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Sem acesso a medicamentos, exames especializados e tecnologias necessárias para o desenvolvimento de seus filhos, famílias cujos bebês nasceram com a Síndrome Congênita do Zika em Pernambuco observam as crianças desenvolverem novas complicações de saúde à medida que vão crescendo. A resposta do poder público, segundo as mães, não chegam na mesma velocidade.

As famílias estiveram em uma audiência pública feita nesta sexta-feira (10) pelo Ministério Público Federal (MPF) em Pernambuco para discutir políticas públicas relacionadas à epidemia do Zika Vírus e a Síndrome Congênita do Zika. O evento é um desdobramento de um procedimento administrativo instaurado pelo MPF para apurar o aumento dos casos de microcefalia no país, especialmente em Pernambuco. Em entrevistas à Agência Brasil, elas relatam novos sintomas e reclamam da falta de apoio do Estado.

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Um problema de saúde observado com mais frequência é a dificuldade dos bebês de engolirem alimentos – a capacidade de deglutição - . Várias relatam que, embora tenham amamentado normalmente ou com alguma dificuldade, seus filhos regrediram e não conseguem mais levar o leite até o estômago. Para nutrir as crianças é preciso instalar uma sonda por meio do nariz ou, em alguns casos, fazer uma gastrostomia para que elas recebam nutrientes com a ajuda de um sistema instalado na barriga.

Luhandra Vitória Batista da Silva, de um ano e três meses, foi diagnosticada com Disfagia grave e precisou da gastrostomia. A operação foi feita pelo Sistema Único de Saúde (SUS), mas os custos relacionados são altos, e a mãe Jusikelly Severino da Silva, 33 anos, afirma que não consegue os insumos necessários na rede pública. Na mochila do bebê ela carregava uma pasta com exames e documentos que atestavam a busca, por meses, dos recipientes e o leite especial para alimentação da menina.

Entre os papéis está uma declaração, de 9 de fevereiro, de que a farmácia do Centro de Saúde Bidu Krause solicitou, no dia 17 de novembro do ano passado, o fornecimento do leite tipo “Fortinni”, mas não houve retorno. O documento também atesta a falta de frasco e equipo para a alimentação, via sonda localizada na barriga. A assinatura é da gerente adminstrativa Maria Marilúcia do Nascimento.

Procedimentos cirúrgicos

Jusikelly faz os cálculos dos gastos com estes elementos a pedido da reportagem. “Uma lata de leite é R$ 48,50, mas são 19 que ela toma por mês. O equipo é R$ 1,90, e ela usa 30 por mês. E o frasco de alimentação é R$ 1, e são 210 no período”, enumera. A moradora do bairro de Teijipió, divisa entre Jaboatão dos Guararapes e Recife, também informa que um equipamento chamado botton, necessário em um futuro próximo para que Luahndra continue a se alimentar, custa R$ 2 mil e não é fornecido pelo SUS.

Outras mães sequer conseguem saber se as filhas precisam fazer a operação. Gleyse Kelly Cavalcante, 28 anos, é vice-presidente da União de Mães de Anjos (Uma), uma organização criada pelas próprias mulheres a partir da troca de informações em redes sociais. Hoje são mais de 400 famílias atendidas, segundo a jovem, com assistência jurídica e na busca por doações de fraldas e leite como o prescrito para a filha de Jusikelly.

Sua filha Maria Giovanna Santos, um ano e três meses, aguarda desde junho de 2016 que uma vídeo-endoscopia da deglutição (VED) seja marcada, sem sucesso. A demora nos exames especializados, segundo Gleyse, é comum. “Em novembro de 2015 ela fez uma tomografia. O resultado só saiu em março de 2016, quando já era para fazer outra, porque esses bebês precisam ser acompanhados para saber como o cérebro vem se desenvolvendo”, explica.

Medicamentos em falta

Outro problema comum entre as mães é a falta de medicamentos em farmácias públicas. A mãe de Luhandra contabiliza os remédios e seus custos na rede privada. “O Keppra, para convulsão, é R$ 90; o Losec, de refluxo, R$ 159; o Sabril, de convulsão, R$ 295, e o Domperidona é R$ 20. Eu compro todos eles”, diz. Para isso, Jusikelly conta com o Benefício de Prestação Continuada (BPC), um programa federal que fornece um salário-mínimo concedido à filha, além de R$ 159 do Bolsa Família. Ela e o marido estão desempregados e pagam aluguel.

O Kreppa é um medicamento que, segundo Gleyse, está entre as necessidades principais destas famílias. Muitos bebês apresentaram convulsões difíceis de serem tratadas com medicação regular destinada a pacientes nos primeiros anos de vida. O problema é que, pelo Sistema Único de Saúde (SUS), a substância só é fornecida para pessoas acima de 16 anos, o que impede o fornecimento gratuito para estas crianças afetadas pela Síndrome Congênita do Zika.

De acordo com a secretária-executiva de Atenção à Saúde da Secretaria Estadual de Saúde de Pernambuco, Cristina Mota, “os medicamentos, principalmente no caso do Keppra, a dificuldade maior é que ele não era incorporado pelo Conitec [Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no SUS]. Foi feita a consulta ao Conitec e num primeiro momento houve uma negativa da incorporação, no ano passado. No último trimestre a gente reiterou a consulta, baseado nos pareces dos neuropediatras locais, que já tinham experiência clínica inclusive com o uso”, afirma. Diante da falta de resposta, segundo Cristina, o Estado decidiu adquirir o medicamento por conta própria, e espera que ao final do primeiro trimeste ele já esteva disponível.

Nota do Ministério da Saúde

Em nota, o Ministério da Saúde confirmou que recebeu a demanda da Secretaria de Saúde do Estado de Pernambuco sobre o medicamento Keppra, e que o pedido foi encaminhado para avaliação da Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no SUS (Conitec). “Cabe informar que o órgão entrou em contato com a Secretaria de Saúde do Estado de Pernambuco para esclarecer alguns questionamentos e, até o momento, aguarda retorno”, diz o texto.

Em relação aos exames especializados, a gestora da Secretaria de Saúde de Pernambuco afirmou que as complicações derivadas do Zika Vírus eram desconhecidas pela comunidade científica, o que dificultaria a organização da rede de atendimento de forma prévia. “Esta necessidade gastroenterológica não é só do exame que há necessidade, mas do acompanhamento multiprofissional. Este exame é bastante especializado, a gente não dispõe na rede assistencial sob gestão direta do estado, e esta demanda surgiu com o desenvolvimento das crianças”. O governo estadual deverá contratar dois serviços de gastroenterologia pediátrica na rede conveniada ao SUS, uma na capital e outra no interior, segundo Cristina.

O botton também deve ser incluído no procedimento contratado, embora o SUS não inclua o equipamento na tabela nacional de custeio, de acordo com a secretária-executiva. “O SUS cobre o procedimento, mas o botton não está previsto”, diz. Ela defende que o Ministério da Saúde busque incorporar novas tecnologias à medida que as necessidades destes bebês apareçam. “São demandas novas que vem surgindo, precisa correr para conseguir atender e evitar sequelas. A gente vai ter que se adpatar, e precisa ser nacional. Problemas como este devem ter nos demais estados da Federação. E o usuário do SUS é um só”.

A respeito do botton para gastrostomia, o Ministério da Saúde não respondeu à informação do Estado de Pernambuco. A Agência Brasil atualizará a reportagem quando receber o posicionamento. O órgão repassou dados, na nota, sobre a rede de reabilitação para assistência às pessoas com deficiência. São 1.541 serviços, sendo 183 Centros Especializados em Reabilitação (CER), que trabalham com a estimulação precoce e a reabilitação dos bebês. A rede recebe anualmente R$ 1,5 bilhão do Ministério da Saúde, “sendo R$ 688,5 milhões como incentivo para o funcionamento dos CER”.

Juan Pedro nasceu há um ano, no Recife, com 26 centímetros de perímetro cefálico, um quadro de microcefalia severa. A mãe do menino, a recepcionista Daniele Ferreira dos Santos, de 29 anos, já vivia com o pai da criança havia cerca de dois anos. Um mês após o nascimento, porém, o pai decidiu ir embora. "Ele dizia que o menino chorava muito e que ele não conseguia dormir. Também reclamava que eu só dava atenção para o bebê".

Embora o estado civil solteira - de 48% das mães de bebês com microcefalia - inclua pessoas que namoram ou moram com companheiros sem oficializar a relação, são comuns relatos de mulheres que foram abandonadas pelos parceiros na gestação ou após o parto de uma criança com a má-formação. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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Pauliana da Silva Souza tinha 15 anos quando largou a escola e foi morar com o namorado, de 18, em uma casa de um bairro pobre do Recife. No ano seguinte, acabou engravidando. A adolescente que há pouco havia saído da infância tinha, a partir daí, a missão de cuidar de uma criança. O desafio mostrou-se ainda maior após o nascimento da pequena Ágatha, mais uma vítima da epidemia de microcefalia, que foi declarada emergência internacional pela Organização Mundial da Saúde (OMS) há exatamente um ano.

A emergência foi suspensa em novembro, mas, assim como Pauliana, 767 brasileiras com menos de 20 anos deram à luz crianças com a má-formação em apenas um ano, conforme dados inéditos do Ministério da Saúde obtidos pelo jornal O Estado de S. Paulo por meio da Lei de Acesso à Informação. Pela classificação da OMS, todas ainda estavam na adolescência.

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O número equivale a um de cada quatro (24%) dos 3,1 mil casos confirmados da má-formação registrados pelo governo federal de novembro de 2015 a setembro de 2016 e incluem registros de microcefalia provocada por todas as causas, não só pelo vírus zika.

Desse total, 35 jovens tinham entre 10 e 14 anos, dado ainda mais preocupante, segundo especialistas. "É uma estatística assustadora porque isso é estupro presumido. Quando vemos meninas sendo mães nessa idade, alguma coisa para essa população falhou. É um momento muito precoce, que vai causar um impacto para a vida toda", diz a antropóloga Débora Diniz, professora da Universidade de Brasília (UnB) e pesquisadora do Anis Instituto de Bioética.

Vulnerabilidade

Os números do ministério também indicam que a gravidez na adolescência é mais prevalente entre mães de bebês com microcefalia do que na população em geral, na qual o índice de gestantes entre 10 e 19 anos é de 18%. Outros dados sobre o perfil das mulheres afetadas pela epidemia da má-formação também mostram que as crianças nascidas com microcefalia parecem estar em famílias com maior situação de vulnerabilidade.

Além do alto porcentual de adolescentes, quase metade (48%) das mães de bebês com microcefalia é solteira, ante 40% na população em geral, e 76% dessas mulheres são pretas ou pardas, enquanto no restante da população, esse mesmo índice é de 59%.

"Por mais que o Aedes aegypti possa estar em toda parte, é muito claro que as consequências da proliferação do mosquito estão mais presentes onde há mais vulnerabilidade social", afirma a antropóloga. Há desigualdades também no perfil das mães por Estado. No Amazonas e em Alagoas, por exemplo, o índice de mulheres que deram à luz bebês com microcefalia antes dos 20 anos chega a 40%.

Apesar de o Ministério da Saúde não ter divulgado os dados de renda das mães de bebês com microcefalia, uma pesquisa feita pela Secretaria de Justiça e Direitos Humanos de Pernambuco, Estado com o maior número de casos da má-formação, mostra que 90% das famílias de crianças com o problema tinham renda per capita de até R$ 220, conforme revelou o jornal O Estado de S. Paulo em 6 de novembro. A pesquisa foi feita com 211 famílias cadastradas em um núcleo estadual de apoio.

Dificuldades

Pauliana, hoje com 17 anos, não gosta quando relacionam sua idade ao fato de já ser mãe. "Não é porque sou jovem que não tenho responsabilidade, mas também não vou dizer que é fácil. É uma situação que a bebê fica dependente de mim, eu que tenho que levá-la para as terapias e não posso deixá-la com ninguém por causa do problema dela", conta.

Na maioria das vezes, a adolescente enfrenta sozinha a rotina de tratamentos da menina. "Dependendo de onde é a terapia, tenho de pegar dois ônibus para chegar e às vezes tenho de ir em pé porque ninguém dá o lugar", conta. O companheiro de Pauliana costuma passar o dia trabalhando. "Foi muito difícil esse primeiro ano porque a gente brigava muito. Cheguei até a me separar dele e voltar para a casa da minha mãe quando a Ágatha estava com 6 meses, mas voltamos quatro meses depois." Hoje, a bebê está com 1 ano e 4 meses.

Contando apenas com a renda de pedreiro do rapaz, o casal tem enfrentado dificuldades para custear todas as despesas. "Ainda bem que tenho conseguido doações. Pego leite, fraldas em uma associação de mães de bebês com microcefalia. Senão, a situação estaria pior." As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

Um ano depois de decretar emergência internacional por causa da proliferação do vírus da zika pelo mundo, a cúpula da Organização Mundial da Saúde (OMS) admite: "ainda está no escuro" diante de vários aspectos da doença, mesmo que muitas perguntas sobre o vírus tenham sido respondidas. A constatação faz parte de um documento usado pela OMS em uma reunião com doadores em janeiro para atualizar a comunidade internacional sobre quais serão os próximos passos.

A agência de saúde da ONU estima que são pelo menos cinco as perguntas ainda sem respostas definitivas: Qual é o risco absoluto da síndrome congênita do zika? Quais os fatores de risco para a microcefalia? Qual é a extensão da infecção em áreas com o mosquito? Qual é o risco de transmissão sexual? E qual é o papel da imunidade natural em diferentes regiões com surtos que tenham ocorrido no passado?

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Só que a entidade já declarou o fim da emergência e optou por transformar o cenário de urgência em programa de longo prazo. Ao Estado, pesquisadores da agência admitiram que a luta contra o zika será longa e onerosa para os governos. Além de lidar com o mosquito vetor da doença, eles precisam preparar-se para ajudar famílias a lidar com crianças com má-formação e problemas que ainda nem sequer são conhecidos.

No caso do Brasil, dados recebidos pela OMS nos últimos dias apontam que o verão fez ressurgir o número de casos, ainda que em um volume menor que o do surto de 2015 e 2016. Ainda assim, fontes dentro da própria OMS criticaram o fim da emergência, alertando que a decisão retirou o foco de doadores e foi prematura.

Vivendo um processo eleitoral para escolher uma nova direção e substituir Margaret Chan no comando, a entidade vive o debate sobre sua credibilidade, duramente afetada nos últimos anos. Durante a campanha, muitos concorrentes disseram não concordar com o fim do status do vírus da zika e a forma de determinar emergências. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

Um estudo brasileiro divulgado na quarta-feira (18), na revista científica internacional Scientic Reports, mostrou que o antiviral sofosbuvir, atualmente utilizado no tratamento da Hepatite C, trouxe bons resultados também contra o vírus zika, inibindo a replicação viral e protegendo as células da morte provocada pela infecção. Mais investigações ainda são necessárias antes da realização de ensaios com pacientes.

O efeito do medicamento foi verificado em testes com diferentes tipos de células, como as neuronais humanas e minicérebros, que são organoides produzidos a partir de células-tronco que reproduzem os estágios iniciais de formação do cérebro e são considerados um modelo para o estudo da microcefalia associada ao zika. Para os pesquisadores, os resultados apontam que o sofosbuvir tem potencial para se tornar uma opção no tratamento da doença.

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"Identificar a ação contra o vírus zika de uma droga que já é clinicamente aprovada é muito importante. Ainda não sabemos quando teremos uma vacina disponível contra o zika e o uso de um medicamento antiviral pode reduzir os danos provocados pela infecção. Dependendo dos resultados futuros, o tratamento poderia até ser considerado como medida profilática, como ocorre, por exemplo, no uso de certos medicamentos antirretrovirais no caso do HIV", avalia o pesquisador Thiago Moreno Lopes Souza, do Centro de Desenvolvimento Tecnológico em Saúde (CDTS/Fiocruz).

Um dos motivos que levou os cientistas a testar o medicamento foi a semelhança entre o vírus da hepatite C e o vírus zika. Eles fazem parte da mesma família e apresentam similaridades em algumas de suas estruturas, como a enzima RNA polimerase, responsável pela replicação do material genético do vírus e alvo da ação do sofosbuvir. Segundo a Fiocruz, outros fatores levados em conta foram os efeitos colaterais reduzidos do produto para os pacientes com hepatite C, na comparação com outros antivirais, e a ausência de prejuízos para a gestão de acordo com estudos em modelos animais.

Os estudos utilizaram uma linhagem do vírus zika em circulação no Brasil. Com resultados positivos observados em estudos com diferentes linhagens celulares, os cientistas decidiram testar o medicamento em modelos mais parecidos aos cérebros dos bebês quando afetados pelo zika na fase da gestação. 

A Fiocruz explica que as células-tronco neurais de pluripotência são produzidas em laboratório a partir de células humanas extraídas da pele e são semelhantes às células que originam os principais tipos celulares do cérebro no início do desenvolvimento dos embriões.

Nos experimentos, o sofosbuvir reduziu drasticamente a replicação do vírus zika tantos nas células-tronco neurais como nos minicérebros, protegendo as células dos danos. "Observamos proteção mesmo quando as células foram submetidas a títulos elevados de vírus", destaca Thiago.

O sofosbuvir é um medicamento lançado em 2013, tendo chegado ao Sistema Único de Saúde (SUS) para tratamento da hepatite C em dezembro de 2015. O medicamento não está disponível nas farmácias e sua utilização só pode ser feita com acompanhamento médico. Em maio de 2016, a Fiocruz e o consórcio BMK assinaram um acordo para produzir o remédio no Brasil.

Já o estudo da relação do sofosbuvir com o vírus zika foi realizado por pesquisadores da CDTS/Fiocruz, Instituto Oswaldo Cruz (IOC/Fiocruz), Instituto D'Or de Pesquisa e Ensino (Idor), Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia para Inovação em Doenças Negligenciadas (INCT/IDN) e consórcio BMK.

Com informações da assessoria

A brasileira Celina Turchi, especialista em doenças infecciosas da Fiocruz Pernambuco, foi escolhida como uma das dez cientistas mais importantes de 2016 pela revista britânica Nature, por causa da pesquisa que descobriu a relação entre a microcefalia e o vírus da zika. Para realizar o estudo, Celina entrou em contatos com cientistas de todo o mundo para pedir ajuda. Ela formou uma força-tarefa de epidemiologistas, especialistas em doenças infecciosas, pediatras, neurologistas e biólogos especializados em reprodução.

"Nem no meu pior pesadelo eu imaginei uma epidemia de microcefalia em bebês", lembrou a pesquisadora em entrevista à Nature, dizendo acreditar que o Brasil estava vivendo uma emergência de saúde pública com o surto da doença.

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Celina disse que o trabalho foi um desafio por não haver testes confiáveis sobre o vírus e nenhum consenso em relação à definição de microcefalia. Mas o intenso contato dentro da rede de especialistas formada por ela permitiu obter evidências suficientes para ligar a infecção por zika e a doença no primeiro trimestre da gravidez.

Outros citados foram a argentina Gabriela González, por uma pesquisa inovadora sobre ondas gravitacionais, e o espanhol Anglada Defendi, que entrou na lista por ter descoberto um planeta parecido com a Terra próximo da estrela Alpha Centauri. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

Autoridades sanitárias argentinas informaram nesta sexta-feira que nasceu um bebê com microcefalia depois de que sua mãe contraiu o vírus zika na Bolívia, um mês depois da morte de um recém-nascido por esta malformação.

A secretária de Prevenção e Promoção da Saúde da província de Córdoba (centro), Marcela Miravet, disse que no fim de semana passado nasceu "um menino fruto de uma gestação de uma mulher de nacionalidade boliviana, que vive em Córdoba, mas que nos primeiros meses de gravidez esteve na Bolívia, onde contraiu a doença do zika", segundo declarações publicadas pelo jornal Clarín.

As autoridades de Saúde provinciais confirmaram que o caso deste bebê foi um dos primeiros detectados na Argentina nos controles de diagnóstico por ultrassonografias.

Miravet acrescentou que nestes estudos "foram encontradas outras lesões do sistema nervoso central, que aparentemente são características, de acordo com o que se conhece no Brasil e na Colômbia, que é onde houve casos de microcefalia e alterações neurológicas vinculadas a grávidas que tiveram zika".

Em meados de novembro, as autoridades sanitárias argentinas reportaram o primeiro caso de morte de um bebê com microcefalia associada ao zika ocorrida na província de Tucumán (norte). O bebê, que morreu dez dias depois de seu nascimento, "tinha (uma) doença congênita pelo vírus zika", informou o diretor nacional de Epidemiologia, Jorge San Juan.

Desde setembro, a Argentina registrou ao menos quatro casos autóctones de zika. A Organização Mundial da Saúde (OMS) anunciou em 18 de novembro que o zika deixou de ser uma "emergência de saúde pública mundial", mas que o vírus continua sendo "um problema extremamente importante a longo prazo". O zika surgiu há um ano na América Latina, e especialistas afirmam que os governos continuam subestimando-o. 

O Brasil é o país mais afetado pelo zika, com 1,5 milhão de pessoas infectadas, mais de 2.000 bebês nascidos com microcefalia e outros 3.000 com suspeita da doença. Até o momento, não existe tratamento nem vacinas para combater o vírus, que é transmitido principalmente pela picada do mosquito Aedes aegypti, o mesmo vetor da dengue e da chikungunya.

Além da microcefalia, o vírus também está associado à síndrome de Guillain-Barré, uma grave doença neurológica.

O Ministério da Saúde abre nesta quinta-feira (1º) pregão que vai definir a empresa fornecedora de repelentes para gestantes do programa Bolsa Família. A previsão indica que a compra beneficie 484 mil grávidas em situação de vulnerabilidade no âmbito do Plano de Enfrentamento ao Aedes aegypti e à microcefalia.

Podem participar do processo empresas que estiverem previamente credenciadas no Sistema de Cadastramento Unificado de Fornecedores, por meio da página www.comprasnet.gov.br. Além disso, os interessados devem encaminhar a proposta de preço por meio do sistema eletrônico até a data e horário marcados para abertura da sessão, às 9h.

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Menor preço

A empresa com a menor proposta de preço e, portanto, vencedora do processo eletrônico deverá distribuir o produto em até 15 dias após assinatura de contrato com o ministério. Os produtos podem ser fornecidos em forma de gel, loção, aerossol ou spray e devem oferecer, no mínimo, quatro horas de repelência. Serão adquiridas 3 bilhões de horas de proteção.

De acordo com o governo, a oferta do produto será realizada por meio do Programa de Prevenção e Proteção Individual de Gestantes contra o Aedes aegypti, que envolve o Ministério da Saúde e o Ministério do Desenvolvimento Social e Agrário, a quem caberá o crédito extraordinário de R$ 300 milhões.

O edital do pregão para compra de repelentes foi publicado no último dia 21 no Diário Oficial da União.

Nesta quarta-feira (30), durante mutirão da Secretaria Estadual de Saúde (SES), em parceria com o Hospital das Clínicas (HC), 72 crianças – de dois meses a um ano - foram atendidas a fim de confirmar ou descartar casos de microcefalia. Dos casos atendidos, 57 deles receberam diagnóstico negativo.

Cerca de 50 profissionais participaram da ação e realizaram avaliações neuropediátricas e exames de imagem, sangue, fisioterapia e terapia ocupacional. Onze casos tiveram resultado positivo para microcefalia e três crianças ainda estão sob investigação. Outra paciente não "desistiu de esperar" e não finalizou o exame.

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De acordo com a SES, foram atendidos moradores de 40 municípios da I e III Gerências Regionais de Saúde (Geres). Para os casos com resultado negativo, o acompanhamento na rede de saúde normal deve ser continuado. Já os positivos serão encaminhados ao serviço de referência. 

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Foi em agosto de 2015 que os primeiros sinais do aumento de microcefalia apareceram, detectados por neuropediatras. Mas foi só no início de novembro que a situação se espalhou na mídia. Na época, de agosto até novembro, Pernambuco havia registrado 141 casos da anomalia, contra apenas 12 no ano de 2014.

A crítica situação se confirmou e Pernambuco ainda hoje é o Estado com o maior número de casos. Com base no último boletim, do dia 12 de novembro, são 394 ocorrências confirmadas e 252 em investigação.

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O aumento dos casos pegou a população despreparada. O que os números mostram este ano é que a situação adiou o sonho de muitas famílias de ter um filho. Tal fato pode ser observado analisando o número de partos nos meses de agosto e setembro deste ano – quando nascem as crianças das famílias que planejavam em novembro ou dezembro do ano passado. 

Em agosto, as unidades hospitalares do Sistema Único de Saúde (SUS) registraram o nascimento de 7947 bebês, enquanto no mesmo mês em 2015 o número estava em 9017, o que representa uma queda de 11,87%. A taxa de variação aumenta em setembro, quando foram anotados 8918 nascimentos em 2015 e 6627 em 2016, uma redução de 25,7%.

Nos anos anteriores, a quantidade de partos esteve sempre superior a oito mil. Em agosto e setembro de 2013 o número de partos ficou em 9916 e 8812, respectivamente; enquanto em 2014, ficou em 9229 e 8991, respectivamente. 

Números expressivos

Segundo o obstetra Edilberto Rocha, coordenador da maternidade do Hospital Santa Joana, a unidade privada registrava aumentos anuais no número de procedimentos. Isto aconteceu no período 2012-2013, 2013-2014, 2014-2015. Porém, em 2016, houve uma redução de 55% no número de partos no período de julho a outubro deste ano em comparação ao mesmo período em 2015.

“Este é um número muito expressivo”, conta Rocha. “Desde o começo que as pacientes vêm demonstrando uma preocupação enorme tanto no consultório, quanto na maternidade. No pós-parto, por exemplo, elas demonstram uma ansiedade de saber se o bebê está bem. Isso é uma coisa que marcou muito as pacientes, elas estavam muito assustadas”, lembra o obstetra. 

Rocha conta que orientou que suas pacientes evitassem ter filho no início do aumento de casos de microcefalia. “Eu orientava que aquelas pacientes que poderiam retardar, ou seja, pacientes que tinham decidido ter um bebê, mas que eram jovens, sem complicações, que provavelmente não teriam maiores problemas em uma gravidez daqui a um ou dois anos, que pensassem realmente e retardassem essa gravidez. Àquelas que tinham uma dificuldade maior para engravidar, de idade mais elevada, que realmente queriam engravidar naquele ano, falava que engravidassem, mas com a consciência do risco. Inúmeros pacientes decidiram retardar a gravidez”, explica. O coordenador da maternidade do Hospital Santa Joana conta que a queda no número de partos é global, sentido no SUS e nas unidades privadas – principalmente no Nordeste. 

A representante comercial Patrícia Ramalho é uma das pessoas que decidiu adiar os planos de gerar um bebê. Ela chegou a perder uma criança em março deste ano e a biópsia não atestou a causa do óbito. Patrícia tem interesse em ter um filho, mas já decidiu que não tentará outra vez este ano. “Optei por adiar, vou esperar um período mais propício. É melhor o período de inverno, a partir de julho, agosto e setembro, porque os três primeiros meses da gestação são os mais críticos”, afirma Patrícia. A representante comercial aponta que o verão é a estação com aumento da circulação do Aedes aegypti e ela quer evitar o risco. 

Na avaliação de Edilberto Rocha, a situação será restabelecida ainda no primeiro semestre de 2017. “Os obstetras estão percebendo é que nos próximos meses todos vão ter aumento no número de procedimentos. Pacientes que retardaram no passado vão ter filhos agora”. O obstetra conta que já não orienta o adiamento. “As causas eram incertas e a zika veio no momento que ninguém tinha imunidade para ela. Neste momento, muita gente já foi exposta ao vírus da zika, a tendência é que as infecções sejam menores”, conclui. 

"Sou uma mãe feliz"

Apesar do medo que muitas famílias tiveram ao decidir adiar o sonho de ter um filho, as mães de crianças com a anomalia contam como essa mudança na vida delas foi importante e positiva. Elas não se abateram e viram naquele bebê a oportunidade de ver o mundo sob outra perspectiva.

É o que se percebe no discurso de Jaqueline Vieira, que atualmente é secretária do grupo União de Mães de Anjos (UMA) e mãe de Daniel Vieira, de um ano e um mês. Em 2013, Jaqueline teve câncer de útero, que se espalhou para o pulmão. Ela conseguiu superar a doença, mas o discurso era de que não poderia mais engravidar. Engravidou.

"Engravidei em janeiro de 2015, mas não sabia. Tive zika com dois meses de gravidez. Na ultrassom, com cinco meses, a médica disse que meu filho tinha hidrocefalia e que iria morrer. Entrei em desespero, fiquei louca. Com sete meses, em um novo exame, o médico disse que na verdade era microcefalia, que meu filho nasceria perfeito, apenas com a cabeça menor e algumas limitações", lembra Jaqueline. "Não fiquei triste, queria muito esse filho. Quando ele nasceu foi a maior felicidade da minha vida. Hoje eu digo que ele é um milagre porque, quando eu não podia mais engravidar, Deus me deu ele.  Sou a mãe mais feliz por ter o Daniel comigo. Não vivo triste, não vegeto", conta.

A vice-presidente da UMA, Gleyse Kelly (foto à esquerda), também agradece muito a chegada de Maria Giovanna, de um ano e um mês. "Descobri a gravidez no dia do meu aniversário, 23 de março de 2015. Na hora foi um susto porque meu terceiro filho estava com cinco meses. Aos sete meses descobri que a Gigi, assim chamada por nós, viria com a microcefalia. Tinha medo que ela não resistisse e viesse a óbito, mas nunca chorei por ela ter vindo com microcefalia". Gleyse conta que se pudesse voltar no tempo teria evitado a gravidez, não pelas condições da filha, mas porque ela tinha um filho com apenas cinco meses e que ainda não consegue dar tanta atenção para ele. "Através da minha filha, hoje eu sou uma pessoa muito melhor. Ela me fez uma mulher melhor. Luto para ajudar as famílias de bebês com micro. O ato de ajudar o próximo faz de mim um ser humano muito melhor", finalizou. 

Um aparelho de tomografia de coerência óptica (OCT) tem auxiliado pesquisadores a diagnosticar, com alta precisão, lesões nas retinas de crianças com microcefalia, cujas mães foram infectadas pelo vírus Zika durante a gravidez.

Diversos estudos já demonstraram a relação entre a infecção pelo vírus Zika e distúrbios graves nos olhos do bebê, que podem ser observados com um exame de fundo de olho, por exemplo. A diferença agora, com o uso desse equipamento, é que ele ajuda o oftalmologista a detectar, com maior precisão, qual o tipo de reabilitação mais adequada para essa criança que tem distúrbios na retina.

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O exame de imagem não é invasivo e costuma ser rápido. A dificuldade, no entanto, é posicionar os bebês de forma que eles não se mexam muito, explicou o oftalmologista Maurício Maia, professor do Departamento de Oftalmologia da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp). Segundo ele, é preciso fazer o laser chegar até a retina e o movimento da cabeça do recém-nascido dificulta o exame. "Conseguimos isso por meio de uma técnica especial”, disse ele, ressaltando que esse é o melhor equipamento para detectar lesões na retina.

A técnica especial, explicou o médico, consiste em envolver as crianças em lençóis. “Nós desenvolvemos uma solução bem simples e barata, envolvendo essas crianças em roupas, em um lençol mais apertado, sem precisar fazer qualquer sedação. A braçadeira do equipamento também faz com que as crianças fiquem em uma posição específica, quieta, em que o laser é capaz de entrar no olho e dar essa imagem para a gente”, acrescentou.

“Essas crianças vão precisar de reabilitação para o resto da vida. O tipo de reabilitação que vamos fazer é diretamente proporcional ao tipo de lesão que a gente encontra com o OCT. Esse é um estudo extremamente importante porque vai dar a diretriz para o oftalmologista de como planejar a reabilitação visual da criança e que tipo de equipamento usar tal - óculos normal, lupa de aumento ou um óculos prismático”, afirmou Maia.

Esta é, de acordo com ele, a primeira vez que o equipamento é utilizado para esse tipo de estudo. “O estudo consegue definir melhor para nós o quanto essas crianças terão de potencial visual e o quanto elas vão enxergar. Não sabíamos, até então, quanto essas crianças enxergam de verdade”,

O estudo foi publicado recentemente na revista Jama Ophthalmology e demonstrou que tanto as camadas externas quanto as internas da retina são as primeiras a serem afetadas pelo vírus, trazendo prejuízos para a visão central dos bebês.

“Quando a lesão é inicial, começa o acometimento das estruturas da retina interna. Quando a lesão é mais grave, mais relacionada aos sintomas da mãe no primeiro trimestre [de gravidez] e mais relacionada à gravidade da microcefalia, aí as lesões atingem a porção externa da retina, sendo que, nos casos mais graves, até a coroide, que é uma estrutura abaixo da retina”, disse.

O trabalho avaliou oito crianças com idades entre três e cinco meses. Sete delas foram submetidas a uma análise para o vírus Zika e apresentaram resultados positivos para os anticorpos IgM, que são produzidos na fase aguda da infecção pelo vírus. Dos 16 olhos analisados, 11 (ou 69% do total) apresentaram alteração da retina.

Alguns bebês infectados pelo vírus da zika nascem aparentemente saudáveis, mas têm malformações cerebrais e depois desenvolvem a microcefalia, um crescimento da cabeça abaixo da média, segundo um estudo divulgado na terça-feira.

Os Centros de Controle e Prevenção das Doenças dos Estados Unidos (CDC) estudaram 13 casos no Brasil de bebês cujas mães tiveram zika durante a gravidez. "Destes, 11 desenvolveram microcefalia mais tarde", afirmaram os cientistas. "Este crescimento anormalmente lento da cabeça foi acompanhado por sérias complicações neurológicas".

Além disso, sete dos 13 bebês sofreram de epilepsia e "todos tinham problemas de motricidade similares aos de uma paralisia cerebral", acrescentou o estudo. Os recém-nascidos foram observados durante seu primeiro ano de vida e, portanto, eram pequenos demais para que suas deficiências cognitivas pudessem ser avaliadas.

Os pesquisadores já sabiam que o zika podia causar microcefalia e problemas no desenvolvimento cerebral mesmo quando não havia sinais externos de microcefalia. Mas o novo trabalho é o primeiro a mostrar o desenvolvimento dos sintomas após o nascimento. "Uma microcefalia pode não ser evidente no nascimento, mas se desenvolver mais tarde com anormalidades cerebrais subjacentes", disse o estudo.

No entanto, nem todos os bebês nascidos após terem sido expostos ao zika desenvolveram este tipo de problemas, e os pesquisadores ressaltam que o estudo não mostra a incidência com que a microcefalia pode se desenvolver depois do nascimento.

Os especialistas pedem, porém, aos ginecologistas que realizem tomografias cerebrais nos fetos expostos ao zika e que façam acompanhamento médico do seu desenvolvimento nos meses posteriores ao nascimento.

No próximo dia 30, um mutirão para diagnosticar bebês com microcefalia será realizado no Hospital das Clínicas (HC) da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), na Zona Oeste do Recife. No dia da campanha, serão atendidas 117 crianças no HC, encaminhadas pela Secretaria Estadual de Saúde, com suspeita da malformação, mas que ainda não possuem o diagnóstico confirmado.

De acordo com a assessoria de comunicação da UFPE, cerca de 30 profissionais, do HC e SES, participam do mutirão. A ação inclui uma avaliação feita por um neuropediatra, exames de imagem e de sangue para confirmação do diagnóstico. Os pacientes que serão atendidos durante a mobilização já foram previamente selecionados. 

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“Somos considerados um serviço de referência no atendimento de crianças com microcefalia. O HC oferece assistência multidisciplinar e especializada para esse público”, afirmou o chefe da Divisão de Gestão do Cuidado, Tiago Feitosa, explicando o porquê do HC ser o local escolhido pela SES para realização do mutirão.

A gerente de Atenção à Saúde do HC, Ana Caetano, acrescentou que, a partir do diagnóstico da microcefalia, “nós poderemos ajudar a tratar estas crianças, a dar apoio psicológico e suporte a essas famílias, buscando minimizar o sofrimento e os efeitos das lesões causadas pelo zika vírus”.

Com informações da assessoria de comunicação

O curso "Microcefalia e infecção por vírus zika: abordagem para a estimulação precoce na atenção domiciliar" abriu suas inscrições nesta quinta-feira (17). A oportunidade, para os profissionais da saúde, é oferecida pela Universidade Federal de Santa Catarina, integrante da Rede Universidade Aberta do SUS (UNA-SUS/UFSC). A carga horária é de 30 horas, e o curso será iniciado no dia 21 de novembro. 

O curso irá preparar os profissionais das equipes multiprofissionais da Atenção Básica e da Atenção Especializada para acompanhar e  monitorar o desenvolvimento infantil e também para realização da estimulação precoce e orientação às famílias de crianças com problemas decorrentes da microcefalia. 

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Para dinamizar os estudos, os conteúdos estão disponibilizados em diferentes mídias e leituras complementares. Além disso, os alunos poderão contar virtualmente com o apoio de monitores. O curso integra o Programa Multicêntrico de Qualificação Profissional em Atenção Domiciliar a Distância

De acordo com a coordenadora geral de Atenção Domiciliar do Ministério da Saúde, Mariana Borges Dias, uma das responsáveis pelo conteúdo do curso, a estimulação precoce na faixa etária dos 0 a 3 anos pode reduzir o nível de comprometimento causado pela má formação cerebral. "A abordagem oportuna por estimulação precoce reduzirá a intensidade do comprometimento neurológico, favorecendo o desenvolvimento psicomotor, das habilidades de linguagem e comunicação e, consequentemente, propiciando a socialização da criança", afirma a coordenadora. 

Microcefalia 

Segundo o boletim epidemiológico do Ministério da Saúde, que monitora os casos de microcefalia, até o dia 29 de outubro, foram confirmados 2.106 casos da doença ou alteração do sistema nervoso central sugestivo da infeção no Brasil. 

Para a professora da UNA-SUS/UFSC, Marta Verdi, que é também responsável pelo conteúdo, é preciso estar atento ao crescente número de casos registrados de doenças virais transmitidas pelo mosquito Aedes aegypti, como dengue, a febre chikungunya e a zika. "Diante da possível relação do zika vírus com o aumento de casos de microcefalia e síndrome de Guillain-Barré, é essencial que todos os profissionais de saúde sejam capacitados para a realização de ações coordenadas com os demais órgãos governamentais, a fim de proteger a saúde da população e reduzir o impacto dessas enfermidades nas pessoas atingidas", ressalta a professora. 

Especialistas, médicos e ativistas têm defendido a possibilidade de garantir à mulher o direito de interromper legalmente a gravidez enquanto perdurar a emergência da epidemia do vírus zika. O principal argumento é o sofrimento e o impacto emocional a que as mulheres são submetidas e a defesa de que o aborto é uma questão de saúde pública e bem-estar.

“Eu penso que, dada a gravidade do problema e ele ser persistente durante a vida do bebê, é um direito da mulher decidir o que ela pode carregar sobre os ombros, isso é fundamental, é um direito humano, é um direito sexual e reprodutivo e é um respeito às mulheres, notadamente as de menor renda”, defende o especialista em medicina fetal, Thomas Gollop.

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A Professora da Faculdade de Medicina da Santa Casa de São Paulo, Tânia Lago, também chama a atenção para a gravidade da epidemia. “É importante que as mulheres, ao decidirem ficar grávidas, tenham claro os riscos aos quais elas estão sendo submetidas e seria muito importante que aquelas mulheres que engravidaram e que tenham zika pudessem ter acesso à opção de interromper a gravidez em função do risco de uma doença grave acometendo o feto, porque as consequências podem ser mais graves do que inicialmente pareciam”, alerta Tânia.

Até o fim deste ano, o Supremo Tribunal Federal (STF) deve julgar uma ação direta de inconstitucionalidade (ADI 5581) que inclui o pedido de interrupção da gravidez como uma possibilidade excepcional para mulheres grávidas infectadas pelo vírus Zika e que estão sofrendo com a epidemia. O documento foi protocolado pela Associação Nacional de Defensores Públicos (Anadep) e destaca que, diante de uma situação de iminente perigo à saúde pública, há a necessidade da garantia de políticas públicas específicas para as mulheres e crianças atingidas pelo vírus Zika, como o acesso a medicamentos, transporte e benefícios sociais como o Benefício de Prestação Continuada e o Tratamento Fora de Domicílio.

“A ADI tem grande repercussão e impacto, sobretudo pelos pleitos principais de implementação de políticas públicas de informações, diagnóstico e tratamento integral às mães e crianças atingidas. Como é de domínio público estamos diante de uma epidemia mundial que exige atuação estratégica e eficaz do Estado brasileiro”, destaca Joaquim Neto, presidente da Anadep.

A ação também tem o apoio da Anis Instituto de Bioética, coordenado pela pesquisadora Débora Diniz, que acompanhou por dois meses a rotina das mulheres afetadas pela epidemia. “Essa ação não visa a legalização do aborto no país, porque nós estamos falando da epidemia, nós temos uma situação concreta que bate à porta. Nós estamos falando das mulheres durante a epidemia e é nelas que nós queremos pensar. Como proteger os direitos violados. É claro que, ao lançar a questão do aborto como parte de uma proteção, o debate do aborto volta pra cena nacional. E nós esperamos muito que ele [o debate] volte de uma maneira mais qualificada e reconheça o intenso sofrimento e risco [que as mulheres] tem ao se manter grávidas contra sua vontade”, argumenta Débora Diniz.

Religião

O contexto da epidemia e a pressão de ativistas, no entanto, não mudaram a posição de grupos religiosos sobre a possibilidade de legalizar a interrupção da gravidez. A Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) afirma que compreende a aflição das mulheres e defende que elas precisam ser amparadas, mas reforça que a epidemia não justifica a interrupção o direito de viver dos nascituros. “O posicionamento da CNBB continua o mesmo, que é o de defesa da vida. Nos chama a atenção a dificuldade de acolhimento dessas crianças. O que devemos fazer é chamar a sociedade para ser presente na vida dessas mulheres e crianças. Existe um descuido geral e temos que retomar essa questão da necessidade de combate ao mosquito. Não se fazem mais trabalhos junto às escolas e os meios de comunicação não falam mais do assunto. Mas o mosquito não transmite só o zika, então, todo o cuidado é pouco”, alerta Dom Leonardo Steiner, secretário-geral da CNBB.

Tanto a CNBB quanto a Anadep devem continuar o debate sobre o aborto depois do julgamento da ação no STF. “Acreditamos que há pontos que podem exigir uma ampliação do debate, a exemplo de audiências públicas nos termos que a própria lei dispõe e, portanto, virem a ser apreciados posteriormente ao julgamento da medida cautelar”, afirma Joaquim Neto, presidente da Anadep. “Já dialogamos com a Anadep. Há elementos importantes que concordamos na ação. E vamos continuar buscando o diálogo para mostrar a importância da vida e do cuidado com o ser humano”, reforça Dom Leonardo.

Aborto inseguro

O Instituto Anis liderou uma pesquisa nacional sobre o aborto e constatou que a interrupção da gravidez já é uma prática entre as mulheres brasileiras. “Nós encontramos que uma em cada cinco mulheres aos 40 anos já fez pelo menos um aborto na vida. Isso significa que o aborto é um evento comum, de mulheres comuns. Ele é um evento reprodutivo que faz parte da vida das mulheres. Ao mesmo tempo que nós criminalizamos o aborto e o descrevemos como um tabu, nós estamos falando de mulheres muito próximas a nós. Todas nós conhecemos cinco mulheres e uma em cada cinco já fez um aborto”, afirma a pesquisadora Débora Diniz.

O medo do futuro e a incerteza dos fatos relacionados à Síndrome Congênita do Zika têm levado muitas mulheres ao aborto clandestino e inseguro. Desde a emergência da epidemia, profissionais de saúde perceberam um aumento no número de cirurgias de curetagem, procedimento que retira os restos de um aborto realizado de forma insegura ou clandestina.

A enfermeira Quéssia Rodrigues trabalha em um dos maiores hospitais públicos de Salvador e observou a diferença na demanda de cirurgias desde o início da epidemia. “Eu tenho me assustado com o número de abortamentos que tem acontecido na unidade. A gente percebe que tá relacionado à questão dela ter tido zika. A gente presencia abortamentos espontâneos, mas a gente tem tido muito abortamento provocado. Às vezes, a gente questiona ela e percebe o medo que ela tem de desenvolver uma criança com microcefalia,” relata Quéssia.

Líderes comunitárias também relatam a ocorrência de abortamentos depois da epidemia. “Tivemos muitos casos de aborto aqui e o que nos traz mais indignação é que as mulheres realizam aborto de uma maneira muito insegura. O maior índice de morte materna na nossa capital, em Salvador, é por conta do aborto", conta a líder do coletivo de mulheres do Calafate, em Salvador, Marta Leiro. Ela ressalta que quem tem maior poder aquisitivo fica menos exposto a riscos: "Quem tem dinheiro faz em clínicas e tem todo um acompanhamento ou então vai pra um país onde [o aborto] é legalizado e fica de boa, sem sentimento de culpa”.

Um estudo da Revista Científica The New England Journal of Medicine mostra que, desde que Organização Mundial de Saúde decretou a epidemia do zika como emergência internacional, houve aumento de pedidos de aborto por mulheres latino-americanas a um grupo internacional que fornece pílulas abortivas e orienta mulheres de países onde a interrupção da gravidez é proibida.

No Brasil, a comercialização de pílulas abortivas, como o Mifepristone e o Misoprostol, também conhecido como Cytotec, é considerada crime desde 2005. A Agência Nacional de Vigilância Sanitária, Anvisa, fiscaliza e apreende os medicamentos vendidos de forma irregular. Do final de 2005 até o momento, a Anvisa determinou a suspensão de 75 páginas de Internet que divulgavam ou comercializavam o Cytotec. Outros 45 sites ainda estão sob a análise da Agência.

Nos três estados que mais registraram casos de infecção pelo vírus Zika e de bebês com microcefalia - Bahia, Pernambuco e Paraíba - , diferentes mães estão traçando um mesmo enredo de dúvidas, angústia e invisibilidade. A epidemia que chamou a atenção do mundo todo tem deixado suas principais vítimas na sombra. Donas de uma vida já difícil, mulheres nordestinas agora carregam diariamente seus filhos em busca de tratamento. Nesta sexta-feira (11) completa um ano desde que o Ministério da Saúde decretou a epidemia como Situação de Emergência em Saúde Pública de Importância Nacional.

O choro dos bebês ecoa nos corredores dos hospitais e centros de reabilitação.  Os exercícios de fisioterapia parecem um martírio para as crianças, que desde o nascimento são desafiadas a transpor seus limites. “As crianças que nascem com diagnóstico de microcefalia tem alteração do sistema nervoso central que podem afetar o desenvolvimento típico da criança e dificulta que elas tenham aquisições dentro do tempo certinho. Aí o papel da fisioterapia precoce é minimizar essas disfunções”, explica a fisioterapeuta Patrícia Carvalho, do Centro de Reabilitação Irmã Dulce, em Salvador.

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Se para os bebês parece um sofrimento, para as mães as terapias representam a esperança de amenizar as sequelas. “Eu acho que o maior medo delas é que eles não sentem, não andem, não falem”, explica a fisioterapeuta Jeime Leal, do Hospital Dom Pedro I, em Campina Grande (PB). Jeime ouve diariamente o desabafo das pacientes. “Às vezes elas chegam aqui, choram, choram, choram e eu não tenho muito o que falar, porque elas já são guerreiras por estarem nessa batalha. Eu sei que elas realmente não estão preocupadas com elas mesmas, nem com o marido, nem com nada, só com a criança. Elas fazem de tudo para não perder nenhuma sessão. Então, acho que isso tem sobrecarregado um pouco elas. Não sei até que ponto, nem até quando elas vão conseguir suportar tudo isso sozinhas.” relata.

Sandra Valongueiro, pesquisadora da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), também ressalta a importância de voltar a atenção para as mulheres. “Você imagina o que é passar a gravidez inteira com essa angústia. Essas mulheres precisam de apoio do Estado, da sociedade e das comunidades. Não é vitimizar as mulheres, mas colocá-las nos lugares onde elas devem estar. Se a maternidade no Brasil é tão importante, do ponto de vista simbólico, porque ela não é importante na prática?”, questiona.

"O meu medo era como ia ser a feição dele, se ia ser bonito"

Foi com silêncio e lágrimas que Paula Custódio reagiu à pergunta: qual é o seu sonho? Paula não revelou com o que sonha, mas contou como sua história mudou depois no nascimento de Anthony, seu primeiro filho. “Quando a gente soube, foi assustador porque eu nunca tinha ouvido falar sobre isso. Não tinham outras pessoas ao meu redor, como eu vejo hoje, que tivessem outras crianças [com microcefalia]. Primeiro, o médico não soube falar o que era. Eles só assustavam, diziam que a criança corria risco de morrer, falavam que ele não ia andar. Foi quando mandaram a gente para um médico aqui em Salvador. Ele me tranquilizou mais, disse que já viu casos piores, então era para curtir o resto da gravidez e esperar nascer”, relembra.

Paula é cuidadora de idosos e mora em Esplanada, a 165 quilômetros de Salvador. No início da gravidez, sentiu dores nas articulações. Fez o teste de sorologia e cinco meses depois do nascimento de Anthony ainda não tinha o resultado do exame. A suspeita de que foi infectada pelo vírus Zika surgiu no último ultrassom, que detectou a microcefalia no bebê. “O meu medo era como ia ser a feição dele, se ia ser bonito. Porque no começo, quando fui olhar na internet, só tinha umas imagens feias”, relata.

O diagnóstico da microcefalia de Anthony foi feito pelo médico do interior, que imediatamente encaminhou o caso para Salvador. Os cuidados com o filho obrigam Paula a se deslocar pelo menos três vezes por semana para a capital, com o carro da prefeitura de sua cidade. Apesar da agenda cheia com a atenção especial ao bebê, Paula tem conseguido conciliar a nova rotina com o trabalho de cuidadora de idosos. E não deixou de sonhar, pelo filho e por ela. “Eu tenho vários sonhos. Só que o principal, fora ele, tem um que eu não quero falar agora”, diz emocionada.

“Tenho planos...”

Lucilene Guimarães Moreira, 22 anos, mora em Monte Santo, “oito horas de relógio” de Salvador, como ela mesma descreveu. O olhar desconfiado e tímido muda no momento em que observa a filha na incubadora. Cauane Vitória nasceu com microcefalia e precisou passar os primeiros meses de vida na UTI neonatal para aprender a sugar. O primeiro desafio da menina foi vencer a recuperação da gastrostomia, cirurgia para colocar uma sonda no estômago.

No corredor do Hospital Geral Roberto Santos, em Salvador, Lucilene segue acompanhada do companheiro Ronaldo de Jesus Guimarães, 32 anos. Eles são primos e estão juntos há um ano e meio. Não planejaram a gravidez, mas também não evitaram: ela diz que não estava usando nenhum tipo de método contraceptivo. Os sintomas de febre, dor de cabeça e dores no corpo a levaram ao médico. Foi assim que descobriu que estava com a febre chikungunya e grávida de dois meses. Combinação que, mais tarde, levou ao diagnóstico de microcefalia no bebê. "Eu tomei um susto, ao mesmo tempo estava ciente que estava acontecendo isso", conta.

Ronaldo é ajudante de pedreiro e também presta serviços gerais. Ficou desempregado por mais de um ano devido à rotina de acompanhar diariamente Lucilene e a filha ao hospital. Sem renda, o casal teve que se mudar para a casa da mãe do rapaz. Para acompanhar a filha na UTI, eles intercalam oito dias em Salvador e oito dias em Monte Santo. Na capital baiana, se hospedam em uma pousada perto do hospital. Quem paga o transporte e a hospedagem é a prefeitura de Monte Santo.

Será assim enquanto Cauane estiver na UTI. E, depois da alta, a mãe sabe que sua rotina não será muito diferente.“Vou ficar todo mês indo para o médico com ela, fazendo acompanhamento, vou ter que dar muita atenção, carinho, ter muitos cuidados especiais”, diz. Antes da gravidez, Lucilene pretendia fazer um curso de enfermagem. O sonho foi adiado por um tempo. Mas a jovem fala com o verbo no tempo presente: “tenho planos” e o que mais quer nesse momento é que sua filha “cresça com saúde, tenha um futuro bom e possa ser normal como qualquer pessoa”.

“Deus está testando a fé de cada mãe”

A voz suave e o rosto de menina contrastam com o tamanho da responsabilidade que Amanda dos Santos Oliveira carrega nos braços. A jovem de 19 anos é mãe de Emanoel, um dos bebês afetados pela Síndrome Congênita do Zika em Campina Grande (PB). Amanda descobriu que estava grávida aos cinco meses de gestação. A essa altura, o relacionamento com o pai da criança já tinha acabado.
A gravidez inesperada passou rápida e sem complicações. Em 14 de dezembro de 2015, Emanoel nasceu na cama dos pais de Amanda: a bolsa estourou e não deu tempo de ir para o hospital. Quando o Samu chegou, o bebê já estava nos braços da mãe, ainda ligado pelo cordão umbilical. Levados para o hospital, receberam os primeiros cuidados e também a notícia de que Emanoel tinha microcefalia. A equipe médica falou primeiramente com os avós, para não assustar a mãe. Passados alguns dias, Amanda soube do diagnóstico e chorou. E lembrou que durante a gravidez apareceram algumas manchinhas vermelhas em seu corpo, um dos sinais característicos da infecção pelo vírus Zika.

No bairro José Pinheiro, periferia de Campina Grande, a vida no barraco de poucos metros quadrados ficou ainda mais apertada. Nos fundos do quintal, Amanda divide um único cômodo com o pai, a mãe, o irmão, o filho e os animais de estimação. Uma cama de casal, um beliche, um guarda-roupa pequeno, uma geladeira e um fogão compõem o mobiliário da casa. Emanoel não tem berço, dorme com a mãe na parte de baixo do beliche. Todo o enxoval do menino foi doado.

Antes de Emanoel, a única responsabilidade de Amanda era com os estudos. Hoje, leva uma rotina de compromissos diários com o filho: consulta, exame, fisioterapia, amamentação. “Não posso mais estudar por causa dele. Antes eu saía com minhas amigas e elas vinham aqui. Eu não importava, dormia até altas horas. Agora acordo cedo, cuido dele, dou banho, ajeito, faço tudo”, descreve.

A mãe da jovem faz faxina e ganha R$ 50 por semana. O pai trabalha fazendo serviços gerais e Amanda aguarda resposta do pedido que fez para receber o Benefício de Prestação Continuada. Na Justiça, ela pede para que o pai do menino reconheça o filho e pague a pensão alimentícia. A jovem conta toda sua história sem tirar o sorriso do rosto e credita tudo o que está passando a uma missão divina. “Não dá para explicar de onde eu tiro força. É só de Deus mesmo. Se ele me deu, eu tenho que ir até o fim. Acho que ele está testando a fé de cada mãe, não só da minha, mas de cada mãe”, diz.

“Ele está reagindo bem ao tratamento, está valendo a pena"

É na alta madrugada que Miriam de França Araújo se levanta, arruma o bebê, toma café e espera pelo carro da prefeitura na zona rural. O motorista chega por volta de 3h e a leva com seu filho por uma estrada de terra sinuosa e cercada pela vegetação peculiar do sertão do Cariri. Já são 4h quando ela chega ao centro de São José dos Cordeiros e troca de transporte. Embarcada na van da prefeitura, segue para o seu destino final: o Hospital Dom Pedro I, em Campina Grande (PB). A maratona se repete pelo menos três vezes por semana para que seu filho Lucas faça fisioterapia e receba assistência médica.

No caminho, o dia vai nascendo. A chegada ao hospital é sempre por volta de 6h30 - ainda falta meia hora para começar a fisioterapia. Sentada na recepção, enquanto o bebê dorme em seu colo, ela conta sua história. “Olha, a história minha e do Lucas é uma história muito bonita. É uma coisa assim, difícil de contar, tem atropelos. É muito cansativo também. Tem os momentos ruins, os momentos bons. Mas, eu estou lutando junto com ele. Ele está reagindo bem ao tratamento, está valendo a pena. Não estou vindo para cá em vão. Ele está tendo tratamento aqui de vários médicos, graças a Deus: oftalmo, otorrino, depois ele vai começar no fonoaudiólogo”, comemora a mãe.

Com 25 anos, nascida em Serra Branca, interior da Paraíba, mãe de uma menina de 7 anos, Miriam não planejava ter o segundo filho. Estava tomando antinconcepcional, mesmo assim engravidou. Ela e o companheiro não vivem mais juntos. No oitavo mês de gestação, ela teve os sintomas do zika. “Eu fiz meu pré-natal normal. Eu não tive nenhum problema durante a gravidez, só no oitavo mês que eu tive essa zika, fiquei internada e tudo. Se não foi a zika, foi Deus que permitiu que ele nascesse assim”, afirma.

A culpa que Miriam sentia foi aliviada pelo acompanhamento psicológico oferecido pelo hospital. A mãe agora se dedica à rotina de tratamento do filho, principalmente as sessões de fisioterapia. "Ele tinha o corpo todo duro, todo entrevado. Era difícil ele soltar som, o choro dele era como se fosse um choro de miado de gato. E agora está praticamente como uma criança normal: ele chora, diz “mama”. Ele brinca, conversa, ri, ele já me conhece, conhece minha filha. Os momentos bons são esses", conta.

Como boa parte das mães de bebês com microcefalia, Miriam passa por dificuldades financeiras. A jovem mora com os pais e ganha R$ 233 do Bolsa Família. O ex-companheiro ajuda quando dá. Com o ensino médio completo, Miriam espera logo poder realizar seu sonho: fazer faculdade e conquistar a casa própria. Sorte não está faltando. Em um sorteio de comemoração ao Dia das Mães no hospital, a jovem foi presenteada com uma bolsa de estudos de uma Faculdade de Campina Grande. “Eu escolhi para Letras ou pra Pedagogia. Porque minha psicóloga daqui acha que eu me identifico muito com a pedagogia. O meu sonho é terminar os meus estudos, fazer um bacharelado e ter minha casa própria.” revela.

Às vésperas de completar um ano do estado de emergência em saúde pública no Brasil declarado por causa da microcefalia, o diretor do Instituto Evandro Chagas, Pedro Vasconcelos, não hesita em afirmar: o zika, vírus associado ao aumento de casos da má-formação, trouxe várias lições para cientistas. "Não se pode desprezar nenhum agente infeccioso, mesmo aqueles que à primeira vista são considerados inofensivos." Esse, completa Vasconcelos, foi o erro cometido com zika no Brasil e no mundo.

Descoberto na década de 40, o zika nunca despertou interesse de pesquisadores. "Até o início de 2015, ele era considerado um vírus de segunda categoria. Ele era pouco estudado, porque se imaginava que seria de pouco interesse para saúde pública."

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O baque, no entanto, não se resumiu ao fato de ele ser muito mais nocivo do que se pensava no início. "O zika rompeu um padrão. Ele representa uma revolução em termos de arbovírus. Até então, acreditávamos que esses agentes eram transmitidos pela picada de artrópodes infectados." O zika veio mostrar que essa ideia era limitada e incorreta. Comprovou-se que ele pode ser transmitido por via sexual, transfusão de sangue. "E ele pode causar doença grave. Tanto na sua forma congênita quanto para pacientes infectados que já apresentam, por exemplo, falhas no sistema imunológico", explica Vasconcelos.

Em virtude do alcance do vírus, a Organização Mundial de Saúde (OMS) declarou, em fevereiro, estado de emergência internacional em saúde pública. Vasconcelos defende que esse status seja mantido.

Estratégias

A equipe de Vasconcelos trabalha em várias frentes. Um dos braços considerados mais promissores é o que se dedica ao desenvolvimento de uma vacina, em parceria com a Universidade do Texas. Os resultados obtidos até agora são animadores. Nos próximos dias, a vacina será testada em primatas, em áreas controladas.

A vacina é desenvolvida com base em um vírus vivo enfraquecido. Por meio do uso de engenharia genética, pesquisadores procuram manter a capacidade do vírus de infectar células, sem, no entanto, que ele possa desenvolver a doença.

O diretor do Instituto Evandro Chagas avalia que há muito ainda que se descobrir sobre o zika. "Ele era praticamente desconhecido. Hoje temos algumas pistas. Mas é preciso muito mais", disse. Uma das hipóteses que necessitam ser avaliadas ainda é o fato de a microcefalia não atingir todos os bebês cujas mães são infectadas pelo zika. "Há uma corrente que arrisca haver um papel protetor da vacina de febre amarela. Isso poderia explicar, por exemplo, o fato de que as regiões onde a microcefalia ocorreu de forma mais intensa no ano passado coincidir com áreas onde a vacina não é aplicada de forma rotineira. Mas são apenas suposições."

Vasconcelos reconhece que, a partir da agora, os brasileiros começam a perder o protagonismo nas descobertas. Ele atribui essa mudança ao investimento realizado em outros países. "Nossa contribuição foi significativa. Mas há uma tendência de que outros centros passem a apresentar estudos."

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

Um ano depois da primeira identificação do surto de zika no Brasil, a OMS ainda não tem respostas para a maioria dos desafios ou novos instrumentos para lutar contra o vírus. Mas tem certeza de que a doença chegou para ficar e que governos e sua própria estrutura terão de trocar uma estratégia de emergência contra a microcefalia por uma resposta de longo prazo para ajudar as famílias afetadas.

Desde 2007, 73 países registraram a transmissão do vírus. Desses, 67 foram alvo de surto desde 2015. Mas em pelo menos sete deles, a situação aponta para uma crise endêmica. Em 12 países, a OMS identificou a transmissão de pessoas para pessoas, numa indicação do poder do vírus em contaminar por meio do contato sexual.

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Nesse mesmo período, 26 países registraram um salto em casos de microcefalia e outras más-formações "potencialmente associadas com o zika". Na semana passada, os últimos a registrar casos de microcefalia foram Bolívia, Trinidad e Tobago e Vietnã. Em 19 países, o aumento de casos foi da Síndrome de Guillain-Barré.

Considerando ser "impossível" medir todas as pessoas contaminadas pelo vírus, a OMS se limita a contar os casos de microcefalia e de Guillain-Barré. Assim, até quarta-feira, a organização somava 2.257 casos de microcefalia pelo mundo. Cerca de 10% deles aconteceram fora do Brasil. O País lidera a lista, com 2.079 casos, ante 54 da Colômbia e 28 nos EUA.

Para a OMS, não há dúvidas de que a proliferação vai continuar e que o vírus "se instalou" de fato em países tropicais. Isso, na avaliação dos especialistas da entidade, vai exigir uma mudança no comportamento da resposta e até mesmo dos serviços de saúde dos países atingidos. "Teremos zika em todos os países que registrarem a presença de mosquito", disse Monika Gehner, porta-voz da OMS.

A OMS sugere que, a partir de agora, a meta não seja apenas a de parar o mosquito. Mas preparar os serviços de saúde para uma resposta de longo prazo para atender crianças afetadas, além de suas famílias.

Dúvidas

Um ano após iniciar o trabalho, porém, a OMS está sem resposta para quase todos os aspectos da doença. Não há, por exemplo, respostas sobre as linhagens do vírus e por que em locais como o Brasil os casos de microcefalia explodiram e, em outros, não. "Estamos vendo um número cada vez maior de casos na Ásia e indicando que qualquer que seja a linhagem, os problemas serão identificados", indicou Monika.

Ela admite, por exemplo, que até hoje a organização não tem uma resposta a dar sobre o motivo pelo qual os casos de microcefalia no Brasil deram um salto importante, enquanto na Colômbia a taxa é muito menor. Documentos obtidos pelo Estado apontam que a OMS quer, até o final de 2017, intensificar investigações para tentar entender qual é de fato o impacto do vírus em fetos e recém-nascidos.

Estão em falta os instrumentos para parar a doença. Produtos contra o mosquito Aedes aegypti não seriam suficientes. Duas vacinas já começaram a passar por testes, mas sua comercialização ainda não tem data e, na melhor das hipóteses, estariam no mercado em 2018. "Podemos levar mais dois ou três anos para ter uma vacina", disse Monika.

Autoridades da Tailândia confirmaram dois casos de microcefalia em bebês de mães contaminadas com o vírus da Zika, o que pode fazer do país, segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), o primeiro do Sudeste Asiático com registro de uma contaminação in utero.

"Dois dos três bebês são microcéfalos pelo vírus da Zika", anunciou Wicharn Pawan, funcionário do ministério da Saúde. Na terça-feira (27), o governo tailandês anunciou suspeitas sobre a microcefalia de três bebês nascidos de mães contaminadas com o vírus Zika e que publicaria os resultados das análises nesta sexta-feira (30).

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Na quarta-feira, a OMS informou que se os casos fossem confirmados seriam os primeiros no sudeste da Ásia. Até o momento haviam sido registrados casos de fetos contaminados por Zika durante a gravidez nas Filipinas e na Malásia. Mas não se estabeleceu uma responsabilidade direta pelo vírus.

As autoridades tailandesas acompanham 36 mulheres grávidas infectadas pelo Zika. Oito delas já deram à luz e três bebês nasceram com microcefalia, sendo que apenas dois podem ser atribuídos à Zika, de acordo com os exames.

Um quarto bebê, que ainda não nasceu, parece sofrer de microcefalia, mas sem relação com o vírus da Zika, de acordo com o ministério da Saúde. O vírus da Zika está presente há vários anos no sudeste da Ásia.

Mas após a divulgação dos casos de microcefalia na América do Sul, a vigilância se tornou mais intensa em outros continentes.O ministério da Saúde da Tailândia recorda que a cada ano entre 200 e 300 crianças com microcefalia nascem na Tailândia, até agora associada em muitos casos a outras doenças, como rubéola e catapora.

O ministério da Saúde da Tailândia recorda que a cada ano entre 200 e 300 crianças com microcefalia nascem na Tailândia, até agora associada em muitos casos a outras doenças, como rubéola e catapora.

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Com o surto da microcefalia no Brasil desde o fim do ano passado, o Ministério do Desenvolvimento Social autorizou o pagamento do Benefício de Prestação Continuada (BPC), no valor um salário mínimo, às mães de bebês com a malformação. Em junho de 2016,  a Lei Federal 13.301 garantiu o pagamento do benefício por três anos para doenças transmitidas pelo mosquito Aedes aegypti. Entre o período de 1 de agosto de 2015 e 10 de setembro de 2016, a Secreteraria Estadual de Saúde já confirmou 379 casos de microcefalia em Pernambuco. De acordo com o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) em Pernambuco, existem apenas 227 pedidos do BPC concedidos. Um total de 152 mães continuam aguardando por respostas do órgão e viram estatísticas na defasagem no atendimento que deveria ser prioritário.

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Para discutir a questão da microcefalia no Estado, o Conselho Regional de Medicina de Pernambuco (Cremepe) convocou uma coletiva de imprensa, na manhã desta terça-feira (20). Presente no encontro, a representante da perícia médica do INSS em Pernambuco, Adriana Veloso, falou sobre as estratégias montadas pelo INSS pare realizar o atendimento das crianças com a microcefalia. "Já estamos nos mobilizando internamente para atender a todas as demanas. No primeiro semestre, consguimos fazer um mutirão de atendimento. O tempo de espera hoje ja é reduzido", informou Veloso. Ainda de acordo com a gestora, no Recife, a espera pelo atendimento é de dois dias para o BPC e de 100 dias para casos no geral. 

De acordo com o Ministério do Desenvolvimento Social, o pagamento do BPC corresponde a um salário mínimo, no valor de R$ 880, e só podem receber as mães que possuir uma renda per capita familiar inferior a um quarto de salário mínimo, R$ 220. Muitas vezes tendo que se dedicar aos cuidados com o bebê, a mãe tende a abdicar de todas outras tarefas, incluindo o trabalho como fonte de renda da família. De acordo com o INSS, existe uma espera padrão de trinta dias, passando pelas perícias e pelo atendimento inicial dos bebês com microcefalia até que o primeiro benefício seja recebido. 

A presidente da União de Mães de Anjos (entidade que presta assistência para mães de bebês com microcefalia), Germana Soares, no entanto, discorda da informação repassada pelo INSS durante a coletiva de imprensa. "São no mínimo três meses até que a gente consiga receber o primeiro benefício. As perícias demoram bastante e o agendamento muitas vezes é marcado para meses depois.", detalhou Germana. Ela ainda falou que muitas vezes, as mães que residem no interior de Pernambuco, se deslocam até a capital e não conseguem obter informações sobre o atendimento necessário no INSS.

Além da questão do benefícios, também foram debatidas outras temáticas durante a roda de conversa. O  presidente do Cremepe, André Dubeux, apresentou um levantamento de que em Pernambuco não existem equipes multiprofissionais suficientes para lidar com a microcefalia. Dubeux também falou de que não foram localizadas creches de acolhimento para crianças com microcefalia, além da falta medicamentos para crianças com doenças raras. Representantes da Secretaria de Saúde de Pernambuco (SES) e da Secretaria de Saúde do Recife não compareceram ao evento. O presidente do Cremepe informou que irá elaborar um documento com as informações colhidas, que será posteriormento encaminhado ao Ministério Público de Pernambuco (MPPE).

Para Germana, que compareceu ao evento com o seu filho Guilherme, a falta de profissionais capacitados e inclusivos é grave. "Trabalhamos com a aceitação, o preconceito e com o psicológico das mulheres porque antes de mães, elas são mulheres  e precisam estar bem para criarem os seus filhos", argumentou. Para ela, as dificuldades do interior e da capital no tratamento dos profissionais, a falta de remédios na rede pública e a escassez de creches inclusivas, torna a criação de seus filhos um  novo desafio. 

Posicionamento das secretarias

Em nota, as secretarias de Educação e Saúde do Recife afirmaram que nenhum representante das respectivas pastas foi convidado para audiência. O texto também menciona o monitoramento e o número de estudantes com microcefalia matriculados nas escolas e creches municipais. Confira o texto na íntegra:

As Secretarias de Educação e Saúde do Recife informam que não foram oficialmente convidadas para a audiência. Somente neste mês, a Seduc participou de dois eventos para discutir a microcefalia.

A Secretaria de Educação do Recife esclarece ainda que a rede municipal de ensino tem 16 estudantes com microcefalia matriculados nas escolas, creches e creches-escolas municipais. Desses, três têm de 0 a 11 meses e estão em turmas de berçário. Essas crianças são sempre monitoradas pela Divisão de Educação Especial (DEE) da Secretaria de Educação e pela Secretaria de Saúde do Recife.

Os estudantes com microcefalia, assim como todos os outros 3.600 alunos com deficiência matriculados na rede, têm aula nas salas regulares, junto com os demais estudantes da rede municipal.  A partir dos 4 anos, os estudantes com deficiência também passam a ser atendidos por professores especialistas em Educação Especial.

Para mais informações relacionadas à saúde, vocês podem procurar a assessoria da Secretaria de Saúde do Recife.

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