Dois anos depois de sua morte, o ex-presidente Hugo Chávez segue gerando posições contrárias entre os venezuelanos, imersos em uma profunda crise econômica que pela primeira vez em 16 anos colocou o chavismo diante do risco de uma derrota eleitoral.
O governo e seus seguidores comemoraram nesta quinta-feira com uma série de atos em Caracas e em outras cidades a morte de Chávez, vítima de um câncer sobre o qual ninguém conhece detalhes.
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"Hoje recordamos as lições aprendidas com o grande mestre, construtor da nossa nova história, Hugo Chávez", disse o presidente Nicolás Maduro, presente em um ato comemorativo que contou com a presença de intelectuais latino-americanos realizado na Praça Bolívar, em Caracas.
Maduro aproveitou o evento para reiterar a denúncia sobre um suposto plano golpista contra ele e seus partidários, clamando para que seus apoiadores "defendam a pátria" e denunciem aqueles que impulsionem a "guerra econômica" através do desabastecimento de produtos básicos.
A comemoração ocorre em um contexto difícil. Além da recessão, a economia sofre com uma galopante inflação que terminou o ano passado em 68,5% e severos problemas de desabastecimento que se evidenciam nas largas filas nas entradas de supermercados e outras lojas.
A forte deterioração das condições de vida dos venezuelanos tem golpeado especialmente os mais pobres, onde ainda se encontra respaldo do governo.
No ano passado, 3,53 milhões de lares estavam em condição de pobreza, dos quais 33% correspondiam a "novos pobres" que entraram nos últimos anos a esse estrato arrastados pela crise, revelou uma pesquisa da Universidade Católica Andrés Bello.
Apesar dos tempos difíceis, a recordação do carismático líder político segue presente para uma parte da população. Outro setor, no entanto, o responsabiliza pela crise que poderia se agravar pela queda nos preços do petróleo, a principal fonte de recursos do país.
O presidente Nicolás Maduro, que se identifica como "afilhado político" de Chávez, tem tentado atrair seus seguidores lançando mão da memória do popular líder e inclusive imitando seu estilo aguerrido e bonachão em diversas situações. Porém, o peso da crise e os erros de sua gestão têm golpeado a sua popularidade, que no final de 2014 havia caído para cerca de 22%.
A perda de respaldo popular ameaça se transformar em problema para o chavismo nas eleições parlamentares deste ano.
Apesar de a oposição estar à frente das pesquisas eleitorais preliminares, a sua situação não é tão favorável devido à falta de recursos, ao limitado acesso comunicacional e à crise interna pelas fortes discrepâncias entre seus membros.
Sob um sol ardente e em meio a uma calçada lotada de lixo, Isabel de Perales, uma humilde dona de casa de 68 anos, aguardava resignada em uma longa fila para entrar em um supermercado do bairro de Propatria, na zona oeste de Caracas, onde é comum cruzar com grandes desenhos de Chávez em muros.
"Agora está tudo mal, porém quando Chávez era vivo, estávamos bem. Agora não sei o que se passa com Maduro que todo o bem está tão mal", afirmou Isabel.
Em toda a capital, atos contrários à Chávez e ao chavismo também ocorrem nesta quinta-feira. Em um deles, manifestantes se "crucificaram" em plena praça pública, alegando que querem mostrar como vivem os venezuelanos. "Hoje toda a Venezuela está crucificada", disse o estudante Ismael Villamizar, de 21 anos.
No plano político, também é possível observar mudanças significativas desde a morte de Chávez.
No ano passado, a equipe ministerial de Jorge Giordani, artífice das políticas econômicas nos quase 14 anos de governo de Chávez, saiu do governo. Também se demitiu outro de seus homens fortes, o engenheiro Rafael Ramírez, que foi por mais de uma década de o ministro do Petróleo e presidente da estatal Petróleos de Venezuela (PDVSA).
No último ano, Maduro tem reforçado a sua equipe com a presença dos militares, especialmente na área econômica.
O presidente do instituto de pesquisa local Datanalisis, Luis Vicente León, afirmou que embora Chávez, um tenente-coronel reformado, tenha dado a seus ex-companheiros de armas um papel destacado no governo, "os militares dependiam" do carismático líder.
Com Maduro, pondera o analista, essa relação tem mudado devido ao fato de o mandatário "depender bem mais do setor militar para sua governabilidade". Fonte: Associated Press.