da Vale estourou", diziam aos prantos sem entender o que estaria acontecendo a poucos quilômetros do centro da cidade, na área urbana. O rompimento da Barragem I da Mina do Córrego do Feijão, da Vale, no último dia 25 de janeiro durou alguns minutos e foi suficiente para devastar um município, que aos poucos busca se reinventar.

Depois do choque dos primeiros dias após o que muitos identificam como o maior "crime" da Vale na região, a lama e as perdas deixaram a população desnorteada, sem saber para onde ir. A rotina se transformou e aos 40 mil habitantes, agora se somam, centenas de bombeiros, policiais militares e muitos voluntários vindo de todas as regiões do Brasil. Pela estimativa do Corpo de Bombeiros de Minas Gerais, os trabalhos deverão se estender por três a quatro meses após o rompimento.

Os dados oficiais do poder público contabilizam 179 mortos já identificados e 131 pessoas desaparecidas após a tragédia. Desses, 102 corpos identificados são de funcionários da Vale, enquanto outros 77 pertencem à comunidade e empresas terceirizadas. Quanto aos desaparecidos, 29 são da Vale e outros 102 do outro grupo. O balanço foi divulgado na noite deste domingo (24) pelo tenente Pedro Aihara, porta-voz do Corpo de Bombeiros Militar de Minas Gerais (CBMMG).

Pela estimativa do Corpo de Bombeiros de Minas Gerais, os trabalhos deverão se estender por três a quatro meses após o rompimento. Foto: Eduarda Esteves/LeiaJáImagens

Já são 31 dias depois da tragédia e a força tarefa que investiga o caso ainda não chegou a uma conclusão sobre o que gerou o rompimento da barragem, apesar de já se ter o conhecimento de que alguns funcionários da Vale sabiam dos problemas. Em entrevista à imprensa, o promotor de Justiça de Brumadinho, William Garcia Pinto afirmou que a barragem rompeu com toda a sua fúria num evento que representantes da Vale insistem em afirmar que foi acidente. "Mas o Ministério Público e as polícias de Minas Gerais têm hoje a convicção de que ocorreu a prática de um crime doloso e um crime de homicídio, por meio do qual diversos atores assumiram o risco de produzir centenas de mortes".

Luto, lama e a tentativa de seguir um futuro diferente distante das atividades mineradoras. É sobre o que muitos brumadinhenses têm debatido nas últimas semanas. No último dia 12 de fevereiro, a Câmara Municipal da cidade sediou a primeira reunião oficial dos moradores para debater o futuro da cidade, levando em consideração as inúmeras consequências do tsunami de lama que manchou a história de Minas Gerais.

Falta de informações, tristeza, baixa nas vendas, incerteza sobre o futuro e soluções pensadas pelos próprios moradores colocam em dúvida se a atividade mineradora ainda será bem vinda na região. O encontro foi organizado pelo Movimento Somos Todos Atingidos de Brumadinho, Movimento dos Atingidos por Barragens-MAB e a Frente Brasil Popular de Brumadinho e contou com a presença de dezenas de participantes.

Passado um mês da tragédia, o que pensam os moradores da cidade sobre o futuro?

Moradores de Brumadinho participam de reunião para pensar sobre o futuro da cidade. Foto: Eduarda Esteves/LeiaJáImagens

Para a moradora Junia Viana, 53, a dor é grande e vai demorar a passar, mas é preciso que a gestão municipal se preocupe com o psicológico das pessoas que seguirão habitando na região. Ela destaca ainda que cidades atingidas por catástrofes têm alto índice de alcoolismo, por exemplo. "Vamos ter que pensar em dar mais qualidade de vida para a nossa população. Brumadinho necessita de praças, parques e espaços de lazer. Podemos fazer a história diferente e isso seria bom tanto para os turistas, quanto para nós, não custa caro", afirmou.

João Sérgio, 26, também acompanhou o debate e decidiu expor a opinião contra o funcionamento de mineradoras em sua cidade. "Aqui nós crescemos ouvindo que no dia que a Vale fechasse, seria um desastre em Brumadinho. Sabemos que a conta não fecha sem os impostos pagos pela mineração. Mas até quando vamos viver disso?", questionou. Ele alertou que nesse primeiro momento, as câmeras do Brasil todo estão voltadas para a cidade e, por isso, devem cobrar do poder público políticas públicas para minimizar a dependência do extrativismo.

Para o morador, o turismo é apenas um dos caminhos, já que o Instituto Inhotim, referência internacional no mundo das artes, fica localizado na cidade. "Sabemos que o turismo gerado por Inhotim é bom, mas não dá conta da cidade toda. Precisamos de mais empresas investindo aqui, temos cachoeiras e trilhas e porque não utilizamos o turismo ecológico. Não somos organizados e muitas vezes o turista nem sabe dessas outras coisas. É o momento de se reinventar porque mesmo que a barragem não tivesse estourado, em um momento esse minério vai acabar e aí o que vai acontecer?", perguntou.

De acordo com dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), a principal atividade de Brumadinho é a mineração seguida pela agricultura de pequeno porte. Dos 20,5 mil hectares de lavoura, 17 mil são de produtores individuais, que utilizam da agricultura de subsistência e comercial para alimentar a família. Avimar Barcelos (PV), prefeito da cidade, disse que sem a mineração, a cidade não conseguiria pagar pelos serviços essenciais. Ele estima que 35% da arrecadação da cidade venha dessa atividade.

Raphaela Pereira, integrante do MAB, questionou a interpretação da Vale de quem são os atingidos. Foto: Eduarda Esteves/LeiaJáImagens

Diante dos números, Raphaela Pereira, integrante do MAB, questionou a forma como a Vale e a Prefeitura da cidade estão interpretando quem são os atingidos. Já que além das mortes, a lama também ceifou o espaço de produção de muitos agricultores, o que também afeta o comércio local. Durante a reunião, representantes da CDL local apontaram uma queda de até 70% nas vendas.

"O que é ser atingido? Como é que eles estão avaliando isso? Não existe essa afirmação de diretamente e indiretamente atingido. Todos nós tivemos um pedaço de nós levados pela lama. Isso abala a vida de todos. Precisamos parar de depender da Vale para tudo. É o momento de pensarmos no fomento de outras formas de renda e união vai ser mais que necessária", apontou a militante.

O Ministério da Saúde anunciou no último dia 18 a liberação de mais R$ 4 milhões para a cidade de Brumadinho e a região. De acordo com o ministro Henrique Mandetta, que assinou os documentos para os repasses na Cidade Administrativa, a pasta vai acompanhar por pelo menos cinco anos as consequências do desastre, com atenção especial para a saúde mental dos moradores.

[@#video#@]

Além do dano social e psicológico, o mar de rejeitos de minério também contaminou o Rio Paraopeba, ao longo de 300 quilômetros do curso d'água. Segundo a Fundação SOS Mata Atlântica, peixes morreram e mais de 270 hectares de vegetação nativa foram devastados. A entidade estima que o ecossistema na região levará pelo menos 300 anos para se recuperar totalmente.

O vereador do município Professor Caio fez um alerta sobre o futuro do Rio Paraopeba. Ele diz que se chover, a cidade vai alagar e será mais um transtorno para se preocupar, já que o rio está com um contingente de tóxicos alto. Se chover, a lama de rejeitos vai afetar todo o centro da cidade e poluir tudo.

"A Vale precisa acelerar isso. Temos dragas em Brumadinho e eles podem alugar esses equipamentos com facilidade. Essa limpeza deve ser feita em caráter emergencial, é uma empresa irresponsável. Essa tragédia não pode ficar impune, perdemos muito mais do que o aspecto financeiro. Eu pescava nesse rio, muitas pessoas precisavam dele para se alimentar e agora a gente nem sabe se ele está vivo. O aspecto ecológico acabou. Eles dizem que estão dando o máximo, mas a gente sabe que é mentira, mataram o nosso rio", contou.

Antônio Paulorinho afirmou que a Vale acabou com a nascente dos rios na região. Foto: Eduarda Esteves/LeiaJáImagens

O aposentado Antônio Paulorinho, 69, morador do Córrego Feijão também criticou a forma como a Vale subtrai os recursos da natureza e não devolve. Na ocasião, ele lamentou que não pode mais produzir seus alimentos porque as nascentes dos rios estão secando. "Trabalhei, economizei, lutei e deixei de comer bem para comprar uma terra para mim. Agora não posso mais produzir porque as minhas águas todas secaram. Estou morrendo aos poucos", contou o morador que também perdeu familiares no rompimento da barragem.

Ele criticou a falta de preocupação da empresa com o futuro dos recursos hídricos já que as hortas e as criações dependem da água. "Eles roubam as nossas águas com esses poços artesianos e não devolvem tudo de boa qualidade, extraem até a última gota. Eu não sou minerador, vou produzir o que? Se minha horta está morrendo e minha casa não chega mais água?".

O governo de Minas Gerais reiterou a proibição do uso da água do Rio Paraopeba, que abastece a região. Não foi informado por quanto tempo valerá a determinação. Em nota, divulgada pelas secretarias de Saúde, Meio Ambiente e Agricultura, o alerta é para evitar o uso em quaisquer circunstâncias. “A orientação de não se utilizar a água bruta do rio, sem tratamento, é válida para qualquer finalidade: humana, animal e atividades agrícolas”.

Para Jarbas da Silva, da Coordenação Nacional do Movimento pela Soberania Popular na Mineração, o rompimento da barragem da Vale, no dia 25 de janeiro, alertou mais uma vez a sociedade brasileira sobre a necessidade de ter mais informações acerca das Barragens de Rejeitos de Mineração que se encontram ao redor de suas casas e cidades. "Somente neste século, ocorreram oito rompimentos de barragens de rejeitos minerais no estado de Minas Gerais, isso demonstra que existe algum grande problema com o processo de extração mineral.

Governo de Minas Gerais recomenda que população não use mais a água do Rio Paraopeba. Foto: Eduarda Esteves/LeiaJáImagens

O ativista ressaltou ainda questionamentos de como está estruturado o setor mineral brasileiro e quais são os motivos dessas tragédias. "Não podemos negar que os rompimentos ocorridos nos últimos anos, que causaram cerca de 400 mortes de trabalhadores, contaminações de pessoas, mortes de rios e destruição da fauna e flora, nos revelou que existem graves limites nos processos de fiscalização e manutenção das barragens de rejeitos no país. Ainda assim, ocultam o verdadeiro problema que necessita ser enfrentado com muita seriedade e responsabilidade: o modelo mineral que mata, mutila, enlouquece, sonega, evade divisas, recebe incentivos de diferentes caráteres, compra parlamentares e possui uma autarquia do Estado para garantir os seus interesses", revelou Jarbas.

Após o desastre, o poder público entrou em alerta. Por conta disso, mais de 1000 pessoas já foram retiradas de casas que ficam abaixo de barragens de risco, em quatro cidades próximas a Belo Horizonte. Assim como em Brumadinho, essas famílias que residem nas cidades de Barão de Cocais, Nova Lima (em dois pontos) e Ouro Preto e Itatiaiuçu, onde há um complexo da ArcelorMittal.

No último dia 18, foi publicada resolução no Diário Oficial da União por recomendação da Agência Nacional de Mineração (ANM). O Ministério de Minas e Energia definiu uma série de medidas de precaução de acidentes nas cerca de mil barragens existentes no país, começando neste ano e prosseguindo até 2021. A medida prevê a extinção ou descaracterização das barragens chamadas "a montante", exatamente como a que se rompeu em Brumadinho, até 15 de agosto de 2021.

Confira mais reportagens clicando nas fotografias abaixo:

Passado um mês da tragédia causada pelo rompimento da Barragem 1 da Vale em Brumadinho (MG), os trabalhos de buscas tentam localizar 134 desaparecidos. O número de mortos chega a 176.

De acordo com informações, a barragem, localizada a 57 quilômetros de Belo Horizonte, rompeu-se por volta das 12h20, de sexta-feira, 25 de janeiro. Sobreviventes relatam que um mar de lama tomou conta de estradas, do rio, do povoado e, sobretudo, da área da Vale, empresa responsável pela barragem. Como era hora do almoço, muitos funcionários ficaram retidos no restaurante.

##RECOMENDA##

O misto de perplexidade, tristeza e indignação se instalou no país. As dificuldades causadas pela lama e riscos de contaminação aliados à chuva intensa aumentaram ainda mais a tensão nas buscas por vítimas. Famílias inteiras desapareceram. Nem todos foram localizados.

Ontem (24), ocorreram manifestações em Brumadinho e em Belo Horizonte para homenagear os mortos.

Incertezas

Pela estimativa do Corpo de Bombeiros de Minas Gerais, os trabalhos deverão se estender por três a quatro meses após o rompimento.

Os rejeitos atingiram o Rio Paraopeba, e o governo de Minas proibiu o consumo da água, devido ao risco de contaminação. Não há estimativa de suspensão da medida.

Governo

O presidente Jair Bolsonaro determinou uma ação rápida após a tragédia. Ele sobrevoou a área que se transformou em um mar de lama e orientou uma força-tarefa a atuar na busca por soluções. Pelo Twitter, ele lamentou o rompimento da barragem.

“Nossa maior preocupação neste momento é atender eventuais vítimas desta grave tragédia”, disse Bolsonaro na época.

No último dia 18, foi publicada resolução no Diário Oficial da União por recomendação da Agência Nacional de Mineração (ANM). O Ministério de Minas e Energia definiu uma série de medidas de precaução de acidentes nas cerca de mil barragens existentes no país, começando neste ano e prosseguindo até 2021. A medida prevê a extinção ou descaracterização das barragens chamadas "a montante", exatamente como a que se rompeu em Brumadinho, até 15 de agosto de 2021.

Outro lado

Há três dias, a Vale informou ao Ministério Público do Trabalho (MPT) que vai manter o pagamento de dois terços dos salários de todos os empregados próprios e terceirizados que morreram na tragédia. Segundo a empresa, o pagamento será mantido por um ano ou até que seja fechado um acordo definitivo de indenização.

A empresa também se comprometeu a só transferir empregados após prévia consulta e concordância do trabalhador, além de consulta ao sindicato. Para a transferência, será priorizado o local de origem do empregado.

Anteriormente, a Vale se comprometeu a garantir emprego ou salário para os empregados de Brumadinho, inclusive os terceirizados, até 31/12/2019. Também prometeu pagar as despesas com funeral e verbas rescisórias das vítimas fatais, conforme certidão emitida pelo INSS.

A Vale informou que dará atendimento psicológico e fará pagamentos de auxílio-creche e de auxílio-educação, além de danos morais para cônjuges ou companheiras, filhos, pais e irmãos das vítimas.

Corpo de Bombeiros de Minas Gerais localizou 176 corpos de vítimas do rompimento da narragem da Mina Córrego do Feijão, em Brumadinho, região metropolitana de Minas Gerais. Todos os corpos foram indentificados pelo Instituto Médico Legal (IML).

Segundo informações do governo de Minas Gerais, 134 pessoas estão desaparecidas, sendo 31 funcionários da mineradora Vale, além de 103 trabalhadores terceirizados e moradores da região.

##RECOMENDA##

Desde ontem (20), uma equipe do Corpo de Bombeiros está fazendo buscas na área onde funcionava o almoxarifado da Vale. No local foi encontrado um corpo, removido para o IML para identificação.

O almoxarifado foi identificado pelo cruzamento de dados, de localizações georreferenciadas e de indicações do terreno. As buscas na área do almoxarifado se desenvolveram durante esta quinta-feira e continuarão amanhã (22), segundo o Corpo de Bombeiros.

O Corpo de Bombeiros trabalha em sete frentes de buscas na área da barragem que se rompeu no último dia 25 de janeiro. Nesta fase de escavações, o trabalho é mais difícil porque a lama está muito profunda. A corporação mineira atua com apoio de militares de outros estados.

*Enviada especial do LeiaJá a Brumadinho (MG) 

Na série de reportagens "Brumadinho - O que restou depois da lama", o LeiaJá viajou pela cidade de Brumadinho ouvindo relatos de pessoas afetadas pelo rompimento da barragem.

##RECOMENDA##

Paulo observa o que restou de parte do Parque da Cachoeira. Foto: Eduarda Esteves/LeiaJáImagens

Era por volta das 12h30 quando a barragem da Vale, na Mina Córrego do Feijão, em Brumadinho, município na zona metropolitana de Belo Horizonte, começava a ceder e se rompia. A nove quilômetros desta região, o comerciante Paulo Alves, 48, estava de serviço em seu segundo emprego, trabalhando com dragas, nas imediações do Rio Paraopeba. O morador do vilarejo Parque da Cachoeira, localizado na área rural da cidade, escapou da avalanche de lama ao receber o telefonema da esposa às 12h35. Embora tenha retrucado com ar de deboche e descrença na afirmação de sua companheira, Paulo juntou seus pertences e foi ao encontro da família na parte mais alta de seu bairro.

“Eu duvidei dela porque sabia que a gente tinha a sirene e em caso da barragem romper, ela ia nos alarmar. Eles, da Vale, nos avisaram assim”, detalha Paulo. Os moradores da região não ouviram nada, nenhum alarme. Quando a onda de lama começou a descer da barragem 1 do Córrego do Feijão levou menos de trinta minutos para chegar no último ponto onde, de acordo com o Corpo de Bombeiros de Minas Gerais, poderia ter feito vítimas, justamente no Parque da Cachoeira (o bairro fica a cerca de seis quilômetros do centro de Brumadinho).

De acordo com o plano de emergência da mineradora Vale, a previsão seria de 24 minutos até o bairro, nas proximidades do Rio Paraopeba, numa velocidade de 80 quilômetros por hora no início do percurso. A trajetória da lama e dos rejeitos seguiram pela área de operações da mineradora, onde estavam instalados escritórios e o refeitório da empresa, ambos devastados. Mais a frente, a charmosa pousada Nova Estância foi soterrada junto com quem estava por lá e mais abaixo também atingiu o bairro do Parque da Cachoeira, antes de adentrar no rio.

Foto: Eduarda Esteves/LeiaJáImagens

Paulo relembra que chegou a observar a lama de aproximando do riacho e das ruas que cortam o seu bairro, mas não dava tempo de avisar a outros moradores da região mais baixa da Rua São Mateus, onde reside. Na visão de Paulo, a tragédia só não foi maior no vilarejo porque era o horário de almoço de uma sexta-feira e muitas pessoas tinham chácaras e sítios de veraneio, frequentavam mais nos finais de semana para fugir do caos dos centros urbanos. “Muita gente procurava o nosso bairro para descansar porque aqui era uma paz, mas também tinham moradores mais humildes na beira do riacho e foi por ali que perdemos cinco pessoas amigas”, lamenta o comerciante.

Como o mar de lama destruiu tudo que estava pela frente, como a vegetação, as casas e outros obstáculos, ao chegar no Parque da Cachoeira já corria mais lentamente, de acordo com o tenente Pedro Aihara, porta-voz do Corpo de Bombeiros. Apesar do menor impacto, foram dezenas de residências destruídas, mortes de moradores e pessoas que estavam no local e a destruição de um bairro que outrora tinha o som dos passarinhos e o som do correr das águas como porta de entrada.

O mineiro se mudou para a comunidade há cerca de vinte anos e observou a atmosfera do local virar de cabeça para baixo em alguns minutos. A calmaria e a vida pacata foi substituída pelo barulho do motor dos helicópteros que não param de sobrevoar a região transportando os oficiais do Corpo de Bombeiros. O cheiro da vegetação, das plantações de hortaliças e da terra quando chove também foram embora com a lama que invadiu o local.

Foto: Eduarda Esteves/LeiaJáImagens

A avalanche marrom engoliu tudo que encontrou em seu percurso e em algumas localidades a sua profundidade é de mais de 15 metros. Na região mais baixa do Parque da Cachoeira, o cenário é desolador. Veículos, concreto, casas completas, roupas e uma série de objetos agora se misturam ao barro que endurece aos poucos e entristece o olhar de Paulo, ao mostrar e relembrar como era o caminho de um riacho e o formato em que as casas eram uma após a outra. “Restou nada, só essa lama fedorenta e doenças para a gente. Estamos com o psicológico abalado, sem ter apoio e orientação do que devemos fazer, é o pior momento que já passei”, complementa.

Ele conta que para a mineradora Vale, sua família não é considerada como “atingida”, justamente porque a casa não foi destruída e eles não perderam nenhum parente. Mas Paulo, em tom de indignação, busca soluções para tocar a vida já que apesar de estar vivo, seu sustento se foi. O Rio Paraopeba foi atingido pela lama e a mercearia que construiu no terraço de sua casa não dá mais lucro. “As pessoas não vão comprar agora porque ninguém tá em condições de nada, preciso pagar as contas e para isso é preciso vender. Estou a 200 metros da lama e é claro que fui atingido. A minha casa está toda rachada depois desse tormento, quero que a Vale me explique o que aconteceu porque até agora estou em choque”, denunciou.

No decorrer dos dias após a tragédia, medidas de emergência foram anunciadas pela mineradora para conter os danos. Uma dela é a de que moradores, mesmo os que não estavam no local no momento em que o rejeito atingiu o terreno, receberão a doação de R$ 50 mil. Já quem exercia alguma atividade produtiva ou comercial na área vai receber R$ 15 mil. Esses não são os valores da indenização. A medida será aplicada para residências dentro da zona de Autossalvamento prevista no Plano de Ação Emergencial pré-existente. Essa área corresponde a uma extensão de 10 quilômetros partindo da barragem.

[@#galeria#@]

Paulo destaca ainda que procurou a empresa para negociar na base de apoio que foi montada em um campo de futebol, na entrada do bairro, mas ouviu dos responsáveis locais que sua casa estava fora dessa zona e por isso ele não tinha direito a nada. “Hoje a gente perdeu toda a liberdade do nosso bairro, os nossos peixes, meus clientes, amigos”, conta. Apesar da situação, ele ainda acredita que os órgãos competentes vão tomar as medidas cabíveis para tentar sanar a situação de tragédia que Brumadinho se encontra. “Eu sei que a Vale não vai fazer nada. Ela não pensa nas pessoas e nunca pensou. Mas as autoridades, como o Ministério Público e até com o presidente da república eu conto, nós lutamos para colocar ele lá e espero que resolva isso para nós”, frisou.

Em reuniões na associação do bairro, moradores se organizam para reivindicar tudo que lhes foi imposto e tirado. O mau cheiro, o aumento da quantidade de mosquitos na região, a impossibilidade de produzir nas terras, todas devastadas pela lama e o o medo por se contaminar com a água do Rio Paraopeba. Embora muitas casas ainda estejam de pé por não terem sido alcançadas pelos rejeitos de minério, permanecer no local é traumático e carece de infraestrutura ao redor. 

“Parado no tempo”, é assim que Paulo define seu estado atual. Se antes, numa semana boa de seu comércio, ele lucrava cerca de R$ 3 mil, hoje o faturamento diário não chega a R$ 30. Ele observa que amigos e vizinhos que não tiveram suas casas destruídas não querem mais morar na região, justamente por não acreditar na recuperação da atmosfera do Parque da Cachoeira. A sua esposa até tentou convencê-lo a se mudar durante uns meses para algum interior de Minas Gerais, mas ele é prefere ficar na localidade por causa de seu comércio e para lutar pelos direitos infringidos pela mineradora.

[@#video#@]

“É de partir o coração encontrar os segmentos dos corpos”

Enquanto caminha pela lama densa que pairou no Parque da Cachoeira em busca dos corpos dos que ainda estão desaparecidos, o subtenente do Corpo de Bombeiros de Minas Gerais, Selmo de Andrade, conversa com a equipe para realizar marcações no terreno. Constantemente helicópteros sobrevoam o local para ajudar no translado dos bombeiros, que estão sendo subdivididos em áreas de atuação. No intervalo de seu trabalho, o subtenente conversou com a reportagem e falou sobre o trabalho minucioso dos oficiais para localizar os desaparecidos.

Há mais de vinte anos na corporação, ele também atuou no rompimento da barragem em Mariana, no ano de 2015, mas reitera que não há como se acostumar com esse tipo de resgate. “A gente treina para cumprir a missão e estamos preparados. Mas dói no fundo coração da gente porque somos pais e somos filhos, também temos a nossa família nos esperando em casa”, explica.

Na região do Parque das Cachoeira, no fim da rua da casa de Paulo, o subtenente confirma a informação de que estão sendo encontrados apenas “segmentos” do corpo humano devido ao tempo e a violência com que a lama desceu. “Não temos previsão para encerrar as buscas, vamos conseguir resgatar todas essas pessoas para confortar os seus parentes, temos recursos e estratégias. Vamos até o fim”, pontua.

"De forma alguma a operação de busca aos desaparecidos terá fim agora. Vamos resgatar todos os corpos e dar esse conforto aos familiares", diz subtenente. Foto: Eduarda Esteves/LeiaJáImagens

“Antes eu ajudava a população carente do bairro, hoje venho pedir cestas básicas”

Sentada em uma das mesas montadas na base de apoio da Vale no Parque das Cachoeira, a empresária Maria Fabiane, 35, aceita receber gotas da medicação floral em sua bebida de uma psicóloga voluntária que veio a Brumadinho após a tragédia. Após pingar três gotas em sua garrafa de água, a moradora do Parque da Cachoeira comenta que está tentando tocar a vida, mas os calmantes estão ajudando e teme pelo futuro da saúde psicológica não só dela, como de todos que foram afetados após o rompimento da barragem da Vale.

Ele acaba de sair do contêiner intitulado “equipe Vale”, improvisado para que os moradores possam se reunir com os representantes da empresa e realizarem as necessárias conversas e demandas. Fabiane trabalha no ramo dos cosméticos  e se considerava bem sucedida em sua área de atuação. Mas, após o dia 25 de janeiro a vida virou de cabeça para baixo e se antes ela doava cestas básicas e presentes no Natal para a população carente do vilarejo, hoje precisa pedir por auxílio para poder se alimentar, junto ao marido e o filho.

Na reunião que acabou de sair ela solicitou que a Vale, pelo menos, arque com a escola privada de seu filho. “Ele estuda em um colégio bom em Brumadinho e lutei a minha vida toda por isso. Ele não pode ser prejudicado por causa desse crime que fizeram com a gente. Não estou pedindo mais nada, só se não vou ter como pagar pela educação dele se meu negócio dependia das pessoas, e elas morreram quase todas”, avalia Fabiane.

"Não quero que a Vale me sustente, só quero o justo para pagar a escola do meu filho, ele não tem nada a ver com esse crime". Foto: Eduarda Esteves/LeiaJáImagens

A resposta da empresa dos representantes da empresa não foi imediata e ela vai precisar aguardar 48h pelo retorno, já que a mineradora não considera que ela foi atingida diretamente. “Eu agradeço que minha casa está intacta e minha família viva, mas a gente precisa seguir a vida e não sei que caminho vou seguir e se vou conseguir trabalhar ou morar aqui. Tudo é uma incógnita”, complementa.

Ela comenta que não tem como vender seus produtos porque ninguém vai querer comprar nesse momento de dor e reclama ainda das interdições nas estradas, o que implica no maior gasto de gasolina para se deslocar. Fabiane veio morar no vilarejo há três anos em busca da calmaria para criar o filho. “Não queria sair da minha casa, mas quero saber se vou poder continuar aqui, com saúde e lazer”.

O seu marido, que preferiu não se identificar, é membro da associação dos moradores do bairro e relembra que a Vale procurou os representantes do Parque da Cachoeira para fazer uma simulação de fuga, em caso da barragem romper. Realizaram reuniões, visitaram a área e informaram sobre a sirene, que nunca tocou.  

O que diz a Vale:

De acordo com a mineradora, o sistema de alerta sonoro é acionado manualmente, a partir de um Centro de Controle de Emergências e Comunicação, com funcionamento 24 horas por dia, que fica localizado fora da área da mina. Mas, devido à velocidade com que ocorreu o evento, não foi possível acionar as sirenes relativas à Barragem I. As causas continuam sendo apuradas. Ainda de acordo com a mineradora, a barragem passava por inspeções quinzenais, que não detectaram nenhuma alteração na estrutura. 

“É importante ressaltar que a Barragem 1 estava inativa desde 2016 e possuía todas as declarações de estabilidade aplicáveis, pois passava por constantes auditorias externas e independentes. Havia inspeções quinzenais, reportadas à Agência Nacional de Mineração, sendo a última datada de 21 de dezembro de 2018. A estrutura passou também por inspeções nos dias 8 e 22 de janeiro deste ano, com registro no sistema de monitoramento da Vale. Foram realizados ainda um simulado externo de emergência em 16 de junho de 2018, sob coordenação das Defesas Civis e com o apoio da Vale, e um treinamento interno com os empregados em 23 de outubro de 2018”, trecho retirado da nota enviada à imprensa.

[@#podcast#@]

Confira mais reportagens clicando nas fotografias abaixo:

 

A mineradora Vale assinou nesta quarta-feira (20) um Termo de Acordo Preliminar (TAP) para antecipar os pagamentos emergenciais a todos os moradores da cidade de Brumadinho, município atingido pelo rompimento da barragem de rejeitos da Mina Córrego do Feijão. Em nota, a companhia informou que serão beneficiadas as comunidades que vivem até um quillômetro do leito do Rio Paraopeba, de Brumadinho até a cidade de Pompéu, na represa de Retiro Baixo.

Segundo a empresa, o acordo preliminar com a Advocacia-Geral do Estado de Minas Gerais, o Ministério Público do Estado de Minas Gerais, a Defensoria Pública do Estado de Minas Gerais, a Advocacia-Geral da União, o Ministério Público Federal e a Defensoria Pública da União foi fechado durante audiência no Tribunal de Justiça de Minas Gerais, na presença ainda de representantes dos atingidos pelo rompimento da barragem.

##RECOMENDA##

Entre outras medidas, o TAP estabelece o adiantamento da indenização por meio de pagamentos mensais a partir de 25 de janeiro, pelo prazo de um ano, com valores equivalentes a um salário-mínimo por adulto, meio salário-mínimo por adolescente e um quarto do valor do salário-mínimo para crianças.

Está definida ainda assessoria técnica independente para que os atingidos possam negociar suas indenizações individuais. Para o governo de Minas Gerais, está previsto reembolso ou custeio direto das despesas extraordinárias feitas pelo executivo mineiro, seus órgãos de atuação direta e sua administração indireta, inclusive mediante o custeio das despesas de transporte, alojamento e alimentação dos servidores envolvidos nos trabalhos de resgate e demais ações emergenciais.

*Enviada especial do LeiaJá a Brumadinho (MG) 

Na série de reportagens "Brumadinho - O que restou depois da lama", o LeiaJá viajou pela cidade de Brumadinho ouvindo relatos de pessoas afetadas pelo rompimento da barragem.

##RECOMENDA##

Terreno transformado após o rompimento da barragem da Mina Córrego do Feijão. Foto: Eduarda Esteves/LeiaJáImagens

Vinte e cinco dias de um tormento, angústia e da pior notícia que a família de Luciano de Almeida Rocha, 40, poderia receber. Roberta Cristina Ferreira, 37, sua esposa, nunca imaginou que a ligação recebida às 12h03, a qual não atendeu, poderia ser o último contato do marido com ela. Ele trabalhava com topografia, no ramo da geotecnia, em várias barragens de Minas Gerais e no último dia 25 de janeiro foi uma das vítimas após o rompimento de uma barragem da Vale em Brumadinho (MG). O corpo de Luciano segue debaixo da lama e pela lista oficial que contabiliza os números da tragédia, está desaparecido.

De acordo com boletim da Defesa Civil do estado divulgado no domingo (17), todos os óbitos já foram identificados. A tragédia na mina Córrego do Feijão, nos arredores da capital Belo Horizonte, deixou ainda 141 pessoas desaparecidas – entre funcionários da mineradora, terceirizados que prestavam serviços à Vale e membros da comunidade.

Apesar do termo oficial, Roberta já cansou de esperar e não nutre esperanças de que achem o corpo de seu marido para que a família possa enterrá-lo com dignidade. A viúva aceitou nos receber em sua casa, no Residencial Bela Vista, em Brumadinho, para a entrevista. Apesar de permanecer na residência com os três filhos após a tragédia, o desejo de Roberta é sair da cidade e tentar amenizar a dor que sente a cada notícia de que ainda não encontraram o que restou de seu marido.

“Agora estou sem chão e não tenho visão de futuro, fizemos planos, pouco depois do dia 25 de janeiro completamos vinte anos de casados, aniversário do meu filho, viagens e tudo mais, acabou. Ele até brincava que não queria ser enterrado, queria ser cremado porque era medroso. Foi enterrado vivo”, lamenta.

Luciano ao lado da família em um passeio por Minas Gerais. Foto: Arquivo Pessoal

Luciano Almeida, nas palavras de Roberta, era um homem trabalhador, vaidoso, carinhoso com a família e adorava bagunça. Ele não gostava de falar sobre seus sentimentos, mas no domingo antes da tragédia em uma conversa informal falou que não saberia o que fazer caso perdesse Roberta e que “ela era a mulher da sua vida”. Ele a conhecia desde a infância, eram amigos e costumavam brincar em um sítio de familiares em Brumadinho.

Há 21 anos, Roberta saiu de Belo Horizonte para casar com Luciano, seu primeiro namorado e amor. Tiveram cinco filhos, dos quais dois faleceram por problemas na gestação. “Fiquei com minhas três jóias. João, Maria e Miguel. Hoje são tudo que tenho para tocar a vida”, conta.

O caso de Brumadinho não é o primeiro desastre com barragens no Brasil. Há mais de três anos, no dia 5 de novembro de 2015, o rompimento da barragem de Fundão, da mineradora Samarco, deixou 19 mortos e causou uma enxurrada de lama que inundou várias casas no distrito de Bento Rodrigues, em Minas Gerais.

Com população de aproximadamente 40 mil pessoas, Brumadinho é uma cidade em que todos se conhecem, praticamente. Caminhar pelo centro do município, mais afastado da barragem que rompeu, não te distancia de sentir os danos que a tragédia causou aos habitantes. Todo mundo perdeu alguém. Seja da família ou um amigo. Se antes para localizar um endereço era preciso a ajuda do google maps, hoje as pessoas conseguem se guiar pela casa de “fulano que está desaparecido ou morto”.

Faixa pendurada no frente da Rodoviária de Brumadinho. Foto: Eduarda Esteves/LeiaJáImagens

Roberta relembra que seu marido não deveria estar na barragem da Mina Córrego do Feijão naquela sexta-feira. Era o dia dele ir para Congonhas, região central de Minas, onde também existem várias barragens. “Ele estava no local errado e na hora errada. Nem deveria estar ali, mas a caminhonete quebrou e ele ficou preso no escritório adiantando serviço”, relembra. Após perceber que tinha perdido uma ligação de Luciano, ela enviou mensagem pelo aplicativo WhatsApp, que ele nunca recebeu.

A dificuldade em acreditar que todo o pesadelo é real se mistura com as memórias recentes de como Luciano estava feliz no dia. Ele comprou salgados, fez pipoca e levou bolo para o trabalho porque era um dia em que eles confraternizavam. Pouco tempo depois, no horário de almoço, Roberta lembra do filho mais velho falar sobre a barragem ter rompido. “Achei que fosse mentira, mas aí minha sogra também comentou desesperada comigo. Eu telefonei para todo mundo de lá e nem chamava. Foi quando começou a passar na televisão e vimos tudo”.

No dia seguinte, o sábado, as buscas já tinham iniciado e vários trechos da região rural de Brumadinho tinham sido bloqueados em decorrência da passagem da lama. “Fui lá no Parque das Cachoeiras no sábado e tinha muita esperança de encontrá-lo com vida. Eles não nos deixavam passar e entrei pelos matos na casa dos outros. Os bombeiros estavam marcando os locais onde estavam os corpos. Sei que é triste, mas eu precisava chegar perto para acreditar. A última lembrança que tenho dele é dele indo trabalhar feliz”, relembra.

Roberta e os três filhos. Foto: Eduarda Esteves/LeiaJáImagens

O escritório onde Luciano estava foi completamente destruído pela lama. Nenhum pertence do topógrafo foi localizado. Roberta confessa que não gosta dessa espera e a cada minuto a sensação de impotência aumenta. Segue tomando algumas medicações para se acalmar e consegue passar o dia relativamente bem cuidando de seus filhos e dos sobrinhos. Mas quando o relógio se aproxima das 17h15, a saudade aumenta e as lembranças todas voltam. Esse era o horário que seu marido chegava do trabalho.

“Eu nunca fui de sentar e esperar as coisas e isso de ficar tendo que aguardar é o que está me matando. Eu não consigo agir de outra forma porque não tem o que eu fazer. Até um padre teve aqui e disse que corpo não vale nada, temos que ver a alma. Mas para a gente, é essencial. Minha filha me perguntou quando vamos enterrar o pai e eu não sei a resposta. Eu tenho muito medo de encerrarem as buscas sem que os outros sejam achados”, destaca Roberta.

A família do marido perdeu quatro pessoas. “Meu concunhado André Luiz, a Letícia Mara, prima do meu marido e o Gustavo, também primo dele. Os quatro trabalhavam para a Vale e foram embora de uma vez só, a família está muito abalada. Todos os três já foram localizados. A avó do Luciano disse para mim que ele seria o último a ser encontrado porque como ele era o mais velho ele iria guiar os primos mais novos. Mas até agora nada”.

"A avó do Luciano disse para mim que ele seria o último a ser encontrado porque como ele era o mais velho ele iria guiar os primos mais novos. Mas até agora nada”. Foto: Eduarda Esteves/LeiaJáImagens

O presidente da Vale, Fábio Schvartsman, destacou em entrevista à imprensa que o incidente é uma "tragédia humana". Ele afirma que a maioria dos mortos pelo desastre são funcionários e terceirizados da empresa, já que, no momento em que a área administrativa foi atingida, havia centenas de pessoas trabalhando no local.

A dona de casa considera que o avalanche de lama que soterrou parte da cidade de Brumadinho não foi um “acidente” ou um “incidente”. Foi uma chacina. “Mataram todos eles, é a mesma coisa de atirar em um por um”, frisa. Mortes, destruição de casas, vegetação e vidas que foram manchadas pela lama e os efeitos de uma rotina calma destruída pela tragédia.

Os passos para superar ou amenizar a dor estão lentos. Roberta detalha que o único serviço prestado pela Vale foi um atendimento psicológico de uma profissional que foi até sua casa, mas não recebeu nenhum telefonema da empresa e não consegue encaminhar as questões burocráticas porque ainda não tem a certidão de óbito, já que Luciano segue desaparecido.

“Eu nunca fui de sentar e esperar as coisas e isso de ficar tendo que aguardar é o que está me matando". Foto: Eduarda Esteves/LeiaJáImagens

“Eles não me procuraram. Parece que estão fazendo favor e a gente tem de suplicar. Fiz o cadastro, mas não recebi nenhum dinheiro de doação, nem de pensão. Fui em uma assistente social na Estação do Conhecimento para saber se poderiam me ajudar com o material escolar dos meus filhos e ainda nada”, denunciou.

Segundo a Vale, até o dia 5 de janeiro, 107 pessoas já haviam recebido a doação de R$ 100 mil. No cadastro da empresa constavam 248 representantes de 229 vítimas registrados. Essa doação não é uma indenização, que será discutida depois com as famílias e representantes do poder público. De acordo com a mineradora, estão aptos a receber a doação representantes de empregados da Vale, de trabalhadores terceirizados e de pessoas da comunidade mortos ou desaparecidos, de acordo com a lista oficial validada pela Defesa Civil.

Roberta destaca ainda que não trabalha e a única renda dentro de casa era a do marido. Ele tinha feito uma promessa para a filha de que no dia 1º de fevereiro iriam comprar o material escolar completo com o tema “unicórnio”, mas não deu tempo. “Ela ficava abalada porque ele tinha prometido, são crianças e ainda não entendem. Arrumei dinheiro e comprei a mochila e os cadernos porque nessas horas a gente precisa pensar mais a frente, mas não fiz isso com a ajuda da Vale. Tenho os dados de sua conta, mas não tenho o cartão e fico nessa de esperar, esperar”.

Na casa de Roberta, os pertences de Luciano ainda estão todos no lugar porque ela não teve coragem de mexer em nada. A única exceção são suas fardas da Vale. Ela fez questão de retirar tudo de seu armário, empacotar e colocar na garagem. “Não quero nada dessa empresa criminosa. Um parente disse que viria buscar, espero que venha logo, quero isso longe da minha casa”, concluiu.

[@#video#@]

Confira mais reportagens clicando nas fotografias abaixo:

O Corpo de Bombeiros Militar de Minas Gerais atualizou para 169 o número de mortes em decorrência do rompimento de uma barragem da mineradora Vale em Brumadinho. A corporação informou que dois corpos foram retirados da lama de rejeitos nos últimos dois dias. Fragmentos de corpos também foram localizados pelas equipes nas últimas horas.

De acordo com boletim da Defesa Civil do estado divulgado neste domingo (17), todos os óbitos já foram identificados. A tragédia na mina Córrego do Feijão, nos arredores da capital Belo Horizonte, deixou ainda 141 pessoas desaparecidas – entre funcionários da mineradora, terceirizados que prestavam serviços à Vale e membros da comunidade.

##RECOMENDA##

As buscas seguem na cidade desde o rompimento da barragem da mineradora Vale, no dia 25 de janeiro. Os rejeitos invadiram áreas da Mina do Córrego do Feijão, onde a estrutura estava, e das proximidades, deixando um rastro de mortes e destruição.

Desde o início das buscas, foram localizadas 393 pessoas, das quais 224 da “lista da Vale” e 169 da comunidade. Não há mais hospitalizados, segundo o balanço atualizado pela Defesa Civil.

Crédito

O Banco do Brasil anunciou que produtores de Brumadinho terão mais prazo para financiamentos adquiridos. O vencimento das dívidas foi adiado em um ano, considerando prejuízos da tragédia.

O Corpo de Bombeiros de Minas Gerais informou que irá evacuar na noite deste sábado, dia 16, uma área de risco das barragens B3/B4 da Mina de Mar Azul, da Vale, no município de Nova Lima (MG). Entre 170 e 200 pessoas terão que ser retiradas do local, que abrange cerca de 49 edificações, entre residências e estabelecimentos comerciais.

Procurada, a Vale informou que acionou na noite deste sábado o nível 2 do Plano de Ação de Emergência de Barragens de Mineração (PAEBM) para a barragem B3/B4 da mina Mar Azul, em Nova Lima (MG). DE acordo com a empresa, a medida, preventiva, foi tomada "por segurança".

##RECOMENDA##

"A decisão é uma medida preventiva e se dá após a revisão dos dados dos relatórios de análise de empresas especializadas contratadas para assessorar a Vale. Cabe ressaltar que a estrutura está inativa e essa iniciativa tem caráter preventivo", frisou a empresa em nota enviada por sua assessoria de imprensa.

De acordo com o Corpo de Bombeiros, a auditoria se negou a atestar segurança da estrutura, o que motivou a evacuação preventiva. As barragens têm cerca de 3 milhões de metros cúbicos de rejeito em alteamento à montante. Ou seja, foi construída com o mesmo tipo de estrutura da Barragem I da Mina de Córrego do Feijão, em Brumadinho, que rompeu no fim de janeiro, em uma tragédia que caminha para ter mais de 300 mortos.

Corpo de Bombeiros Militar, Defesa Civil e Polícia Militar foram acionados e estão com equipes no local. "A barragem está no nível 1, mas será modificada para nível 2 dentro de alguns minutos, seguindo o protocolo uma vez que a auditoria não atestou a segurança. A sirene será acionada dentro de alguns minutos", informou assessoria do Corpo de Bombeiros por volta das 20h15.

"O trabalho está sendo conduzido pela Vale com apoio da Defesa Civil e demais órgãos competentes. As pessoas evacuadas estão sendo acolhidas e registradas no centro comunitário, onde receberão informações adicionais. Posteriormente, elas serão acomodadas em hotéis da região. A Vale dará toda a assistência e apoio necessários até que a situação seja normalizada", declarou a empresa.

Embora a comercialização do ‘vale-refeição’ ou ‘vale-alimentação’ seja uma prática inapropriada, ela tem sido bastante comum entre os trabalhadores brasileiros. De acordo com um levantamento realizado pela Confederação Nacional de Dirigentes Lojistas (CNDL) e pelo Serviço de Proteção ao Crédito (SPC Brasil), 39% dos consumidores que recebem o benefício possuem o hábito de vender seus tíquetes, dos quais quatro em cada dez (44%) usam o valor para pagar as contas. A pesquisa mostra que tal prática é mais recorrente nas classes mais pobres, já que 61% das pessoas que recebem o auxílio diz nunca recorrer a essa prática - esse percentual é maior nas classes A e B (75%).

Parte de quem opta pela troca do crédito do vale pelo dinheiro, de acordo com o levantamento, não o fazem apenas pela necessidade de complementar o orçamento. Fazer compras foi a principal finalidade apontada por 36% dos entrevistados, enquanto 21% disseram guardar o valor que recebem e 17% reservam para atividades de lazer.

##RECOMENDA##

Por ser um benefício que o empregador oferece aos trabalhadores, o vale-refeição tem como uso exclusivo a alimentação e não pode ser desviado de sua finalidade, de acordo com o “Programa de Alimentação do Trabalhador (PAT)”. “Além da prática ser inapropriada, trocar o tíquete refeição por dinheiro pode ser um mau negócio do ponto de vista financeiro. Quem compra, costuma cobrar um percentual, levando o trabalhador a perder parte do valor do benefício”, explica a economista-chefe do SPC Brasil, Marcela Kawauti.

Foram entrevistados 804 consumidores, acima de 18 anos, de ambos os gêneros e de todas as classes sociais nas 27 capitais. A margem de erro é de no máximo 3,5 pontos percentuais para um intervalo de confiança a 95%.

Oito funcionários da Vale foram presos na manhã desta sexta-feira (15) em Minas Gerais e Rio de Janeiro. As prisões foram em Belo Horizonte, Itabira (MG) e na capital fluminense. Ao todo, são 14 mandados de busca e apreensão, e oito de prisão. O pedido foi do Ministério Público de Minas Gerais (MP-MG).

Entre os presos estão quatro gerentes (dois deles, executivos) e quatro integrantes das respectivas equipes técnicas. Segundo o MP de Minas, todos são diretamente envolvidos na segurança e estabilidade da Barragem 1, em Brumadinho, rompida no dia 25 de janeiro. As prisões temporárias foram decretadas pelo prazo de 30 dias.

##RECOMENDA##

Um dos presos é Alexandre Campanha, executivo da Vale, que foi detido na região centro-sul de Belo Horizonte, em Minas Gerais. Ele prestou depoimento em 7 de fevereiro à força-tarefa que investiga o rompimento da barragem 1 na Mina Córrego do Feijão, em Brumadinho, na região metropolitana de Belo Horizonte.

Campanha foi citado pelo engenheiro Makoto Namba, da Tüv Süd, que disse ter se sentido pressionado pelo executivo a assinar documento atestando a estabilidade da barragem que rompeu. Em depoimento, Campanha negou ter travado o diálogo com o responsável pelo laudo da barragem.

Alexandre Campanha é gerente executivo corporativo da Vale e, segundo depoimento de Namba à Polícia Federal, fez pressão para que assinasse o documento. "A Tüv Süd vai assinar ou não?", teria dito Campanha, segundo Namba.

O engenheiro, então, disse ter respondido que assinaria se a Vale adotasse recomendações que fez em revisão periódica de junho de 2018. Namba afirmou ainda ter assinado o laudo - e que se sentiu sob risco de perder o contrato.

Busca e apreensão

Segundo o Ministério Público, foram ainda alvos de busca e apreensão nesta sexta, em São Paulo e Belo Horizonte, quatro funcionários (um diretor, um gerente e dois integrantes do corpo técnico) da empresa alemã TÜV SÜD, que prestou serviços para a Vale, referentes à estabilidade da barragem rompida. Também foi cumprido mandado de busca e apreensão na sede da empresa no Rio de Janeiro.

A operação contou com o apoio das Polícias Militar e Civil do Estado de Minas Gerais e, ainda, com atuação dos Ministérios Públicos dos Estados do Rio de Janeiro e São Paulo.

Todos os presos serão ouvidos pelo Ministério Público Estadual, em Belo Horizonte. Também são apurados crimes ambientais e de falsidade ideológica.

Veja a lista dos presos:

Joaquim Pedro de Toledo

Renzo Albieri Guimarães Carvalho

Cristina Heloíza da Silva Malheiros

Artur Bastos Ribeiro

Alexandre de Paula Campanha

Marilene Christina Oliveira Lopes de Assis Araújo

Hélio Márcio Lopes da Cerqueira

Felipe Figueiredo Rocha

Páginas

Leianas redes sociaisAcompanhe-nos!

Facebook

Carregando