A quarta edição da Cúpula da Comunidade dos Estados Latino-Americanos e Caribenhos (Celac) terminou nesta quarta-feira (27), em Quito, com muitas declarações protocolares, mas sem um rumo claro para o próximo período. Temas como alternativas para enfrentar as incertezas econômicas, no momento em que os países da Celac enfrentam queda no preço das commodities, baixo crescimento e alta da inflação ocuparam boa parte dos debates, mas foi o presidente da Venezuela, Nicolás Maduro, quem roubou a cena ao sugerir um "plano anticrise" para estimular o comércio da região.
"Vivemos uma situação de emergência", disse Maduro. "A bonança do preço do petróleo, se serviu para grande investimento social, também reafirmou a dependência do modelo rentista petroleiro. Em tempos de crise, as famílias se ajudam. É hora de um plano de solidariedade."
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Antes mesmo de discursar, Maduro já havia afirmado que "a Venezuela está em uma situação muito difícil", enfrentando problemas graves, como hiperinflação, escassez de produtos essenciais e queda acentuada das receitas. No plenário, ele recebeu apoio de seus pares.
Depois de dizer que chegaria à Celac disposto a "ir com tudo" para cima do presidente da Argentina, Maurício Macri, Maduro recuou. Macri não compareceu e enviou no seu lugar a vice-presidente Gabriella Michetti. Em vez de responder às críticas do país vizinho cobrando a liberdade dos presos políticos, Maduro pediu solidariedade à Argentina na batalha para recuperar os territórios das Ilhas Malvinas, sob controle britânico.
O vice-presidente de Cuba, Miguel Díaz-Canel, pediu apoio à presidente Dilma Rousseff, que enfrenta ameaça de impeachment. "Estendemos a Dilma Rousseff e ao povo brasileiro nossa solidariedade e apoio na batalha que enfrentam para defender as conquistas sociais e políticas dos últimos 13 anos", afirmou Canel, após elogiar Maduro e pedir a soltura dos prisioneiros de Guantánamo.
A reunião de Quito marcou a primeira cúpula da Celac após a retomada das relações entre Cuba e Estados Unidos. Dos 33 chefes de Estado e de governo que formam o grupo, porém, só 14 compareceram. Os outros 19 enviaram representantes.
Dilma ficou menos de 24 horas em Quito e retornou ao Brasil antes da sessão plenária da Celac. A defesa da unidade do bloco para o combate à crise global foi feita pelo ministro das Relações Exteriores, Mauro Vieira.
O encontro terminou esvaziado, sem consenso sobre pontos considerados importantes pelo Equador, como a Agenda 2020, com metas de redução da pobreza e de mudanças climáticas.
"Lamentavelmente, por falta de consenso e diferentes visões sobre a Celac --que, pessoalmente, não considero excludentes--, não pudemos estabelecer metas quantificáveis", disse o presidente do Equador, Rafael Correa, que renovou as queixas à atuação da Organização dos Estados Americanos (OEA). "O mundo do futuro será de blocos. A Celac deve substituir a OEA, que nunca funcionou e é cada vez mais anacrônica. Fidel (Castro) a chamou adequadamente de ministério das colônias", provocou Correa.
Farc
A Celac firmou o compromisso de apoiar o acordo de paz entre Bogotá e as Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc), previsto para este ano.
"Hoje estamos dando aqui um passo muito importante adicional para a busca da paz e o fim da guerra na Colômbia. Essa paz vai beneficiar todo o continente", disse o presidente da Colômbia, Juan Manuel Santos. "É talvez o único conflito armado hoje que se está resolvendo de forma dialogada e exitosa."
A missão de observação para o cumprimento do acordo de cessar-fogo entre o governo colombiano e as Farc foi aprovada na segunda-feira pelo Conselho de Segurança da Organização das Nações Unidas (ONU). Santos comemorou a decisão e disse que a Celac será "fonte de pessoal" para verificar o desarmamento.
Em nota divulgada ontem, o Ministério das Relações Exteriores saudou a adoção da missão política especial por parte do Conselho de Segurança da ONU para monitorar o acordo de paz na Colômbia. "Ao reiterar o compromisso do Brasil com a preservação da paz e a manutenção da estabilidade regional, o governo brasileiro expressa seu apoio aos esforços da Colômbia para a conclusão e plena implementação do Acordo Final, que trarão efeitos positivos para toda a região, e reafirma sua disposição de contribuir para esse fim", diz um trecho da nota do Itamaraty.
Santos observou que a partir de agora as Nações Unidas escolherão os participantes da missão. "Entregamos uma Celac com toda a capacidade de apoiar a verificação do acordo do cessar-fogo e de entrega de armas na Colômbia", observou Correa.
Uma disputa de bastidores marca agora a negociação para a presidência da Celac, a partir de 2017. A Bolívia é candidata a suceder a República Dominicana, que ontem assumiu o comando do grupo. O problema é que o Chile não aceita que a Bolívia presida o bloco. Motivo: avalia que, nessa condição, a Bolívia usaria a Celac para avançar na sua antiga demanda de recuperar o acesso ao Oceano Pacífico.
Na tentativa de impedir a Bolívia de chegar à presidência, o Chile agora estimula uma candidatura de Honduras para dirigir a Celac em 2017. (Vera Rosa)